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O COMÉRCIO NO CONTEXTO DAS CIDADES E DA

1.4. AS CIDADES E OS LUGARES DO COMÉRCIO

Conforme descrito anteriormente, a intensificação das relações internacionais, a nova divisão internacional do trabalho, as mudanças na geografia da produção, a velocidade das informações, dos meios de comunicação e de transportes, o crescimento internacional da economia e dos serviços, e o aparecimento das cidades globais constituem os principais elementos que promovem a interdependência entre os lugares.

Os processos de concentração e centralização do capital, constantes no modo de produção capitalista, tornam-se ainda mais acirrados em períodos de crise econômica e favorecem as empresas que apresentam um número maior de rotações, permitindo-lhes um aumento na acumulação. Com a finalidade de produzir e beneficiar-se de grandes aglomerações, o mercado, enquanto lugar da efetivação das trocas, sempre buscou um lugar estratégico nas cidades, constituindo-se um elemento gestor de centralidades. Barata Salgueiro (1996, p.183) escreve que:

A importância do comércio transcende a transacção comercial, pois o lugar de mercado é também uma fonte de informação, uma ocasião para contactos, um sítio de recreio e de ócio. É por isso que no comércio se pode ver o embrião da vida urbana naquilo que ela pressupõe de interacção, de troca em sentido lato, de produção da inovação. [...] o comércio e alguns serviços contribuem fortemente para definir a estrutura dos núcleos de povoamento e para a integração funcional dos bairros periféricos.

Devido ao aumento do tráfego e do congestionamento, o centro perdeu acessibilidade. Por outro lado, os centros urbanos também não dispunham de espaços para abrigar as novas formas de comércio e de serviços que passaram a exigir grandes áreas para se estabelecerem. Assim, surgiram novos centros terciários dentro da própria cidade ou na sua periferia. Alguns estavam inseridos em importantes operações urbanísticas

destinadas a descongestionar os centros, enquanto outros foram criados a partir de iniciativas privadas.

Concentradas inicialmente no centro das metrópoles, as formas comerciais mostravam-se organizadas de acordo com as mercadorias que vendiam. Hoje, em determinados lugares das metrópoles, concentram-se grandes superfícies comerciais que vendem produtos extremamente variados.7 No lugar onde se estabelecem essas novas superfícies comerciais, produz-se um novo tipo de relação social capaz de criar uma nova capacidade de concentração, ou seja, uma nova centralidade.

No processo de expansão dos espaços urbanos, o comércio influencia na valorização e, também, na desvalorização de áreas. Ao discutir as novas centralidades urbanas, Carlos (2001, p.178), salienta que:

[...] a cidade explodiu e concretizou-se a partir de novas formas, estruturas e funções onde áreas imensas ganham novo valor de uso e, conseqüentemente, valor de troca, pois o espaço mercantilizado insere-se no mundo da mercadoria.

Nos locais onde se instalam, as novas formas e estruturas comerciais ampliam o mercado de consumo. Criam novas espacialidades urbanas. A própria urbanização é intensificada.

Na história do comércio, os mercados e os hipermercados representam os pontos extremos dos lugares destinados à troca de alimentos. Conforme as cidades foram crescendo, surgiram novas necessidades que criaram condições para que novas formas de trocas se desenvolvessem. O surgimento de novas modalidades comerciais alterou as exigências locacionais não só para os varejistas como também para a maioria das empresas prestadoras de serviços. Com o objetivo de buscar os melhores lugares para a instalação das atividades comerciais, vários estudos foram desenvolvidos. Alguns especialistas no assunto chegaram até a desenvolver importantes teorias que ainda hoje são aceitas e utilizadas.

A mais famosa teoria de localização do comércio varejista é a de Christaller, de 1933, na qual o referido autor desenvolveu um modelo hexagonal em que os centros de comércio e de serviços localizam-se nos vértices de hexágonos, cujos raios são tanto maiores quanto a expressão do centro e de sua respectiva área de influência determinada

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Como exemplos de superfícies comerciais pode-se citar: os supermercados, os hipermercados e os shopping

por vários fatores como: quantidade e variedade dos bens ofertados, poder de compra da população, distância econômica (preço do bem, custo e tempo de deslocamento).

