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Aspectos simbólicos da marca

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Capítulo 2 – O consumo na contemporaneidade

3.3 Aspectos simbólicos da marca

O aspecto funcional de uma marca define-se por sua capacidade primordial de identificar, isto é, de demonstrar às pessoas quem é o fabricante de um determinado produto ou qual é a sua origem. Sob esse ponto de vista, a American Marketing Asso- ciation (DICTIONARY..., s.d., tradução minha) possui uma declaração muito assertiva quanto ao significado da palavra brand (marca), descrevendo-a como: “nome, termo, design, símbolo ou qualquer outra característica que identifique um vendedor de bens ou serviços e o diferencie de outros vendedores."1 Nesse caso, como complementam

Kotler e Keller (2012, p. 9), “uma marca é uma oferta de uma fonte conhecida."

Para se diferenciar, a marca pode optar por um nome fantasia e até um símbolo que a identifique. Este, por sua vez, pode ser impresso nas embalagens e até ser usado em variados suportes ou mídias. Mas Costa (2011, p. 93), entretanto, esclarece que as marcas não nascem senão a partir da comercialização de seus produtos; ou seja, é o uso dos bens, ao longo do tempo, que faz as marcas adquirirem vida autônoma:

1. Original: “name, term, design, symbol, or any other feature that identifies one seller’s good or service

É bastante evidente e visível que a vida das marcas é sustentada basicamen- te pelo objeto de consumo: os produtos. Eles são realidades materiais tangí- veis que as pessoas compram, consomem, destroem, utilizam, conservam, detestam, adoram, etc. [...]. O discurso da marca começa com o produto ou o serviço. Desta forma, a identidade, a originalidade, a inovação... e a satis- fação do consumidor e do usuário tomam corpo e vida com o produto ou o serviço. A marca não nasce do abstrato (COSTA, 2011, p. 103).

Ou seja, as marcas nascem quando seus produtos começam a circular e então evoluem à medida que mais consumidores os experimentam, testam, consomem e destroem (o mesmo aplica-se a serviços). Enquanto os produtos não estiverem em contato com as pessoas, a marca tem apenas um papel funcional de identificação. No entanto, ao usar produtos, os consumidores geram associações positivas ou negati- vas e assim estabelecem uma conexão mais emocional com a marca.

Em outras palavras, um fabricante pode aproveitar a mídia para chamar a atenção para suas ofertas, tornar seu nome conhecido ou convidar as pessoas a conhecerem a marca. No entanto, é pelo contato com os produtos e com as manifestações da marca (lojas físicas, virtuais, atendimento, funcionários, parceiros, etc.) que as asso- ciações são geradas e se transformam nos valores responsáveis por formar a imagem da marca na mente dos consumidores. Essa imagem extrapola a funcionalidade do produto, pois tem conexão com os sentidos e emoções. Logo, de um aspecto funcio- nal, a marca se enche de significados e se torna um sistema simbólico de valores. A American Marketing Association (DICTIONARY..., s.d., tradução minha) prossegue, então, com a seguinte declaração acerca da palavra brand (marca):

A marca é uma experiência do consumidor, representado por uma coleção de imagens e ideias; muitas vezes, ela é referenciada por um símbolo como um nome, logotipo, slogan e esquema de design. O reconhecimento da marca e outras reações são criados pelo acúmulo de experiências com o produto ou serviço específico, ambos diretamente relacionados a seus usos e pela influência da publicidade, design e comentários de mídia. [...]. Uma marca geralmente inclui um logotipo explícito, fontes, esquema de cores, símbolos e sons que podem representar valores implícitos, ideias e até personalidade.1

É assim que a marca, antes classificada por um caráter estritamente funcional (de identificação do fabricante), passa a ser reconhecida por aspectos simbólicos e emo- cionais. O nome e o símbolo se transformam em conceitos, diretamente relacionados às experiencias que cada cliente possui, enquanto usa ou consome a marca.

1. Original: “A brand is a customer experience represented by a collection of images and ideas; often, it

refers to a symbol such as a name, logo, slogan, and design scheme. Brand recognition and other reac- tions are created by the accumulation of experiences with the specific product or service, both directly relating to its use, and through the influence of advertising, design, and media commentary." (Added definition) “A brand often includes an explicit logo, fonts, color schemes, symbols, sound which may be developed to represent implicit values, ideas, and even personality." Vide https://bit.ly/1LbxqiQ.

