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Caracteres da conduta lesiva ensejadora da responsabilidade do

No documento MESTRADO EM DIREITO SÃO PAULO 2009 (páginas 140-143)

4. BREVE ANÁLISE SOBRE A RESPONSABILIDADE DO ESTADO PELA

4.2 A responsabilidade objetiva da Administração Pública

4.2.1 Fundamentos e pressupostos da responsabilidade civil objetiva do Estado

4.2.1.3 Caracteres da conduta lesiva ensejadora da responsabilidade do

A doutrina é pacífica no sentido de que a responsabilidade civil do Estado consiste no dever de indenizar prejuízos sofridos por terceiros em razão de ação ou omissão imputável ao Estado. Questiona-se, todavia, se a mera objetividade de uma conduta estatal lesiva a terceiro é suficiente para ensejar esta responsabilidade ou se faz-se necessário que o comportamento danoso seja viciado por culpa ou dolo.

Objetivando responder a esse questionamento, a doutrina majoritária tem feito uma distinção entre os atos comissivos, em que o comportamento do Estado provoca o dano; e, ainda, os omissivos, que Celso Antônio Bandeira de Mello322 subdivide em duas possibilidades. A primeira delas é aquela em que por omissão do Estado, um evento alheio causa um dano que o Poder Público tinha o dever de evitar; trata-se da hipótese de falta de serviço, nas modalidades em que o serviço não funcionou ou funcionou tardiamente. Na segunda hipótese, também não é uma atuação do Estado que provoca o dano; no entanto, é por atividade dele que se cria a situação propiciatória do dano, porque expôs alguém a risco.

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4.2.1.3.1. Atos comissivos do Estado

Na hipótese de ato comissivo, inexistem dúvidas de que aplica-se a responsabilidade objetiva do Estado, seja o dano decorrente de uma conduta legítima ou não. Afinal, conforme salienta Celso Antonio Bandeira de Mello, ―tanto numa como

noutra hipótese o administrado não tem como se evadir à ação estatal. Fica à sua mercê, sujeito a um poder que investe sobre uma situação juridicamente protegida e a agrava‖.323

Também Maria Sylvia Zanella Di Pietro entende que, no direito administrativo, a responsabilidade civil do Estado pode decorrer de atos ou comportamentos que, embora lícitos, causem a pessoas determinadas ônus maior do que o imposto aos demais membros da coletividade.324

Neste tocante, impende notar a posição divergente de Marçal Justen Filho, para quem, não se pode admitir que ―um ato jurídico conforme ao direito, praticado pelo

Estado de modo regular e perfeito, acarrete sua responsabilização civil – exceto quando essa for a opção explicita de uma lei‖.325

Em que pese a consideração do ilustre doutrinador, ousamos discordar, compartilhando do posicionamento esboçado pelos autores que o antecederam. A responsabilidade objetiva por danos advindos de atos lícitos é extraída do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, que determina a responsabilidade do Estado sempre que sua ação causar danos a terceiros, sem fazer qualquer ressalva quanto aos prejuízos advindos de ato legítimo do Estado.

Um caso típico de responsabilidade do Estado por ato lícito diz respeito às obras públicas que impliquem desvalorização imobiliária. Um caso notório diz respeito à construção, na cidade de São Paulo, de viaduto ligando os bairros da zona sul e centro à zona leste. A mencionada obra, apelidada de ―minhocão‖, foi construída por cima de uma avenida, na qual havia vários prédios residenciais, que foram nitidamente afetados com a obra. Diversos proprietários de imóveis ali instalados sofreram prejuízo com a abrupta desvalorização, em razão da poluição sonora e visual provocada pela obra. Com efeito, o dano provocado pela ação do Estado, ainda que legítima, é ensejadora da sua responsabilidade civil.

323 Curso de direito administrativo, p. 995. 324 Direito administrativo, p. 561.

142 Assim, a mera conduta lesiva a bem jurídico garantido de terceiro é suficiente para, com base no princípio da igualdade, inerente ao Estado de Direito, ensejar a responsabilidade civil do Estado.

