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ASPECTOS CONCEITUAIS ENTRE EDUCAÇÃO E AVALIAÇÃO

No documento EDUCAÇÃO BÁSICA E PESQUISA VOLUME 1 (páginas 112-115)

Uma das maiores problemáticas do ensino educacional brasileiro é a avaliação da aprendizagem. Normalmente criticada por autores e pesquisadores pela sua caracterização regulatória, classificatória e excludente, este ato pedagógico é visto como complexo e, muitas vezes, contraditório. O tema da avaliação das aprendizagens foi, historicamente, alvo de alterações oriundas de políticas educacionais de Estado e de governo no Brasil. Nesse imbróglio, a avaliação como prática e fundamento pedagógico do cotidiano escolar, histórica e tradicionalmente constituiu-se como um meio de regulação, de caráter classificatório, e como um fim. Essas características, ainda tão presentes no universo escolar, inviabilizam possibilidades de compreender a avaliação como procedimento em prol da democracia e da emancipação, conforme

1 Mestre em Educação pela Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). Participa do grupo de pesquisa: História, Memórias e Narrativas em Educação. Docente de Educação Física no município de Vera Cruz/RS.

2 A primeira versão, sob o título de avaliação emancipatória, ocorreu no ano de 1985, como resultado de sua tese de Doutorado. Posteriormente, em 1988, emergiu sua 1ª edição em livro. Na presente pesquisa, utilizou-se a 8ª e última edição, conforme referências (SAUL, 2010).

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Saul referencia a abordagem avaliativa e Freire, a educação.

Dentro da categoria de emancipação, a definição do seu significado não é considerada como ambígua, independentemente da língua materna (CIAVATTA, 2014), mas o cuidado da sua conceituação passa pela apreensão dos fins do sistema político liberal. Saliento que a emancipação não consiste tão somente em um estado a que se chega, mas também significa a existência de espaços e movimentos onde possam insurgir experiências na condição libertadora, em prol da humanização e na busca de certa harmonia e equilíbrio.

Na perspectiva da emancipação freireana, a mesma não ocorre de modo natural, pois ela é dialógica, social, inter-relacionando à teoria e à prática das contradições que se formam e se impõem às opressões. Não há como se propulsar uma emancipação humana vivendo-se num mundo desumanizado. A educação (formal, não formal, informal, popular, alfabetizadora, de jovens e adultos, etc.) e a emancipação transcorrem pela intencionalidade política e crítica da luta pela transformação igualitária (MOREIRA, 2016). Nessa perspectiva de educação, posicionada contrariamente ao senso comum, o dever é resistir às práticas de desumanização do sistema capitalista em prol de uma sociedade mais justa e democrática.

Freire (2014b) destacou que a educação deveria atuar para o desenvolvimento, nos sujeitos, de uma consciência em trânsito, crítica e política, ao deslocar-se da ingenuidade e da alienação para sua transformação social. Também Freire objetivou uma educação dialética que resultaria em uma práxis socioeducativa emancipatória, lutando pela autonomia contínua contra o modelo educacional tecnicista e tradicional da educação bancária competitivista (AMBROSINI, 2012). Na proposta educacional freireana não existe uma pedagogia sem avaliação, e vice-versa, pois avaliar significa mais do que um fundamento e/ou ato obrigatório de ensino. Segundo Romão (2016, p. 133), a visão freireana procura esclarecer, destacando que existem “educações”

e, não, educação. Para cada direcionamento educativo, a avaliação, por estar continuamente na sua companhia, acabaria em caminhos com resultados práticos e teóricos dessemelhantes.

Entre as inúmeras reflexões de Paulo Freire, que contextualizou conceitos como emancipação e transformação crítica, uma delas nos diz que não há uma única forma de educação. Consequentemente, a avaliação também pode ser perceptível deste mesmo ponto de vista. Nesse caso, Freire sempre propôs um trabalho educativo necessário e articulado com a avaliação, pois não existe um ato pedagógico sem avaliar.

Freire afirmava que a educação deve pautar-se no caráter democrático. Da mesma forma, a avaliação emancipatória difundida por Ana Maria Saul (2010) seria, assim, conceituada nas suas práticas e teria, como princípio fundamental, a disponibilização do direito à informação e ao conhecimento. Porém, historicamente,

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João Luís Coletto da Silva AVALIAÇÃO EMANCIPATÓRIA...

muitas vezes a avaliação foi, e é, ainda tratada, por políticas educativas de Estado e de governo, como um processo autoritário e antidemocrático (SAUL, 2016). Isto foi amplamente disseminado, com grande predominância e ênfase de práticas educativas nacionais, quanto às avaliações pragmáticas e regulatórias, priorizadas por políticas educacionais (LIMA, 2004), inclusive com a conformidade estatal de conter um caráter de monitoramento na onda de expansão do neoliberalismo, ao final do século XX (COCCO; SUDBRACK, 2012) e, nesse mesmo século, com a ideia de ranqueamento (ARELARO, 2016). Assim, haveria a necessidade da transformação do modo avaliativo, opondo-se a este estilo opressor e tendo a avaliação emancipatória como uma alternativa viável para tal.

No Brasil, uma pesquisadora que projetou uma ideia de avaliação emancipatória foi Ana Maria Saul. De acordo com Saul (2016), essa abordagem contribuiu para que outros pesquisadores e pesquisadoras se inquietassem a buscar meios e modos de compreender mais a avaliação, como demonstraram Hoffmann e Vasconcellos, entre outros.

Saul (2008) reflete que as diferentes práticas e concepções avaliativas são decorrentes de distintos significados sobre educação. Assim, a avaliação não tem como ser pensada e praticada de forma isolada, pois não existe neutralidade no ato educativo. Cocco e Sudbrack (2012) relatam que a avaliação pode ser tanto emancipatória quanto regulatória, mas isso dependeria da análise e da praticidade da totalidade que a envolve. Todavia, a diversidade de ressignificações conceituais deve ser vista como positiva; porém, os campos da ciência do conhecimento e das políticas educacionais não poderiam, em nenhum momento e/ou exceção, ser apreendidos de forma acrítica, a-histórica, etc., aos sujeitos das comunidades escolares. Isso porque a própria funcionalidade da educação é, e deveria ser, uma mola propulsora, ao dar meios para cada indivíduo desenvolver a sua autonomia verdadeira, conforme a realidade vivenciada e a sua visão de mundo.

A abordagem avaliativa emancipatória já está há bastante tempo apresentada em nível nacional e mundial, conforme Medeiros e Lima (2014). Entretanto, não significa que seja algo de simples compreensão e prática, pois aparenta não estar difundida na sociedade ou ser coerente com a mesma.

A educação pode ter diferentes significados, e estes interferem na existência, ou não, de práticas avaliativas emancipatórias. De um modo geral, a história da educação e da avaliação, desde o período da modernidade até então, demonstra que suas riquezas empíricas e/ou teóricas vêm da intensificação das fronteiras de conhecimentos estabelecidos durante a invasão cultural moderna. Entretanto, a mesma limitou inúmeras funcionalidades de processos educativos, como a própria necessidade de uma avaliação emancipatória, sentida no Brasil na década de 1980 (SAUL, 2010). A funcionalidade metodológica da avaliação emancipatória será descrita a seguir.

No documento EDUCAÇÃO BÁSICA E PESQUISA VOLUME 1 (páginas 112-115)