Atualmente, as atividades comerciais tendem a localizar-se de acordo com a distribuição da população. Grande parte dos estudos geográficos que abordam a questão da localização do comércio analisa, principalmente, a questão da acessibilidade ao centro e sua localização estratégica do ponto de vista do mercado consumidor. Para Santos (1979), o limiar e o alcance de determinados bens variam de acordo com os níveis de desenvolvimento os quais classificou como circuito superior e circuito inferior que, ao se reproduzirem, criam, em nível espacial, social e ideológico, distintos campos dentro do urbano.

Ao discutir a origem dos negócios varejistas, Richard Nelson (apud VARGAS, 2001, p. 62) mostrou que o valor do lugar do “ponto” dependia da acessibilidade da população residente e em deslocamento, da atração física da loja, do uso do solo ao seu entorno e da qualidade dos produtos que oferecia. Ainda de acordo com Nelson, os negócios têm sua origem no propósito inicial de compra, por exemplo, ir ao supermercado; na compra por impulso que se traduz na atração suscetível de compra; e na atração de vizinhança que seria, de acordo com o autor, um negócio compartilhado, ou seja, compras de produtos associados.

No que diz respeito à escolha da localização, o referido autor desenvolveu ainda um conjunto de oito princípios básicos para a escolha da localização do estabelecimento comercial de varejo que seriam: o potencial da área – representado pelo volume de negócios que podem ser gerados no local escolhido; a acessibilidade – vias e meios de transportes disponíveis; o potencial de crescimento – obtido através da análise do potencial de crescimento demográfico e da renda da população; interceptação de negócios – localização entre moradias e compras habituais; atração cumulativa – compras comparadas, especializadas; compatibilidade – correspondendo às compras associadas; a minimização de riscos de concorrência – análise do local para identificar a concorrência; e, por fim, os aspectos microeconômicos – os custos de funcionamento. (NELSON, apud VARGAS, 2001, p. 63) Evidencia-se, assim, a preocupação com a concorrência, com o consumidor e, principalmente, com o espaço da loja que passou a representar um importante elemento de atração.

A partir dos estudos de Nelson sobre as teorias locacionais do comércio varejista, surgiram outras que enfatizam o papel do consumidor destacando o comportamento, os hábitos de compra e a qualidade dos serviços no atendimento aos clientes.

Frente à intensificação das relações internacionais, o novo enfoque direciona-se aos aspectos administrativos, ou seja, à análise e à administração do mercado – o marketing; ao trabalho – enfatizando as características da mão-de-obra, como o tipo, a mobilidade, a disponibilidade e o custo; ao capital - a disponibilidade de capital tanto físico quanto móvel; à demanda – relacionada com o poder de consumo e, conseqüentemente, com o desenvolvimento econômico do lugar; os transportes – redução dos custos de transportes conforme o modo de transporte, a densidade da rede, a periodicidade e a tecnologia disponível; aos fluxos – destacando-se os fluxos de insumos de comunicação, de informação, de consumo, de capital e de pessoas; à organização empresarial – com respeito à localização do gerenciamento da empresa, as fusões e aquisições empresariais que ocorrem cada vez mais, há uma tendência ao gerenciamento à distância, ou seja, a parte administrativa continua no país sede das empresas internacionais o que, de certa forma, torna impessoal o processo administrativo. Tal processo também tem acontecido muito com os serviços que estão cada vez mais sendo terceirizados; as políticas públicas – representam as intervenções governamentais representadas pela criação de empregos, manutenção da balança comercial, estratégias de desenvolvimento empresarial, políticas de isenção de impostos, doação de terrenos para a instalação de empresas, criação de distritos industriais, entre outros; o contexto sócio-cultural – no que concerne a fatores como idade, nível de escolaridade, de informação, de cultura e de consumo; a tecnologia disponível no lugar, ou seja, o grau tecnológico de uma dada sociedade, o nível de inovações e invenções na produção; e o espaço físico – a disponibilidade de espaço para a instalação de novos empreendimentos comerciais.

A partir do século XX, surgiram modernas e gigantescas empresas monopolistas que expandiram seu mercado de atuação. Em busca de maiores lucros e utilizando-se de novas formas de produção, apoiada na lógica de racionalização e de desenvolvimento tecnológico e tecnocrata, elas passaram a uma produção em massa para um consumo também em massa.

