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Arquitetura ferroviária

No documento Caieiras: núcleo fabril e preservação (páginas 197-200)

Habitação e Arquitetura

Figura 64 Madeiramento do telhado nas casas do

3.2.1 Arquitetura ferroviária

A implantação do transporte ferroviário, no Brasil, data de meados do século XIX155. A São Paulo Railway foi inaugurada no momento em que a produção de café tornava-se sinônimo de riqueza e prosperidade. Teve seu primeiro trecho – São Paulo até Santos – inaugurado em 1866 e seu prolongamento até Jundiaí, em 1867. Devido à necessidade de escoar a produção de cal da Fazenda Industrial Cayeiras foi inaugurada

155

Em 1854, por iniciativa do Barão de Mauá foi implantado o primeiro trecho de estrada de ferro no país. Este trecho fazia a ligação entre o Porto de Mauá até a estação de Fragoso, no Rio de Janeiro. A participação do Barão com investimentos foi também fundamental no estabelecimento da Estrada de Ferro de Recife ao São Francisco, da Estrada de Ferro Bahia ao São Francisco, da Estrada de Ferro Dom Pedro II e da São Paulo Railway. Grande parte da implantação da rede ferroviária brasileira e de seus edifícios esteve sob a responsabilidade de firmas inglesas. Normalmente utilizava-se técnica mista para edificar as estações. Os prédios que serviam aos passageiros e à administração costumavam ser erguidos em alvenaria enquanto as coberturas das plataformas eram erguidas em estrutura metálica. Em estações de menor porte havia plataformas abrigadas por estruturas de madeira ou metal acopladas ao edifício de alvenaria. A utilização do metal para construção foi difundida, pois possibilitava construções rápidas favorecendo o atendimento das demandas crescentes devido à ampliação do comércio, favorecido pela abertura dos portos, após a vinda da Corte (KÜHL, 1998). Na segunda metade do século XIX, com novos transportes, surgiu um novo fenômeno na arquitetura brasileira: a importação de edifícios, de madeira ou de metal, inteiramente produzidos na Europa (REIS FILHO, 1987). A importação de edifícios metálicos teve maior êxito nos locais que apresentavam rápido crescimento econômico, muitas vezes em locais onde a mão-de-obra qualificada para construção era escassa. Outro fator que favoreceu a utilização dos edifícios europeus foi a necessidade de uma aproximação política e cultural entre o Brasil e os países “desenvolvidos”. A aceitação das soluções arquitetônicas européias, mesmo que defasadas em relação à origem, favorecia uma afirmação social embasada em preceitos de desenvolvimento e progresso tecnológico (KÜLH, 2008). Exemplo de edifício importado foi o da Estação da Luz, em São Paulo. Os conjuntos ferroviários, no Brasil, eram compostos por uma estrutura que garantia a funcionalidade do complexo. Assim, armazéns de carga e mercadoria, oficinas de manutenção, locais para manobra de composições, caixas d’águas suspensas para abastecimento das caldeiras das locomotivas, depósito de carvão, casas para funcionários, abrigos para máquinas paradas, entre outras edificações, costumavam compor o cenário ferroviário (SOUKEF JUNIOR, 2008).

uma parada para trens dando início à Estação Ferroviária de Cayeiras, em 1º de julho de 1883 (DONATO, 1990).

O edifício construído para a parada de trem, em Caieiras, era uma construção de pequeno porte que mesclava a alvenaria em tijolos de barros com a construção em madeira. Anexo a este edifício, a plataforma parecia ter não mais do que 5,00m de extensão, protegida por uma cobertura acoplada ao edifício principal. A madeira era material abundante na região - devido à quantidade de mata nativa - e parecia compor a cobertura e parte do edifício principal, o piso e a estrutura da plataforma. A chaminé, disposta na extremidade do edifício principal, construída em tijolos de barro pode sugerir a existência de um fogão à lenha ou algum tipo de aquecedor. O telhado em duas águas com beirais protegia as guilhotinas vedadas com vidro. Esta arquitetura inspirava-se, de forma simplificada, na linguagem da arquitetura vernácula européia dos chalés. Em seu porte, aspecto formal e natureza dos materiais empregados para a construção da parada de trem de Cayeiras nota-se semelhança com a Estação Juquery, atual Estação Franco da Rocha.

Figura 90 Parada da São Paulo Railway, em 1883 Fonte: Donato (1990, p. 15)

Figura 91 Primeira Estação Juquery. Fonte: Mazzocco e Santos (2005)

Com o aprimoramento das ferrovias, as edificações dos conjuntos ferroviários passaram a ser projetadas por profissionais especializados contratados para o serviço ou ainda já pertencentes ao quadro de funcionários das companhias ferroviárias (SOUKEF JUNIOR, 2008).

