• Nenhum resultado encontrado

SETE CICLOS DE SELEÇÃO CLONAL DE PORTA-ENXERTOS POTENCIALMENTE TO LERANTES À MORTE-PRECOCE DO PESSEGUEIRO

No documento Anais... (páginas 133-137)

Newton Alex Mayer1; Bernardo Ueno1

1 Eng. Agr., Dr., Pesquisador da Embrapa Clima Temperado; BR 392, Km 78; Caixa Postal 403; CEP 96010-971; Pelotas, RS, Brasil;

alex.mayer@embrapa.br e bernardo.ueno@embrapa.br

No Brasil, a morte-precoce do pessegueiro (Peach Tree Short Life, em inglês) surgiu na região persíco- la de Pelotas-RS no final da década de 1970 e, desde então, tem provocado graves prejuízos aos produtores, em diferentes regiões produtoras do Estado do Rio Grande do Sul. Os sintomas visuais ocorrem durante e/ ou no final da dormência (junho a agosto), com redução do crescimento, diminuição ou falta de brotação e floração, morte de gemas, brotos, de parte da planta ou mesmo de toda a copa. Foram constatadas plantas sintomáticas com idade entre um e oito anos, isoladas ou em reboleira, em pomares de diferentes cultivares- copa, níveis tecnológicos, tipos de solo, topografia, sentido da declividade do terreno e altitude, em áreas previamente cultivadas ou não com pessegueiro. Em casos mais graves, identificou-se mortalidade de até 90% das plantas do pomar (Mayer et al., 2009).

Diversos fatores bióticos e abióticos têm sido reportados na literatura como agentes precursores ou causais da síndrome. Entretanto, pesquisas realizadas nos Estados Unidos têm focado na seleção de porta -enxertos tolerantes à síndrome, as quais culminaram com o lançamento dos porta-enxertos Guardian® (Okie

et al., 1994), Sharpe (Beckman et al., 2008) e MP-29 (Beckman et al., 2012). No Sul do Brasil, a indefinição dos porta-enxertos utilizados na maioria dos pomares (predominam as misturas de caroços de diferentes cultivares-copa obtidas nas indústrias de conservas), têm promovido notáveis diferenças entre as plantas e dificultado a compreensão da síndrome. Se por um lado a variabilidade genética dos porta-enxertos pro- move diferenças indesejáveis entre as plantas, por outro lado também pode ser utilizada em um programa de seleção clonal in loco, considerando-se as condições edafoclimáticas existentes (pressão de seleção) nos pomares afetados pela síndrome.

Diante dessas constatações e hipótese da existência de porta-enxertos tolerantes à morte-precoce, desenvolveu-se a metodologia da decepa da copa abaixo do ponto de enxertia para promover a brotação do porta-enxerto de interesse, clonando-o por meio do enraizamento de estacas sob câmara de nebulização intermitente (Mayer et al., 2009). O presente trabalho objetivou resumir os principais resultados de sete ci- clos de seleção clonal in loco de porta-enxertos potencialmente tolerantes à morte-precoce do pessegueiro, realizado pela Embrapa Clima Temperado.

Entre 2007 e 2014 foram realizadas visitas técnicas a mais de 50 propriedades rurais produtoras de pêssego no Estado do Rio Grande do Sul, cujos pomares apresentavam sintomas de morte-precoce. As indi- cações foram recebidas de extensionistas da Emater/RS-ASCAR (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado do Rio Grande do Sul), de técnicos envolvidos na cadeia produtiva do pêssego e dos próprios produtores. Quando localizadas plantas ou grupos de plantas com sintomas típicos da síndrome, em meio a plantas assintomáticas (Figura 1a), procedeu-se à seleção das plantas tolerantes (entre 5 e 10 plantas por pomar), mediante a concordância dos proprietários. Resumidamente, o trabalho compreendeu as seguin- tes etapas (Mayer et al., 2009): a) visitas técnicas e escolha de pomares afetados pela morte-precoce do pessegueiro; b) registro de informações dos pomares; c) decepa das copas das plantas selecionadas, abaixo do ponto de enxertia (Figura 1b); d) georreferenciamento, proteção e codificação das plantas selecionadas (Figura 1c); e) coleta dos ramos herbáceos entre 100 e 150 dias após a decepa, oriundos dos porta-enxertos selecionados (Figura 1d); f) preparo de estacas herbáceas, tratamento com 3.000 mg.L-1 de ácido indolbutí-

rico e acondicionamento em vermiculita sob câmara de nebulização intermitente (Figura 1e); g) avaliações do enraizamento (Figura 1f) e classificação das estacas enraizadas em aptas e inaptas ao transplantio; h) transplantio das estacas enraizadas aptas para sacos plásticos ou citropotes, para aclimatação; i) introdução

