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4. RESULTADOS

4.3 ANÁLISE DOS DADOS

4.3.10 Categoria: Professor – Um Agente

Buscando verificar quais são as percepções dos professores acerca dessa dinâmica de inclusão/exclusão dos alunos prounistas no ambiente acadêmico, e bem como analisar o papel dos professores junto aos alunos prounistas, nessa categoria o papel do professor como agente de inclusão ou de exclusão é apresentado.

Ferdman et al. (2009) apontam que sentir-se valorizado como membro do grupo e também como ser humano, ser reconhecido e apreciado, propicia ao indivíduo a experiência de inclusão. PROF 03 percebe essa carência em alguns de seus alunos prounistas e se mostra disponível a acolhê-los, conforme relata:

[...] o que eu percebo é uma questão de afetos mesmo, que eu sinto que às vezes eu preciso sentar... eles querem falar comigo. Você vê que no fundo a carência de atenção e de afeto é tão grande que quando ele percebe que o professor tem essa abertura, ele quer conversar com você. No fundo ele quer saber até que ponto você olha para ele e o vê como ser humano (PROF 03).

O desdobramento de comportamentos inclusivos é proporcionar ao aluno uma experiência de inclusão. Dois alunos prounistas entrevistados (P4M-IN e P3H-IN) citam que alguns professores, incluindo PROF 02, PROF 03 e PROF 04 são pessoas que lhes servem de referência, que os instigam, lhes são acessíveis e consideram que o comportamento destes em relação a eles proporciona uma experiência positiva dentro da IES.

É um cara que te instiga a pensar. Eu tive contato com esses dois professores que são acima da média para mim [PROF 02 e PROF 03] (P3H-IN).

Gosto muito dos professores, eu tenho uma relação muito de amizade com os professores, confesso. Nunca teve nenhum distrato pessoal. Com os professores formo um vínculo de amizade, mesmo. Tanto é que, tem professores que eu gosto tanto, que de quinta-feira eu assisto duas vezes a mesma aula [de PROF 04] (P4M-IN).

Ao ser questionada sobre sua experiência mais positiva até o momento dentro da IES,

P4M-IN aponta que a interação com os professores PROF 02 e PROF 04, a sensibilidade

destes às questões sociais, a abertura para trocas com eles são comportamentos que trazem como consequência o bem-estar, que favorecem a uma experiência de inclusão, conforme relato:

Ele [PROF 04] desperta a luz de você tentar ter aquela experiência de uma sociedade mais igualitária, mais justa, e de olhar diferente para as minorias, e não olhar como empecilho, mas como pessoas que devem ter alguns direitos, para tentar competir com as pessoas que estão acima. Então, ele é uma luz, uma luz completamente. E esse semestre também, PROF 02, ela também é outra luz, outra luz. Tive experiências sensacionais com eles. Troca de conhecimentos (P4M-IN).

PROF 03 afirma que nunca precisou intervir junto a algum aluno, mas seu discurso

revela que o faz uma intervenção educativa e preventiva, uma vez que “[...] trabalha questões sociais em sala”, o que é fundamental para a desconstrução de prejulgamentos e crenças estereotipadas acerca do Programa e dos alunos beneficiados. Portanto, a saída possível, e para a qual o professor pode ser importante agente, é trabalhar essas questões em sala de aula, prover o aluno de informações fundamentadas, a partir das quais possam se posicionar. PROF

02 tem convicção de que alunos que são contra políticas públicas e contra o ProUni o fazem

por desinformação, e afirma ter “[...] certeza que se... cota, ProUni, tudo isso, se tivesse um professor que viesse aqui na frente e falasse: é isso, isso, isso... estudem, analisem a Constituição, vejam os argumentos a favor e os contra” esses posicionamentos seriam revistos. Portanto, fornecer informações e discutir essas questões mostra-se o caminho mais eficaz para fazer com “[...] que as pessoas entendam do que se trata, e tem que ser em sala de aula. O professor passar trabalhos sobre o tema, porque aí o cara vai mergulhar”. Contudo, para que esse tipo de conduta seja adotada, é necessário que haja uma crença institucional e pessoal de cada professor, de que o caminho da inclusão e do respeito ao ser humano em suas singularidades e diferenças é também o caminho para uma sociedade mais justa e melhor, e que isso necessariamente passa pela educação e informação.

A percepção de imparcialidade de tratamento dos professores para com os alunos é indicativo de que estes não se sentiram discriminados por eles, que relatam não perceber qualquer favoritismo ou preconceito. P1H-IM assinala que “[...] os professores tratam bem quem se interessa. Não importa sua classe social, não importa sua cor...”, mas em seguida aponta a existência de uma exceção, que é elitista. Sua opinião é corroborada por outros

alunos que apontam o comportamento inadequado de professores agentes de discriminação em função da condição social ou base cultural.

[...] um professor só, que era extremamente elitista. Ele fazia a chamada e perguntava pelo sobrenome das pessoas, se conhecia tal pessoa... se tal pessoa era amigo, e... a gente viu que, no final do semestre essas pessoas ganhavam pontinhos (P1H-IM).

Alguns professores que me perseguiam, mas mais relacionado a condição social, o de XXX [dá o nome da matéria] por exemplo, o de YYY [dá o nome da matéria], que era terrível, acho que só. Esses dois são terríveis. É. Acho que são só esses dois mesmos (P7H-FN).

Fazer chacota com a ignorância do outro... eu estou buscando conhecimento. Você é o professor, você está aqui para isso e fazer chacota é o nível mais baixo que um professor pode chegar, e eu já encontrei isso (P11M-FM).

