• Nenhum resultado encontrado

Apresentação dos Critérios Estabelecidos ao Grande Grupo

6.4. A Definição do Robot Vencedor

6.4.4. Apresentação dos Critérios Estabelecidos ao Grande Grupo

O grupo do DNR estabeleceu, como já analisámos anteriormente, o tempo mínimo de cada Robot como critério para definir o vencedor e, em caso de empate, considerou que ganhava aquele que tivesse menor

tempo máximo. No momento de apresentação deste critério à turma, o grupo apresentou a tabela ao lado.

Este critério, estabelecido para desempatar os Robots, criou alguma discussão no grande grupo pois o

grupo do Vinagre não o considerou justo. A argumentação foi que o grupo estava a usar duas

Tempo (em segundos)

Classificação Mínimo Máximo DNR 26,54 29,75 1.º Jagunço 27,05 27,57 2.º Vinagre 27,05 30,44 3.º X-5 28,32 33,52 4.º Tabela 6.8: Critério apresentado pelo grupo do DNR.

6. Das Corridas com Robots à Aprendizagem da Estatística e da Cidadania

medidas estatísticas apenas para o desempate e, de acordo com este grupo, justo seria utilizar a amplitude da amostra para estabelecer a classificação dos Robots. Os outros grupos evidenciaram o seu contentamento por este critério destituir o Jagunço de vencedor.

Aproveitámos este momento para discutir a ideia de que não existe ‘critério certo’ ou ‘critério errado’ e que o importante é a coerência da argumentação sobre o que é apresentado. Os alunos verificaram que na Estatística os problemas podem não ter uma única solução, tal como usualmente acontece na Matemática tradicional, principalmente, no domínio do cálculo algébrico e concordaram que o essencial é utilizar argumentos estatísticos para defender as ideias.

A apresentação do grupo do DNR serviu para os alunos ampliarem a plataforma de conhecimento partilhado pela turma com os conceitos de extremos e de amplitude da amostra, estes conceitos apenas faziam parte da plataforma de conhecimento dos elementos do grupo do DNR, o qual foi construído enquanto estavam a definir um critério de modo que o seu Robot fosse o vencedor das corridas.

O facto de os alunos terem conseguido encontrar uma medida estatística que descrevia os dados recolhidos durante as corridas e tornar um determinado Robot no vencedor foi importante, pois, permitiu-lhes contactar com diferentes significados das medidas estatísticas e examinar como a escolha do critério pode ter impacto sobre os resultados. Durante este processo os alunos adquiriram uma maior consciência das medidas estatísticas e em simultâneo criaram estratégias e desenvolveram argumentos válidos. A literacia estatística desenvolveu- se na relação dialética entre estes dois polos (Lopes & Fernandes, 2016).

Após a discussão, no grande grupo, que dependendo da medida estatística utilizada um ou outro Robot poderia ser o vencedor, a S disse: “Isso é o que acontece na comunicação social. Como aquela notícia que dizia que a Escola X era a melhor a nível nacional. Afinal só 10 alunos tinham feito exame”. Esta frase da aluna foi por nós aproveitada para fomentar a discussão de que, muitas vezes, na comunicação social, ‘nem tudo é o que parece’. Pelo diálogo estabelecido, mas também pelo conhecimento que adquiriram nas aulas anteriores, conseguiram ‘detetar’ e ‘desmascarar’ algumas das estratégias utilizadas na comunicação social para ‘vender’ determinado produto ou ‘defender’ determinado ponto de vista, o que nos permite considerar que a Educação Estatística realizada com a implementação do CA, fez ressonância em situações fora da sala de aula de Matemática e permitiu desenvolver nos alunos capacidades para o exercício de uma Cidadania Crítica.

