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O conceito de área de figuras planas nos documentos oficiais brasileiros

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2 O CONCEITO DE ÁREA DE FIGURAS GEOMÉTRICAS PLANAS

2.2 O conceito de área de figuras planas nos documentos oficiais brasileiros

Há quase duas décadas, diversas recomendações curriculares para a Educação Básica, aqui no Brasil, têm valorizado a possibilidade de que cada saber a

ser ensinado deve ser tratado por meio de situações-problema, tentando estabelecer as conexões com outros saberes da própria matemática ou, até mesmo, de outras disciplinas. Também há uma orientação no sentido de o professor, em suas aulas, partir do cotidiano do aluno, abordar a história deste componente curricular e enfatizar a matemática presente na vida em sociedade (BRASIL, 1998).

Na década de 90, os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN (BRASIL, 1998) propõem que os conteúdos matemáticos do ensino fundamental sejam organizados em grandes blocos; um deles está destinado ao ensino das grandezas e medidas. Nesse bloco, estudam-se as grandezas físicas (tempo, temperatura, massa, etc.) e geométricas (comprimento, área e volume) e de suas medidas. Os autores ainda preconizam que os conteúdos sejam trabalhados de forma articulada, privilegiando as conexões intra-matemáticas, da matemática com outras disciplinas ou ainda com situações da vida cotidiana e das práticas sociais, o que avaliamos como positivo na proposta.

Concordamos com Bellemain e Lima (2000) quando afirmam que a indicação das Grandezas e Medidas como um bloco de conteúdos aponta para a consideração de que, ao lado dos números e da geometria, as grandezas físicas e geométricas devem ocupar, no plano conceitual, uma posição mais clara do que a que lhe tem sido atribuída no ensino da Matemática.

O bloco das grandezas e medidas é reconhecido nos PCN como um espaço apropriado para a articulação com outros domínios do conhecimento (Números e operações, Espaço e Forma, Tratamento da Informação) e, em particular, quando se trata de conteúdos relativos às grandezas geométricas, existem ricas possibilidades de interligações, proporcionando um vasto campo de tipos de tarefas “que permitem consolidar e ampliar a noção de número e possibilitar a aplicação de noções geométricas” (BRASIL, 1998, p.85). Vale salientar que as grandezas geométricas são abordadas nos PCN em todos os ciclos do ensino fundamental.

Segundo esse documento, é bastante frequente, nas tarefas que envolvem grandezas e medidas, os alunos confundirem noções de área e de perímetro ou estabelecerem relações incorretas entre elas. Enfatiza ainda que uma das possíveis razões para isso é que raramente os alunos são colocados perante tipos de tarefas em que as duas noções estejam presentes simultaneamente.

Olhando com a lupa da TAD, em relação ao conceito de área de figura geométrica plana, os Parâmetros Curriculares Nacionais distribuem da seguinte

forma: inicia-se com os tipos de tarefas ‘calcular área de figuras desenhadas em malha quadriculada’ e ‘comparar áreas de duas figuras sem o uso de fórmulas’, no 4º e 5º ano do ensino fundamental. Focaliza-se no 6º e 7º ano ‘calcular as medidas de área pela decomposição e/ou composição em figuras de áreas conhecidas’, enquanto que no 8º e 9º anos volta-se para a questão das fórmulas de áreas de figuras planas. No entanto, o documento alerta que, dependendo da forma como esse conceito é ensinado, ou seja, o tipo de tarefa e técnicas propostas, poderá fazer com que os alunos não compreendam efetivamente esse conceito.

Dessa forma, esse documento propõe que os tipos de tarefas envolvendo áreas de figuras planas devem ser baseados em técnicas que favoreçam a compreensão das noções envolvidas. Algumas dessas técnicas contribuem para a construção do conceito de área como grandeza. Por exemplo, obter, pelo processo de decomposição e recomposição, figuras que tenham a mesma área que uma figura inicial para as quais se dispõe de meio de cálculo de área usando uma fórmula conhecida. Esse tipo de técnica reforça a ideia que figuras distintas podem ter a mesma área, favorecendo a distinção entre os quadros geométricos e as grandezas. Por outro lado, técnicas de medida por contagem, estimativas e aproximações contribuem para a compreensão dos elementos envolvidos nas várias formas de medir área.

Baseados nos Parâmetros Curriculares Nacionais, o Estado de Pernambuco lançou em 2008 a Base Curricular Comum (BCC) para as redes públicas de ensino, na qual esquematiza as grandes linhas do currículo escolar. Esse documento, diferente dos Parâmetros Curriculares Nacionais, propõe que os conteúdos matemáticos para a Educação Básica sejam organizados em cinco domínios: Números e Operações, Álgebra e funções, Grandezas e Medidas, Geometria e Estatística, probabilidade e combinatória.

Em relação às Grandezas e Medidas, esse documento destaca a importância do estudo desse domínio desde os anos iniciais até o ensino médio. Salienta que “Convém destacar a necessidade de ligação do estudo das grandezas e medidas em situações do cotidiano do aluno” (PERNAMBUCO, 2008, p.87) e afirma que é fundamental a vivência de tipos de tarefas que levem o aluno a comparar grandezas, sem recorrer a medições, principalmente nos anos iniciais de escolarização.

