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O cenário mundial é constituído, essencialmente hoje, pela emergência do ciberespaço, meio de comunicação surgido a partir da conexão mundial dos computadores (LEMOS; LÉVY, 2010) e visto como uma dimensão da sociedade em rede, na qual fluxos de informações (CASTELLS, 1999) delineiam novas formas de relações: econômicas, sociais, profissionais, políticas, trazendo novos contornos à sociedade.

A internet configura-se como espaço de conexão e compartilhamento. Como principal canal de comunicação na atualidade, é um espaço que pode ser utilizado num pensamento coletivo; a web permite a criação coletiva da inteligência (LÉVY, 1999). O advento da conectividade fez com que o computador deixasse de ser o centro e se tornasse um fragmento da trama, um componente incompleto da rede universal. Tanto Lévy (1999) quanto Castells (1999) percebem que a virtualidade da internet é a própria realidade.

As diferentes maneiras de organizar os dados no espaço virtual, compreendido como ciberespaço, delineia um agrupamento de informações na forma de links, sites de busca, páginas pessoais e redes sociais (LEMOS; LÉVY, 2010, p. 204). Esse sistema informacional permite o acesso, a manipulação, a transformação e o intercâmbio de informações. O ciberespaço,

É o espaço que se abre quando o usuário conecta-se com a rede. [...] Um sistema de comunicação eletrônica global que reúne os humanos e os computadores em uma relação simbiótica que cresce exponencialmente graças à comunicação interativa (SANTAELLA, 2009, p. 45).

Com essas possibilidades de organizar os dados no ciberespaço, novas lógicas instauram-se como formas de viver em sociedade. O ciberespaço é complexificado pela apropriação de um novo espaço: o espaço do saber (LEMOS; LÉVY, 2010), que são capazes de gerar novos usos, novas formas de construção dos espaços sociais. Para Lemos (2004, p. 128) o ciberespaço “é um espaço mágico, caracterizado pela ubiquidade, pelo tempo real e pelo espaço não físico”. É

um espaço sem dimensões, um universo de informações navegável de forma instantânea e reversível.

É na interação com o outro que o ciberespaço adquire sentido, constituindo-se como espaço propício para que constituindo-seus usuários teçam e construam conhecimento. É nessa rede de interfaces abertas que professores e alunos constroem suas redes educativas. Entende-se que o conhecimento é construído a partir de trocas, diálogos, interações e transformações. Para Machado e Matos (2012, p. 8) “o ciberespaço é visto como uma tecnologia que pode ampliar a comunicação humana e estimular a adoção do paradigma educacional defendido há muito tempo, mas tão pouco praticado: o da aprendizagem colaborativa”. Cada conectado pode a qualquer tempo e hora cocriar e manifestar os seus interesses, desejos, subjetividades, por meio de texto, sons e imagens. Vivencia-se e cria-se laços que emergem das interações e das relações estabelecidas por meio das redes sociais, dos e-mails, blogs, ambientes virtuais de aprendizagem, entre outros. As relações sociais no ciberespaço, apesar de virtuais, tendem a repercutir ou a se concretizar no mundo real. Estabelece um novo tipo de sociedade. O indivíduo rompe com alguns princípios reconhecidos como regras sociais, alterando alguns valores e crenças, sem que isso seja uma determinação da sociabilidade existente no mundo.

O ciberespaço proporciona o desenvolvimento da cibercultura. Lévy (1999, p. 17) define a cibercultura como o “conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o ciberespaço”. Para Santos (2011, p. 77) “cibercultura é a cultura contemporânea estruturada pelo uso das tecnologias digitais em rede nas esferas do ciberespaço e das cidades”. Conforme os autores, as relações pessoas e tecnologias digitais vão se entrelaçando, produzindo linguagens e signos mediados e socializados pelo digital. Esta cultura é híbrida da internet, com os seres humanos em movimento e em processos de comunicação e de redes sociais. Segundo Santos (2011, p. 77), a cibercultura já existia mesmo antes do fenômeno da mobilidade conectada, pois já se instituía nos espaços urbanos, a exemplo das operações bancárias, dos ambientes culturais, comerciais, industriais e agrícolas, entre outros. Existe uma nova maneira de pensar os meios de comunicação que se organizam dentro e fora do ciberespaço. Mas, é no ciberespaço que saberes são produzidos pela cibercultura, principalmente no que se refere a aprender com o outro e em

comunidade, criando uma rede de aprendizagem em um ambiente aberto, fluido, atemporal e ininterrupto.

