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Classificação de necessidades por Murray e por Maslow

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Capítulo 2 – O consumo na contemporaneidade

2.1 Consumo para suprir necessidades

2.1.1 Classificação de necessidades por Murray e por Maslow

Mais especificamente, Murray (1938, p. 76-85), um reconhecido psicólogo que es- tudou o comportamento humano sugere que as necessidades podem ser divididas em doze classes primárias ou viscerogênicas e vinte e oito secundárias ou psicogênicas. As necessidades viscerogênicas correspondem àquelas por ar, água, comida, sexo, lactação, micção, defecação, evitar danos prejudiciais, evitar nocividades, evitar o calor, evitar o frio e também preservar a consciência. Enquanto isso, as necessidades psicogênicas são divididas pelo psicólogo em subgrupos que consistem em:

• Necessidades associadas a objetos inanimados: aquisição, preservação, or- dem, retenção e construção.

Necessidades que refletem ambição, poder, realização e prestígio: superiorida- de, realização, reconhecimento, exibição, inviolabilidade (atitude inviolada), evi- tação (evitar a vergonha, o fracasso, a humilhação e o ridículo), defesa (atitude defensiva) e oposição (atitude opositora).

Necessidades relacionadas ao poder humano: dominação, transferência, imita- ção, autonomia, contradição (agir diferente dos outros).

Necessidades sadomasoquistas: agressão e humilhação.

Necessidades relacionadas à afeição entre pessoas: afiliação, rejeição, criação (alimentar, ajudar ou proteger os desamparados), socorro (procurar ajuda, pro- teção ou simpatia), divertimento.

Necessidades relacionadas à integração social (necessidades de perguntar e dizer): conhecimento (atitude inquiridora) e exposição (atitude expositiva).1

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Schiffman e Kanuk (2012, p. 71) explicam que a classificação adotada por Murray (1938) talvez tenha sido a primeira abordagem sistemática envolvendo a compreen- são das necessidades humanas não biológicas.2 Para Murray (1938), as pessoas pos-

suem o mesmo conjunto básico de necessidades, sendo que cada indivíduo caracte- riza-se por suas escolhas particulares quanto às prioridades de supri-las. Essa teoria diferencia-se do estudo de Maslow (1943), apresentado a seguir, para quem as ne- cessidades não apenas se dividem em categorias, mas ordenam-se da mais urgente para a menos urgente (figura 2), motivando as pessoas a supri-las progressivamente. Ou seja, ao contrário de Murray (1938), Maslow (1943) sugere que certas neces- sidades são prioritárias sobre as outras e que as pessoas primeiro buscam saciar as necessidades mais urgentes (o primeiro nível da hierarquia) para depois avançarem ao segundo nível e assim continuarem sucessivamente até o último nível.

Em outras palavras, a proposta de Maslow (1943) supõe que os indivíduos sentem várias necessidades com graus diferentes de importância, justificando uma hierarqui- zação. Inicialmente, as pessoas procuram satisfazer as necessidades que lhes pare- cem mais urgentes; tão logo elas cessam, procuram então direcionar seus esforços à saciação das necessidades seguintes. Isso não significa, obviamente, que as pessoas nunca mais retornam aos níveis anteriores: como exemplo, a fome, que em um mo- mento é suprida, certamente volta a chamar a atenção em pouco tempo, assim como as roupas podem precisar, com alguma frequência, ser renovadas.

1. A tradução dos termos originalmente usados por Murray (1938, p. 80-85) quanto às vinte e oito ne- cessidades psicogênicas foram extraídos de Schiffman e Kanuk (2012, p. 71).

2. Solomon (2002, p. 99) lembra que ainda hoje a estrutura de necessidades de Murray (1938) serve como base para testes específicos de personalidade, como a Técnica de Percepção Temática (TPT) e a Relação de Preferências Pessoais, de Edward (RPPE).

Figura 2. Hierarquia de necessidades de Maslow. Autorrealização (realizações pessoais) Estima (reconhecimento, status) Sociais

(companheirismo, amor, amizade)

Segurança

(segurança, proteção)

Fisiológicas

(comida, água, descanso, sexo) Fonte: baseada em Maslow (1943).

Maslow (1943) considera que no nível mais baixo da hierarquia, isto é, na base, en- contram-se as necessidades fisiológicas, que incluem os anseios por comida, bebida, descanso (sono) e sexo. São essas as necessidades primárias ao sustento da vida, consideradas pelo psicólogo como prioritárias frente a quaisquer outras. Nessa pers- pectiva, Schiffman e Kanuk (2012, p. 72) acrescentam que a vida de muitas pessoas sem-teto, nas grandes cidades e em áreas devastadas, é focalizada quase inteiramen- te no atendimento de tais necessidades; vale lembrar, ainda, a obra Ilha das Flores, de Furtado (1988), que também retrata a existência de pessoas que enfrentam diariamen- te o desafio de suprir a fome ou qualquer dessas necessidades: para elas, avançar aos outros níveis da hierarquia, sobretudo aos mais altos, é um sonho distante.