Esta criticidade quanto à informação estatística que aparece no quotidiano foi sendo desenvolvida naturalmente pelos alunos, enquanto analisavam os dados por eles recolhidos

durante as corridas. Nessa altura, ao circularmos pelos grupos, começámos a ouvir frases como: “Saber Estatística ajuda a perceber e criticar o que os jornalistas dizem” (G). “Afinal nem tudo é o que parece. Saber Estatística permite usar os dados para dizermos o que queremos” (R, D e S). “Perceber Estatística permite dizer que afinal aquilo não é bem assim” (M e P.T). Comentários semelhantes a estes foram proferidos cada vez com mais regularidade pelos alunos ao longo do tempo em que implementámos o CA. Assim, consideramos que os alunos passaram a atribuir à Estatística um significado voltado para o exercício crítico da Cidadania e reconheceram que esta serve para fazer uma análise crítica às situações de forma a poder contestar o que é dito. Inicialmente apenas três alunos, S, G e B, tinham considerado que a Matemática permitia compreender a informação estatística mas não tinham referido que permitia criticá-la. O facto de os alunos terem analisado dados por eles recolhidos, permitiu- lhes reconstruir o seu foreground acerca da aprendizagem da Matemática, permitindo-lhes atribuir agora um significado diferente, tornando-se mais visível para estes alunos a sua utilidade no quotidiano.

Ao estabelecer os critérios para um Robot ser vencedor, os alunos apresentaram e argumentaram as suas perspetivas sobre a situação o que fez emergir estratégias variadas e originais. Foram capazes de interpretar e avaliar criticamente a informação recolhida durante as corridas, utilizar e estabelecer relações estatísticas de forma a definir o Robot vencedor, usando métodos de análise, explorando os dados de forma a extrapolar questões além das nossas expetativas (Lopes, 2013a; Lopes & Fernandes, 2015). Além disso, foram capazes, no grande grupo, de explicar o processo criado pelo seu grupo para definir o Robot vencedor por suas próprias palavras, evidenciando, assim, terem desenvolvido um raciocínio processual integrado e ampliado a literacia estatística.

Podemos considerar que os alunos desenvolveram o seu raciocínio estatístico (Garfield, 2002) na medida em que foram capazes de compreender, interpretar e explicar os métodos estatísticos baseados nos dados reais das corridas realizadas. Desenvolveram o seu pensamento estatístico (Chance, 2002) pois conseguiram identificar os conceitos estatísticos (moda, média, amplitude da amostra, máximo, mínimo) envolvidos nas investigações realizadas e revelaram capacidade em lidar com eles no contexto da situação.

Notemos que, apesar da aparente justiça de todos os critérios criados pelos grupos, não podemos descurar o facto de que tentaram, sempre que possível, arranjar um argumento válido para tornar o seu Robot no vencedor, o que revela que os alunos foram capazes de refletir sobre os dados e na adequação e eficácia de uma determinada medida estatística para tornar um Robot

6. Das Corridas com Robots à Aprendizagem da Estatística e da Cidadania

no vencedor. Assim, podemos considerar que desenvolveram raciocínio sobre as medidas estatísticas (Garfield & Gal, 1999).

Durante a discussão dos critérios estabelecidos para um Robot ser vencedor, os alunos apresentaram e argumentaram a sua perspetiva sobre a situação e defenderam as suas opiniões, revelando assim terem adquirido e desenvolvido literacia estatística (Watson, 1997; Gal, 2000).

No grande grupo, tiveram que relacionar os dados com a situação em análise e explicitar o que os dados expressavam sobre o problema em foco. Assim sendo, fizeram uso e devolveram o pensamento estatístico (Mallows, 1998).

Os argumentos e estratégias explicitadas pelos grupos de trabalho tiveram por base a média, o tempo mínimo e os extremos da amostra (como vimos nos episódios anteriores). Em todos os casos, os alunos tiveram que explicar o significado dos conceitos utilizados no contexto da situação em análise. Alguns conceitos utilizados pelos alunos foram aproveitados por nós para fazer emergir outros conceitos estatísticos e, dessa forma, permitir que os alunos desenvolvessem a sua literacia estatística.

No final das apresentações dos quatro grupos de trabalho, o grupo do X-5 solicitou-nos apresentar um outro critério de classificação dos Robots, alegando que após a sua apresentação no grande grupo, resolveu criá-lo pois “um dos grupos nunca respeitava os outros quando estes apresentavam” (T).

