• Nenhum resultado encontrado

1. O MUNICÍPIO DE JUNDIAÍ E SUA ORLA FERROVIÁRIA

1.1. Evolução histórica – O crescimento urbano e a provisão de infraestrutura de

1.1.3. As rodovias e a reorientação das zonas industriais

A priorização do transporte sob pneus a partir de meados do século XX, endossada pela Lei Federal nº 8463, de 27 de dezembro de 1945, que criou o Fundo Rodoviário Nacional, teve impactos profundos na ocupação urbana de Jundiaí e em sua orla ferroviária. As novas indústrias passaram a se instalar no distrito implantado junto à rodovia Anhanguera, inaugurada em 1948, situação que se consolidou com a construção da Rodovia dos Bandeirantes, 30 anos depois. Enquanto isso, o setor industrial têxtil, cujas fábricas situavam-se junto à ferrovia, entrou em decadência entre as décadas de 1930 e 1960, evidenciada pela redução da participação desta atividade na produção industrial nacional nesse período de 46,4% para 23,1% (PEREIRA, 1981, p.26).

A trajetória de algumas empresas de Jundiaí revela uma inadequação frente às novas realidades econômicas, tecnológicas e financeiras [...]. Foi o caso da pioneira, Companhia de Fiação e Tecelagem São Bento, falida em 1972 devido a um projeto mal sucedido de importação de máquinas automáticas proposto em 1967, com financiamento de alto custo e demora na implantação (POLLI, 2012, p. 5).

Muitas empresas deste setor foram à falência, como a Tecelagem Argos, que na década de 1970 sofreu com problemas administrativos e com a concorrência internacional resultante da abertura do mercado interno ao jeans norte-americano (SCHNEIDER, 2008, p. 110). Desta forma surgiram inúmeros vazios urbanos distribuídos ao longo da ferrovia que não foram substituídos por outras atividades

22

FIGURA 1.5 - Principais rodovias e ferrovias existentes e previstas da Região de Jundiaí.

23

FIGURA 1.6 - Mapa Esquemático da região Sudeste da Orla Ferroviária de Jundiaí.

24

FIGURA 1.7 - Sobreposição de zonas industriais previstas no Plano Diretor/Zoneamento – Lei 1.576/1969 (azul) e no Zoneamento previsto na Lei Nº 7.858/2012 (vermelho).

Fonte: Elaborado por Luciana Siguemoto a partir do Zoneamento de 1969 contido em PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE JUNDIAÍ, 2011, p. 10, e com Zoneamento de 2012 em JUNDIAÍ - LEI Nº 7.858/2012.

25 industriais, agora atraídas para o distrito junto às rodovias.

Coincidentemente as ferrovias paulistas entraram em decadência no mesmo período em que se encerrava o ciclo da indústria de tecidos em Jundiaí. Apesar da malha ferroviária deste estado ter chegado à sua máxima extensão nos anos 1940, os investimentos nesta rede já estavam sendo reduzidos desde a década anterior, devido à queda da lucratividade da agricultura. Na década de 1960, sem um fundo nacional que fornecesse o mesmo amparo destinado às rodovias, as Companhias Paulista e Mogiana e as Estradas de Ferro Araraquarense, Sorocabana e São Paulo-Minas passaram por graves crises financeiras, que levaram à sua transferência para o Governo do Estado em 1971, formando a Fepasa - Ferrovia Paulista S.A., que manteve parte dos serviços até o final da década de 1990. Apesar disso, na década de 1960 já haviam desaparecido diversos ramais ferroviários, como o trecho Rami, que atendia parte das indústrias cerâmicas do município (SCHNEIDER, 2008, p. 68). Naquele período a São Paulo Railway já havia sido transferida para a administração federal, após o fim do contrato de concessão de 80 anos firmado com a empresa inglesa, em 1947, transformando-se na Estrada de Ferro Santos-Jundiaí.

No início de suas operações, na década de 1970, a Fepasa chegou a transportar 13 milhões de passageiros ao ano, 42 mil por dia, transportados por 42 composições. No ano de 1997 esta empresa tinha apenas 18 trens em operação, transportando menos de 4000 passageiros por dia, cerca de 1,2 milhões de passageiros ao ano. O contínuo sucateamento da infraestrutura ferroviária paulista culminou com a transferência desta empresa à União, como pagamento de parte da dívida do Estado de São Paulo, sendo posteriormente privatizada, em 1997 (SECRETARIA DE TRANSPORTES METROPOLITANOS, 2010).

Como observou Raymundo Faoro no artigo “A questão Nacional: A modernização” (1992), o desenvolvimento da malha ferroviária paulista resultou das necessidades de uma elite de fazendeiros cafeicultores, que dependia desta infraestrutura para levar sua produção agrícola até o porto exportador de Santos. A deterioração desta rede, apesar dos inúmeros benefícios que trazia à população em geral como meio de transporte, deixa claros os limites do programa modernizador que orientou sua implantação. A mudança de ciclo econômico fez com que a linha

26 férrea deixasse de ser um investimento interessante para os setores dominantes, que sempre orientaram as ações do Estado de acordo com seus interesses.

