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1. ELEMENTOS ESSENCIAIS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

1.5. Excludentes de responsabilidade civil

1.5.5. Cláusula de não indenizar

José de Aguiar Dias, em obra clássica sobre a cláusula exonerativa de responsabilidade, relaciona quatro matérias de direito obrigacional e responsabilidade como “fórmulas de equilíbrio entre as exigências da reparação e as da conservação da atividade responsabilizada”: a cláusula penal, a cláusula de limitação da responsabilidade, a cláusula de irresponsabilidade, e o seguro de responsabilidade civil. De fato, a multiplicação dos sinistros deixa o julgador em uma posição delicada: ou deixam-se muitas vítimas sem reparação, ou empobrecem-se muitos devedores194.

No que tange à primeira delas, a ser novamente abordada no Capítulo 3 deste trabalho, sustenta que a cláusula penal, que estabelece o montante da indenização em caso de não cumprimento da obrigação, suprime a incerteza da liquidação do dano, de maneira a evitar o risco de serem arbitradas verbas superiores às naturalmente derivadas do inadimplemento195. Assemelha-se à cláusula de limitação da responsabilidade, com a diferença de que a cláusula penal é invocada pelo credor, enquanto a limitativa de responsabilidade o é pelo devedor196. As cláusulas limitativas, de fato, são estipulações pelas quais se determina antecipadamente a soma que o devedor pagará ao credor, no caso de ser declarado responsável pelo dano197. O seguro de responsabilidade, por fim, traz para a relação estabelecida entre as partes um terceiro, a seguradora, para a qual será transferida a obrigação de pagar a indenização no lugar do verdadeiro responsável, o segurado, que poderá, assim, manter íntegro seu patrimônio.

192 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de Direito Civil – responsabilidade civil, p. 95.

193 A norma em comento possui a seguinte redação: “Art. 17 – As estradas de ferro responderão pelos desastres que nas suas linhas sucederem aos viajantes e de que resulte a morte, ferimento ou lesão corpórea. A culpa será sempre presumida, só se admitindo em contrário alguma das seguintes provas:

1a – Caso fortuito ou força maior;

2a – Culpa do viajante, não concorrendo culpa da estrada”.

194 AGUIAR DIAS, José de. Cláusula de não-indenizar: chamada cláusula de irresponsabilidade. 3. ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Forense, 1976. p. 20.

195 Ibidem, p. 21. 196 Ibidem, p. 129. 197 Ibidem, p. 125.

O princípio da autonomia da vontade é a principal fundamentação das cláusulas de exclusão e limitativas de responsabilidade contratual de maneira geral198, por isso, não é de agrado da integralidade da doutrina, que, frequentemente, sustenta a incompatibilidade da cláusula de não indenizar com o direito privado em sua concepção contemporânea199.

No presente momento, tratar-se-á apenas da modalidade que importa em exclusão do dever de indenizar, já que a matéria estudada é sobre excludentes de responsabilidade civil e não da limitação de indenizar.

A cláusula de não indenizar, também chamada de cláusula exonerativa de responsabilidade200, consiste na convenção que exclui o dever de indenizar, modificando o resultado da ocorrência de dano, e transferindo os riscos do negócio de um contratante para o outro. Estabelece-se, com isso, que determinada parte não será responsável por certos danos.

Lapidar é a definição de José de Aguiar Dias:

“A cláusula ou convenção de irresponsabilidade consiste na estipulação prévia por declaração unilateral, ou não, pela qual a parte que viria a obrigar-se civilmente perante outra afasta, de acordo com esta, a aplicação da lei comum ao seu caso. Visa anular, modificar ou restringir as consequências normais de um fato da responsabilidade do beneficiário da estipulação”201.

Em outras palavras, pode-se dizer que a cláusula exonerativa de responsabilidade é o pacto acessório que, antecipadamente, afasta a obrigação indenizatória atribuída ao

198 Observa-se a existência de cláusulas de supressão total de responsabilidade, cláusulas limitativas da responsabilidade ou de responsabilidade atenuada, bem como cláusulas de responsabilidade atenuada temporariamente. Será abordada apenas da primeira modalidade.

199 Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho assim se manifestam a respeito do tema, in verbis: “Em verdade, essa cláusula não nos agrada muito.

No Direito Civil ensinado e difundido na primeira metade do século XX, imbuído de ideais individualistas e egoísticos, essa convenção teria lugar mais apropriado.