Ressaltando seu papel de agente de inclusão, PROF 03 diz que está “[...] sempre acolhendo, mas não é todo o corpo docente, não”. Eventualmente o próprio professor não está aberto para as questões sociais, não acolhe o aluno prounista e ainda utiliza o espaço de sala de aula para disseminar suas opiniões preconceituosas e discriminatórias. Em uma sala na qual 10% dos alunos são bolsistas do ProUni, um professor falar abertamente ser contrário ao Programa faz no mínimo com que esse aluno, indiretamente, o perceba como desfavorável a ele. O professor PROF 01 argumenta que “[...] o professor, ele é modelo”, mas que os comentários tecidos por eles em sala de aula instigam alunos ao preconceito. Mais do que expressar opinião acerca do Programa, as crenças pessoais são as bases para as ações, e, em decorrência disso, ao invés do professor atuar como agente de inclusão torna-se agente de preconceito e exclusão.

Eu tive já nesses 10 semestres, comportamentos inadequados de alguns professores, em relação a alguns alunos. Às vezes ele era prounista, às vezes eles não eram. Os professores deveriam exercer, e isso é papel do professor, criar mecanismos de interação. Não pode deixar (NP4M-FN).

Eu acho que eles estão sendo muito estimulados esse jogo [disputa entre grupos maioritários e minoritários] e eu fico sempre preocupada com isso. E é problemático porque os professores fazem muito (PROF 02).

Ao invés de emitir comportamentos que criam, mantêm ou reforçam vantagem para alguns grupos e seus membros em relação a outros grupos e seus membros (DOVIDIO et al. , 2010), os professores deveriam agir no sentido de desconstruir crenças e quebrar interações sociais disfuncionais, intervir a fim de combater manifestações de preconceito e discriminação que promovem a exclusão. Caso na IES houvesse uma política de gestão da

diversidade, necessariamente esses comportamentos inclusivos seriam adotados com base em normas institucionais, em condutas preconizadas que expressassem valores e princípios institucionais (DAVIDSON; FERDMAN, 2001); não o sendo, baseiam-se nos valores pessoais desses professores. Portanto, não havendo apoio institucional e não sendo alguns deles sensíveis a essas questões, não só não se mobilizam a intervir, como erram eles mesmos em suas condutas, conforme sugerido por NP4M-FN.

Acredito que um professor com um pouco mais de percepção, ele perceberia e poderia quebrar algumas coisas que se sedimentaram na nossa sala [fragmentação da sala em feudos bem demarcados]. Aqueles professores que pegam muito pesado com alguns alunos, um pouquinho mais é... sabe... [humildes]. Embora sei e conheça professores que são um pouco exagerados, de alguma forma no trato, não posso dizer se eles sabiam que o aluno era do ProUni (NP4M-FN).

Questionados acerca de intervenções pessoais e papéis que eventualmente desempenham junto aos alunos prounistas, os professores entrevistados PROF 02, PROF 03 e PROF 04 afirmam nunca terem sido necessárias intervenções pessoais, pois nunca presenciaram qualquer manifestação de preconceito ou discriminação. No entanto, ao adotarem uma postura disponível e manifestarem frente à sala um posicionamento pessoal sensível às questões sociais já se tornam agentes de inclusão, pois servem de referência positiva para eles e utilizam o espaço acadêmico para ampliar o debate sobre as questões sociais. PROF 01 afirma já ter feito intervenções pontuais para resolver problemas quando a omissão de aluno prounista nas listas de e-mail da sala foi utilizada com estratégia de exclusão, para privá-los do acesso a informação, resolvendo a questão ao cuidar pessoalmente do envio das mensagens. A professora assumiu a conduta de “[...] mandar o e-mail pra elas (alunas prounistas excluídas da lista) com cópia para o grupo”. Também afirma ter feito intervenções de caráter educativo/informativo, discutindo o tema com seus alunos e indo à lousa estabelecer conceitos, comprometendo representante de sala, em representar a sala, o que inclui os alunos prounistas, e não seus amigos pessoais, conforme relatado:

[Aluno diz] “Professora você sabe que a gente é contra [o ENEM]... Eu olhei e eu falei: Não, vocês são elitistas. Elitista é aquele que acha que só quem teve as mesmas condições têm os mesmos direitos. Não tem problemas, muita gente nesse país é, mas saiba que você é... [...] E aí ocorreu um processo legal... Foi assim na primeira semana, na segunda semana eles já estavam fazendo a campanha a favor (PROF 01).

Eu tenho muito o hábito de chamar o representante: Você se decidiu ter um cargo representativo, então você vai fazer direito. É... mais isso sou eu. Eu

falo mesmo, e eu falo em voz alta e falo pra todo mundo ouvir. Não é comum (PROF 01).

Intervenção simples de um professor, com resultados positivos e que produziu mudança de comportamento do grupo, o exemplo relatado é indicativo de que discutir essas questões e conscientizar todos os agentes envolvidos na vida acadêmica são caminhos necessários, para que os benefícios da diversidade sejam vistos na IES pesquisada. De forma otimista, PROF 01 afirma que está percebendo que “[...] alguns professores agora já estão começando, não só a perceber [as manifestações de preconceitos e discriminações] como a responsabilizar [seus agentes]”. Após oito anos da implantação do Programa na IES, alguns professores “começam a perceber” as situações excludentes que ocorrem no ambiente acadêmico. É necessário que esse olhar se amplie, bem como o nível de consciência e de informação de todos os agentes, para que comportamentos inclusivos e percepção subjetiva de inclusão possam ser regra e não exceção.