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ANEXO V: Goldman Environmental Prize Concedido à Ruth Buendía Ashaninka

CAPITULO 1 CONSTRUTIVISMO SOCIAL, REDES TRANSNACIONAIS DE DEFESA DE DIREITOS E COMUNIDADES EPISTÊMICAS

1.1. Características e Premissas Construtivistas

Um dos objetivos deste capítulo é analisar como a abordagem construtivista pode ajudar a demonstrar, por um lado, a importância do contexto interno peruano e por outro lado, a força política e ideacional de ONGs organizadas em uma rede transnacional para obtenção de uma importante reversão de tomada de decisão pelo governo peruano a respeito de suas relações externas com o país vizinho, o Brasil.

O Construtivismo é uma abordagem que pesquisa a natureza da vida social e da mudança social (FINNERMORE & SIKKINK, 2001). Segundo o professor Nicholas Onuf, a realidade social consiste naquilo que as pessoas constroem ou constituem como realidade social (ONUF, 1989, p. 35-65). Segundo ele, os termos Construir e Constituir são sinônimos no sentido em que as pessoas e a sociedade se constroem, ou se constituem, mutuamente.

Para as construtivistas Finnermore & Sikkink (2001), as perspectivas positivistas, essencialmente materialistas como a do Racionalismo contemporâneo em Relações

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Internacionais (formado basicamente por neo-realistas e institucionalistas neoliberais), veem nas imagens, crenças, valores e instituições um papel meramente instrumental, afetando apenas o custo da tomada de diferentes ações e apontando, desta forma, aquela que maximize os ganhos e minimize as perdas – ou seja, a alternativa mais racional.

Segundo os construtivistas, o conhecimento socializado, as ideias compartilhadas14 ou o conhecimento social sobre a relação causa-efeito não apenas regula o comportamento mas constitui a própria identidade dos atores. Além disso, os construtivistas advogam que, ao contrário dos individualistas, os agentes humanos estão fortemente influenciados pelo seu ambiente social e seu sistema de significados compartilhados coletivamente. Isto quer dizer que em matéria de análise de processo decisório, não é possível existir uma decisão no modelo do Ator Racional, uma vez que é impossível o tomador de decisão ser isento de influências pelo ambiente externo. Na verdade, segundo os construtivistas, o próprio Ator, tido como Racional, está na posição de tomada de decisão em virtude de ter sido constituído pelo sistema, pelo ambiente, pela estrutura. E o ambiente, a estrutura, também são constituídos por este ator detentor do poder de tomar decisões. Esta é a vertente dialógica ou discursiva do Construtivismo Social. Os efeitos constitutivos das normas sociais apontam a diferença entre construtivismo social e a escolha pelo modelo do Ator-racional.

Os construtivistas veem o mundo que vivemos como socialmente construído. “Socialmente” quer dizer que os construtivistas dão mais valor às relações sociais do que ao material (como poder econômico e militar) na política mundial. “Construído” significa que os construtivistas entendem o mundo como sendo formado/construído através de um processo de interação entre agentes (indivíduos, estados e atores não estatais) e as estruturas de seus ambientes internos. Este mundo em permanente construção é constituído pelo o que os construtivistas chamam de “agentes”. Ao chamar de “agentes” internacionais, os construtivistas que assim se referem àqueles que agem internacionalmente, contrapondo ao sentido de “atores”, que estariam limitados a desempenhar papéis predeterminados. Assim, no construtivismo existe um processo de constituição mútua e permanente entre os agentes e estruturas. Por exemplo, ao invés de assumir que um determinado ator de política mundial tenha certos interesses, os

14 Segundo Risse (2000), ideias compartilhadas são expectativas coletivas sobre qual comportamento ideal deve

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construtivistas exploram como estes interesses são construídos através de um processo de interação com um ambiente (contexto) mais amplo.

Segundo DOUGHERTY & J. PFALTZGRAFF (2003), o Construtivismo parte do reconhecimento de que a realidade social é uma construção resultante da interação de escolhas humanas em ambientes de maior ou menor liberdade ao longo das suas gerações. Rejeita-se a ideia de que os acontecimentos da história podem ser explicados como verdades necessárias, eventos exemplares do funcionamento de algum mecanismo fenomenal generalizante, de causas claras que independem de contextos espaço-temporais. As capacidades e a própria existência dos agentes estão necessariamente ligadas, de alguma forma, ao contexto social estrutural– dependentes, portanto, da socialidade humana. Assim, define-se a estrutura em termos gerativos, formada por um conjunto de relações que definem as interações das partes entre si e a posição desses agentes na estrutura. Desta maneira, a própria existência dessas estruturas depende do entendimento dos atores a respeito do que estão praticando e gerando. Essa é a dimensão discursiva: as estruturas só geram efeitos causais por meio da consciência prática dos agentes.

Ideias e Mudança Política

A área mais desenvolvida da literatura construtivista é no subcampo da economia política comparada para explicar a influência das ideias econômicas na elaboração das políticas econômicas.

A literatura sobre ideias faz as seguintes três perguntas principais (FINNERMORE & SIKKINK, 2001):

1. Como as novas ideias emergem e se tornam proeminentes?

2. Como as ideias se tornam institucionalizadas e ganham vida própria?

3. Como, por quê e quando as ideias importam em uma determinada circunstância?

Na resposta à primeira pergunta, a literatura construtivista explicitamente contesta a explicação comum de que as ideias são impostas por aqueles que detém poder político,

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econômico e militar. Parte da literatura afirma que a força e continuidade das novas ideias dependem do grau em que são incorporadas por instituições. Uma parte importante da literatura explora como estas ideias se tornam institucionalizadas e qual diferença isto faz.

Risse (2000) afirma que a busca do consenso justificado e discutido auxilia os atores (no caso aqui analisado, o governo peruano) a superar muitas ações orquestradas através da ação coletiva justamente como campanhas, manifestações entre outras. Com efeito, arguimos que se a decisão é tomada de maneira conjunta e compartilhada com o máximo de stakeholders (atores interessados e/ou afetados pela decisão) possíveis, será menos provável que algum ator que tenha tomado a decisão conjuntamente se oponha ao seu cumprimento. Nesta linha, com o crescimento de redes nacionais e transnacionais cada vez mais bem organizadas, argumentamos que a forma de condução de um processo decisório que envolva questões com potenciais conflitos socioambientais, com transparência e participação dos stakeholders torna-se cada vez mais essencial para o seu êxito.

1.2. Contribuições Construtivistas para a análise de processo decisório

Segundo Jeffrey T. Checkel (2008), há três formas de análise dentro da abordagem construtivista que podem colaborar com a análise de processo decisório: (i) análise da construção do interesse das burocracias (Estados), (ii) análise da argumentação no processo decisório e (iii) análise do impacto da sociedade e suas normas na prática da política dos Estados. Com base nestas formas de análise, como veremos no capítulo 5, será possível perceber que a mudança no discurso e comportamento do Estado Peruano durante a campanha contra o Acordo Energético Brasil-Peru, foi influenciado pelos seguintes fatores: (a) novos valores e ideais que influenciaram o conteúdo e definição do interesse nacional peruano e sua externalização; (b) força da argumentação elaborada pela campanha transnacional e (c) impacto da sociedade civil internacional (rede transnacional de defesa de direitos, mídia, academia, comunidade epistêmica contra o Acordo) na condução e alteração do percurso do Acordo após sua assinatura em 2010.

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