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A alusão a esta segunda circunstância, aliada ao que an teriormente afirmei, quanto à proximidade que se estabelece en-

ORDEM ECONÔMICA

25. A alusão a esta segunda circunstância, aliada ao que an teriormente afirmei, quanto à proximidade que se estabelece en-

tre os conceitos de ordem econômica, parcela da ordem jurídica, e Constituição Econômica, impõe o desvio de nossa atenção para dois outros temas: o relacionado aos tipos de Constituição e o atinente àquele segundo conceito, de Constituição Econômica.

Anteriormente a sua abordagem, todavia, até para que pos- sa, adiante, retomá-las, devem as seguintes verificações ser pontualizadas:

— a contemplação, pela ordem jurídica, do conjunto de nor- mas referível como ordem econômica não é uma inovação deste século, que, por si só, peculiarize a ordem jurídica intervencionista — é a compostura dela, ordem econômica, que a peculiariza (a ordem jurídica intervencionista) como tal;

— a nova ordem econômica — aquela, à qual me referi na primeira afirmação que postulei neste ensaio — não se esgota no nível constitucional, compondo-se por inúmeras normas infra- constitucionais.

26. A enunciação de uma tipologia de Constituições pressu-

põe o desenvolvimento, anterior, de um exercício classificatório. As classificações, como observa Carrió,14 não são verdadei-

ras nem falsas, mas, simplesmente, úteis ou inúteis. Suas vanta- gens ou desvantagens estão sujeitas ao interesse que orienta quem as formula e a sua fecundidade para representar um campo de conhecimento de uma maneira mais facilmente compreensível ou mais rica em conseqüências práticas desejáveis.

Inúmeros critérios há desde os quais, de forma múltipla, se pode classificar as Constituições. Nenhuma dessas classificações é verdadeira; nenhuma é falsa. O que resulta, simplesmente, é que, se o que se pretende demonstrar, comprovar ou esclarecer é algo bem definido, em regra será demonstrável, comprovável ou

esclarecível mediante o recurso a uma dessas classificações. Esta, no caso, será a classificação que se presta, de modo útil, ao fim almejado; as demais serão inúteis para tanto.

Assim, podemos cogitar, por exemplo, de classificá-las se- gundo o critério que aparta a Constituição escrita da Constituição real.15 Ou as classificaremos, desde o critério da análise ontológi-

ea da concordância das suas normas com a realidade do processo do poder, em Constituições normativas, nominais e semânticas.16 E

poderemos, sucessivamente, classificá-las em Constituição formal e Constituição material e em Constituição política e Constituição social, ou, noutra série, emConstituição-garantia e Constituição prospectiva, Constituição simples e Constituição complexa ou compromissória, Cons- tituição definitiva e Constituição provisória.17

Nenhuma dessas classificações ora nos interessa, senão a que opõe Constituições estatutárias (ou orgânicas), de um lado, e Cons- tituições diretivas (ou programáticas, ou doutrinais), de outro.

27. Toma-se, genericamente, como Constituições estatutárias ou orgânicas as que se bastam em definir um estatuto do poder, concebendo-se como mero "instrumento de governo", enuncia- doras de competências e reguladoras de processos.18 Estas não

deixam de dispor normas que se possa indicar como integradas na chamada Constituição Econômica, ainda que o façam de modo tão-somente a "receber" a ordem econômica praticada no mun- do real,19 ou seja, simplesmente afirmando normas que a retra-

tem.

15. Ferdinand Lassalle, Que é a Constituição?, 2a ed., sem indicação de tra- dutor, Kairós Livraria e Editora Ltda., São Paulo, 1985.

16. Karl Loewenstein, Verfassungslehre, 3. Auflage, J.C.B. Mohr (Paul Siebeck), Tübingen, 1975, pp. 151 e ss. (há tradução espanhola: Teoria de la

Constitueión, trad. de Alfredo Gallego Anabitarte, reimpressão da 2a ed., Edito- rial Ariel, Barcelona, 1979, pp. 217 e ss.).

17. V. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, t. II, 2a ed. (reimpres- são), Coimbra Editora, Coimbra, 1987, pp. 22 e ss.

18. José Joaquim Gomes Canotilho, Constituição Dirigente e Vinculação do

Legislador, Coimbra Editora, Coimbra, 1982, p. 12.

19. Carlos Ferreira de Almeida (Direito Econômico, Associação Acadêmica da Faculdade de Direito de Lisboa, Lisboa, 1979, p. 711) as refere como "espelho da ordem estabelecida".

Já como Constituições diretivas ou programáticas — doutrinais — são concebidas as que não se bastam em conceber-se como mero "instrumento de governo", mas, além disso, enunciam di- retrizes, programas e fins a serem pelo Estado e pela sociedade realizados. Elas, pois, as que se transformam em um "plano nor- mativo-material global, que determina tarefas, estabelece progra- mas e define fins"; não compreendem tão-somente um "estatuto jurídico do político", mas sim um "plano global normativo" do Estado e da sociedade.20 A Constituição Econômica que nelas se

encerra compreende a enunciação dos fins da política econômi- ca, postulando, na sua conformação, a implantação de uma nova ordem econômica.

Veja-se, da jurisprudência do STF, as ADIs 1.950 e 3.512. Daí referirmos uma Constituição Econômica estatutária — que estatui, definindo os estatutos da propriedade dos meios de pro- dução, dos agentes econômicos, do trabalho, da coordenação da economia, das organizações do capital e do trabalho — e uma Constituição Econômica diretiva (ou programãtica) — que define o quadro de diretrizes das políticas públicas, coerentes com deter- minados objetivos também por ela enunciados.21

E no seio das Constituições diretivas que germinam as novas ordens econômicas (mundo do dever ser), consubstanciantes de Constituições Econômicas diretivas. Cumpre observar, no entan- to, a circunstância de que, paralelamente a essa afirmação — de que tais ordens econômicas germinam no seio das Constituições diretivas —, estas como diretivas se qualificam justamente por abrigarem Constituições Econômicas diretivas.

Isso é explicado em razão do que anota Vital Moreira:22 as-

sim como o sistema econômico se apresenta sempre sob uma de- terminada forma econômica, também a Constituição Econômica se apresenta, sempre, sob a forma de Constituição Econômica diretiva de uma determinada ordem econômica (mundo do ser); e, além disso, a descoberta da Constituição Econômica estatutária implica sempre uma leitura através (e para trás) das disposições da Constituição Econômica diretiva — neste sentido, acrescenta

20. Cf. José Joaquim Gomes Cariotilho, idem, ibidem.

21. Cf. José Joaquim Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 2- ed., Almedina, Coimbra, 1980, p. 117.

Viial Moreira, podemos dizer que a Constituição Econômica es- i.ilutária é sempre implícita.

Assim se justifica a circularidade das afirmações anterio- res: embora o primeiro uso da expressão "constituição econô- mica" remonte ao século XVIII — usada por Badeau, para sig- nificar conjunto dos princípios jurídicos reguladores da "socie- dade econômica"23 — o seu emprego, para designar o conjunto

de normas constitucionais que instrumentalizam, conformando-a, uma determinada ordem econômica (mundo do ser), é coevo ilo surgimento das Constituições diretivas: caracteriza-se como diretiva, a Constituição, por abranger uma Constituição Econô- mica diretiva.

Vide "Apêndice", neste livro.

28. A idéia de Constituição Econômica ganhou corpo na dou-

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