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Gramsci, Antônio Caderno 12 (1932) “Apontamentos e notas dispersas para um grupo de ensaios sobre a história dos intelectuais; Cadernos do Cárcere, volume II; Os intelectuais e o princípo educativo” Edição de Carlos Nelson Coutinho, com

ESPAÇOS DINÂMICOS; ELITES CONSERVADORAS Contexto histórico, cultural, geográfico e político do tema

74 Gramsci, Antônio Caderno 12 (1932) “Apontamentos e notas dispersas para um grupo de ensaios sobre a história dos intelectuais; Cadernos do Cárcere, volume II; Os intelectuais e o princípo educativo” Edição de Carlos Nelson Coutinho, com

Marco Aurélio Nogueira e Luiz Sérgio Henriques; 2006, páginas 52 e 53

75 “A relação entre os intelectuais e o mundo da produção não é imediata, como ocorre no caso dos grupos sociais fundamentais, mas é mediatizada, em diversos graus, por todo o tecido social, pelo conjunto de superestruturas, do qual os intelectuais são precisamente os funcionários” (GRAMSCI, 2006: 20)

amplificada” da história literária mato-grossense, classifica a poesia de Arlinda Morbeck, esposa de José Morbeck, como expressão legítima da alma feminina condenada à solidão naqueles sertões do Leste Araguaia, enquanto “seus homens”, ricos ou pobres, encontram- se a léguas e mais léguas de distância em busca das pedras que os fascinam ao mesmo tempo em que os aprisionam. Porém, esta manifestação artística espontânea logo seria suplantada, numa segunda fase, pela “historiografia encomendada” das elites políticas e comerciais da região, a qual se tornará hegemônica nos diversos aspectos da “produção cultural” barra-garcense. A partir daí, assume a liderança, com destaque inegável, a figura folclórica de Valdon Varjão (15/12/23 a 13/02/2008), personalidade ímpar na tradição histórica e “literária” da região do Garças e Araguaia na segunda metade do século XX.

“Historiador” autodidata, migrante cearense e negro (como fazia questão de mencionar), além de homem público em diversos cargos e fundador e presidente de honra da Academia de Letras, Cultura e Artes do Centro Oeste (na qual ocupava a cadeira de número 13), é ele quem solidificará, através das suas obras e da guarda dos documentos arquivados em seu próprio Cartório de Notas e Ofícios, o imaginário histórico/cultural da “terra barra-garcense” que predomina até os tempos atuais. Diante do mito construído por Valdon, tanto velhos como novos governantes devem prestar seu devido tributo. Mesmo Kiko, em conversas conosco, como Chaparral e Fátima Resende, ao longo das entrevistas, reconheceram a força deste legado histórico. A despeito da obra de Valdon Varjão não se assentar em bases historiográficas reais (no sentido científico e acadêmico do termo), os três mais importantes representantes públicos da esquerda barra-garcense foram enfáticos em afirmar que, “o que Valdon fez, ninguém, ao menos em Barra do Garças, fez”. Em razão disto, todos os três também prestaram o necessário respeito à sua memória nos cargos públicos que ocuparam, seja pela elaboração de portarias, decretos e projetos de leis, seja pela efetivação de políticas concretas de valorização e resgate cultural dos seus arquivos.

Típico representante de uma região atravessada no passado por constantes levas migratórias, bem como fugas e abandonos intermitentes, Valdon Varjão encarna, por si mesmo, a trajetória de uma toda uma elite – e, porque não reconhecer, de parcelas importantes do povo - que precisou de ânimo e disposição para permanecer numa região que, ao mesmo tempo em que lhes dava o brilho dos diamantes, também lhes impunha os dissabores da vida nos sertões. Lá estão, portanto, no prefácio de apresentação de um dos seus principais livros de referência – “Barra do Garças, Migalhas da Sua História”, o retrato de uma classe que ascendeu dos barrancos do garimpo à dominação dos mais diversos setores da vida política e social do município e, por extensão, de parte expressiva do próprio governo do estado de Mato Grosso:

VALDON VARJÃO, nascido em Cariús, Ceará, a 15/12/1923, filho de Manoel Cardoso Varjão e Maria Olímpia Varjão. Garimpeiro, comerciante, agropecuarista, tabelião, contador, contista, escritor, membro do Instituto

Geográfico de Mato Grosso, jornalista, editor, vereador, prefeito, deputado estadual, deputado federal, senador da república, poeta e mato-grossense de coração (VARJÃO, 1985: 3)

O perfil de Valdon Varjão encaixa-se à imagem e semelhança com o de outros membros da elite política em debate. Veja-se, por exemplo, o tratamento dado ao primeiro prefeito do município de Barra do Garças, Antônio Paulo da Costa Bilêgo (1909 - 1991), mandatário que formalizou a transferência, em 1948, da sede de Araguaiana76 para a então vila da “Barra Cuiabana”, localizada na foz do rio Garças, comandada e organizada de fato pelo Coronel Cristino Cortes77, considerado o “patriarca” e principal responsável pela fundação do futuro município de Barra do Garças. Por onde quer que se leia nas publicações locais sobre a biografia de Bilego, encontraremos as mesmas credenciais necessárias para se pertencer à elite política daqueles rincões:

Desde garoto trabalhou como balconista na firma do irmão, Félix Costa e do tio Emiliano Costa. Depois tornou-se o responsável pelas compras, vendas e transporte das mercadorias que chegavam nos barcos de carga que navegavam pelo rio Araguaia. Aos dezesseis anos assumiu a gerência da empresa em Barra do Garças onde fixou residência Foi Garimpeiro, fazendeiro, comerciante, vereador por duas legislaturas e presidente da Câmara Municipal, Superintendente da extinta Fundação Brasil Central, fundador da loja maçônica Acácia do Araguaia e, no Governo de Frederico Campos, prefeito nomeado de Aripuanã (extremo norte do MT). [...]. Depois que encerrou a trajetória política, Bilego dedicou-se à pesquisa e a literatura. Como historiador e escritor, publicou vários contos, poemas e artigos em revistas e jornais, deixando também escrita sua autobiografia78. (Revista “Brasil VIP”, de setembro de 2008, em homenagem aos 60 anos da cidade79)

Assim, não obstante os equívocos do personalismo exacerbado, bem como os freqüentes exageros de escala, o culto às elites promovido por Valdon sustenta-se sobre uma base histórica concreta, na qual se explora à exaustão os ideários de pioneirismo e pertencimento. Face ao isolamento da região - que, em última instância, atingia a todos indiscriminadamente – criou-se uma forma de solidariedade na qual o culto à “história de alguns” tornou-se o retrato da “história de todos”. Neste mundo mágico, não há diferença entre as classes sociais, nem dificuldades que impeçam a realização dos sonhos de conquista. Desse modo, ricos e pobres, donos de lavras e diaristas do barranco, fazendeiros e peões, pecuaristas e lavradores, homens de famílias ou solitários, chefes políticos e subordinados, gente da lei ou da prisão, mendigos e milionários, desamparados e

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