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Antonio Carlos Guedes Danielle Alencar Parente Torres

No documento O-MUNDO-RURAL-2014 (páginas 118-124)

Introdução

No período de 2011 a 2013, o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), desenvolveu uma ação voltada para o estudo da produção de alimentos no Brasil, com foco na sustentação e na sustentabilidade futuras dessa produção.

Essa ação, que tomou o nome de Sustentabilidade e sustentação da produção de alimentos: o papel do Brasil no cenário global (ou Projeto Alimentos), foi proposta ao CGEE pelo ex-ministro e professor Alysson Paolinelli, membro do Conselho Diretor do centro, com o propósito de estudar os condicionantes do sistema agroalimentar brasileiro, visando propiciar subsídios para políticas públicas e programas que possam garantir a sustentabili- dade e a sustentação da produção de alimentos no Brasil, além de gerar excedentes para o suprimento de parte da crescente demanda global. Este capítulo constitui, portanto, uma síntese do Projeto Alimentos.

A produção de alimentos, tema estratégico para o Brasil e para o mundo, requer um processo de constante reflexão, que considere os elementos necessários para a sustentação da produção (conjunto de conhecimentos, tecnologias e políticas) a longo prazo e que pro- mova a sua sustentabilidade, ou seja, o atendimento das demandas de ordem econômica, ambiental e social da geração presente, sem afetar o suprimento das gerações futuras. Isso é

válido para qualquer país, mas assume maior importância quando se trata de um país como o Brasil, hoje grande produtor e exportador de alimentos, e com grande potencial de se tornar um dos principais responsáveis pelo suprimento alimentar da população global no futuro.

A elevação, em âmbito global, dos preços dos alimentos, associada às projeções de aumento da população e da sua renda, ampliou os debates sobre a necessidade de aumento de produção e ganhos de produtividade, como forma de subsidiar o processo de construção da segurança alimentar mundial.

Além dos fatores já mencionados, a agricultura mundial terá de enfrentar uma cres- cente taxa de urbanização, com as consequentes mudanças comportamentais no consumo, a diminuição da disponibilidade dos recursos terra e água, o aumento da produtividade de alguns cultivos a taxas cada vez menores em países desenvolvidos, bem como a relação cada vez mais estreita entre agricultura e produção de energia limpa (RODRIGUES et al., 2012). Somam-se a esses elementos as preocupações com as mudanças climáticas, com a governança global e com a sustentabilidade da produção.

Como parte do processo de reflexão, tornou-se fundamental identificar e analisar a influência que drivers de mudanças (elementos que impactam diretamente seu ambiente de influência) poderão exercer sobre o desempenho do sistema agroalimentar doméstico e global nos próximos anos. Os drivers analisados neste estudo são classificados em dois grupos: consolidados e “sinais fracos” (weak signals).

Drivers consolidados são aqueles já conhecidos na literatura e que apresentam gran-

de potencial de ocasionar impactos substanciais. No sistema agroalimentar, destacam-se três: o aumento populacional, a crescente urbanização e a expansão da renda per capita (RODRIGUES et al., 2012).

Com relação ao primeiro driver, a população mundial deve aumentar dos atuais 7 bilhões para mais de 9 bilhões até a metade deste século. Tudo indica que parte subs- tancial do aumento populacional se dará no mundo em desenvolvimento, e que, na segunda metade do século, haverá estabilização no tamanho da população e início de um decréscimo populacional (LUTZ et al., 2001).

As projeções indicam que o Brasil apresentará crescimento populacional até 2042, quando se espera que a população atinja o chamado “crescimento zero”. A partir daquele ano, serão registradas taxas de crescimento negativas. Dada essa evolução, a população brasileira deverá alcançar um total de 226 milhões de habitantes em 2050 (IBGE, 2013).

