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3. RESISTÊNCIAS E RE-EXISTÊNCIAS DO CINEMA NEGRO BRASILEIRO

3.1 Entrevistados: trajetória, vida e obras

3.1.1. André Novais Oliveira

André Novais Oliveira é diretor, roteirista e assistente de direção. Tem 33 anos, é natural de Contagem, região Metropolitana de Belo Horizonte. Cresceu no bairro Amazonas, periferia da cidade. Sua relação com o cinema se iniciou a partir da influência do seu irmão mais velho, Renato Novais, que o convidava para assistir filmes com ele. Logo esse processo virou rotina entre os irmãos que passavam todo final de semana assistindo filmes que alugavam na locadora do bairro.

O irmão do André também o levou para conhecer os festivais de cinema que acontecia em BH, como o Indie Festival, Festival de Curtas de Belho Horizonte e outros. “E a gente começou a frequentar esses festivais, eu tinha uns 15, 16 anos na época e aí comecei a me interessar bastante”, lembra o cineasta. A partir da frequência nos festivais, acompanhar os debates com os realizadores, gerou o despertar de também produzir filmes e participar daquele meio. Em um desses festivais, pegou um panfleto que continha um anúncio de um curso de Cinema e Vídeo na Escola Livre de Cinema de Belo Horizonte, viu que era a oportunidade e resolveu fazer o curso. Nesta época, ele estudava Edificações no CEFET-BH e fazia estágio na área, mas não estava contente com o curso, que de alguma maneira, sua insatisfação o motivou a vislumbrar

uma nova carreira. E assim, em 2004, André entra na Escola Livre de Cinema. Era um curso de um ano apenas que ensinava o básico da linguagem audiovisual, mas foi um período muito importante para sua carreira. A mãe do diretor, Maria José Novais, conhecida como Dona Zezé, em depoimento numa entrevista, lembrou que André chegou a fazer faxina para conseguir custear as mensalidades do curso56.

Na escola fez seu primeiro curta-metragem, Uma homenagem a Alízio Netto (2004), após ter o roteiro selecionado em um concurso de uma oficina de Super-8 na época que estudava. O filme circulou por diversos festivais chegando a ganhar alguns prêmios. Foi também durante o curso que André conheceu Gabriel Martins, que alguns anos depois, juntamente com Maurílio Martins57, iriam criar a produtora Filmes de Plástico.

O Gabriel eu conheci na Escola Livre, tínhamos feito um curta juntos, e o Maurílio conheci logo em seguida. A gente fez outros curtas também, ele era muito próximo do Gabriel, eles estudavam no curso de cinema da UNA. Acabei me aproximando e a Filmes de Plástico surgiu em 2009. (OLIVEIRA, 2014, sem página).

Entretanto, ainda na dúvida se faria uma faculdade de cinema, como alguns de seus amigos, preferiu seguir outro caminho na graduação. Entrou no curso de História da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas), também por seu interesse sobre a história do cinema nacional. Ele chegou a fazer uma oficina com o Carlos Augusto Calil, no Instituto Moreira Salles de BH, sobre as primeiras décadas do cinema brasileiro. Na universidade, ganhou uma bolsa de iniciação científica da FAPEMIG para pesquisar o cinema mineiro dos anos 1960.

Mesmo no curso de história, o cineasta não queria se afastar da produção. Realizou mais alguns curtas, ora com recursos próprios e outros com a verba de premiações de festivais. Nos anos seguintes produziu A mulher que sabia demais (2005), Um dia meio parado (2006), 150 miligramas (2009).

Neste período, trabalhou numa tradicional locadora de filmes de Belo Horizonte chamada Videomania, conhecida por seu grande acervo em filmes de arte e/ou conceituais. Sua passagem pelo estabelecimento contribuiu para sua formação, afirma o cineasta. Pois como funcionário, tinha acesso aos filmes de forma gratuitas. “Era muita gente da época do cinema

56 BRAGA, Carolina. André Novais Oliveira roda seu primeiro longa dentro de casa, no Bairro Amazonas, com

elenco formado por familiares. Portal Uai, 25 Jul. 2013. Disponível em:

<http://www.uai.com.br/app/noticia/cinema/2013/07/25/noticias-cinema,144588/simples-assim.shtml > Acesso: 20/05/2017.

57 Gabriel Martins e Maurílio Martins apesar de terem o mesmo sobrenome não há relação de parentesco entre

que ia trabalhar lá e era uma das melhores locadoras de BH para filmes raros e clássicos. Meu fim de semana era só assistir filmes” (OLIVEIRA, 2016). Nesse sentido, entre as suas influências estão Billy Wilder, Mike Leigh e Abbas Kiarostami, porém, acrescenta que o cinema brasileiro contemporâneo também é uma grande referência para seus trabalhos.