Não nos dias de hoje, em que vivemos um re-pensar do Direito Privado, mais vocacionado aos superiores princípios constitucionais, e influenciado por valores de solidarismo social” (Novo curso de Direito Civil – responsabilidade civil, p. 119).

200 Também é possível encontrar referência às expressões “cláusula de irresponsabilidade” e “cláusula de exclusão de responsabilidade”.

devedor em decorrência do inadimplemento de suas obrigações. O que se exclui, portanto, não é o cumprimento da obrigação, mas sua sanção habitual202.

A atuação da cláusula se dá no plano da obrigação de indenizar, em fase posterior à verificação dos elementos da responsabilidade civil. Em consequência disso, não é, tecnicamente, causa excludente de responsabilidade porque esta obsta o preenchimento dos requisitos da responsabilidade civil, ao passo que a convenção em comento afasta o surgimento da obrigação reparatória.

A aplicação da cláusula, de qualquer modo, não é irrestrita, sendo aplicável somente na esfera contratual, eis que a responsabilidade extracontratual tem fulcro em princípios de ordem pública inspirados pelo escopo de proteção do bem comum contra atos ilícitos. Ademais, na responsabilidade aquiliana inexiste negócio jurídico anterior que vincule as partes, de maneira que não há que se cogitar na matéria em comento203.

Saliente-se, ainda, que a cláusula se sujeita a alguns requisitos, conforme enunciados a seguir:

• não pode afastar obrigações essenciais do contrato204;

• não deve contrariar a ordem pública205 e os bons costumes, motivo pelo qual somente pode versar sobre direitos individuais disponíveis206;

202 MALUF, Carlos Alberto Dabus. Do caso fortuito e da força maior excludentes de culpabilidade no Código Civil de 2002. In: DELGADO, Mário Luiz; ALVES, Jones Figueiredo (Coord.). Questões

controvertidas – responsabilidade civil, v. I, p. 60.

203 Há, contudo, posicionamento em contrário: Wilson Melo da Silva (Da responsabilidade civil

automobilística, p. 32); José de Aguiar Dias (Cláusula de não-indenizar: chamada cláusula de

irresponsabilidade, p. 57).

204 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 746-747.

205 Entende-se como ordem pública o conjunto de princípios fundamentais do ordenamento jurídico cuja salvaguarda tem em vista, sobretudo, a tutela de interesses coletivos. O mesmo preceito se observa no art. 1.229 do Código Civil italiano, com a seguinte redação: “Clausole di esonero da responsabilità. É nullo qualsiasi patto che esclude o limita preventivamente la responsabilità del debitore per dolo o per colpa grave (1490, 1579, 1681, 1694, 1713, 1784, 1838, 1900).

É nullo (1421 e seguenti) altresi qualsiasi patto preventivo di esonero o di limitazione di responsabilità per i casi in cui il fato del debitore o dei suoi ausiliari (1580) costituisca violazione di obblighi derivanti da norme di ordine pubblico (prel. 31)”. (Tradução livre: “Art. 1.229. Cláusulas de exoneração de responsabilidade. É nulo qualquer pacto que exclui ou limita preventivamente a responsabilidade do devedor por dolo ou por culpa grave (1490, 1579, 1681, 1694, 1713, 1784, 1838, 1900). É nulo (1421 e seguintes) qualquer outro pacto preventivo de exoneração ou limitação da responsabilidade para os casos em que o fato do devedor ou de seus auxiliares (1580) constitua violação de obrigações derivadas de normas de ordem pública (prel. 31))”. 206 AGUIAR DIAS, José de. Da responsabilidade civil, t. II, p. 654.

• somente pode ser aplicada na hipótese de ausência de dolo ou culpa inescusável (grave)207;

• pressupõe a igualdade dos contratantes, o que faz que não possa ser utilizada em caso de vulnerabilidade jurídica de uma das partes;

• deve haver bilateralidade do consentimento, razão pela qual não é admissível em contratos de adesão.

Além dos requisitos elencados, à cláusula somente pode ser conferida validade se esta possibilitar a manutenção do equilíbrio contratual econômico, o que deverá ser apurado no caso concreto.

