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APONTAMENTOS SOBRE AS AÇÕES DO NEB/UNISC: A FORMAÇÃO DOCENTE CONTINUADA E AS REFLEXÕES SOBRE AS PRÁTICAS DE

No documento EDUCAÇÃO BÁSICA E PESQUISA VOLUME 1 (páginas 88-91)

ENSINO EM UM CENÁRIO DE DISCUSSÕES

O NEB tem uma trajetória na UNISC. Surgido em 1995, a partir dos grupos de trabalho do PIEB (Programa Interinstitucional de Integração da Universidade com a Educação Básica), o NEB teve, desde o início de suas atividades, a finalidade de propor ações de Ensino, Pesquisa e Extensão voltadas à Educação Básica, visando garantir espaços de reflexão e ação acerca de temáticas permanentes e emergentes relacionadas à área de educação. Desde então vem promovendo encontros de planejamento, discussão e realização de atividades tendo como uma de suas premissas propostas de articulação entre Universidade e comunidade através do Programa de Pós-graduação em Educação (PPGEdu). Suas ações incluíram, desde o início das atividades, o entendimento de que a qualificação docente se constrói a partir da formação continuada e de ações articuladas, principalmente entre Universidade e escola (CASTRO; MORSCH; GOES; SPERONI, 2017). O surgimento do NEB coincide com o cenário de discussões sobre os rumos das políticas educacionais em âmbito nacional e estadual durante os anos 1990. Discussões que se iniciaram ainda nos anos 1980 em congressos, encontros e simpósios realizados em vários lugares do país, estimulados, dentre outros fatores, pela abertura política e democrática desde o fim da década de 1970. Assim, deve-se dizer que o entendimento da qualificação docente a partir da formação continuada e da reflexão sobre as práticas de ensino, embora relativamente consensual entre nós professores e educadores, ainda enfrenta dificuldades de efetivação, tendo em vista que se trata de algo recente quando se considera o lastro histórico das políticas públicas educacionais e as visões acerca das práticas de ensino desde o início do século XX.

Embora o repensar as práticas de ensino possa ser compreendido como uma das premissas da profissão docente, no caso brasileiro foi somente a partir dos anos 1980-1990, tendo em vista a abertura democrática e uma nova configuração sociopolítica, que se abriu um espaço mais efetivo para as discussões sobre as políticas educacionais e, na esteira dessas discussões, os debates mais próximos do cotidiano escolar, as práticas de ensino e os processos de ensino-aprendizagem.

É relativamente recente, portanto, que esses debates e discussões tornaram-se

realidade nos cursos de formação continuada e nos cursos de licenciatura na forma como se conhece atualmente. Mesmo considerando a amplitude e, talvez, o tema já (de)batido, ao que parece, trata-se de um enfrentamento ainda muito presente tornar, afinal, realidade as reflexões sobre a prática como parte do cotidiano docente. Isso se deve, dentre outros fatores, ao lastro histórico da trajetória das práticas de ensino nos cursos de formação de professores e às políticas educacionais relacionadas, entre os anos 1930-1950 e, depois, entre 1960-1970, quando as noções de prática de ensino e o lugar que ocupavam nos currículos dos cursos de formação tinham pouca importância ou eram ligados à uma concepção “instrumental” (PIMENTA, 1997; SAVIANI, 1991; GERMANO, 1994).

Mesmo correndo o risco de generalização, pode-se dizer que foi apenas nos anos 1980 que se iniciaram os questionamentos de uma visão meramente

“instrumental” das práticas de ensino e da didática, até então vigentes. Em 1982 foi realizado o seminário A Didática em Questão, na PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), evento que se constituiu com um marco histórico no movimento de revisão da didática e que influenciou boa parte dos estudos na área educacional. No debate pedagógico, ganhou ênfase a crítica à dicotomia “teoria e prática” presente nos currículos dos cursos das licenciaturas. Avizinhava-se uma das primeiras tentativas de instigar o cotidiano escolar e da sala de aula, inserindo as práticas reflexivas. Iniciava-se, pouco a pouco, a dissolução do gelo instrumental das práticas de ensino deixado pela ditadura. Embora ainda embrionário, tratou-se de um momento importante se colocado em relação aos cenários anteriores.

As posições construídas a partir dos anos 1980, sobretudo depois do seminário realizado na PUC-Rio, encaminharam-se para uma concepção dialética da educação, na qual a “prática é indissociada da teoria, sendo ambas indissociadas da prática social” (CAIMI, 2004). Para se ter uma ideia sobre a centralidade que a prática passou a ganhar nesses debates, basta ver que a principal referência citada era o livro de Adolfo Sanches Vasquez, Filosofia da Práxis (1968) que tinha como premissa a não dissociação entre prática e teoria e as suas relações com a prática social. Assim, as práticas de ensino ganharam gradativamente um novo status, ocupando o lugar central do palco, atingindo outros e novos contornos, não livres de controvérsias de todo tipo, na década de 1990, que incluiu a elaboração dos dispositivos legais que regem a educação em seu projeto nacional.