Muito mais do que um nome e um logo, [uma marca] é a promessa de uma empresa ao cliente de concretizar aquilo que ele simboliza em termos de be- nefícios funcionais, emocionais, de autoexpressão e sociais. Mas uma marca é mais do que uma promessa. Ela também é uma jornada, uma relação que evolui com base em percepções e experiências que o cliente tem todas as vezes que estabelece uma conexão com a marca (AAKER, 2015, p. 1).

É por essa perspectiva que Khauaja e Prado (2008, p. 24) consideram que as mar- cas representam ideias e atributos que adquirem vida na mente dos consumidores, fazendo, como acrescenta Perez (2016, p. 11), uma ligação simbólica entre uma em- presa e seus consumidores ou entre uma pessoa e sua oferta para outras pessoas. É assim também que Batey (2010, p. 31) define marcas, quando diz que elas são um agrupamento de significados e podem gerar, como completa Aaker (2015, p. 1), uma conexão emocional ligada ao estilo de vida e às aspirações profundas dos indivíduos.1

Já Costa (2011, p. 17), ao encontro desses autores, assegura que uma marca não corresponde exatamente à soma de seus elementos (como produtos, serviços, fun- cionários, etc.), mas sim ao "todo mais as suas partes”, já que quanto mais partes são incorporadas a ela, maior também são as interações e a complexidade da marca.

Para Klein (2009, p. 46-48), os bens de consumo, vistos por essa ótica, nem de- veriam ser apresentados como produtos, mas como conceitos que carregam uma atitude, um estilo de vida, uma expressão ou conjunto de valores, afinal, não se vende

mais um produto e sim um conceito, um estilo de vida associado à marca. Nas pala- vras de Lipovetsky (2007, p. 96): "já não se trata tanto de vender um produto quanto de um modo de vida, um imaginário, valores que desencadeiam uma emoção: o que a comunicação se esforça para criar cada vez mais é uma relação afetiva com a marca." É daí que se pode compreender o raciocínio do fundador da Revlon, Charles Rev- son (apud KOTLER; KELLER, 2012, p. 5), quando certa vez proferiu uma frase que exprime esse entendimento acerca dos aspectos simbólicos da marca. Disse ele: “Na fábrica fazemos cosméticos. Na loja, vendemos esperança." Isso demonstra, afinal, que os valores que os produtos carregam vão muito além de seus atributos físicos, já que abrangem, como diz Perez (2016, p. 13), a "totalidade das percepções, crenças, ritos, experiências, usos e sentimentos associados como o produto/serviço." É por isso que a Revlon não vende produtos ou apenas "cheiros agradáveis", mas sim bele- za, sedução, aceitação e elegância. É por isso também que:

A IBM não está vendendo computadores, mas “soluções” para os negócios. A Swatch não tem relação com relógios, mas com o conceito do tempo. Na Die- sel Jeans, o proprietário Renzo Rosso disse à revista Paper: “Não vendemos 1. Daí o fato de as marcas extraírem sua vitalidade das lógicas do consumo na pós-modernidade.

(...) O conceito da Diesel é tudo. É o modo de vida, é a maneira de se vestir, é o jeito de fazer alguma coisa." E como me explicou a fundadora da Body Shop, Anita Roddick, suas lojas não têm nada a ver com o que vendem, são veículos para uma grande ideia – uma filosofia política sobre as mulheres, o ambiente e os negócios éticos (KLEIN, 2009, p. 48).

Calder (2006, p. 28) concorda que as marcas são essencialmente conceitos. Cla- ro que os consumidores formam conceitos de tudo o que experimentam; no entan- to, prossegue o autor, no caso dos produtos comerciais, os profissionais de negócio tentam influenciar as associações que são geradas pelos consumidores. De maneira mais específica, entender a marca como um conceito é útil porque ajuda a esclarecer um aspecto crítico do branding, que lida com percepções: “os consumidores estão, constantemente, formando e usando conceitos. Estão ativamente tentando categorizar produtos. Crucial para essa categorização é o processo psicológico de percepção."

É importante se ater às percepções porque, na dimensão conceitual em que as marcas situam-se, elas importam muito mais do que estatísticas ou verdades absolu- tas. Em mercados cada vez mais saturados em que os produtos são pouco diferencia- dos por seus aspectos tangíveis, é o parecer, isto é, a imagem do produto e da marca que faz a diferença, que seduz e que faz vender (LIPOVETSKY, 2007, p. 46).