No final do século XIX, começaram a surgir os projetos para a construção das estações. As estações costumavam ser classificadas de acordo com o trajeto da linha férrea. Esta forma de classificação evidenciava três situações diferentes: as estações de passagem ou chamadas intermediárias, localizadas ao longo do percurso; as estações terminais, com referência às extremidades onde começavam e terminavam as viagens de

trem; e as de transferência ou entroncamento, onde era possível fazer a troca de percurso. Assim, os edifícios recebiam os serviços e os acabamentos de acordo com o porte e a importância da localidade para as devidas companhias ferroviárias. A S.P.R. padronizava as formas e os materiais utilizados para a construção dos edifícios ferroviários. Geralmente, o corpo principal das edificações da São Paulo Railway compreendia um bloco retangular, pouco ornamentado, em alvenaria de tijolos de barro. A companhia dispunha de projeto-tipo para as estações de 3ª classe (denominação adotada para as estações intermediárias), na qual estaria incluída a estação de Caieiras (SOUKEF JUNIOR, 2008).

Para garantir a correta execução dos detalhados projetos das estações de passageiros de “terceira classe”, a SPR publicou, em 1897, o folheto “Estações de 3ª Classe – Condições Geraes e Especificações”, de autoria do engenheiro- chefe da SPR, James Ford. 38 artigos regulamentavam a contratação das obras das estações e 25 especificavam o tipo de material que deveria ser utilizado na construção (cal; areia; saibro; concreto; pedra; tijolos; madeira, mas apenas pinho-de-riga; telhas; canos de barro para drenagem importados de Londres; ladrilhos de duas cores “conforme amostra do escritório”; peças de banheiro e elementos de ferro fundido “fornecidos pela companhia”; lambrequins para a cobertura das plataformas “de 0,030 metro de grossura e recortados segundo o desenho”). Além de detalhar a execução de: alicerces; paredes de tijolos em argamassa de cal que “serão edificados de conformidade com os desenhos detalhados, com tijolos devidamente sobre salientes”; alvenaria de pedras e tijolos; pisos e soalhos; tetos e forros; rodapés; portas e janelas de caixilho envidraçado e veneziana; banheiros; cozinha; obras de drenagem; reboco; pintura e execução das duas plataformas, cada uma com 120 m de comprimento e a 0,90 metro de altura em relação aos trilhos (MAZZOCO; SANTOS, 2005, p.82).

Figura 92 Projeto tipo para estações de 3ª classe Fonte: Mazzocco E Santos, 2005.

O engenheiro da S.P.R. Daniel Makinson Fox constatou e registrou a dificuldade de se encontrar, em São Paulo, mão-de-obra adequada e diversidade de materiais que não fossem a madeira, pedra, tijolos, cal e brita. Fox alertava para a necessidade utilizar o pinho-de-riga pela sua trabalhabilidade superior à da madeira dura, embora de boa qualidade, das florestas brasileiras. Os registros de Fox alertavam ainda para a pouca qualidade de outros materiais e mão-de-obra local:

No interior há escassez de pedras apropriadas para a construção. Todos os edifícios antigos de São Paulo são construídos em ‘pisé’ ou ‘rammed earth’, localmente chamada de ‘taipa’. Essa forma de construir foi, entretanto, mais tarde substituída pela alvenaria de tijolos; tijolos de boa qualidade são fabricados por duas ou três máquinas Clayton em uso na província. [...] O grande defeito dos tijolos confeccionados à maneira nativa é o fato de raramente serem suficientemente queimados. Invariavelmente, a alvenaria de tijolos é de confecção grosseira, e não há atenção para com o prumo, junção e alinhamento; no final, a alvenaria é recoberta com argamassa. Alguns dos edifícios de estações são belos exemplares de construção em tijolos, porém erguidos por pedreiros alemães, ingleses ou portugueses (MAZZOCO; SANTOS, 2005, p.74).

Algumas das estações intermediárias da S.P.R. são semelhantes em suas características. Kühl (2008) aponta estas semelhanças destacando o aspecto formal dos edifícios retangulares de um único pavimento construídos em alvenaria de tijolos aparentes, plataformas protegidas por abrigos apoiados em colunas de ferro fundido produzidos pela Walter MacFalane de Glasgow e passarela metálica pré-fabricada para atravessar as duas vias. Obedeceriam a este padrão as estações de Rio Grande da Serra, Ribeirão Pires, Jaraguá, Franco da Rocha, Várzea Paulista e Caieiras (KÜHL, 2008). Caieiras e algumas estações contariam ainda com uma cabine de sinalização.

Figura 93 Estação de Caieiras, 1922, tipo 3ª classe. Ao fundo, à esquerda, a passarela metálica. À direita o

casarão que alguns moradores de Caieiras afirmam ter sido a residência de Bertha e Walther Weiszflog, demolida na década de 1960

No documento Caieiras: núcleo fabril e preservação (páginas 197-200)