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Autores de diferentes referenciais ideológicos coincidem diretamente em reconhecer o impulso de desenvolvimento

ESPAÇOS DINÂMICOS; ELITES CONSERVADORAS Contexto histórico, cultural, geográfico e político do tema

72 Autores de diferentes referenciais ideológicos coincidem diretamente em reconhecer o impulso de desenvolvimento

embrionário deixado pela Fundação Brasil Central (LENHARO, 1986; RIBEIRO 2001; RIGA, 2005; SIQUEIRA, 1990; VARJÃO, 1985).O segundo autor, com quem tivemos a oportunidade de conversar pessoalmente (pois reside em Barra do Garças e é professor do campus universitário da UFMT em Pontal do Araguaia), atribui à FBC a causa maior das diferenças de postura política que permaneceram entre as elites de Aragarças e Barra do Garças. Como a primeira, pelo fato de ter sido sede da estrutura administrativa da FBC, teve a presença de muitos funcionários públicos federais, o ambiente político da cidade é, até

NEVES (2001), comentando sobre o “jogo dialético” entre “Leões e Raposas na

política mato-grossense”, confirma o caráter intrinsecamente conservador da modernização

do estado na primeira metade do século XX e mesmo depois, já com o golpe militar de 1964 plenamente instalado na vida política do país:

A verdade é que as velhas estruturas agrárias não foram seriamente ameaçadas. Ainda que perdendo espaço político, não foram totalmente desalojadas do poder, nem mesmo pela ascensão dos interesses e das classes urbano-industriais. [...] Na condição de um estado agrário, dominado por consistentes grupos oligárquicos, com fundamento nas relações de compromisso entre o poder público e o “coronelismo”, é importante observar se ocorreram e quais foram as principais alterações no poder dessas oligarquias e os efeitos na ascensão de novos grupos políticos. [...] A tese da coligação conservadora pode ser um referencial aplicável à recomposição de forças nas circunstâncias mato-grossenses. Convém lembrar que a região – de feição marcadamente rural – estava despojada das condições materiais para a modernização econômica e industrial nos moldes urbanos do sudeste (NEVES, 2001:102-103).

A região do Araguaia, oficialmente consolidada como parte territorial pertencente ao estado a partir de 1943 (quando se define a fronteira entre Goiás e Mato Grosso), se encaixava com precisão às estruturas maiores deste processo histórico. Como conseqüência, se o passar das décadas modificou continuamente o espaço sócio-territorial do município de Barra do Garças (como veremos adiante), o mesmo não ocorreu em relação à “tendência monopolizadora” das elites locais na forma de exercer o poder. Em outras palavras, mudaram as pessoas e o perfil das classes dominantes da região, mas não o “conteúdo de classe” daqueles que as sucediam. Cada qual foi substituída, com algumas variantes, pelos herdeiros políticos dos chefes da lavra, e nem mesmo as sucessivas migrações sulistas que povoaram as vastas extensões do Vale do Araguaia alteraram sobremaneira o poder das “famílias tradicionais” barra-garcenses (quando não a elas se aliaram nos moldes da “coesão arranjista”73, prática comum no Mato Grosso ao longo dos governos militares - 1964-1984).

2.3 - “Intelectualidade garimpeira”: imaginário e consentimento social na cultura

histórica de Barra do Garças.

“Cidade amiga

Nos deram os garimpeiros Que abraça os que a visitam E hospeda os forasteiros”

(“Barra do Garças”, por Valdon Varjão. In: DINIZ, 2005: 159)

[..] se se pode falar de intelectuais, é impossível falar de não intelectuais. [...] Não há atividade humana da qual se possa

hoje, menos propício às práticas oligárquicas do que a segunda, historicamente sob os ditames dos “coronéis”do garimpo. Isso, para o autor, explica em parte (em parte, fez questão de enfatizar) a vitória da reeleição do candidato do PT em Aragarças e a derrota do PCdoB em Barra do Garças nos pleitos municipais de 2008.

excluir toda a intervenção intelectual, não se pode separar o “homo faber do homo sapien”. Em suma, todo homem, fora de sua profissão, desenvolve uma atividade intelectual qualquer, ou seja, é um filosofo, um artista, um homem de gosto, participa de uma concepção de mundo, possui uma linha consciente de conduta moral, contribui assim para manter ou para modificar uma concepção do mundo [...] GRAMSCI 74

Em que pesem as características clássicas do coronelismo na formação da ordem política e social da região do Araguaia, há que se fazer as ressalvas indispensáveis na compreensão desta sociedade oligárquica dos “cerrados amazônicos” do leste mato- grossense, especialmente das elites políticas nativas que se formaram no município de Barra do Garças antes e depois da sua emancipação, em setembro de 1949. De forma alguma poderíamos entendê-las se as enxergássemos apenas como uma forma rude e tosca de se exercer o poder. Decerto que a violência era um recurso importante na estruturação maior desse domínio, mas obviamente que não era o único.

Recorrendo-se aqui ao preceito básico da teoria gramsciana, a região em debate talvez seja um dos melhores exemplos da necessidade de se obter o “consentimento” das massas para que uma determinada classe ou grupo social possa de fato exercer o poder (GRAMSCI, 2006: 20-21). E isso, seguramente, as elites locais sempre o fizeram muito bem. Ainda que no interior de uma região isolada e afastada dos grandes centros de desenvolvimento, não faltaram “intelectuais” a elas ligados que cumpriram com zelo e competência esta tarefa essencial. Porém, ao invés de atuarem como meros “funcionários” ou “mediadores” de determinada classe historicamente ascendente (como o percebe Gramsci em algumas passagens do Caderno do Cárcere”75), alguns desses “intelectuais” se

constituíram, especialmente o mais importante deles, como os construtores do tecido social do qual eles próprios emergiram como liderança cultural e política. Foram, portanto, na acepção plena da palavra, autênticos “intelectuais orgânicos” no lado conservador do processo de dominação.

Na primeira fase destas manifestações culturais, entre os anos de 1914 a 1943 (portanto, antes da fundação de Barra do Garças), o “verniz intelectual” destas elites se desenvolveu nos campos mais propícios para as condições de isolamento da região, ou seja, na literatura de fundo histórico, na poesia romântica, nos registros de viagem das “expedições desbravadoras” e na manutenção cultural e religiosa da tradição local. MAGALHÃES (2001: 80-96; e 121 - 124), no seu notável esforço de construir uma “resenha

74 Gramsci, Antônio. Caderno 12 (1932) “Apontamentos e notas dispersas para um grupo de ensaios sobre a história dos

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