A cultura digital e a cibercultura estão relacionadas entre si, por isso é preciso que exista o desejo de explorar, resgatar, fortalecer a curiosidade, e não apenas de reproduzir. A dinâmica social contemporânea, ao mesmo tempo em que vem demandando outras formas de incorporação das tecnologias digitais, também tem solicitado que os sistemas educacionais ultrapassem essa dimensão utilitária e a integrem como elemento fundante das transformações em que estão vivenciando. Os educadores precisam compreender que tomar as tecnologias como fundantes significa integrá-las como elementos carregados de conteúdos e significados para que se possa trabalhar visando ao fortalecimento das culturas e dos valores locais.

Nesse contexto, é preciso compreender como se dá a formação de professores no ciberespaço, pois o desenho curricular requer não só a preocupação com conteúdos, mas a organização do material disponibilizado no ambiente online. Assim, a concepção de espaço de aprendizagem rompe com o espaço físico da escola, e nesse veio o currículo escolar não pode passar despercebido.

O currículo escolar ainda é bastante focado nas competências voltadas para o letramento, o número e o presencial, o que pode dificultar a navegação no ciberespaço em sala de aula, já que todas as escolhas do que deve ou não integrar os conteúdos trabalhados pelos professores acaba, ao menos em tese, tendo o objetivo de preparar os estudantes para um modelo societário nem sempre condizente com a sociedade da informação. Sendo assim, hoje também é necessário que o currículo abarque os letramentos digitais e midiáticos de modo que a população infantil, juvenil e adulta possa ler, escrever e aprender empregando múltiplas linguagens de comunicação e expressão propiciadas pelas tecnologias digitais de informação e comunicação.

É importante reconhecer a polissemia envolvida nos conceitos de currículo apresentados na literatura, cujos sentidos “são produzidos nas respostas, na busca de sua ação, efeito ou aparecimento” (OLIVEIRA; AMORIM, 2006, p. 4). Apple (1982) afirma que as relações entre sociedade e educação não se estabelecem de modo determinista, hierárquico e linear, mas se relacionam dialeticamente, sendo o currículo uma criação humana caracterizada pela contradição. Silva (2005, p. 148) complementa essa postura ao afirmar que currículo “é uma questão de saber, poder e identidade”. Conforme Almeida (2012, p. 36) as concepções apresentadas pelos

curriculistas a respeito do conceito de currículo: “não determinismo, contradição, criação humana, identidade, poder, busca de respostas, construção, diálogo, participação, intencionalidade, experiência, narrativa, aprendizagem, gerenciamento da vida”, são essenciais para a integração do currículo pensando no que pode ser criado e desenvolvido no ciberespaço. Trata-se de um currículo que possibilita a ação reflexiva e o desenvolvimento de atividades envolvendo os alunos, professores e as tecnologias, por meio de uma abordagem que valoriza interesses e motivações do coletivo.

Ao mesmo tempo em que o currículo tem caráter de ordenação da experiência e de sistematização formal, ele é reelaborado em função de tempos, espaços e contextos e, sobretudo, é reconstruído na prática social pedagógica e adquire sentido junto aos sujeitos do ato educativo, envolvendo seus saberes, história, sentimentos, modos de interação social e ação no mundo com os instrumentos culturais de sua época (ALMEIDA, 2012, p. 38).

Essa concepção de currículo vai ao encontro do Parecer CEB/CNE nº 7/2010, que discorre sobre as Diretrizes Curriculares Gerais da Educação Básica26 quando traz em seu texto que as tecnologias da informação e comunicação devem perpassar transversalmente a proposta curricular, imprimindo direção aos projetos políticos pedagógicos; que os programas de formação de professores devem prepará-los para o desempenho de suas atribuições, considerando necessário: [...] “compreender, interpretar e aplicar a linguagem e os instrumentos produzidos ao longo da evolução tecnológica, econômica e organizativa”, além de assegurar na organização do percurso formativo o estímulo à criação de métodos didático-pedagógicos, utilizando os recursos tecnológicos de informação e comunicação, visando superar a distância entre alunos e professores no que diz respeito à apropriação e utilização da linguagem digital. Assim, entende-se currículo para além da mera disposição de conteúdos e sua gestão. Superação da forma lógica e linear. É premente que as ações pedagógicas inovadoras contemplem o projeto político pedagógico escolar, tendo em vista a demanda de nativos digitais no ambiente escolar.

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26 BRASIL. Ministério da Educação. Parecer CEB/CNE Nº 7/2010. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/rceb007_10.pdf. Acesso em: 20 dez. 2013.