Em algumas hipóteses, a legislação afasta expressamente a validade da cláusula. É o que ocorre, v.g., no art. 25 da Lei n. 8.078/1990 (CDC)208, reforçado pelo disposto no art. 51, inc. I, do mesmo Diploma legal209, que acaba por não conferir validade a essa cláusula nos contratos de consumo, na medida em que veda disposição que exonere ou atenue a responsabilidade civil do fornecedor. Com efeito, trata-se de contrato que não pressupõe a igualdade entre as partes, razão pela qual a cláusula não pode ser estipulada.

207 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil – responsabilidade civil, v. 4, p. 181. Agostinho Alvim admite a validade da cláusula em caso de culpa grave ou lata porque a lei vigente repeliu a graduação da culpa. (Da

inexecução das obrigações e suas conseqüências, p. 321). José de Aguiar Dias também sustenta que a culpa

grave não se assimila ao dolo, aduzindo que: “a gravidade da culpa é, pois, incapaz de equipará-la ao dolo. O valor que lhe pode ser reconhecido é o de prova ou indício de má-fé. Sendo tal a gravidade da falta que representa procedimento por demais aberrante do que se poderia esperar, em face da obrigação, servirá de elemento de convicção para estabelecer que o agente procedeu de má-fé e nada mais do que isso” (Cláusula

de não-indenizar: chamada cláusula de irresponsabilidade, p. 99). No presente trabalho, contudo, não se

partilha de tal entendimento, adotando-se posicionamento alinhado com a parte majoritária da doutrina. 208 O dispositivo legal em comento tem a seguinte redação:

“Art. 25. É vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores.

§ 1o – Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores.

§ 2o – Sendo o dano causado por componente ou peça incorporada ao produto ou serviço, são responsáveis solidários seu fabricante, construtor ou importador e o que realizou a incorporação”.

209 O artigo, no inciso mencionado, determina que:

“Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

I – impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis”.

Na mesma esteira, dispõe o art. 734 do CC, que a cláusula exonerativa de responsabilidade também não se aplica aos contratos de transporte de pessoas210. Nesse caso, não se trata somente de desigualdade entre as partes – visto se tratar também de contrato de consumo –, mas também da vedação contida no item “a” retromencionado. Ao contrato de transporte é ínsita a cláusula de segurança e preservação da incolumidade do passageiro. Sendo assim, se fosse afastada a indenização por danos dessa natureza, estar- se-ia liberando o transportador de obrigação essencial do contrato.

Do mesmo modo, não se admite a cláusula exonerativa em contratos de estacionamento, nos quais em regra se coloca, indevidamente, placa informando a não responsabilidade por furto ou roubo de bens. Esse posicionamento é reforçado pelo disposto na Súmula 130 do STJ, cuja redação é a seguinte: “A empresa responde perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento”. Ressalte-se que, mesmo se inexistisse a Súmula, trata-se de caso evidente de contrato de consumo, sendo, portanto, aplicável o art. 25 do CDC.

Pelos mesmos motivos, a cláusula de não indenizar também não pode ser invocada em caso de furtos em hotéis e similares, assim como aposta em contratos de guarda, como os de depósito211.

210 A matéria já era objeto da Súmula n. 161, do STF: “Em contrato de transporte é inoperante a cláusula de não indenizar”. O Decreto n. 20.704/1931 (Convenção de Varsóvia) não admite a cláusula exoneratória de responsabilidade, mas possibilita a limitação convencional da indenização em algumas hipóteses. Também relacionado com a matéria, verifique-se o art. 12 do Decreto-lei 2.681, de 7 de dezembro de 1912, com a seguinte redação: “A cláusula de não-garantia das mercadorias bem como a prévia determinação do máximo de indenização a pagar, nos casos de perda ou avaria, não poderão ser estabelecidas pelas estradas de ferro senão de modo facultativo e correspondendo a uma diminuição da tarifa. Serão nulas quaisquer outras cláusulas diminuindo a responsabilidade das estradas de ferro estabelecida na presente lei”.

211 TARTUCE, Flávio. Direito Civil – Direito das obrigações e responsabilidade civil, v. 2, p. 569-570. O autor assegura que a cláusula não tem validade reconhecida em contratos de seguro, mesmo quando há negativa de pagamento de indenização com justificativa de suposta informação incorreta fornecida pelo segurado.