Com relação à urbanização, a população urbana mundial passará dos atuais 50% da população total para quase 70% em 2050 (FAO, 2013). Esse crescimento da urbanização cer- tamente trará implicações importantes em termos da demanda futura de produtos agrícolas e agroenergéticos. No Brasil, o Censo Populacional do IBGE de 2010 apontou que 86% de

uma população de quase 200 milhões de brasileiros vive nas cidades. As projeções de popu- lação para 2030 indicam que essa participação deve se elevar para mais de 90%, chegando a 94% em 2050 (IBGE, 2013). Além de ser influenciado por drivers demográficos, o desempenho do sistema agroalimentar é impactado também por drivers de natureza econômica, entre os quais se destaca o aumento da renda per capita, principalmente em países emergentes e em desenvolvimento (HAWKSWORTH; CHAN, 2013). Espera-se que, de um modo geral, os aumentos na renda per capita acarretem mudanças significativas nos padrões de consumo, resultando na expansão da demanda de carnes, frutas e vegetais e, em menor quantidade, de alimentos básicos. Essa elevação deve motivar também alguns grupos de consumidores a procurar por produtos de maior qualidade, alimentos pré-cozidos e processados.

No caso da oferta, os drivers que mais se destacaram foram: a tendência de redução da disponibilidade dos recursos água e terra agricultável; os avanços da ciência, da tecno- logia e da inovação agropecuária; e os avanços das áreas de tecnologia da informação e da comunicação. Isso deverá ainda ser agravado por outros fatores, nos próximos anos, como: mudanças climáticas, degradação dos solos, crescente urbanização, uso industrial da água e utilização da terra para a produção de biocombustíveis.

Entre os principais weak signals que poderão causar impacto significativo no sistema agroalimentar brasileiro nos próximos anos, destacam-se: a mudança na composição do setor produtivo agropecuário, que está sendo formado principalmente pela pequena produção e pela grande empresa agrícola; a nova tendência de financiamento de investimentos agríco- las e agroindustriais, realizados por investidores internacionais e/ou empresas privadas de capital estrangeiro; e a redução da disponibilidade de mão de obra qualificada na agricultura.

Nesse contexto de drivers influenciando oferta e demanda, os principais desafios que afetarão a produção sustentável de alimentos nos países referem-se à necessidade de garantir segurança alimentar e nutricional às populações, por meio da expansão e da inten- sificação da produção de alimentos em âmbito global, minimizando os efeitos negativos para as gerações futuras.

Este capítulo está dividido em quatro partes, incluindo esta introdução. Na segunda seção, será apresentada a metodologia; na terceira, os principais resultados; e, por fim, na quarta, as considerações finais.

Metodologia

Para uma análise integrada dos condicionantes estratégicos e dos desafios da oferta e demanda de alimentos no Brasil, tomou-se por base um modelo conceitual fundamentado em condicionantes do sistema agroalimentar. Para melhor análise e entendimento da nature- za e da atuação desses condicionantes, bem como das sinergias existentes entre eles, os con-

dicionantes foram agrupados em 11 conjuntos temáticos, que abordaram: Estudo 1: Insumos estratégicos; Estudo 2: Produção e produtividade agropecuária; Estudo 3: Pequena produção; Estudo 4: Tecnologia; Estudo 5: Sustentabilidade econômica; Estudo 6: Riscos e incertezas ambientais; Estudo 7: Agroindústria; Estudo 8: Distribuição de produtos agroindustriais; Estudo 9: Infraestrutura para transporte e armazenagem; Estudo 10: Consumo de alimentos; e Estudo 11: Políticas e legislação. Além desses, foram elaborados outros três estudos sobre: a) “Drivers de mudanças no sistema agroalimentar brasileiro”, com base na análise efetuada por especialistas brasileiros em mesa-redonda realizada na Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo; b) “Desafios globais para a produção de alimentos”, com base em painel internacio- nal de especialistas, realizado como parte da programação da Rio +20, no Rio de Janeiro; e c) “Cenários globais selecionados para a produção de alimentos”, com base em documentos relativos a iniciativas já realizadas sobre essa tema, por outros países e organizações.