Como acrescenta Perez (2016, p. 18), "a agregação efetiva do produto só se dá quando o consumidor percebe a qualidade ou a diferenciação." Nesse sentido, "de nada adianta o discurso da empresa sobre a qualidade, mas, sim, se esta é percebida

e valorizada pelos consumidores." Logo, geralmente a questão não é qual produto ou

serviço é melhor, mas sim qual produto ou serviço as pessoas acham que é melhor:

A presença de uma marca bem conhecida afetará fortemente como as pes- soas veem um produto ou serviço. Se veem um nome de marca premium em um produto, provavelmente percebem o item como de alta qualidade, exclu- sivo e caro. Se as pessoas veem um nome de marca de desconto em um produto, provavelmente perceberão o item como de baixa qualidade e barato (CALKINS, 2006, p. 2).

Para demonstrar o poder que uma marca exerce sobre os produtos, Calkins (2006, p. 3) conduziu um experimento com seus alunos de MBA, dividindo-os em três grupos. Para o primeiro grupo, perguntou quanto esperariam pagar de um par de brincos de boa qualidade, sem qualquer marca específica, feito em ouro 18 quilates, tendo dois diamantes de 60 miligramas incrustados: a média de valor foi de US$ 550,00. Para o segundo grupo, fez a mesma pergunta, com o mesmo par de brincos, mas declarou que o produto seria da famosa joalheria Tiffany & Co.: só por essa informação, a mé- dia de valor subiu para US$ 873,00 (quase 60% a mais do que a média sem marca). Por fim, ao terceiro grupo, trocou a marca Tiffany & Co. pelo Walmart e percebeu que

a média caiu para US$ 81,00, o que representa um declínio de 85% em comparação aos “brincos sem marca” e 91% em comparação aos “brincos da Tiffany & Co.”.

Isso demonstra como o poder de uma marca influencia nas percepções dos clien- tes. O conceito de boa qualidade é diferente quando proveniente da Tiffany & Co. em relação ao Walmart, o que se reflete na experiência de usar produtos de ambos. Aci- ma de tudo, o experimento de Calkins (2006) demonstra que a distinção não está nos aspectos físicos dos produtos, mas sim na dimensão conceitual das marcas.

Não quer dizer que os produtos que o Walmart comercializa sejam ruins ou de pés- sima qualidade. Ao contrário, o que muda entre as marcas citadas é a imagem que os consumidores formam delas. Como o Walmart realiza promoções diariamente e compete pelo custo mais baixo, em termos conceituais ele passa a ter uma imagem de marca de descontos que é, afinal, sua vantagem competitiva. Já a Tiffany & Co., ao contrário, projeta uma identidade de alto valor e dificilmente anuncia promoções, já que tais ações não combinam com o segmento de luxo ou os valores que ela propaga.

Algumas marcas prometem benefícios emocionais que giram em torno da autoapresentação e de um relacionamento pessoal com outras pessoas. A fábrica de motocicletas Harley-Davidson promete a seus clientes que serão vistos como fortes, rebeldes e independentes e farão parte de um clube de pessoas parecidas (por exemplo, o Harley Owners Group [HOG]). A Aber- crombie promete aceitação a seu mercado de adolescentes porque a empre- sa, historicamente, oferece estilos de roupas de moda ou novas tendências de vestuário (TYBOUT; STERNTHAL, 2006, p. 20).

O segundo capítulo deste estudo demonstrou a relevância do consumo nas socie- dades contemporâneas, sendo uma prática capaz de classificar indivíduos de acordo com o potencial de compras. Logo, se as pessoas acabam por ser subjugadas me- diante aquilo que consomem, as marcas passam a ser mais do que um endosso para os produtos, pois tornam-se o meio pelo qual elas podem se destacar e assegurar publicamente seu status ou seu pertencimento a uma classe social. Quem compra, por exemplo, um automóvel da Ferrari, além de obter prazer e levar para casa um produto de alta qualidade, com bancos confortáveis e motor potente (que são alguns benefícios funcionais), também adquire o status e o prestígio decorrentes desse bem (benefícios simbólicos). Esse exemplo, assim como outros que poderiam ser citados, reforça que as marcas extrapolam as dimensões dos seus produtos por se constituírem em veí- culos de adesão social (PEREZ, 2016, p. 121), com capacidade de constituir grupos:

As marcas comerciais tornaram-se hoje um fator de agregação preponderan- te: em torno delas, magneticamente, constituem-se grupos. No reconheci- mento e na localização que elas autorizam, a marca e sua imagem provocam adesão: produzem acordo; e esse acordo engendra, por sua vez, a constitui- ção de um grupo. A marca gera ao mesmo tempo aqueles que devem estar

acordo. A marca fabrica o grupo e aquilo que permite a este constituir-se como grupo: uma imagem dele mesmo (QUESSADA, 2003, p. 137).

Perez (2016, p. 129) escreve que ao valor de uso dos produtos, acrescenta-se sua capacidade de conferir status social, por meio das significações simbólicas da marca. Por isso, como prossegue Quessada (2003, p. 132), as pessoas se revestem de mar- cas: “a exibição delas continua a servir para a demarcação, a expressão da diferença, a distinção, a oposição ou a associação, a classificação ou a hierarquização."

Os significados tornam-se o motor da lógica das marcas, pois permitem a distinção entre pessoas pelas roupas que usam, os objetos que exibem, as músicas que ouvem etc.: "a marca propõe a seu público um compartilhar", enfatiza Perez (2016, p. 142).

Como exemplo, Atkin (2007, p. 41-53) escreve sobre os motociclistas, proprietários de uma Harley-Davidson: o que une os membros do grupo “Harley” é o desejo de ex- pressar alguém que não se sente à vontade com a rotina da sociedade e que no fundo acredita ser um rebelde; alguém que ama estradas e a companhia dos outros, mas se sente aprisionado em casa, no emprego ou na família. Se os motociclistas querem se sentir livres e individualistas, a Harley-Davidson os une em torno desse objetivo.

Vale notar que os respectivos motociclistas da Harley-Davidson não são pessoas que pensam diferente, mas sim indivíduos que compartilham valores semelhantes, como o mencionado desejo de liberdade e o sentimento de rebeldia em relação a normas tradicionais.1 É possível, assim, identificá-los como uma tribo ou comunidade

emocional, pois estão conectados a um líder (nesse caso, a marca) ou a uma ideia, tendo um interesse em comum e até uma forma particular de se comunicar. Como escreve Maffesoli (2014, p. 35), são nessas comunidades que se encontram a partilha sentimental de valores, de lugares ou ideias que estão absolutamente circunscritas e são encontradas sobre diversas modulações e em numerosas experiências sociais.

A comunidade Harley-Davidson tem todos esses aspectos. Sua adesão não se constitui somente pela aquisição de uma motocicleta (embora esse seja o ingresso de entrada), mas também pela aceitação das particularidades da comunidade. Nesse caso, seus membros possuem marcações distintivas próprias, como tatuagens, rou- pas de couro, bandanas, calças jeans rasgadas, além de uma linguagem com jargões específicos. Como diria Maffesoli (2014), trata-se de uma aura estética de valores que envolvem a comunidade emocional. Nordstrom e Ridderstrale complementam:

Os argumentos para se comprar uma Harley têm pouco a ver com razões ra- cionais – preço ou desempenho – e tudo a ver com afeição, intuição e desejo. O CEO Richard Teerlink concorda dizendo: “nosso sucesso é dirigido por mui- 1. Para Godin (2013, p. 38), a diferença entre um grupo e uma tribo (ou uma comunidade emocional) é que o primeiro equivale a uma comunidade sem um líder ou comunicação particular, enquanto a segun- da representa pessoas com um interesse em comum e até uma comunicação particular.

as pessoas realmente querem ter nesse mundo estressante (NORDSTROM; RIDDERSTRALE, 2001, p. 231).

