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Para Borgatti et al. (2009, p. 892), a noção de que as pessoas estão conectadas em redes é uma das mais potentes idéias nas Ciências Sociais, sendo que a teoria das redes sociais provê respostas ao questionamento da ordem social, existente desde o tempo de Platão. Tal teoria inicia-se em 1932 com o trabalho do psquiatra Jacob Moreno sobre a relação entre a estrutura social e o bem estar psicológico, para entender os motivos da evasão escolar de alunas da Hudson School for Girls em Nova Iorque. Com tal estudo, segundo os citados autores, Moreno cria a sociometria, técnica para representar graficamente indivíduos e sentimentos de um em relação ao outro, evidenciando canais para fluxo de idéias e influência social, tornando as estruturas sociais tangíveis às ciências.

Os autores esclarecem que nas décadas de 1940 e 1950 o trabalho em redes sociais tem grande avanço com o uso de gráficos e matrizes algébricas, que formalizam conceitos fundamentais da sociologia e da psicologia sobre grupos em rede; entre os anos 1970 e 1980, a Análise de Redes Sociais – ARS é fortemente utilizada por antropólogos e sociólogos no estudo de diversas questões; a partir dos anos 1990 a ARS amplia-se a diversos campos como física, biologia, administração, criminalidade etc. e atualmente

A representação e análise de comunidades estruturadas em rede encontram-se na vanguarda das pesquisas de redes nas ciências sociais, com interesse crescente em desvendar a estrutura de comunidades virtuais suportadas pelo computador, que se desenvolveram nos anos recentes (BORGATTI et al., 2009, p. 893, tradução nossa).

Analisando a aplicação da ARS nas ciências sociais, mediante os diferentes focos de pesquisa de cada disciplina, os autores salientam que a ARS é ―muitas vezes mais usual para predizer o comportamento dos indivíduos e a percepção deles em relação ao mundo do que para mensurar o mundo atual e real de tais indivíduos‖ (BORGATTI, 2009, p. 895). Em análise similar, Dias (2007, p. 11-12) destaca que nas ciências sociais o estudo das redes compreende pelos menos quatro grandes fluxos, os fluxos migratórios, os fluxos de mercadorias, os fluxos financeiros e os fluxos informacionais, sendo que a análise das redes sociais procuraria, na busca pela compreensão de tais fluxos, chamar a atenção para as relações e para a complexidade das interações entre os atores.

Segundo Marteleto e Tomaél (2005, p. 81-82), a Análise de Redes Sociais – ARS é ―uma metodologia oriunda da Antropologia Cultural e da Sociologia, mas com aplicações em diversas disciplinas, cujo foco analítico recai sobre as relações e interações entre os indivíduos, como maneira de entender a estrutura relacional da sociedade‖.

Sob essa ótica antropológica, a CI possui estudos tidos como da Antropologia da Informação – AI, que ―lida com a informação como artefato ou dimensão da cultura‖ (GONZÁLEZ DE GOMEZ, 2000, online). Conforme Marteleto e Tomaél (2005, p. 82-83), dentre os vários tipos de estudos de redes sociais existentes, há pesquisas que priorizam dois pressupostos da ARS oriundos da AI: 1) entender o que são e como funcionam as estruturas e relações sociais e de que maneira os sujeitos em interação concorrem para sua reprodução e transformação; 2) mapear as diferentes configurações comunicacionais e informacionais da rede social, para perceber as mediações utilizadas para a construção do conhecimento social, o conhecimento em prática. Para as autoras, os estudos de redes sociais que têm como base tais pressupostos costumam fundamentar perguntas relativas ao conhecimento, à comunicação e à informação, principalmente, no campo da CI.

Sobre a Ciência da Informação, uma das definições clássicas afirma ser ela a ciência cujo objeto é ―a produção, seleção, organização, interpretação, armazenamento, recuperação, disseminação, transformação e uso da informação‖ (GRIFFITH, 198018 apud CAPURRO, 2003, online). Para Capurro (2003, online), a CI ―nasce em meados do século XX com um paradigma físico, questionado por um enfoque cognitivo idealista e individualista, sendo este por sua vez substituído por um paradigma pragmático e social [...] mas agora de corte tecnológico e digital‖. Acerca de tais paradigmas, o autor sintetiza-os em: a) paradigma físico – postula que há um objeto físico transmitido por um emissor a um receptor, tendo foco na recuperação da informação; b) paradigma cognitivo (idealista e individualista) – entende a informação como sendo interpretada objetivamente e relacionada aos conteúdos intelectuais, e como separada do usuário e existente somente em espaços cognitivos ou mentais; c) paradigma social – compreende a informação em contextos sociais e materiais humanos, com foco na interação entre os usuários da informação.