O parâmetro temporal adotado para a construção da visão de longo prazo foi o ano de 2050, com períodos intermediários (2022 e 2035), em razão da maior disponibilidade de estudos e informações para esses períodos.

Na análise dos estudos e dos documentos produzidos, procurou-se identificar os gran- des desafios e os prováveis impactos causados pelos drivers externos ao sistema agroalimen- tar analisado, nas próximas décadas, o que gerou uma grande quantidade de informações provenientes dos 14 estudos, mais as 72 notas técnicas elaboradas pelos especialistas. Para trabalhar essas informações, empregou-se uma ferramenta especialmente desenvolvida, para, sob uma ótica prospectiva, extrair indicadores1 de possíveis futuros para o setor, como:

fatos portadores de futuro, tendências, referenciais de futuro e recomendações.

A análise conjunta desses indicadores e de suas inter-relações apontou os principais desafios com potencial para impactar o futuro do setor agroalimentar, os quais foram reunidos, por afinidade, em seis blocos, descritos como “Grandes desafios para o sistema agroalimentar”. Esses blocos deram origem à proposição de seis pilares, com ações im- prescindíveis e iniciativas que possam contribuir para a definição de políticas públicas e programas para garantir a sustentabilidade e a sustentação futura da produção brasileira de alimentos. Dessas duas condições dependerá o papel que o Brasil desempenhará no cenário global nas próximas décadas.

Para a discussão e a validação das ações e das iniciativas já apontadas nos estudos, e para o aporte, por parte dos especialistas, de outras sugestões para a proposição de 1 a) tendência: perspectiva de futuro, cuja direção é suficientemente visível para se admitir sua permanência ou

avanço no período considerado; b) fato portador de futuro: sinal fraco hoje, porém de impacto potencial muito alto para alterar trajetórias e cenários, se ocorrer no horizonte de tempo considerado; c) referencial de futuro: constatação de um fato que deverá ocorrer em uma data ou horizonte de tempo futuro definido; e d) recomendações: ações necessárias para dar suporte à sustentação e à sustentabilidade da produção de alimentos.

políticas para o setor, foram realizadas, no CGEE, seis oficinas temáticas, uma para cada pilar, com especialistas convidados.

As etapas de desenvolvimento do projeto podem assim ser resumidas:

1) Análise do panorama externo, visando identificar, com base nos cenários globais, os principais drivers e desafios externos ao sistema agroalimentar que impactam esse sistema.

2) Planejamento e proposição de termos de referência para a condução dos es- tudos e das notas técnicas, e contratação de especialistas para a elaboração de estudos e notas técnicas.

3) Análise detalhada de cada estudo, para a identificação de elementos indicado- res de futuro (fatos portadores de futuro, tendências, referenciais de futuro e recomendações).

4) Formação de infográficos tomando por referência as palavras-chave definidas com base nos elementos indicadores de futuro identificados na análise da cada estudo.

5) Definição dos grandes desafios para o sistema agroalimentar, com base na análise individualizada de nuvens formadas no infográfico de cada estudo e na nuvem formada no infográfico do conjunto de estudos.

6) Definição, tomando por referência os grandes desafios, dos pilares, das ações imprescindíveis (must wins) e das iniciativas necessárias à sustentação e à susten- tabilidade da produção de alimentos.

7) Realização de seis oficinas com especialistas, uma para cada pilar, para a valida- ção das ações imprescindíveis e das iniciativas identificadas, e de outras ações e políticas sugeridas pelos especialistas como importantes para a sustentação e a sustentabilidade da produção de alimentos.

Resultados

Grandes desafios e pilares para o sistema agroalimentar

No documento O-MUNDO-RURAL-2014 (páginas 118-124)