Analisando a produção fordista no pós-guerra, Harvey (1992, p.131) afirma que a abertura de investimentos estrangeiros em países capitalistas, especialmente aqueles que receberam auxílio norte-americano através do Plano Marshall, possibilitou:

[...] a formação de mercados de massa globais e a absorção da massa da população mundial fora do mercado comunista na dinâmica global de um novo tipo de capitalismo. [...] A abertura do comércio internacional representou a globalização da oferta de matérias-primas geralmente baratas [...] O novo internacionalismo também trouxe no seu rastro muitas outras atividades – bancos, seguros, hotéis, aeroportos e, por fim, turismo. Ele trouxe consigo uma nova cultura internacional e se apoiou fortemente em capacidades recém-descobertas de reunir, avaliar e distribuir informações.

A nova forma de produção provocou o fortalecimento da atividade comercial nas cidades, originando-se as galerias, as grandes magazines, as lojas de departamento que, no início, visando beneficiarem-se das vantagens provenientes da aglomeração urbana, localizavam-se nos centros das cidades.

Na Europa Ocidental a concentração das atividades comerciais acentuou-se a partir da segunda metade do século XX, com a implantação de grandes lojas no centro das principais aglomerações e o surgimento das lojas filiais nos bairros periféricos. Com a criação de novas formas de comércio, as pequenas lojas tornaram-se menos importantes e, nos grandes centros urbanos, especialmente nas metrópoles, tenderam ao desaparecimento. As feiras e mercados passaram a se dedicar à comercialização de produtos perecíveis, principalmente alimentos. A partir do momento em que surge a necessidade de se buscar espaços mais amplos para a instalação desses estabelecimentos comerciais, começa a ocorrer a descentralização do comércio. No centro das cidades, em substituição a essas formas comerciais, começaram a se estabelecer as grandes “lojas populares”, que anteciparam os supermercados já existiam nos Estados Unidos desde 1880. Elas se desenvolveram num momento em que o poder aquisitivo era baixo, apresentando-se como novas fórmulas de vendas caracterizadas por instalações estritamente funcionais, com o emprego de mão-de-obra não qualificada, com enormes variedades de produtos direcionados quase que exclusivamente à classe operária. Porém, a crise econômica de 1929 reinstala uma nova fase de concentração e dela emerge o supermercado, revelando a imensa capacidade do capital renovar-se. Nesses novos lugares de troca vislumbrou-se

[...] o gigantismo de uma economia “super” produtiva e uma sociedade “hiper” consumista, o que requereu, mais e mais, o aparecimento de estabelecimentos comerciais urbanos, a princípio concentrados no centro da cidade. Todavia, algumas inovações, como novas técnicas de comercialização, a exemplo do self service, com a popularização do uso do automóvel, com o aperfeiçoamento de equipamentos eletrodomésticos que facilitaram o armazenamento de produtos, etc., foram possibilidades para descentralizar certos setores do comércio, isto é, muitos se localizam em áreas afastadas do centro da cidade, numa espécie de periferização ou suburbanização do comércio. (FREIRE, 1999, p. 63)

A urbanização foi um importante instrumento para ampliar a capacidade do comércio, pois, na medida em que a cidade se expandia, criavam-se novos pontos de atração para a localização dos novos tipos de estabelecimentos comerciais, ou seja, novas centralidades.

Em seu estudo sobre a descentralização do comércio varejista na cidade de Belo Horizonte, Teixeira (2000, p.79) afirma que a descentralização do varejo começou na década de 1920, em algumas cidades dos Estados Unidos onde a população das regiões urbanas começou a se distanciar das áreas centrais das cidades. A partir desse fato, ocorreu a abertura das lojas de departamentos, de vestuários e de variedades em lugares que representavam grandes concentrações populacionais como as estações de trens suburbanos, de metrôs e de bondes. De acordo com o referido autor, é nesse contexto que os estabelecimentos de agências de bancos e o aparecimento de modernas “drugstores”8 , as lojas de variedades pertencentes a cadeias nacionais e as de calçados começaram a constituir os denominados “outlets”9. A partir de então, foram criados os centros secundários de varejo com a mesma estrutura dos localizados nas áreas centrais. Aos poucos, esses novos centros passaram a atrair um grande número de consumidores, inclusive de áreas mais distantes da cidade.