Nesse contexto de paradigma social da CI, Marteleto e Tomaél (2005) observam que as pesquisas em AI fundamentam o alcance da metodologia de ARS no entendimento do conhecimento, da comunicação e da informação como fenômenos sociais.

A partir do entendimento de que as redes sociais são um espaço para compartilhamento de informações, é preciso conceituar informação. Capurro (2003) assegura que definir informação é uma das tarefas mais complexas e amplas da CI. Para, González de Gomez (2000, online), informação é um termo flutuante que

designa um fenômeno, processo ou construção vinculado a diversas ‗camadas‘ ou ‗estratos‘ de realização. Formam parte desses estratos a linguagem, com seus níveis sintáticos, semânticos e pragmáticos e suas plurais formas de expressão – sonoras, imagéticas, textuais, digitais/analógicas –; os sistemas sociais de inscrição de significados – a imprensa e o papel, os meios audiovisuais, o software e o hardware, as infra-estruturas das redes de comunicação remota; os sujeitos e organizações que geram e usam informações em suas práticas e interações

comunicativas. De maneira simplificada, podemos dizer que a informação, como objeto cultural, se constitui na articulação desses vários estratos, em contextos concretos de ação, e chamaremos ao fatum dessa constituição de um valor ou evidência de informação, uma ação de informação.

Acerca da dificuldade de se escolher um ou outro entendimento de informação, Capurro e HjØrland (2007, p. 149, 2007) frisam que ―diferentes concepções de termos fundamentais, como informação, são, assim, mais ou menos úteis, dependendo das teorias (e, ao fim, das ações práticas) para as quais espera-se que dêem suporte‖. Nesse sentido, para efeitos desse estudo, entende-se que informação

não é o produto final de um processo de representação, ou algo transportado de uma mente para outra, ou, finalmente, algo separado como em uma cápsula subjetiva, mas uma dimensão existencial do nosso ser em um mundo com outros. Informação é, mais precisamente, a articulação de um entendimento prioritário pragmático de um mundo comum compartilhado. Este entendimento prioritário, nosso pré-entendimento, permanece em grande medida na forma tácita, ainda quando o articulamos em forma falada ou escrita, dado que, por nossa finitude, nunca podemos explicitá-lo (CAPURRO, 1992, online, tradução nossa).

Com isso, tratando-se de uma investigação de usuários da informação sobre amor, é importante considerar o que afirma González de Gomez (1990, p. 121) acerca da condição da informação, pois

A informação, com efeito, nunca contém a si mesma, sempre se desdobra e é transcendida por outra ordem de fenômenos, ações ou coisas acerca do que informa a informação. Enquanto a informação é informação contextualizada, é também e sempre informação de alguma coisa que na maior parte das vezes não é informação (‗mundos‘ biológicos, econômicos, culturais, ‗visuais‘ etc.).

Assim, a antecipação e o condicionamento do que será concebido ou aceito como informação é dado pela ação de informação – a possibilidade de realizar ações de segundo grau sobre processos de comunicação e conhecimento (GONZÁLEZ DE GOMEZ, 1990, p. 120) – que articula os estratos de realização da informação em três dimensões:

semântico discursiva, enquanto a informação responde às condições daquilo sobre o que informa, estabelecendo relações com um universo prático-discursivo ao qual remetem sua semântica ou conteúdos; outra, meta-informacional, onde se estabelecem as regras de sua interpretação e de distribuição, especificando o contexto em que uma informação tem sentido; a terceira, uma dimensão infra- estrutural, reunindo tudo aquilo que como mediação disponibiliza e deixa disponível um valor ou conteúdo de informação, através de sua inscrição, tratamento, armazenagem e transmissão (GONZÁLEZ DE GOMEZ, 2000, online).

Portanto, analisar o compartilhamento e a relação do usuário com a informação, bem como o que tal usuário entende como informação, não é tarefa somente da ARS, mas também dos estudos de usuários definidos como ―uma investigação que objetiva identificar e caracterizar os interesses, as necessidades e os hábitos de uso de informação de usuários reais e/ou potenciais de um sistema de informação‖ (DIAS; PIRES, 2004, p.11). Para Wilson (1999), tais estudos iniciam-se na década de 1940 com as pesquisas sobre

busca e uso das informações disponibilizadas em bibliotecas, sendo que tais pesquisas voltam-se, no início, principalmente à comunidade científica. Segundo Figueiredo (1994), somente nos anos 1970 os estudos de usuários, antes focados em cientistas das ciências puras e em engenheiros (anos 1940), depois nos tecnologistas e educadores (anos 1960), consideram cientistas sociais de modo geral e altos escalões governamentais.