2. O DANO

Este Capítulo destina-se à análise do dano em seus diversos aspectos, motivo pelo qual serão objetos de estudo: o conceito de dano, a caracterização do dano ressarcível, as formas de ressarcimento, bem como as modalidades de dano, quais sejam, patrimonial, moral, estético e perda de uma chance.

Cumpre salientar, de início, o entendimento de que o dano estético não constitui uma categoria autônoma, mas sim uma espécie de dano moral lato sensu, o que não impede sua cumulação com o dano moral stricto sensu. A perda de uma chance, por outro lado, diz respeito, em regra, a uma espécie de dano material, especificamente dano emergente212, como será esclarecido nos tópicos que se seguem.

2.1. O conceito de dano

O complexo estudo do pleno significado que o termo “dano” pode obter escapa ao propósito do presente trabalho. É necessário, não obstante, que fique estabelecido um ponto de partida para o desenvolvimento do tema escolhido. Para esse fim, vislumbrar-se-á o dano como a subtração a um bem jurídico que, como tal, encontra proteção no ordenamento jurídico. Dessa perspectiva, o dano pode ser material, quando atinge bens apreciáveis em dinheiro, ou moral, se resultante de lesão a bens não apreciáveis em pecúnia, ou seja, que não podem ser valorados monetariamente213.

212 Entende-se que não é salutar a criação de um “terceiro gênero de dano” sempre que o doutrinador deparar com uma situação que se apresente peculiar em relação às modalidades clássicas. Isso levaria, ao final, à perda da sistematização da matéria. Verifique-se, v.g., que João Antônio Álvaro Dias sustenta ser o dano corporal tertium genus, em razão de nele identificar elementos de dano patrimonial, e extrapatrimonial (Dano

corporal – quadro epistemológico e aspectos ressarcitórios. Coimbra: Almedina, 2004. p. 205). Ora, está-se,

então, diante de um panorama problemático: uns defendem que o dano estético é um terceiro gênero, outros o fazem com relação ao dano corporal, há ainda aqueles que sustentam que a perda de uma chance configura outra espécie de dano, e assim em diante. Antônio Junqueira de Azevedo sugere ainda a existência de outro tipo de dano – o dos danos sociais –, que se opõe aos danos individuais (divididos em patrimoniais e morais), ensejando verba autônoma a ser revertida à vítima, a despeito de seu caráter social (Por uma nova categoria de dano na responsabilidade civil: o dano social. In: _____. Novos estudos e pareceres de direito privado. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 377-384, É evidente que nem todos estão com a razão; portanto, é mais prudente manter a divisão já centenária entre danos patrimoniais e extrapatrimoniais, procedendo às subdivisões que se fizerem necessárias.

213 LALOU, Henri. La responsabilité civile: principes élémentaires et applications pratiques. 2. ed. Paris: Dalloz, 1932. p. 81; FISCHER, Hans Albrecht. Der Schaden Nach den Bürgerlichen Gesetzbuche. Trad.

Explica Teresa Ancona Lopez que, do ponto de vista etimológico, o termo dano advém de demere, que pode ser entendido como tirar, apoucar, diminuir. Assim, de acordo com a autora, “a ideia de dano surge das modificações do estado de bem-estar da pessoa, que vem em seguida à diminuição ou perda de qualquer dos seus bens originários ou derivados extrapatrimoniais ou patrimoniais”214.

O conceito de dano, em verdade, sofreu muitas alterações ao passar do tempo, eis que, de início, somente incluía os danos de natureza patrimonial. Tal processo se deu também no Direito brasileiro, bastando lembrar que muitos eram os estudiosos defensores de que o Código Civil de 1916 somente dava abrigo ao dano material. Nos dias atuais, conforme disserta Anderson Schreiber, está-se diante de um processo de ampliação da possibilidade de reparação, no qual se denota o desprestígio da culpa e do nexo causal em detrimento do dano, em particular aqueles de natureza existencial215. Esse tema será tratado adiante, nos itens 2.6 e seguintes. Por ora, dedicar-se-á à análise do conceito de dano, em suas características mais amplas.

Encontra consenso entre os diversos doutrinadores a assertiva de que o dano é elemento necessário à configuração da responsabilidade civil. José de Aguiar Dias registra que, para a unanimidade dos autores, não pode haver responsabilidade sem a existência de um dano216. Para este estudo, no entanto, não é suficiente entender o dano apenas como pressuposto da responsabilidade civil, mas sim como elemento necessário para a configuração dessa responsabilidade, razão pela qual serão analisados outros aspectos deste.