Um dos mais importantes fenômenos que aconteceu com as cidades, ainda no século XX e que se manifesta até os dias atuais, foi, sem dúvida, a multiplicação e a diversificação das áreas de concentração das atividades comerciais e de serviços que, ao migrarem das áreas centrais das cidades para áreas consideradas até então como periféricas, criaram novos fluxos, estabelecendo e intensificando novas centralidades.

Ao analisar a expressão centralidade, Sposito (1991, p.6) preocupa-se com o processo de produção e estruturação das cidades que, segundo ela, passa pelo entendimento do papel do centro. Segundo a autora, é preciso, antes de qualquer coisa, entender a estruturação urbana como um termo que guarda a idéia de “que esta organização/desorganização da cidade contém a dinâmica do próprio processo social que determina”. Reforça-se, assim, a idéia de que a estrutura urbana é a realidade conhecida num dado momento histórico. Dentro da estruturação urbana, o centro reflete a forma como os processos sociais estruturam o espaço em um dado período da organização social. Assim, podemos caracterizar o centro como o lugar onde as pessoas se dirigem para a

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Lojas norte-americanas que vendiam remédios, bebidas gasosas, bens de conveniência e sorvetes.

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Centros secundários de varejo, situados a cerca de mais de 10 km dos centros e que, em termos de estrutura, eram similares aos localizados nas áreas centrais das cidades.

realização de determinadas atividades e, ao mesmo tempo, o local que interage com outras atividades que se localizam fora do centro. Portanto, o centro integra e dispersa. Conforme salientou Sposito (1991, p.7),

Ao manifestar a concentração de múltiplos papéis, tanto mais necessariamente concentrados e hierarquizados organizadamente na área de melhor acessibilidade no interior das cidades o centro é o resultado do processo de crescimento delas, por sua vez originárias da própria divisão social do trabalho.

Nesse sentido, o crescimento da cidade é um fator determinante para a organização da área no entorno do centro e fora dele. Implica na reorganização de usos nas áreas já ocupadas, de maneira que o espaço será organizado para expressar as formas de organização que constituem tipos de crescimento da área central. Estudando as modificações que ocorreram com o comércio varejista na cidade de São Paulo, Pintaudi (2002, p. 148) afirma que, até os anos de 1950, a localização do comércio no denominado centro da cidade não foi colocada em questão, nem “mesmo com a implantação de subcentros comerciais em diferentes bairros, onde se instalaram algumas lojas de departamento, devido ao crescimento populacional e econômico de São Paulo[...]”. Eles acompanharam a expansão territorial da cidade. Por sua vez, o centro da cidade passou a receber um grande número de lojas populares, proporcionado pelo crescimento populacional que se traduziu num aumento expressivo do consumo.

Analisando a dinâmica das áreas centrais urbanas, Sposito (2001, p.236) escreveu que:

O aumento de números de áreas centrais produz duas dinâmicas econômico- territoriais correlatas entre si: a descentralização territorial dos estabelecimentos comerciais e de serviços e a recentralização dessas atividades. Essas dinâmicas ocorrem através de iniciativas de duas ordens que se dão simultaneamente: a de surgimento de novas atividades e estabelecimentos comerciais e de serviços fora do centro principal e a relocalização, em novos centros, de atividades e estabelecimentos que antes estavam restritos ao centro principal.

Essas novas centralidades promoveram uma reestruturação interna das cidades, as denominadas centralidades intra-urbanas e inter-urbanas. Assim, os novos fluxos comerciais atuam não somente nas cidades receptoras de novas formas comerciais, mas também na área de influência e de polarização delas. Sposito (2001, p.237) afirma ainda que, dessa forma, houve uma generalização da ocorrência de uma centralidade múltipla e complexa em áreas não metropolitanas em função dos seguintes fatores:

[...] – entrada nessas cidades de capitais comerciais de grande porte, com novas lógicas locacionais; - aumento do interesse dos capitais imobiliários na construção de novos equipamentos comerciais e de serviços, de forma associada ou não a esses capitais comerciais; - ampliação da diferenciação sócio-espacial, refletindo-se, muitas vezes, em exclusão sócio-espacial; - melhoria das formas de transporte, com destaque para o aumento do uso do transporte individual.

