• Nenhum resultado encontrado

Propostas para exportação de eletricidade ao Brasil: Pontos de Discórdia e Conflito Regulatório

ANEXO V: Goldman Environmental Prize Concedido à Ruth Buendía Ashaninka

Mapa 7. Localização do polo hidroenergético para integração energética com Brasil Fonte: MINEM 2009.

3.1.1. Propostas para exportação de eletricidade ao Brasil: Pontos de Discórdia e Conflito Regulatório

A primeira proposta do MINEM ao MME referente à quantidade de eletricidade a ser exportada na integração energética Peru- Brasil foi enviada em julho de 2009 no anexo do Oficio no 226-2009-MEM/VME, propondo que a energia de cada central hidrelétrica em território peruano seria enviada ao mercado brasileiro de forma escalonada: 80% da produção de cada central durante os dez primeiros anos de vigência do Acordo, 60% durante o segundo decênio e 40% durante os últimos dez anos (Figura 6 abaixo). A diferença seria destinada ao mercado peruano, sendo que ao concluir o prazo de concessão de 30 anos, 100% da produção seria destinado ao mercado peruano. Adicionalmente, o Ofício mostra que as potências efetivas de todas as centrais hidrelétricas que fossem desenvolvidas no marco do Acordo Peru-Brasil seriam no mínimo de 2.000MW e no máximo de 6.000MW. A proposta peruana de fixação e escalonamento de exportação ao Brasil está demonstrada abaixo:

138

Figura 6 (Acima). Proposta peruana de percentuais de eletricidade destinada ao Brasil ao longo das três décadas (claro Brasil e escuro Peru)

Porém, estes percentuais decrescentes foram questionados pelo Brasil porque o modelo de comercialização de energia elétrica para o mercado regulado brasileiro (contratação de energia nova pelas distribuidoras) requer uma quantidade constante de energia firme pelo prazo de 30 anos (AVANZINI,2010, p.49). Este foi sem dúvida uma das maiores batalhas diplomáticas a vencer para chegar a assinatura do convenio. Sem obter um consenso, a versão assinada não menciona quantidade mínima nem máxima de eletricidade a exportar ao Brasil ao longo do tempo, determinando porém, uma sequencia de prioridades no abastecimento.

A cláusula 3, “b” do acordo determina que a partir da geração, o fornecimento de eletricidade será oferecido segundo a seguinte ordem de prioridade:

1) Oferece ao mercado regulado peruano. Caso houver sobras de eletricidade, passa para a 2ª prioridade:

2) Oferece ao mercado livre peruano. Caso ainda houver sobras de eletricidade, passará a ser ofertada a 3ª prioridade:

3) Oferece à exportação ao Brasil pelo prazo de 30 anos.

A forma de determinação da quantidade de potência e energia elétrica associada de cada uma das Centrais de Geração que será comprometida com cada um destes três mercados está estabelecida no item “c” da cláusula 3.

139

140

141

Aqui há de se fazer uma importante observação em termos de diferença de regulação do setor elétrico entre os dois países. Se por um lado, para fins de segurança energética de longo prazo, o Brasil desenvolveu uma Lei de Concessões Elétricas que exige a garantia de um fornecimento pelo gerador de eletricidade por um prazo de 30 anos para um determinado concessionário; por outro lado, a Lei de Concessões Elétricas e a Constituição Política peruanas deixam o mercado livre para determinar o destinatário daquela eletricidade e o prazo de concessão.

Desta maneira, o Estado peruano não tem a competência legal para determinar que uma certa quantidade de eletricidade gerada nos projetos no âmbito do Acordo seja destinada ao mercado brasileiro de eletricidade. Esta diferença exige que, para a implementação do acordo, seja necessária uma reforma legal no Estado Peruano e/ou no Estado Brasileiro, condição dificilmente de ser cumprida nas atuais circunstâncias políticas dos países em questão conforme se verificará na seção 4.5. referente aos Fatores Conjunturais mais adiante.