4.2.1.3.2. Atos omissivos do Estado

Em se tratando de uma ação omissiva do Estado, parte da doutrina distingue a responsabilidade de acordo com a natureza da omissão do Estado, qual seja, de dano que decorreu de uma omissão do Estado (falha no serviço) e de dano que, embora não seja efetuado pelo Estado, foi produzido em razão de situação por ele propiciada. Examinaremos brevemente tais hipóteses sem, contudo, adentrar em seus pormenores, por não ser objeto do presente trabalho o estudo da responsabilidade do Estado por ato omissivo, mas tão somente por ato comissivo.

No primeiro caso mencionado, em que há a falha do serviço, deveria, no entender de parte da doutrina, ser aplicada a teoria da responsabilidade subjetiva. Afinal, se o Estado não agiu, sua responsabilização só se justifica caso estivesse obrigado a impedir o dano causado, ou seja, se sua conduta omissiva constituir um comportamento ilícito (proveniente de negligência, imprudência ou imperícia ou com nítido propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação).

Celso Antonio Bandeira de Mello bem sintetiza essa hipótese:

Se o Estado, devendo agir, por imposição legal, não agiu ou o fez deficientemente, comportando-se abaixo dos padrões legais que normalmente deveriam caracterizá-lo, responde por esta incúria, negligência ou deficiência, que traduzem um ilícito ensejador do dano não evitado quando, de direito, deveria sê-lo. Também não o socorre eventual incúria em ajustar-se aos padrões devidos.

Reversamente, descabe responsabilizá-lo se, inobstante autuação compatível com as possibilidades de um serviço normalmente organizado e eficiente, não lhe foi possível impedir o evento danoso gerado por força (humana ou material) alheia.326

Na hipótese ora em exame a responsabilidade seria, então, subjetiva, de modo que o Estado só seria responsável pelos danos que não causou se tinha a obrigação de impedi-lo e não o fez. Um bom exemplo que demonstra isso é o caso das enchentes que vem ocorrendo, recentemente, no Sul do País. A princípio, não pode o Estado ser

143 responsabilizado pelos danos provocados pelos fenômenos naturais. Diversamente, se os danos provocados por uma enchente decorreram de entupimento e sujeira dos bueiros de escoamento das águas, que impediram o escoamento da água, aí sim estará caracterizada a culpa do Estado a justificar sua responsabilização.

Frise-se, por oportuno, que nesses casos de responsabilidade subjetiva, admite-se a inversão do ônus da prova, sem o que o administrado ficaria em posição extremamente desvantajosa, ante a dificuldade ou mesmo impossibilidade de demonstrar que o serviço não se desempenhou como deveria. Assim, compete ao Estado provar a inexistência de culpa a ensejar sua responsabilidade.

Já em se tratando de casos em que o Estado propicia a situação da qual o dano depende, ainda que este não tenha sido originado por ato de agente estatal, tais casos, na lógica daqueles que diferenciam a omissão, assimilar-se-iam aos de danos produzidos pela própria ação do Estado e, por isso, ensejam a aplicação do princípio da responsabilização objetiva. Afinal, o risco a que terceiros são expostos pelo Estado não poderia deixar de ser assumido por quem os criou. Alguns exemplos dessas condutas omissivas que ensejariam a responsabilidade do Estado são do presidiário que é assassinado dentro do presídio, a fuga de internos de manicômios que realizem violência sobre bens ou pessoas sediadas nas imediações; a explosão de um paiol onde estejam armazenadas munições de guerra, dentre outros.

Em que pese as considerações da doutrina majoritária, entendemos que a responsabilidade é sempre objetiva, de modo que a questão restringe-se ao nexo causal existente entre a ação ou a omissão do Poder Público, por meio de seus agentes, e os danos sofridos pelo particular, cabendo ao Estado alegar e demonstrar a existência de alguma das causas excludentes de responsabilidade do Estado.

No documento MESTRADO EM DIREITO SÃO PAULO 2009 (páginas 140-143)