Ficámos curiosas para conhecer este ‘novo critério’ e permitimos que o grupo fosse ao quadro explicá-lo.

A: Fomos criando uma tabela com as atitudes e valores durante as várias apresentações. C: Resolvemos criá-la pois não gostámos da atitude do grupo do Jagunço. Ficaram todos convencidos que eram os vencedores e não respeitaram o trabalho dos colegas.

Inv: Como assim? Porque é que não respeitaram?

T: Perder e ganhar é desporto e eles faziam uma festa sempre que um critério mostrava que eram o vencedor e gozavam do que ficava em último. Não está correto!

Inv: Claro que sim. Não devemos gozar de ninguém. Mas eles foram repreendidos quando o fizeram.

C: Sim, sabemos que foram. Mas saber estar é importante. Por isso, criámos este critério. Inv: Claro que sim. É importante saber estar em qualquer lugar. Mostrem lá o que fizeram. Os alunos projetaram, através do computador, a tabela seguinte e explicaram-na, com base nos apontamentos que tinham.

Atitudes e valores na apresentação do… Classificação Final X-5 DNR Vinagre Jagunço

1º Vinagre 1º Vinagre 1º DNR 1º Vinagre 1º Vinagre 2º DNR 2º X-5 2º X-5 2º DNR 2º DNR 3º Jagunço 3º Jagunço 3º Jagunço 3º X-5 3º X-5

4.º Jagunço Tabela 6.9: Tabela criada e apresentada pelo grupo do X-5.

C: Durante cada apresentação definimos o 1.º, 2.º e 3.º lugar. Como está aqui na tabela. [O aluno enquanto explica aponta na tabela que está a projetar.] Depois demos pontos, 3 pontos ao 1.º lugar.

T: O Vinagre ficou nas 3 apresentações que assistiu em 1.º lugar, por isso, ficou com 9 pontos. Eles estavam caladinhos enquanto os outros apresentavam e quando tinham dúvidas ponham o dedo no ar para perguntar. Nunca interrompiam.

A: Demos 2 pontos ao 2.º lugar e 1 ponto ao 3.º lugar.

T: As DNR ficaram em 2.º lugar com 7 pontos. Tiveram um 1.º lugar e dois 2.os. 3 + 2 + 2 é

7. Elas também estavam caladinhas mas nunca levantaram dúvidas nem participaram nas apresentações dos outros. Para elas estava sempre tudo bem.

A: Também a R chegou tarde mesmo sabendo que eram as apresentações. O que não é boa atitude. Nós ficamos em 3.º lugar, pois às vezes falávamos entre nós, embora baixinho, enquanto os colegas estavam a explicar. Mas, também, portámo-nos muito bem. Só que o Vinagre e as DNR portaram-se sempre bem.

C: O Jagunço fica em último lugar, pelo que explicámos. Só ficaram com 3 pontos.

Saber estar e participar são algumas das capacidades que se tentou desenvolver com a implementação do CA, pois sempre que algum aluno tinha uma atitude menos boa, chamávamos-lhe à atenção. Este critério criado pelos alunos revela que para eles é importante o saber estar na sala de aula e mostra que se tornou uma perspetiva partilhada que além dos conhecimentos matemáticos, são importantes e relevantes, na sala de aula de Matemática, as atitudes e valores dos alunos pois, se tal não fosse, este critério não seria estabelecido pelo grupo do X-5 e aceite por todos os restantes alunos. O grupo do Vinagre admitiu: É Justo. Têm razão! Concordamos com essa classificação.

Durante as apresentações os alunos apresentaram, e explicaram, os vários gráficos que construíram com recurso à folha de cálculo do Excel. O grupo do X-5 criou um gráfico, que nenhum outro grupo tinha criado,

com os tempos máximos e mínimos de cada Robot e atribuíram a classificação dos Robots tanto pelo tempo mínimo como pelo tempo máximo.

Este grupo, também

utilizando apenas o tempo máximo de cada Robot definiu a classificação dos Robots. Atribuiu o 1.º lugar ao Robot que tinha menor tempo máximo, o 2.º lugar ao Robot que tinha o segundo

menor tempo máximo e assim sucessivamente, como mostra a tabela seguinte:

Gráfico 6.2: Gráfico criado, no Excel, pelo grupo do X-5, para apresentar o tempo mínimo e máximo de cada Robot.