142

De acordo com cláusulas acima100, ficou acordado que a quantidade de excesso de

eletricidade deve ser pré-estabelecida a cada geração de energia. Este pré-estabelecimento de quantidade de eletricidade para exportação é um dos principais obstáculos para ratificação no Congresso do Peru. Os congressistas da Comission de Relaciones Exteriores, liderada por Martin Belaunde, argumentam que não é possível pela legislação peruana obrigar uma empresa, nas regras do livre mercado, a vender seu produto para um determinado comprador, muito menos pelo prazo de 30 anos. Argumentam que este pré-estabelecimento fere a constituição peruana e seus preceitos fundamentais sobre a ordem econômica do Estado. Isto representa um potencial problema para o Peru pois limita o uso de seu potencial se houver demanda. Se a demanda peruana crescer durante o período em que a quantidade de excesso de eletricidade para exportação já havia sido determinada, o Estado peruano pode ficar “preso” a 30 anos de comprometimento de exportações de eletricidade ao Brasil de uma quantidade pré-fixada. Se isto ocorrer, não há cláusula no acordo prevendo uma solução para o problema peruano. Há apenas uma cláusula de emergência no caso de crise hídrica, as partes vão combinar como proceder. A análise aprofundada desta questão é encontrada no capítulo 5 na discussão do “Dictamen” (parecer, vide item 5.2) sobre o Acordo Energético emitido pelo Congresso peruano, que, por esta e outras razões, determinou o arquivamento do Acordo em maio de 2014.

Em 2010, antes do Acordo Peru-Brasil ter sido firmado, verificaram-se três documentos neste processo de negociação: a Nota nº 5-2-M/055 de 17 de fevereiro, o Proceso de Negociación Perú-Brasil nº 144 de 12 de março e a Revisión de 03 de maio. Por fim, o Acuerdo para El Suministro de Electricidad al Perú y Exportación de Excedentes al Brasil foi assinado em 16 de junho de 2010 pelos ministros de energia e minas de ambos101, e desde então encontra-se em

discussão, no Peru, no Congresso da República, como Proyecto de Ley (PL) nº 4750/2010-PE para sua ratificação. No Brasil, a Casa Civil não chegou a enviar ao Congresso Nacional para apreciação, sendo devolvido ao Itamaraty onde se encontra arquivado.

Dentre os pontos de questionamento de tal Acordo no Peru a serem analisados no capítulo 4 (seção 4.3.2.), encontra-se a necessidade de possíveis mudanças no marco regulatório peruano para se adequar ao brasileiro, no caso da venda para o mercado regulado brasileiro dos

100 Principalmente o item “v” da alinha “c” da cláusula 3.

101 Ao contrario de como saiu nas fotos jornais, o acordo não foi assinado pelos presidentes, mas sim por seus

143

excedentes de energia elétrica gerada. Como veremos neste capítulo, setores da sociedade peruana questionaram a real necessidade destes projetos para o mercado elétrico peruano, uma vez que no Peru ainda não há esta tamanha demanda de eletricidade. Até o momento da assinatura do Acordo, não havia sido estabelecido uma projeção adequada da demanda de energia elétrica e há outras possibilidades de geração com menores impactos ao meio ambiente e às sociedades locais. Ao final de 2014, a situação das centrais hidrelétricas apresentadas como possíveis exportadoras de excedente de energia para o Brasil pode ser vista na tabela 10 abaixo.

Conforme se desprende da análise da coluna status da tabela, todos os projetos estão paralisados, o que evidencia a insegurança jurídica do Acordo e o grande risco de investimento que as empresas brasileiras e o Estado Brasileiro incorreram desde o inicio das tratativas. Os capítulos 4 e 5 analisarão os argumentos e resultados da campanha transnacional contra o Acordo Energético.

As linhas de transmissão correspondentes que seriam integradas ao sistema interligado nacional (SIN) brasileiro são de extensão de aproximadamente 4 mil km (vide Mapa 8 abaixo).

144

Fonte: Adaptação de Eletrobrás, 2012.

Mapa 8. Localização das hidrelétricas escolhidas para exportação de energia ao Brasil e

Outline

Documentos relacionados