Cabe destacar que, com o passar do tempo, parte dos espaços da orla ferroviária de Jundiaí já foi reocupada e passou a abrigar novos usos e funcionalidades, muitas vezes relacionados a atividades institucionais, a habitação ou ao setor terciário, resultado da gradativa expansão de atividades predominantes nos bairros próximos em direção à linha férrea, como o comércio, que desde o período colonial teve forte atividade na região central do município. Apesar disso, ainda existem grandes áreas que não se reestruturaram, entre as quais se destacam a antiga oficina da Companhia Paulista, operada pela Fepasa, e o entorno da atual estação Jundiaí da Linha 7- Rubi da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), objeto de estudo desta pesquisa, que também inclui o galpão industrial da antiga indústria Duratex, atualmente desativada, e um extenso vazio adjacente à linha férrea parcialmente utilizado como depósito de contêineres pela concessionária da rede ferroviária de cargas MRS logística (ver figura 1.6).

Analisando a evolução do perímetro urbano de Jundiaí ao longo do século XX, é possível verificar como esta ocupação se concentrava predominantemente ao redor do eixo da linha férrea operada pela Companhia Paulista e pela São Paulo Railway, situação que se manteve até a década de 1940, quando este município tinha cerca de 58 mil habitantes. A implantação da rodovia Anhanguera nas décadas de 1940/1950 promoveu uma expansão deste perímetro no sentido Sudoeste, embora a própria rodovia tenha funcionado como barreira a este avanço, devido às poucas transposições (PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE JUNDIAÍ, 2012). Em 1977 verificamos que o perímetro urbano continuava a se expandir na direção Sudoeste, transpondo o limite da Anhanguera, tendo seu avanço contido por outra rodovia, a dos Bandeirantes, inaugurada em 1978 (PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE JUNDIAÍ, 2011).

27

FIGURA 1.8 - Evolução da área urbanizada de Jundiaí entre 1940 e 1977 – Rodovias em Vermelho e Ferrovia em Lilás.

Fonte: PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE JUNDIAÍ, 2011, p. 8.

A partir da década de 1980 o perímetro urbano passou a se expandir novamente, orientado em dois novos sentidos, em direção ao Oeste, pela Rodovia Dom Gabriel Bueno Couto (SP-300), que liga as cidades de Jundiaí e Itupeva, e no sentido Leste, passando por parte da Rodovia Constâncio Cintra (SP-360) que leva a Itatiba, e da Avenida Humberto Cereser, que leva até Jarinu e permite acesso à Rodovia Dom Pedro I através de sua conexão com a SP-354 (Rodovia Edgard Máximo Zamboto).

FIGURA 1.9 - Evolução da área urbanizada de Jundiaí entre 1980 e 2010 – Rodovias em Vermelho e Ferrovia em Lilás.

28 Essas avenidas e rodovias cortam o município de Jundiaí transversalmente, promovendo a integração entre as Rodovias Anhanguera e Bandeirantes, que atravessam o território desta cidade no sentido Sudeste-Noroeste. Essa tendência de crescimento se mantém até os dias atuais, uma vez que o município não mais se expandiu em direção ao Sudoeste, devido à Rodovia dos Bandeirantes e à presença da reserva de flora e fauna da Serra do Japi, tombada pelo Condephaat em 1983 e declarada Reserva da Biosfera da Mata Atlântica pela Unesco, em 1992 (SCHNEIDER, 2008, p. 279).

Ao analisarmos a legislação de zoneamento resultante do primeiro Plano Diretor do município de Jundiaí, elaborado em 1969, com a legislação de uso e ocupação do solo mais recente, de 2012, temos um vislumbre de como a cidade se expandiu nessas últimas quatro décadas, e também da forma como a função industrial foi gradualmente mudando de posição dentro do território, devido aos fatores já analisados neste tópico (ver figura 1.7). O primeiro zoneamento foi elaborado em um momento de transição, com a coexistência dos bolsões industriais originais a Sudeste, junto à ferrovia, e de um novo núcleo de indústrias entre as Rodovias Anhanguera e Bandeirantes, que posteriormente se expandiu até os limites do município, junto à cidade de Itupeva.

É possível concluir que a configuração urbana de Jundiaí foi linear durante muitas décadas, com regiões urbanas concentradas principalmente junto aos principais eixos de transporte que atravessavam o acidentado relevo da Serra dos Cristais no sentido Sudeste-Noroeste, ligando o interior, especialmente a cidade de Campinas, à capital do estado. O crescimento no sentido transversal iniciou-se com a transposição da ferrovia no sentido Leste, onde existem terrenos com topografia mais plana, ocupados por bairros como Ponte São João e Colônia (PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE JUNDIAÍ, 2012).

Com o surgimento das rodovias, a cidade cresceu em direção ao Sudoeste, embora as ocupações entre a Bandeirantes e Anhanguera, com exceção do distrito industrial ao Norte, sejam de função predominante residencial com densidades muito baixas. Com a transferência das atividades industriais para o cruzamento entre as referidas vias estaduais e a Rodovia Dom Gabriel Paulino Bueno Couto, promoveu- se uma expansão do perímetro urbano ao longo do eixo viário que corta

29 transversalmente a região Norte do município, já distante das zonas de preservação ambiental e com relevo mais acidentado, situadas junto ao seu limite Sul. O crescimento neste novo vetor está promovendo o desenvolvimento de bairros próximos aos municípios de Jarinu e Itupeva, que fazem parte do Aglomerado Urbano de Jundiaí, questão que será abordada nos próximos tópicos.