Carlos Alberto Bittar define o dano como “lesão ou redução patrimonial, sofrida pelo ofendido, em seu conjunto de valores protegidos no Direito, seja quanto à sua própria

port. de Ferrer Correia. A reparação dos danos no Direito Civil. São Paulo: Acadêmica, 1938. p. 81; e SALAZAR, Alcino de Paula. Reparação do dano moral. Rio de Janeiro: Borsoi, 1943. p. 125-126.

214 LOPEZ, Teresa Ancona. O dano estético – responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 20.

215 SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil – da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos, p. 81-83.

216 AGUIAR DIAS, José de. Da responsabilidade civil, t. II, p. 702. Nesse mesmo sentido, Carlos Roberto Gonçalves: “O dano é pressuposto inafastável da responsabilidade civil. Não há responsabilidade onde não existe prejuízo” (Comentários ao Código Civil – parte especial do Direito das obrigações (arts. 927 a 965). São Paulo: Saraiva, 2003. v. 11, p. 319). Também Sílvio Rodrigues: “O ato ilícito só repercute na órbita do direito se causar prejuízo a alguém” (Direito Civil – responsabilidade civil, v. 4, p. 18). Ainda tratando desse tema, Maria Celina Bodin de Moraes lembra que, apesar de muitas teorias pretenderem conceituar o dano como o pressuposto inafastável para a configuração da responsabilidade civil, uma vez que não havendo dano, não há o que indenizar, o dano moral não é propriamente indenizável, mas sim compensável (Danos à

pessoa humana – uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro/São Paulo: Renovar,

pessoa – moral ou fisicamente – seja quanto a seus bens ou a seus direitos”. Acrescenta que o dano se identifica com a perda, ainda que parcial, “de elementos, ou de expressão, componente de sua estrutura de bens psíquicos, físicos, morais ou materiais”217. A definição apresentada pelo autor é bastante interessante na medida em que relaciona o dano com a invasão injusta da esfera jurídica do lesado, atingindo-se elementos tanto de seu complexo pecuniário como de seu complexo moral e pessoal.

Para Luiz Roldão Freitas Gomes, dano é toda lesão nos interesses de outrem, tutelados pela ordem jurídica, quer tais interesses sejam de ordem patrimonial, quer sejam de caráter não patrimonial 218. Anderson Schreiberressalta como vantagem dessa definição o fato de que ela possibilita o destaque do interesse lesado e não as consequências econômicas e morais. O dano moral, segundo o autor, é uma cláusula geral que permite ao magistrado determinar se o interesse lesado em questão merece proteção219. Essa visão do dano é a adotada para o prosseguimento do presente trabalho e a que se propugna que deveria ser considerada definição padrão de dano, de acordo com a concepção da responsabilidade civil atual.

A despeito das respeitáveis opiniões em sentido contrário, diverge-se dos doutrinadores que consideram o patrimônio apenas como o conjunto do acervo material220.

217 BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil – teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 1989. p. 8. 218 GOMES, Luiz Roldão de Freitas. Elementos de responsabilidade civil, p. 76. Maria Helena Diniz, na mesma toada, também menciona o fato de o dano ser pressuposto indispensável da responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, podendo ser dividido, não de acordo com a índole dos direitos subjetivos afetados, mas sim conforme os efeitos da lesão jurídica provocada (Curso de Direito Civil brasileiro: responsabilidade civil p. 58). Por fim, a autora o conceitua como “a lesão (diminuição ou destruição) que, devido a um certo evento, sofre uma pessoa, contra a sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral” (ibidem, p. 61). Severo também segue na mesma linha, conceituando-o como a lesão de interesses juridicamente protegidos, devendo o dano atingir um interesse legítimo e pessoal (SEVERO, Sérgio. Os danos extrapatrimoniais. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 224). Wilson Melo da Silva, após citar várias definições de dano dadas por diversos doutrinadores, conceitua o dano como diminuição ou subtração de um bem jurídico, sendo este amplamente considerado como o conjunto de haveres, patrimônio, honra e outros aspectos morais (O dano moral e sua reparação. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 324). Acrescenta que se definir o dano apenas como diminuição do patrimônio, considerando este como o conjunto dos direitos de valor econômico, seria, na linguagem de G. Formica (Dizionario pratico del diritto privato,