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Reformas na economia e a transformação de atores na gestão da energia elétrica: Do Estado para o Setor privado e a Parceria Pública-Privada

ANEXO V: Goldman Environmental Prize Concedido à Ruth Buendía Ashaninka

Mapa 2 Linhas de Transmissão de Energia Elétrica na América do Sul

2.1.4. Reformas na economia e a transformação de atores na gestão da energia elétrica: Do Estado para o Setor privado e a Parceria Pública-Privada

Os modelos de gestão da energia elétrica na América do Sul variaram no tempo e possuem origens e explicações complexas, transformando-se conforme a preponderância da gestão pública ou privada e ainda público-privada, cada tipo de gestão com suas vantagens e desvantagens. Enquanto no Brasil, houve uma forte gestão empresarial que posteriormente passou para as mãos do Estado e depois passou para uma gestão hibrida público-privada; no Peru, a gestão continua fortemente feita pelos atores privados com pouca intervenção do Estado.

No contexto pós Segunda Guerra Mundial, a lógica econômica do país era pautada na necessidade de industrialização como lema para “atingir o desenvolvimento”, época em que a demanda de energia elétrica deu um salto de maneira que foi necessário desenvolver um planejamento de fornecimento de eletricidade. Neste sentido, o Plano Nacional de Eletrificação brasileiro foi desenvolvido por Getúlio Vargas, que foi a base do atual sistema integrado nacional. Até a crise econômica internacional de 198245, o Estado que financiava as obras para alimentar o sistema. Neste contexto, Getúlio criou a Eletrobrás com o mandato de elaborar o planejamento energético do país. A Eletrobrás montou o sistema interligado em escala nacional baseado em usinas hidrelétricas. Nesta época, a Eletrobrás era uma empresa verticalizada, responsável ao mesmo tempo pela geração, a distribuição e a transmissão.

Entretanto, segundo CASTRO, N.J. LEITE, A. L. S. e ROSENTAL, R. (2012), a crise econômica internacional iniciada em 1982 desarticulou o planejamento do Sistema Elétrico Brasileiro (SEB), pois provocou a queda de demanda de eletricidade e as usinas planejadas previstas ficaram paralisadas.

A crise internacional também colaborou para diminuir a capacidade de financiamento público do Estado, levando o SEB repensar o modelo do setor elétrico para ser mais eficiente e ter maior diversificação da matriz energética. Desta forma, na década de 1990 acontece uma grande medida de privatizações de empresas públicas do setor elétrico através do Programa

45 Vale lembrar que a crise de 1982 foi a da dívida externa que levou o Brasil à iminência de um racionamento de

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Nacional de Privatização (Lei 8.031/1990). Este programa foi voltado para o equilíbrio fiscal do Estado com o objetivo de atrair investidores. E em 1995, houve a promulgação da Lei das Concessões (Lei 8.987/95) para a construção de um novo ambiente de marco regulatório. Em seguida a Lei 9.074/95 antecipou as bases do modelo competitivo, introduzindo princípios de renovação e leilões de empresas geradoras. Em 1996 foi criada a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), autarquia federal com a missão de “proporcionar condições favoráveis para que o desenvolvimento do mercado de energia elétrica ocorra com equilíbrio entre os agentes e em beneficio da sociedade”.

A respeito da estrutura acionária no setor elétrico antes das privatizações, FERREIRA (2000, p.181) aponta que:

“O setor de serviços públicos era todo de propriedade pública, mas o governo federal era proprietário dos ativos da geração de transmissão, enquanto só governos estaduais eram proprietários das empresas de distribuição bem como algumas empresas de serviços públicos com integração vertical. O Presidente FHC decidiu pela privatização do setor elétrico no inicio do seu primeiro mandato em 1995. Críticos acreditavam que não seria bem sucedido pois o núcleo central do sistema elétrico não poderia ser desmembrado ou descentralizado. Houve um processo de desverticalização e desmembramento do setor elétrico para geração e distribuição de energia elétrica. Em 3 anos após o inicio da privatização dos ativos do setor, os governos federal e estaduais receberam US 20,8 bilhões da privatização dos serviços públicos. Foi criado um novo sistema regulatório e um mercado atacadista de energia elétrica gradualmente em processo de introdução.” (Grifos nossos).