Para todos os seres humanos, essas necessidades são fundamentais. Para muitos, como as pessoas que estão abaixo da linha da pobreza, essas ne- cessidades permanecem constantemente satisfeitas abaixo do nível adequa- do, de modo que esses indivíduos nunca chegam a ter necessidades de nível mais alto [ou seja, eles nunca alcançam os outros níveis da hierarquia, tais como o reconhecimento social, status ou realizações pessoais, que são os mais altos] (SHETH; MITTAL; NEWMAN, 2001, p. 328).

No segundo nível da hierarquia, estão as necessidades de segurança, que seme- lhante ao primeiro nível, são consideradas prioritárias por serem inerentes ao susten-

to da vida. Blackwell, Miniard e Engel (2009, p. 243) lembram que as preocupações com predadores naturais hoje são menores se comparadas a séculos anteriores; no entanto, os cuidados em usar roupas para resistir ao frio e ao calor, ter um abrigo e a manutenção da saúde física e mental ainda são quesitos importantes à sobrevivência. Para Maslow (1943), assim que as necessidades fisiológicas e de segurança estão satisfeitas (ou seja, os dois primeiros níveis), as pessoas voltam seus esforços para as necessidades psicogênicas ou secundárias. Consequentemente, no terceiro nível da hierarquia encontram-se as necessidades afetivas e sociais, que se relacionam à sensação de pertencimento, de amor, de gostar e ser gostado de alguém, de conviver com outras pessoas e de estabelecer relacionamentos. Nas palavras de Schiffman e Kanuk (2012, p. 72): “as pessoas procuram relacionamentos humanos cordiais e sa- tisfatórios com outras pessoas e são motivadas pelo amor de suas famílias."

O quarto nível da hierarquia corresponde às necessidades de estima, que denotam o reconhecimento da posição social do ser, autoaceitação, autoestima, sucesso, inde- pendência e satisfação pessoal. Ao alcançar esse nível, o indivíduo já saciado fisio- logicamente e protegido pode se esforçar para ser ainda mais querido, isto é, querer comprovado prestígio, status e o máximo reconhecimento de outras pessoas.

No topo da pirâmide, no quinto e último nível, encontram-se as necessidades de autorrealização, que consistem na busca por prazer, desenvolvimento pessoal, pro- fissional e de talentos individuais. É nesse nível que o indivíduo esforça-se em de- senvolver sua potencialidade e tenta conhecer, estudar e se organizar em busca do autoconhecimento, não mais ligado às necessidades de sobrevivência, mas ao cres- cimento de si, ou seja, de se tornar tudo o de que um homem é capaz. Na opinião de Sheth, Mittal e Newman (2001, p. 330), esse objetivo é o que motiva as pessoas a se engajarem em cursos de educação superior ou buscarem amplamente a perfeição em uma habilidade ou área, tal como nos esportes, nas artes ou nas ciências.

Um jovem pode desejar ser um astro olímpico e se esforçar resolutamente durante anos para se tornar o melhor em sua categoria de esporte. Um artista pode precisar expressar-se em uma tela; um cientista pesquisador pode se esforçar para descobrir um novo medicamento que acabe com o câncer. Mas- low observou que a necessidade de autorrealização não é necessariamente um impulso criativo, mas tem a propensão de assumir essa forma em pessoas com alguma capacidade de criatividade (SCHIFFMAN; KANUK, 2012, p. 73).

Schiffman e Kanuk (2012, p. 73) argumentam que a teoria de Maslow (1943) obteve ampla aceitação em muitas disciplinas sociais por apontar as motivações presumi- das ou inferidas de muitas pessoas. Por exemplo, quem está com fome tende a se alimentar e quem está se sentindo inseguro pode investir em mais segurança para sua residência. De acordo com Solomon (2002, p. 99), não demorou muito até essa

hierarquia de necessidades ser incorporada por profissionais de marketing às suas práticas de negócio, já que, indiretamente, sua contextualização tende a exprimir os tipos de benefícios em produtos que as pessoas procuram, de acordo com o estágio em que elas se encontram na pirâmide. Aliás, a hierarquia possibilitou ainda uma es- trutura muito útil até aos profissionais que desenvolvem anúncios publicitários para produtos, primeiro porque tais mensagens poderiam ser focalizadas em um nível de necessidade provavelmente compartilhado por um segmento do mercado e, segundo, porque a hierarquia facilitaria o posicionamento ou o reposicionamento de produtos:

Por exemplo, muitos anúncios de refrigerantes enfatizam o apelo social mos- trando um grupo de pessoas jovens se divertindo e o produto anunciado; outros ressaltam a capacidade de se refrescar (uma necessidade fisiológica); e outros ainda podem focalizar o baixo teor calórico (apelando indiretamente para a necessidade do ego) (SCHIFFMAN; KANUK, 2012, p. 74).

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