Um conjunto de reformas, abrangendo questões pedagógicas, materializou-se ao longo dos anos 1990. Foram criados: o Plano Decenal de Educação (1993-2003); Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) de 1996; os PCN´s (Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e Ensino Médio) as Diretrizes Curriculares para o Ensino Superior; o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF); o Financiamento Estudantil (FIES); o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB)

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Diego Orgel Dal Bosco Almeida, Rafael de Brito Vianna A FORMAÇÃO DOCENTE CONTINUADA EM CENÁRIOS INSTÁVEIS...

que corresponde ao Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e também ao Exame Nacional de Curso (ENC), conhecido como “provão” para o ensino superior;

a Secretaria de Educação à distância, atuando por meio da TV Escola; o então denominado Programa de Informação (PROINFO) e o Programa de Apoio à Pesquisa em Educação à distância (PAPED), dentre outros. Todos esses documentos, bem como sua implementação, não estiveram livres de controvérsias, questionamentos e debates. Embora considerando que o debate é longo e que se estende pelos já pelo segundo decênio dos 2000, é possível perceber, pelo menos, dois eixos principais de discussão: das entidades representantes de professores e os que, oficialmente, implementaram a gestão das reformas da década de 1990. A chamada Carta de Recife e, depois, a Carta do Rio, respectivamente datadas de 1999 e de 2000, são alguns dos exemplos das críticas que foram publicadas. As entidades representantes de educadores e professores, em um dos eixos de discussão, argumentam que a política educacional não deve deixar de considerar a valorização do magistério e as melhorias na qualidade da escola e da educação pública para jovens e adultos, além da busca pela emancipação humana e pela construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Essas entidades direcionam críticas às reformas, sobretudo ao argumento de que a educação estaria restrita a um investimento no capital humano, em uma educação resumida tão somente em competências e habilidades como flexibilidade, polivalência, liderança, cooperação, ideias que integram o segundo eixo de discussões. Nenhum dos eixos prescinde da centralidade de reflexões sobre as práticas de ensino, embora deem direcionamentos diferenciados às mesmas.

Em detrimento de referências importantes da década de 1980, como foi o caso do livro de Adolfo Sanches Vasquez, Isabel Alarcão (2001), pesquisadora e educadora portuguesa, é diversas vezes citada nos documentos oficiais. Vem do trabalho de Alarcão, por exemplo, a inspiração que orientou a gestão das reformas educacionais em relação à organização dos currículos através das “competências e habilidades”

que deveria auxiliar a qualificar os estudantes para ocupar postos de trabalho em um novo contexto marcado pelo avanço tecnológico e pela globalização cultural e dos mercados (CAIMI, 2004). Esses debates e discussões não desapareceram. Continuam estimulando reflexões de educadores e pesquisadores nas universidades e nas escolas. No entanto, persistem, no cotidiano escolar, modelos, práticas e modos de

“dar aulas” que, a despeito dos debates e discussões realizadas, permanecem sendo reproduzidos. Uma das explicações para tal situação pode estar associada ao tipo de estruturação presente nos currículos das licenciaturas: embora “formado” enquanto

“professor reflexivo” na teoria, tende a assumir uma posição de “professor prático”

depois da formação. A indissociabilidade entre teoria e prática, bastante discutida nos últimos decênios do século passado, encontra dificuldades de efetivação na Educação Básica e mesmo nos cursos de formação de professores, tendo em vista que os cursos de licenciatura, muitas vezes, não conseguem tão facilmente desconstruir essas ideias tão enraizadas, já que a centralidade do currículo permanece restrita às

disciplinas de conteúdos específicos em detrimento das disciplinas de cunho didático-pedagógico (DIEHL; MACHADO, 2001; FONSECA, 2003; BITTENCOURT, 2004), reservadas, geralmente, aos professores dos cursos de pedagogia ou “lotados” em outros departamentos. A despeito de todas as discussões e debates realizados nos últimos trinta anos, que colocaram a prática no centro do palco, a atuação do NEB, desde a década de 1990 foi importantíssima, pois buscou articular possibilidades de relação e aproximação entre os diferentes cursos de licenciatura, transpondo obstáculos reais e simbólicos da divisão departamental e da estrutura dicotômica dos currículos. Ao mesmo tempo, buscou promover a aproximação entre a Universidade e as Escolas, entre o conhecimento acadêmico e o conhecimento escolar, realizando, em encontros com os professores da Educação Básica, reflexões sobre as práticas de ensino através de cursos de formação continuada.

O NEB E AS REFLEXÕES SOBRE AS PRÁTICAS DE ENSINO EM CENÁRIOS

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