28,32 26,54 27,05 27,05 33,52 29,75 27,57 30,44 0 5 10 15 20 25 30 35 40 X – 5 DNR Jagunço Vinagre

Tempo mínimo e tempo máximo de cada Robot

6. Das Corridas com Robots à Aprendizagem da Estatística e da Cidadania

Robot Tempo Máximo (em segundos) Classificação Jagunço 27,57 1.º

DNR 29,75 2.º Vinagre 30,44 3.º X-5 33,52 4.º

Tabela 6.10: Tabela criada pelo grupo do X-5 para classificar os Robots utilizando o tempo máximo de cada Robot.

O gráfico apresentado pelo grupo do X-5 foi por nós aproveitado para solicitar que justificassem, apenas através da observação ao gráfico, qual o Robot que tinha menor amplitude entre os tempos das corridas e qual o que tinha tido maior amplitude entre os tempos das corridas. O M explicou que o Robot que tem menor amplitude entre o tempo máximo e mínimo é aquele em que as barras têm uma altura mais semelhante e o que tem maior amplitude entre o tempo máximo e tempo mínimo é o que tem maior diferença entre a altura das barras. A restante turma concordou com o M. Por esta resposta apresentada pelo aluno e aceite pelos colegas podemos concluir que, realmente, faz parte da plataforma de conhecimento partilhado da turma o que representa a amplitude da amostra e que os alunos tornaram-se capazes de ler a informação contida em gráficos construídos pelos colegas, o que revela que os alunos desenvolveram raciocínio processual (Garfield, 2002) e tornaram-se capazes de fazer raciocínio sobre associações (Garfield & Gal, 1999).

Após todas as apresentações, concluíram que, pelos critérios estabelecidos, na maioria dos casos, o vencedor é o Jagunço e o 2.º lugar era do Vinagre.

Durante a apresentação de um dos grupos de trabalho detetámos que não era uma perspetiva partilhada pela turma o que consistia ‘uma corrida’. Alguns alunos consideravam que tinham sido realizadas 24 corridas, outros consideravam que tinham sido realizadas 12 corridas. Mesmo no próprio grupo não havia consenso sobre o número de corridas que tinham sido realizadas. Várias foram as tentativas de explicação entre os alunos sobre o que era uma corrida, mas difícil foi que todos concordassem com as definições e justificações apresentadas até que o H pediu licença para apresentar a sua perspetiva.

H: Na fórmula 1, correm vários carros ao mesmo tempo, mas é só uma corrida, cada carro faz o seu tempo, mas é apenas contabilizada uma corrida. O mesmo se passa com o rally e também com as nossas corridas.

P.M: Foi como nós, correram dois Robots ao mesmo tempo, ficámos com dois tempos e uma corrida, por isso, temos 24 tempos realizados em 12 corridas.

S: Nós temos 24 tempos mas esses foram contabilizados em 12 corridas porque cada corrida foi realizada entre 2 Robots. Nenhum Robot correu sozinho. Se o Robot tivesse corrido sozinho então tínhamos 24 corridas pois temos 24 tempos de corridas.

Foi recorrendo a vivências de outras práticas que os alunos conseguiram construir uma perspetiva partilhada acerca do que é, no contexto em análise, realizar uma corrida. Com a perspetiva apresentada pelos alunos foi possível reformular perspetivas, abandonar algumas e construir uma perspetiva partilhada acerca do que é uma corrida e porque é que tínhamos realizado 12 corridas e contabilizado 24 tempos.

Investiu-se tempo nesta discussão pois consideramos importante que os alunos tenham oportunidade de construir a sua perspetiva sobre os assuntos em análise e criar as suas próprias definições, para que a aprendizagem tenha significado. Ao abrirmos espaço para a discussão permitimos que os alunos construíssem uma ideia partilhada sobre o que é uma corrida e o que significa o tempo de um Robot numa determinada corrida.