Godin (2013, p. 17) reitera que as tribos ou comunidades emocionais relacionam- -se pela crença de várias pessoas em uma ideia, além do respeito a um líder (que, nesse caso, pode ser a marca Harley-Davidson). Logo, elas podem ser geradas em torno dos esportes, dos estilos musicais, das marcas, dos looks e muito mais. Deve-se concordar com Lipovetsky (2007, p. 215) quando ele destaca que, dos rappers aos surfistas ou skatistas, das comunidades presenciais a virtuais, das reuniões esporti- vas às associações, dificilmente seria possível fazer uma lista de todas as tribos ur- banas que se formam ou até se desfazer em função das modas e dos momentos. As pessoas não estão restritas a escolher apenas uma comunidade para se vincularem; ao contrário, ao longo da vida, cada indivíduo pode filiar-se a várias comunidades, de acordo com seus interesses ou valores particulares:

O que são o Greenpeace, a Anistia Internacional ou os hip-hoppers senão tri- bos biográficas globais compostas de pessoas de todas as partes do mundo? O mesmo dizemos dos MBAs, dos arquitetos, dos hackers, de engenheiros e músicos que extrapolam suas habilidades (e atitudes) de comunidades glo- bais. Essas tribos têm suas linguagens, códigos de vestir, sinais, símbolos, totens e rituais próprios (NORDSTROM; RIDDERSTRALE, 2001, p. 113).

Acima de tudo, estar em uma tribo ou comunidade, avalia Godin (2013, p. 11), “é uma grande parte de como vemos nós mesmos." Por essa razão, as marcas se constituem em mídia de comunicação, capaz de permitir aos indivíduos exprimirem ao restante do mundo quem eles são ou gostariam de ser (isto é, seu estilo de vida e seus valores). No fundo, a imagem da marca acaba por se tornar a própria imagem do indivíduo e vice-versa (NORDSTROM; RIDDERSTRALE, 2001, p. 227).

Posto dessa forma, usar marcas não é apenas uma questão de como o indivíduo é visto em relação ao outro, mas primeiro demonstra a relação que ele próprio tem de si. Como exemplo, Aaker (2015, p. 55) cita que alguém pode parecer despojado por com- prar roupas na Zara, criativo por escolher a Apple ou inteligente por estudar em uma universidade como Yale. A personalidade de uma mulher pode usar diferentes marcas se ela quiser ser vista como mãe, advogada, nadadora ou fã de música clássica.

Deve-se notar, aliás, que não se trata apenas de escolher usar uma única marca, mas sim um conjunto delas para plenamente demonstrar um estilo de vida ou o per- tencimento a um grupo. Como salienta McCracken (2003, p. 153), diferentes marcas, de acordo com o posicionamento que empregam no mercado, são capazes de mutua- mente se complementarem para atribuir valor aos indivíduos. Por exemplo:

...o sistema de relógios com o sistema de carros, e assim determinar, de um modo geral, quais relógios "se dão" com quais carros. Quanto o conjunto de produtos relógios é posto lado a lado com o de carros, torna-se aparente que o Rolex e o BMW são equivalentes estruturais. Ambos ocupam a mesma posição relativa em suas respectiva categoria de produtos. [...]. O sistema de correspondência que organiza a relação entre cultura e bens de consumo es- tabelece um esquema no qual o Rolex e o BMW figuram como equivalentes estruturais e, assim, "andam juntos" (MCCRACKEN, 2003, p. 153).

Sendo assim, uma marca é ainda mais eficiente para demonstrar um estilo de vida ou o pertencimento a um grupo quando é complementada por outras marcas que pos- suem semelhante significação. É interessante observar que esse conjunto de marcas que se complementam e identificam as pessoas permanece tão evidente no cotidiano que qualquer compra de algo que não tenha precedentes relacionais pode parecer divergente ou causar estranheza. Não surpreende Quessada (2003, p. 172) destacar que, caso alguém queira mudar seu estilo de vida, a primeira coisa que deve fazer é alterar todas as marcas que usa para assim definir uma nova significação.

Se nas sociedades contemporâneas o consumo, por vezes, pode ser usado como linguagem comunicacional (além de sanar necessidades, buscar prazer e felicidade, como enfatizado no segundo capítulo), esse terceiro capítulo demonstrou que as mar- cas, mais do que identificar um fabricante, caracterizam-se por aspectos simbólicos. As marcas, ou melhor, o conjunto delas, distingue as pessoas e seus valores; acima de tudo, as marcas comunicam a relação do indivíduo para com o outro e, no fundo, equivalem à autoimagem dele próprio. É justamente por isso que Lipovetsky (2007, p. 47) detecta que "cada vez mais, compramos uma marca e não um produto."

Nem todas as marcas, entretanto, conseguem gerar uma tribo ou comunidade emo- cional em torno de si, tampouco acabam se tornando um signo que identifica um estilo

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