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4.1. Antecedentes

O habeas data, no Brasil, é inovação jurídica introduzida pelo art. 5º, LXXII, da CF de 1988, verbis:

LXXII – conceder-se-á habeas data:

a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público;

b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo;

A Lei n. 9.507, de 12.11.1997, regulamenta o remédio e estabelece o rito a ser aplicado. Da mesma forma que ao mandado de injunção, enquanto não existia regulamentação, aplicava-se a mesma relativa ao mandado de segurança (Lei n. 1.533/51, atualmente Lei n. 12.016/2009). O art. 8º estabelece que a petição inicial deve preencher os requisitos dos arts. 282 a 285 do atual Código de Processo Civil. Deve ser apresentada em duas vias. Os documentos que instruírem a primeira serão reproduzidos por cópia na segunda.

No direito norte-americano existem normas relacionadas à possibilidade do particular obter informações relacionadas à sua pessoa constantes de registros públicos ou privados por meio de norma específica: o Freedom of Information Act, reformado pelo Freedom of Information Reform Act; o primeiro de 1974 e o segundo de 1978.

4.2. Finalidades

A finalidade desse instrumento é dúplice: a primeira delas é a obtenção de dados, o termo data refere-se às informações que devem ser objeto da ação. Assim, a pessoa pode exigir da autoridade que proceda à informação acerca de sua pessoa constante em banco de dados públicos ou mesmo privados. Estes últimos são aqueles que têm interesse público, a exemplo da Serasa (Centralização de Serviços Bancários) e do SPC (Serviço de Proteção ao Crédito), consultados frequentemente por instituições de crédito.

Isso está prescrito no art. 1º da Lei n. 9.507/97, bem como no art. 43 do Código de Defesa do Consumidor, Lei n. 8.078/90, no sentido de considerar público o registro ou banco de dados contendo informações que sejam ou possam ser transmitidos a terceiros.

A possibilidade de obter informações, nas hipóteses do habeas data, cingem-se à pessoa do impetrante. Isso quer dizer que, além de pessoal, a informação refira-se à própria pessoa de quem ingressa com o mandamus. 4.3. Objeto do habeas data

O primeiro deles é disponibilizar a todos o amplo acesso aos bancos de dados públicos e privados (equiparados a públicos por força de lei), a fim de que possam obter informações relacionadas à sua pessoa.

Em segundo lugar, é plenamente possível constatar algum erro nos registros. Se isso ocorrer, o impetrante terá direito à retificação dos dados. Podendo até exigir a supressão, quando absoluto o equívoco.

Certamente não há necessidade de se ingressar com dois habeas corpus para tais finalidades. No primeiro, o juiz, constatada a passagem pela via administrativa sem obtenção dos dados, determinará a quem detenha os dados que os libere. Uma vez constatada a incorreção, determinará sua

exclusão ou retificação no mesmo processo. Não há necessidade de um novo habeas data para tanto.

4.4. Necessidade de recusa ao acesso às informações

O já citado art. 8º da Lei n. 9.507/97, nos termos dos incisos I, II e III, exige que a petição inicial seja instruída com a prova da recusa ao acesso às informações, do decurso de mais de dez dias sem decisão, da recusa em fazer- se a retificação ou da recusa em efetiva anotação.

Observou-se anteriormente que Di Pietro opina em sentido oposto. Considera inconstitucional o prévio esgotamento da via administrativa para interposição do habeas data. Moraes acertadamente infere que a exigência poderia ser excluída quando a pessoa decide ir diretamente ao Judiciário, sem ter passado pela instância administrativa. Na prática, tudo depende do Tribunal que recebe o mandamus.

4.5. Gratuidade do instrumento

O art. 5º, LXXVII, estabelece a gratuidade do habeas data, da mesma maneira que isentou o habeas corpus e todos os atos necessários ao exercício da cidadania. Não há incidência de custas, taxas, emolumentos ou quaisquer outros encargos relacionados aos processos judiciais em geral.

O art. 8º da Lei exige que a petição inicial do habeas data preencha os requisitos dos arts. 300 a 302 do CPC vigente, o que se traduz na imprescindibilidade de advogado para acompanhar o procedimento judicial. No administrativo, é possível o acompanhamento por um advogado, mas não é imprescindível. Há possibilidade de concessão de liminar desde que isso não acarrete a irreversibilidade dos efeitos da decisão.

4.6. O habeas data e o direito a informação, obtenção de certidões e sigilo

O remédio aqui analisado não pode ser confundido com a garantia ao direito à informação previsto no art. 5º, XXXIII, o qual permite a todos o recebimento dos órgãos públicos de informações relativas a seu interesse pessoal ou de interesse coletivo ou geral. Exceção feita, na parte final, para aquelas

relacionadas à segurança do Estado e da Sociedade, regulamentada pela Lei n. 11.111/2005.