Anais do VI Encuentro Latinoamericano Prunus Sin Fronteras

134

de exemplares de cada clone na “Coleção Porta-enxerto de Prunus”, da Embrapa Clima Temperado (Figura 1g); j) produção de mudas sobre os porta-enxertos clonais (Figura 1h) e estabelecimento de Unidades de Observação, em áreas comerciais com histórico de morte-precoce do pessegueiro; l) avaliações da reação dos genótipos selecionados à morte-precoce do pessegueiro. Em alguns pomares, realizou-se também a seleção e clonagem de porta-enxertos de plantas sintomáticas, para uso como testemunhas suscetíveis nas Unidades de Observação. Em 2014, realizou-se a seleção e a decepa de plantas enxertadas em seedlings de

Prunus mume Sieb et Zucc., em Unidade de Observação previamente estabelecida (Mayer et al., 2015), sendo

os únicos acessos deste trabalho que não pertencem a P. persica.

Nos sete ciclos de seleção clonal de porta-enxertos potencialmente tolerantes à morte-precoce do pessegueiro, realizaram-se seleções em 45 diferentes propriedades rurais, localizadas em oito diferentes municípios gaúchos (Pelotas, Canguçu, Morro Redondo, Bagé, São Marcos, Caxias do Sul, Pinto Bandeira e Vale Real). No total, foram selecionadas e decepadas 352 plantas assintomáticas. Destas, 218 porta-enxer- tos brotaram, o que corresponde a média de 61,9% de brotação (Tabela 1). Esse percentual é considerado bastante satisfatório, considerando-se a variabilidade genética dos materiais utilizados como porta-enxerto (a grande maioria é proveniente das misturas varietais das indústrias de conservas), as diferentes caracte- rísticas químicas e físicas de solo ao redor de cada planta selecionada, os níveis tecnológicos adotados nos pomares, a presença ou ausência de proteção da cepa contra os raios solares e as épocas de realização.

Com a coleta dos brotos dos porta-enxertos selecionados, realizada entre 100 e 150 dias após a de- cepa das copas, constatou-se considerável variabilidade no número de brotos por cepa (entre 1 e 47), no diâ- metro e no comprimento das brotações. Essas características determinaram o número de estacas herbáceas que foi possível preparar de cada clone, bem como a qualidade inicial dessas estacas. Além do fator genético, a sanidade das folhas e o diâmetro adequado (entre 8 mm e 12 mm) das estacas herbáceas também são fatores que influenciam decisivamente no enraizamento e na qualidade das raízes formadas. Neste aspec- to, foram obtidos percentuais de enraizamento entre os clones que variaram desde 0 a 100%, assim como notáveis diferenças na qualidade das raízes (número, comprimento, distribuição ao redor da estaca, por- centagens de estacas enraizadas aptas e inaptas ao transplantio), porcentagens de sobrevivência na fase de aclimatação (entre 0 e 100%) e crescimento no viveiro e no campo. Em função das perdas que normalmente ocorrem nestas fases, foi possível resgatar e estabelecer 148 acessos na “Coleção Porta-enxerto de Prunus”, da Embrapa Clima Temperado. Portanto, das 352 plantas inicialmente decepadas, verifica-se que 42% dos acessos foram efetivamente resgatados, índice considerado muito bom.

Nas plantas estabelecidas na coleção, observaram-se diferenças entre os clones quanto ao vigor, re- tenção foliar e épocas de floração e brotação (Figura 1g). A caracterização molecular dos acessos está sendo realizada pela equipe do Laboratório de Biologia Molecular da Embrapa Clima Temperado.

Para testar a hipótese da existência de porta-enxertos tolerantes, em 2014 foram estabelecidas duas Unidades de Observação (Pelotas, RS, e Canguçu, RS), em áreas com histórico da síndrome, utilizando-se a cultivar-copa Granada enxertada em 14 seleções clonais. Em 2015, duas novas Unidades de Observação (Pelotas-RS e Piratini-RS) foram estabelecidas com a cv. Sensação, enxertada em 40 seleções. As avaliações de reação à morte-precoce e produção serão realizadas nos próximos anos, visando identificar clones de porta-enxertos mais promissores.

Como considerações finais, verifica-se que a decepa das plantas abaixo do ponto de enxertia para promover a brotação dos porta-enxertos, seguida pelo enraizamento destes através de estacas herbáceas, é um método simples, rápido e eficiente para resgatar acessos de interesse em pomares de pessegueiro com plantas desuniformes (uso de seedlings como porta-enxerto), em áreas com histórico de morte-precoce. En- tretanto, somente com a avaliação desses porta-enxertos clonais em Unidades de Observação estabelecidas em áreas com histórico da morte-precoce, será possível identificar quais são os genótipos efetivamente to- lerantes. É possível ainda que, com este método, outras características dos porta-enxertos também estejam sendo selecionadas, como adaptação à solos com baixos níveis de fertilidade e/ou elevada saturação por Al, bem como tolerância a estresses hídricos. O método aqui descrito também poderá ser utilizado para sele- cionar genótipos de interesse em outras frutíferas, desde que exista variabilidade genética, ocorra adequada brotação e tenha-se domínio da técnica de propagação por estacas herbáceas sob câmara de nebulização intermitente.