Essa experiência, somada ao reconhecimento na cena independente que seus filmes já estavam proporcionando, o diretor, em 2011, também trabalhou como programador e curador da sala Cine Humberto Mauro, uma tradicional sala de cinema da capital mineira conhecida pela tradição cineclubista e pela variedade de mostras de produções cinematográficas de diversas partes do mundo.

Como já destacamos, em 2009, André Novais de Oliveira em parcerias com Gabriel Martins e Maurílio Martins criam a produtora Filmes de Plástico – posteriormente Thiago Macêdo Correia juntou-se ao grupo. A primeira produção do diretor com a produtora chama-se Fantasmas. Lançado em 2011, o curta-metragem foi vencedor de 15 prêmios e exibido em festivais importantes como o 14º Festival Luso-brasileiro de Santa Maria da Feira em Portugal, 30º Uppsala Internacional Short Film Festival na Suécia, 13ª Mostra de Cinema de Tiradentes, a III Janela Internacional de Cinema de Recife dentre vários outros. Em 2011, Fantasmas foi distribuído pela Revista Continente em um DVD junto com o filme Pacific, também lançado em 14 salas de cinema junto com o mesmo longa no projeto Vitrine Filmes.

Também no mesmo ano, foi lançado o longa-metragem Estado de sítio (2011). Uma realização coletiva em que André Novais de Oliveira participou juntamente com outros sete cineastas mineiro: Gabriel Martins, Flávio C. von Sperling, João Toledo, Leonardo Amaral, Leo Pyrata, Maurílio Martins e Samuel Marotta.

No anos seguintes, André Novais Oliveira dirigiu o curta-metragem Pouco mais de um mês (2013). O filme foi lançado na Mostra de Cinema de Tiradentes (MG), saiu de lá direto para o Festival de Cannes ao ser selecionado por uma “olheira” do festival francês para mostra paralela chamada “Quinzena dos Realizadores”. Pouco mais de um mês (2013) ganhou uma Menção Especial do Júri no festival na França e outros 13 prêmios em diversos festivais pelo mundo. Foi ainda selecionado para diversas outras mostras como Indie Lisboa, Cartagena, Semana dos Realizadores do Rio e Janela Internacional de Cinema de Recife.

O cineasta voltaria novamente ao Festival Francês, na mesma mostra paralela, em 2015, com o curta-metragem chamado Quintal (2015). No Brasil, o filme circulou em grandes festivais como

26º Festival Internacional de Curtas de São Paulo, e também no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, obtendo êxito em algumas premiações.

Quintal (2015) mais uma vez trouxe seus pais biológicos, Norberto Francisco Oliveira e Maria José Novais, como protagonistas. Algo que já tinha ocorrido no primeiro longa-metragem solo do diretor, Ela volta na quinta, de 2014. Foi o primeiro filme do cineasta com recurso advindo de um edital público de fomento à produção audiovisual. Porém, segundo o diretor, o prêmio, no valor de R$ 87 mil, era para realização de um curta-metragem, no entanto, segundo o diretor, ao perceber que ainda havia história a contar, resolveu fazer um longa-metragem. O projeto ainda foi contemplado pelo edital Rumos do Itaú Cultural, no valor de R$ 150 mil reais, para a finalização.

Não muito diferente de seus trabalhos anteriores, Ela Volta na Quinta (2014) circulou nos principais festivais nacionais e internacionais. O filme foi ganhador do prêmio máximo no X Panorama Internacional Coisa de Cinema, em Salvador, e na VI Semana dos Realizadores, no Rio de Janeiro. Por meio da distribuição da Vitrine Filmes, chegou ao circuito comercial brasileiro em 2015, sendo exibido nos cinemas em dez cidades pelo país.

André afirma que depois de sua passagem pelo festival francês, obteve um maior reconhecimento do seu trabalho e das produções da Filme de Plástico. Entretanto, mantém-se com os pés no chão ao considerar que não ocorreu maiores transformações em sua carreira. “A dificuldade pra fazer filmes é a mesma. Continuo não vivendo disso plenamente, do jeito que gostaria, mas confesso que nos últimos anos isso melhorou”, conclui. Ressalta que houve momentos que faziam filmes sem orçamento ou com orçamento muito reduzido, às vezes, tirando do próprio bolso. “São as dificuldades dos cinema brasileiro como um todo”, resume. A produtora Filmes de Plástico destaca-se pelo trabalho coletivo de seus integrantes. Por exemplo, nos trabalhos de seus companheiros da produtora, André atua em outras funções, como assistente de direção, fotografia, produção executiva, etc. e vice-versa. Ou seja, do mesmo modo, quando André está dirigindo, Gabriel, Maurílio e Thiago assumem as demais funções do set. Inclusive, se estendendo para atuação. Todos, em um certo momento, já atuaram em algum filme do outro.

O diretor André Novais de Oliveira já trabalha em seu próximo longa-metragem, nome ainda não revelado, oriundo de outro projeto contemplado de um Edital de Baixo Orçamento (B.O) em Belo Horizonte.