Outra questão que se levanta é a existência ou não de sigilo no habeas data. Isto é, sendo os dados relacionados à própria pessoa, existe alguma informação que seja a ela inacessível? Motta e Barchet23 indicam posições contrárias à

manutenção de sigilo, pois se trata de informações relacionadas ao impetrante. Contudo, essa posição é minoritária. A predominante refere-se à manutenção de sigilo, mesmo que seja à própria pessoa, quando assim considerada dentro dos trâmites da retrocitada Lei n. 11.111/2005.

A informação objeto do habeas data diz respeito à pessoa do impetrante. As informações do art. 5º, XXXIII, são de interesse geral e coletivo e são materializadas por meio de certidões que conterão as informações desejadas.

Hely Lopes Meirelles reitera esse entendimento no seguinte sentido:

o habeas data não se confunde com a garantia constitucional de obter certidões, justificando-se pelo simples interesse, que não necessita de maiores motivações, do impetrante que deseja conhecer o teor dos dados e registros e eventualmente retificá-los. A doutrina dominante considera que só cabe a impetração se a autoridade se recusa a prestar as informações ou a fazer as correções em tempo razoável.24

4.7. Legitimidade ativa e natureza do remédio

Basicamente, o habeas data conecta-se a pessoas físicas. Contudo, não há como excluir as jurídicas dessa possibilidade, eis que também são incluídas nos bancos de dados de instituições que servem a estabelecimentos comerciais e financeiros.

Certamente as pessoas jurídicas, da mesma forma que as físicas, podem impetrar o habeas data, ou seja, possuem legitimação ativa. Estão aptas igualmente para requerer a retificação que se fizer oportuna no banco de dados que erroneamente tenha consignado dados, ulteriormente à verificação da informação.

O habeas data é ação constitucional de caráter civil. Seu intuito é revelar as informações relativas à pessoa do impetrante e retificá-los, se houver anotações errôneas ou incorreções relativas à pessoa. Pode ser interposto, como visto, perante repartições públicas e privadas, que sejam consideradas públicas por força de lei.

A interposição desse instrumento deveria ser personalíssima, como anota José Afonso da Silva.25 Pode ser interposto por estrangeiro. Cita decisão do

STJ, quando ainda era TFR, no sentido de permitir que o cônjuge supérstite e os herdeiros ingressem com habeas data a fim de impetrar o writ, pois injusto que o nome do falecido registre informações equivocadas ou errôneas, sem que elas possam ser retificadas, uma vez que haja tal constatação.

O habeas data é uma ação constitucional, de caráter civil, que tem por objeto a proteção de direito líquido e certo do impetrante a conhecer informações e registros relacionados à sua pessoa, consignados em repartições públicas ou particulares acessíveis ao público, para eventual retificação de seus dados.

4.8. Processamento do habeas data

Ao interpor-se a inicial, em duas vias, o advogado deve observar os requisitos exigidos pelos arts. 319 a 321 do CPC vigente e pela Lei n. 9.507/97. Deve instruí-la com os documentos já citados, ou seja, prova de esgotamento do recurso administrativo ou inobservância de prazo para a entrega das informações. Com sucesso, vários dispensam a prova de esgotamento da via administrativa, indicando na inicial que preferiram ingressar diretamente no Judiciário.

Apelação poderá ser interposta na hipótese de a autoridade judicial indeferir a inicial por constatar ausência de algum dos requisitos previstos na Lei; caberá dessa decisão recurso de apelação.

Ao dar andamento ao processo, o juiz determinará a notificação do coator, para que, em dez dias, preste as informações que julgar necessárias. Após o prazo, será ouvido o Ministério Público em cinco dias, e os autos seguem conclusos ao juiz, para que, também em cinco dias, se manifeste. Cabe apelação da sentença que concede ou nega o habeas data.

O parágrafo único do art. 15 da citada Lei regulamentadora dispõe que quando a sentença concede o remédio do habeas data, o recurso tem apenas efeito devolutivo. A execução da sentença, consequentemente, é imediata, mediante o cumprimento da determinação da autoridade judiciária. O presidente do Tribunal ao qual competir o conhecimento do recurso pode ordenar ao juiz, excepcionalmente e nos casos que sejam necessários, a suspensão da execução da sentença. De acordo com o art. 18, ainda tem-se que

“o pedido de habeas data poderá ser renovado se a decisão denegatória não lhe houver apreciado o mérito”.