CASTRO, N.J. LEITE, A. L. S. e ROSENTAL, R. (2012) ressaltam que esta dinâmica ocorreu em toda América Latina e que em alguns países como na Argentina, a escala de privatização das empresas públicas foi tão alta a ponto de o Estado perder sua capacidade de elaboração da política energética e de realizar o planejamento energético a longo prazo. No Brasil, apesar da privatização da distribuição demorar oito anos, houve seguidas crises econômicas que tornaram impossível a privatização de todas as atividades da Eletrobrás, o que, para muitos estudiosos, foi melhor para o futuro do país.

Em 2003-2004, um ano após o apagão, é introduzido no país um novo modelo de gestão do setor elétrico que permite investimentos estatais em parceria com empresas privadas (“modelo de parceria público-privada”). Desta maneira, as obras não são inteiramente estatais como ocorreu na 1ª fase com Itaipu, por exemplo, nem feitas totalmente por empresas privadas como

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ocorreu com a privatização após a crise internacional. Nesse novo modelo, suspendeu-se o processo de privatização das empresas estatais de energia elétrica e inicia-se a formação de consórcios para construção de usinas hidrelétricas onde o capital é público-privado e os sócios possuem o objetivo em comum de construir uma usina, obra decidida a partir de um planejamento de demanda energética feito pela Empresa de Planejamento Energético, a EPE.

A criação da EPE, em 2004, resgatou a importância e a elaboração dos planejamentos de demanda energética a longo prazo como função essencial do Estado para garantir equilíbrio dinâmico entre crescimento da demanda e da oferta. Com a criação da EPE, foi retirada a função de planejamento da Eletrobrás que se tornou menos verticalizada. Assim, a EPE desenvolve estudos de planejamento de 30 anos (Plano Nacional de Energia - PNE) e 10 anos (Plano Decenal de Energia - PDE) sendo que os PDEs são realizados e atualizados a cada ano.

Neste contexto de evolução regulatória, as usinas como Belo Monte, Santo Antônio e Jirau estão sendo construídas através deste modelo de parceria público-privada. Ocorre porem que este modelo, apesar de envolver o setor privado, o número de empresas privadas elegíveis e envolvidas pelo governo é extremamente limitado e frequentemente não variam. Portanto, percebe-se que há neste modelo pouca competição efetiva e alta concentração de capital em mãos de poucas empresas.

Em relação ao Acordo Energético Peru-Brasil, verificou-se que a partir dos anos 70 havia apenas estudos de levantamento do potencial energético em território peruano, porém somente no ano 2010 foi finalmente assinado tal Acordo. Desta forma, o contexto da celebração do Acordo se deu em um ambiente concorrencial (apesar de ser pouca competição efetiva), a partir do planejamento de demanda energética feito pela EPE e com o modus operandi “parcerias público-privadas” como veremos em maior profundidade no Capítulo 3 sobre o Acordo.

Por outro lado, no Peru até hoje vemos a dificuldade do Estado construir um planejamento energético de longo prazo. Apenas no final de 2014, foi publicado o primeiro “Plan Energético Nacional - 2014 -2024”, prevendo o crescimento da demanda de acordo com dois cenários de crescimento do PIB (4,5% e 6,5%) do país e segregando como sanar a demanda de acordo com as fontes de geração. Além disso, a Constituição Política Peruana e a atual Lei de Concessões

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Elétricas preconizam o modelo de garantia ao livre mercado, livre comercio e indústria que não facultam ao Estado dirigir o destino da produção de energia.

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