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CLASSIFICAÇÃO DE JOSÉ AFONSO DA SILVA

Esta classificação merece ser destacada em virtude de ser a utilizada por nossos tribunais superiores em suas decisões, bem como por grande parte dos certames públicos.

Esse estudo da aplicabilidade das normas constitucionais teve como origem a obra do professor José Afonso da Silva, Aplicabilidade das normas constitucionais, em 1967.

Segundo o autor, a teoria indicada por Rui Barbosa, retrocitada, e Pontes de Miranda estaria, hoje, superada, pois o debate científico da matéria seguiu a formulação italiana provocada por discussões acerca da aplicação da constituição daquele país, de 1948.

O autor centraliza o debate em torno da constituição como “sistema de normas jurídicas”,5 não como norma pura, desvinculada da realidade social e

Em um primeiro momento refere-se ao sentido sociológico da constituição, a partir do momento que ela é considerada obra com influência proveniente da realidade social e política. Isso faz com que o direito encontre nos fatos sociais base para sua normatividade. A constituição em sentido político refere-se ao fato de que ela é a própria decisão política fundamental. No sentido jurídico, a constituição nada mais é do que a norma jurídica fundamental. Essa seria a concepção do liberalismo e do racionalismo que deram origem ao constitucionalismo atual.

Seguindo ainda seu raciocínio, refere-se à aplicabilidade como sendo uma possibilidade de aplicação. Nada mais é do que a aplicação direta da norma ao caso concreto. Vigência, no sentido técnico-formal, nada mais é do que modo específico da existência da norma regularmente promulgada e publicada, com determinação certa para entrar em vigor.6

A teoria da aplicabilidade das normas constitucionais é iniciada a partir da imprecisão terminológica que as cerca. Isso não seria condição específica das normas dessa categoria, mas da ciência jurídica em geral.

As normas constitucionais pertencem à categoria de normas ius cogens, normas cogentes, taxativas.7 De outro lado, normas dispositivas também têm

eficácia e valor jurídico, mesmo as de caráter ideológico-programático.8 Isso

pode ser confirmado por recente decisão da ADPF n. 45, firmando o princípio da reserva do possível, conforme indicado a seguir.

A concretização de políticas públicas, quando previstas na CF, deve ser aferida pelo STF, a fim de não se abster de tornar efetivos os direitos econômicos, sociais e culturais. O desrespeito à Constituição tanto pode ocorrer mediante ação estatal quanto mediante inércia governamental. Apenas depois de atingi-los é que se poderá discutir, relativamente aos recursos remanescentes, em que outros projetos se deverá investir. O mínimo existencial, como se vê, associado ao estabelecimento de prioridades orçamentárias é capaz de conviver produtivamente com a reserva do possível. A cláusula da “reserva do possível” traduz-se no binômio: razoabilidade da pretensão e a disponibilidade financeira do Estado. Ainda que a formulação e a execução de políticas públicas dependam de opções políticas, reconhece-se que não se revela absoluta essa liberdade de conformação do legislador. Caso haja injustificável inércia estatal ou abusivo comportamento governamental em face das condições mínimas necessárias a uma existência digna e

essenciais à própria sobrevivência do indivíduo, aí, então, justificar-se-á a possibilidade de intervenção do Poder Judiciário, em ordem a viabilizar o acesso aos bens cuja fruição lhes haja sido injustamente recusada pelo Estado.9

Assim, não há norma constitucional destituída de eficácia. O que se admite é que ela não se manifeste na plenitude de seus efeitos jurídicos enquanto não houver normatividade infraconstitucional executória prevista ou requerida.10 Portanto é possível diferenciar as normas constitucionais somente

quanto ao grau de seus efeitos jurídicos.

José Afonso da Silva11 classificou as normas em:

Normas constitucionais de eficácia plena (direta, imediata e integral) – São aquelas que, desde sua entrada em vigor no texto constitucional, produzem todos os efeitos essenciais, ou tenham a possibilidade de produzi-los, porque o constituinte criou normatividade suficiente para que isso ocorresse. “Estabelecem conduta jurídica positiva ou negativa com comando certo e definido”.12 Exemplos típicos: arts. 15, 44, 45 e 76 da CF.

Normas constitucionais de eficácia contida (direta, imediata, mas não integral) – Incidem imediatamente e produzem – ou podem produzir – os efeitos jurídicos desejados. Contudo, há previsão de meios capazes de “manter sua eficácia contida em certos limites”. Destarte, conquanto se pareçam com aquelas (são de aplicabilidade imediata) sob o aspecto da aplicabilidade, delas se distanciam pela possibilidade de contenção de sua eficácia, mediante legislação futura ou outros meios; e, se assemelham às de eficácia limitada pela possibilidade de regulamentação legislativa.13

Exemplos típicos são os incisos VIII e XIII do art. 5º da CF.

Normas de eficácia limitada (indireta, mediata ou reduzida) – O constituinte cometeu ao legislador ordinário a tarefa de complementar as normas dessa categoria, seja porque não produziu normatividade suficiente para torná-las de eficácia plena ou por qualquer outro motivo; “são aquelas que dependem de outras providências para que possam surtir os efeitos essenciais colimados pelo legislador constituinte”.14

Mais adiante aponta que, pela simples leitura das constituições contemporâneas, é possível observar dois tipos diferenciados de normas de eficácia limitada:

Normas constitucionais de princípio institutivo ou organizativo – Aqui, o termo princípio designa começo ou início. São normas designativas de como deve se compor determinado órgão, entidade ou instituição, relegando à legislação infraconstitucional essa tarefa. Poderiam também ser conceituadas como normas de princípio orgânico ou organizativo.15 Exemplo típico é a

questão da organização administrativa e judiciária dos territórios que vierem a se formar (art. 33 da CF), assim como no § 2º do art. 90 que prevê a organização e o funcionamento do Conselho da República.

Normas constitucionais de princípio programático – Importante o fato remarcado pelo autor de que as constituições atuais são documentos jurídicos de compromisso “entre o liberalismo capitalista e o intervencionismo”,16 o que

significa dizer que existem dispositivos de liberdade econômica ao mesmo tempo que outros protegem os direitos do trabalhador, dos cidadãos etc. Assim, tais normas caracterizam-se por ter o constituinte traçado os princípios para serem cumpridos por seus órgãos (executivo, legislativo ou jurisdicional), tudo por meio de programas a serem implementados de forma a realizar os fins sociais do Estado. Como da espécie pode-se citar os arts. 21, IX, 48, IV, 184 e 215 da CF.