Anais do VI Encuentro Latinoamericano Prunus Sin Fronteras

135

Figura 1. a) Pomar comercial com plantas sintomáticas e assintomáticas de morte-precoce do pessegueiro; b) decepa da copa abaixo do ponto de enxertia; c) proteção e codificação da cepa selecionada; d) cepa brota- da; e) clones selecionados sendo propagados por estacas herbáceas; f) estacas enraizadas; g) clones estabe- lecidos na “Coleção Porta-enxerto de Prunus” da Embrapa Clima Temperado, ilustrando diferenças entre dois clones selecionados no mesmo pomar; h) mudas enxertadas em diversos porta-enxertos clonais e mantidas em citropotes com fertirrigação, prontas para formar Unidades de Observação. Fotos: Newton Alex Mayer.

a b

c d

e f

Anais do VI Encuentro Latinoamericano Prunus Sin Fronteras

136

Tabela 1. Resumo dos sete ciclos de seleção clonal de porta-enxertos potencialmente tolerantes à morte

-precoce do pessegueiro, realizada pela Embrapa Clima Temperado. Embrapa Clima Temperado, setembro de 2015. Ciclo de se- leção(1) n° municípios(2) n° propriedades(3) n° dece- pas(4) n° e % cepas brotadas(5) n° clones esta- belecidos(6) 2007/2008 01 01 10 04 (40,0%) 04 2008/2009 03 10 69 43 (62,3%) 14 2009/2010 07 16 90 45 (50,0%) 30 2010/2011 03 13 90 63 (73,3%) 49 2012/2013 02 02 12 12 (100,0%) 12 2013/2014 02 08 51 28 (54,9%) 27 2014/2015 01 01 30 23 (76,7%) 12

Total 08 (diferentes) 45 (diferentes) 352 218 (61,9%) 148

(1) Ciclo de seleção: ano em que foi realizado a decepa/ano de coleta dos ramos, enraizamento e aclimatação; (2) n° municípios = número de municípios onde se realizou a seleção de porta-enxertos potencialmente tole-

rantes à morte-precoce; (3) n° propriedades = número de propriedades rurais onde se realizou a seleção. Em

cinco propriedades foram realizadas seleções por 2 ou 3 anos; (4) n° decepas = número de plantas decepadas

abaixo do ponto de enxertia, objetivando a estimular brotação do porta-enxerto; (5) n° e % cepas brotadas

= número e porcentagem de cepas brotadas (porta-enxertos selecionados), dos quais foi possível coletar ramos herbáceos para o preparo de estacas; (6) n° clones estabelecidos = número de clones, propagados por

estacas herbáceas, estabelecidos na “Coleção Porta-enxerto de Prunus”, da Embrapa Clima Temperado, para constituição de matrizeiro.

Agradecimentos

À Emater-RS/ASCAR (Escritórios Municipais de Pelotas, Canguçu, Morro Redondo, Vale Real, São Marcos, Pinto Bandeira e Caxias do Sul e Escritório Regional de Caxias do Sul); às 45 famílias de persicultores que permitiram a realização deste trabalho; ao CNPq e à Embrapa pelo suporte financeiro.

Referências

MAYER, N. A.; UENO, B.; ANTUNES, L. E. C. Seleção e clonagem de porta-enxertos tolerantes à mor-

te-precoce do pessegueiro. Pelotas: Embrapa Clima Temperado, 2009. 16p. (Embrapa Clima Temperado.

Comunicado Técnico, 209).

MAYER, N. A.; UENO, B.; REIGHARD, G. L. Selection of Prunus mume as rootstocks for peaches on PTSL site.

Acta Horticulturae, n.1084, p.89-96, 2015.

OKIE, W. R.; BECKMAN, T. G.; NYCZEPIR, A. P.; REIGHARD, G. L.; NEWALL, W. C.; ZEHR, E. I. BY520-9, A peach rootstock for the Southeastern United States that increases scion longevity. Hort Science, v.29, n.6, p.705-706, 1994.

BECKMAN, T. G.; CHAPARRO, J. X.; SHERMAN, W. R. Sharpe, a clonal plum rootstock for peach. Hort Scien-

ce, v.43, n.7, p.2236-2237, 2008.

BECKMAN, T. G.; CHAPARRO, J. X.; SHERMAN, W. B. MP-29, a clonal interspecific hybrid rootstock for pea- ch. Hort Science, v.47, n.1, p.128-131, 2012.

Anais do VI Encuentro Latinoamericano Prunus Sin Fronteras

137

COMPORTAMENTO DE CULTIVARES E SELEÇÕES DE PESSEGUEIROS NA DEPRES-

No documento Anais... (páginas 133-137)

Outline

Documentos relacionados