Segundo González de Gomez (2000) apud Araújo (2008, p. 8), na década de 1980, principalmente nos países de terceiro mundo, o campo da CI começa a preocupar-se com a democratização da informação. Esse movimento é concretizado por meio da constituição da subárea informação social (CARDOSO, 199419 apud ARAÚJO, 2008, p. 8). Para Lallement (2004, p. 9)20 apud Araújo (2008, p. 8), tal subárea ―toma como pressuposto teórico básico a idéia de tensionalidade, da existência de conflitos no âmbito da realidade humana e social, em oposição à idéia de integração, basilar das abordagens positivistas e funcionalistas das ciências humanas e sociais‖. Essa nova abordagem busca estudar outros usuários da informação ampliando o foco das pesquisas – antes direcionado, principalmente, ao usuário acadêmico, científico e/ou organizacional – aos usuários não especializados, por vezes marginalizados pelos estudos científicos (ARAÚJO, 2008). Assim, a CI expande o foco da pesquisa para além dos usuários científicos da informação, pois a legitimação no âmbito da CI ―não se dá mais pelo foco na produção científica que lhe deu origem, mas na metodologia científica que lhe dá sustentabilidade‖ (MIRANDA, 2002, p. 13).

Em relação aos estudos de usuários, Figueiredo (1994) apresenta uma divisão comum na literatura de CI, categorizando-os em estudos orientados ao sistema (biblioteca ou serviço de informação) e estudos voltados ao usuário, que investigam o comportamento de uma comunidade na obtenção de informação. Outra divisão de tais estudos refere-se à abordagem tradicional e alternativa. Assim, segundo Ferreira (1996), a abordagem tradicional trata a informação como externa, objetiva, algo fora do indivíduo. Desse modo, a informação existiria em um mundo ordenado e poderia ser descoberta, definida e medida. O usuário, nessa abordagem, é passivo em relação à informação: ele a recebe, mas sua ação sobre essa informação não é considerada.

Sob outra ótica, a abordagem alternativa, para Ferreira (1996), caracteriza-se por: a) observar o ser humano como sendo construtivo e ativo; b) considerar o indivíduo como sendo orientado de acordo com a situação; c) visualizar holisticamente as experiências do indivíduo; d) focalizar os aspectos cognitivos envolvidos; e) analisar sistematicamente a individualidade das pessoas; f) empregar maior orientação qualitativa

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CARDOSO, Ana Maria Pereira. Retomando possibilidades conceituais: uma contribuição à sistematização do campo da informação social. Revista da Escola de Biblioteconomia da UFMG, Belo Horizonte, v. 23, n. 2, p. 107- 114, jul./dez. 1994.

(DERVIN e NILAN, 198621 apud FERREIRA, 1996). Dervin (1989)22 apud Ferreira (1996) salienta que os usuários da informação na abordagem alternativa são entendidos como

pessoas com necessidades cognitivas, afetivas e fisiológicas fundamentais próprias que operam dentro de esquemas que são partes de um ambiente com restrições socioculturais, políticas e econômicas. Essas necessidades próprias, os esquemas e o ambiente formam a base do contexto do comportamento de busca de informação. Os mais importantes atos de comunicação – questionar, planejar, interpretar, criar, resolver, responder, tão esquecidos no modelo tradicional – são amplamente valorizados no modelo alternativo (DERVIN, 1989 apud FERREIRA, 1996, online)

De acordo com as categorizações dos estudos de usuários anteriormente apresentadas, a presente pesquisa guia-se nas prerrogativas dos estudos orientados ao usuário e da abordagem alternativa de tais estudos, voltando-se a um usuário não especializado, como são, predominantemente, os usuários do Orkut e das comunidades virtuais em estudo, pois como ressaltam Cruz e Silveira (2009) e Cruz (2010), as informações circulantes no Orkut ultrapassam a cotidiana troca de scraps, servindo para a promoção de debates relevantes e espontâneos.

Com isso, salienta-se que, segundo Rabello (1980), para se entender os usuários da informação é preciso que a CI busque aporte teórico em outras disciplinas que considerem aspectos não abordados pela CI e que sejam necessários a tal entendimento. Sob essa ótica interdisciplinar, Marteleto e Tomaél (2005, p. 82) afirmam que apesar das especificidades da metodologia de ARS na CI, tal análise não possui arcabouço teórico próprio, sendo preciso combinar teorias apropriadas ao ambiente e às questões em estudo.

Por isso, apresenta-se a seguir teorias pertinentes à problemática da presente pesquisa, para subsidiar o entendimento de redes sociais virtuais voltadas à discussão do sentimento amoroso e de usuários das informações presentes nestas.