As novas formas de comercialização de bens e serviços são as razões para o aparecimento de novos empreendimentos e de novas lógicas territoriais para o desenvolvimento das atividades comerciais e de serviços. Essa nova dinâmica é incorporada pelas grandes empresas que atuam no setor, pelos agentes imobiliários e pelos próprios donos do solo urbano, pois significa mais uma forma de acumulação de capital.

Por outro lado, é importante ressaltar que aspectos geográficos como o tamanho da cidade, o sítio urbano onde ela está inserida, o seu grau de centralidade e as próprias características do espaço interno destas, são importantes fatores que poderão interferir no desenvolvimento das novas centralidades e territorialidades urbanas. Esse processo é, portanto, dinâmico e resulta da divisão territorial do trabalho, das redes urbanas, do ritmo de crescimento demográfico das cidades, do papel e do interesse desempenhado pelos órgãos públicos que desenvolvem o planejamento urbano, sobretudo na instalação de novas infra-estruturas urbanas como a implantação e a ampliação de novas formas de transportes, na “lei de uso e ocupação do solo”, enfim, nas formas de produção e apropriação do espaço urbano.

Ao tratar dos processos espaciais e a cidade, Corrêa (1997, p. 121-122) assinala que, enquanto forma de concretização das relações sociais, o que caracteriza a organização espacial das metrópoles modernas são os processos espaciais postos em ação pelos atores que modelam e organizam o espaço. Proprietários dos meios de produção, proprietários de terras, empresas imobiliárias e de construção civil, associadas ou não ao grande capital, e o Estado têm suas próprias estratégias de ocupação e valorização espacial. Ao caracterizar o que ele denominou de “metrópole moderna”, na mesma obra acima citada, Corrêa (p.124) afirma que a existência de uma área central, onde se concentram as principais atividades comercias e de serviço, os terminais de transporte interurbanos e intra-urbanos, resultou do processo de centralização, produto da economia de mercado gerada pelo capital industrial. Afirma ainda que a acessibilidade da área central, dentro do espaço urbano, foi o elemento responsável pela valorização da terra urbana. Para o autor, esses espaços centrais foram ocupados pelas atividades que podiam “transformar a acessibilidade em lucro”, ou seja, “o comércio varejista em expansão [...] e novos serviços cuja área de mercado era todo o

espaço urbano ou a hinterlândia da cidade”. Prosseguindo sua análise, o autor escreve que a descentralização é um processo mais recente, espontâneo ou planejado, que visa “diminuir a excessiva centralização, causadora de deseconomias de aglomeração [...] está também associada ao crescimento da cidade, tanto demográfico como espacialmente [...]”. (CORRÊA, p. 124-125. grifo nosso) Enquanto espaço produzido de forma planejada, o uso do solo urbano no interior da cidade e seus diferentes níveis de articulação entre o centro e a periferia, auxiliam no entendimento do processo de produção, de apropriação e de consumo do espaço urbano a partir da imposição de novas lógicas espaciais gestadas pelo poder público, que define suas ações segundo uma ordem de prioridades, privilegiando determinados segmentos sociais em detrimento de outros.

Ao analisar tal processo, Santos (1997, p.112) afirma que “O processo social está sempre deixando heranças que acabam constituindo uma condição para novas etapas [...] a prática depositada nas coisas, tornada condição para novas práticas.” Assim, provocadas por uma forma específica de articulações econômicas, sociais, políticas e ideológicas, o espaço urbano se (re)define como resultado das interações entre o social e o espacial. Nesse contexto, o poder público, enquanto interventor da produção/organização do espaço urbano, viabiliza a reprodução do capital na sua forma monopolista. No Brasil, os fatores que possibilitaram tal atuação/intervenção estão diretamente atrelados às novas formas de relações entre o Estado e a sociedade, principalmente a partir da década de 1960, quando o espaço passou a ser visto como objeto de poder do Estado Desenvolvimentista.

Com relação à produção do espaço urbano e a atuação do Estado, Milton Santos