Quanto às grandezas geométricas, a BCC-PE (Base Curricular Comum do Estado de Pernambuco) orienta que, nos anos finais, o tipo de tarefa deve ser

ampliado no sentido de buscar a “dissociação entre as figuras (triângulo, quadrilátero, etc), as grandezas associadas à figura (3m, 4 cm2, 12m3, 30º, etc.) e o número associado à medição dessas grandezas (4, 12, 30, etc.)” (PERNAMBUCO, 2008, p. 100). Essa recomendação vai ao encontro da concepção de área adotada nessa tese, que é de considerar área como uma grandeza geométrica autônoma.

Na BCC-PE o conceito de área de figuras geométricas planas está inserido no domínio das Grandezas e Medidas, mas não apresenta claramente em que ano de escolaridade pode ser trabalhado e o que poderá ser estudado. Acreditamos que, por isto, este documento tenha sido ampliado.

Expandindo a discussão sobre o currículo para a Educação Básica, o Estado de Pernambuco avança e elabora um referencial norteador intitulado Parâmetros para a Educação Básica, que, além de apresentar uma reflexão sobre o estatuto da matemática, seu papel neste nível de escolaridade, a matemática e o fazer matemático na sala de aula, também apresenta as expectativas25 de aprendizagem para cada ano.

Esse documento mantém a organização curricular da BCC-PE em relação aos domínios de conteúdos matemáticos, ou seja, Geometria, Estatística e Probabilidade, Álgebra e Funções, Grandezas e Medidas, Números e Operações. No entanto orienta ao professor que:

É importante que, ao ensinar Matemática, o professor não isole os conteúdos em blocos estanques e autossuficientes e leve em conta que a aprendizagem é mais eficiente quando os conteúdos são revisitados, de forma progressivamente ampliada e aprofundada, durante todo o percurso escolar (PERNAMBUCO, 2012, p. 14).

Em relação às Grandezas e Medidas, esse documento argumenta que frequentemente é dada excessiva importância a tipos de tarefas que necessitam de conversão de unidades de medidas e aplicações de fórmulas, o que causa, muitas vezes, dificuldades na aprendizagem. Assim defende que se estabeleçam tarefas nas quais os estudantes sejam estimulados a compreender o significado das grandezas e desenvolvam a capacidade de estimar medidas, desde os anos iniciais.

Quanto ao conceito de área de figuras geométricas planas, a orientação dos Parâmetros para a Educação Básica do Estado de Pernambuco é a de que esse

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O termo expectativas é tomado em seu sentido etimológico de espera, ou seja, expectativa de aprendizagem é aquilo que “esperamos que nosso estudante aprenda” (PERNAMBUCO, 2012, p.13).

conhecimento deve ser visto a partir do 3º ano do ensino fundamental. Inicialmente com tipos de tarefas de comparar área de duas figuras planas recorrendo às relações entre elas ou à decomposição e composição, até o estudante ter “condições necessárias para a compreensão de demonstrações mais elaboradas que conduzam a fórmulas para o cálculo de áreas e de volumes de figuras geométricas” (PERNAMBUCO, 2012, p. 134).

Especificamente no Município de Paulista26- PE foi elaborada uma Base Curricular da Rede Municipal de Ensino, inspirada nos PCN, com o objetivo de “oferecer subsídios para o trabalho didático pedagógico e colaborar na consolidação das escolas públicas municipais do Paulista como espaços inclusivos e de qualidade” (PAULISTA, 2012, p.14).

O documento citado acima, não configura um currículo único ou mínimo, mas nele estão identificadas as competências27 a serem desenvolvidas por todos os estudantes da Educação Básica Municipal. Também argumenta que as diretrizes são amplas e flexíveis, mas que são obrigatórias.

Este documento organiza os conteúdos de matemática em quatro domínios: Números e Operações Numéricas, Grandezas e Medidas, Espaço e Forma e Tratamento da Informação (Estatística e Estudo de Probabilidade). Cada domínio apresenta as competências que deverão ser desenvolvidas pelos estudantes de acordo com o ano de escolarização.

Em relação ao domínio das Grandezas e Medidas, são elencadas competências da Educação Infantil até o 9º ano. Nas orientações do documento fica claro que, na Educação Infantil, no “trabalho acerca das grandezas, deve-se priorizar diferentes procedimentos para compará-las, sendo introduzidas noções de medidas de comprimento, peso, volume e tempo, utilizando-se de unidades convencionais e não convencionais” (PAULISTA, 2012, p.207). No entanto, ao verificar as competências do domínio Grandezas e Medidas, percebemos que não há indicativo de utilizar unidades convencionais nesse período, e sim, estratégias pessoais de medida.

Nas orientações sobre o domínio das Grandezas e Medidas para o ensino fundamental, percebemos uma grande confusão relativa à grandeza e à sua medida.

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Como o contexto da nossa pesquisa aconteceu no município do Paulista/PE optamos por analisar, também, as orientações curriculares do referido município.

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Segundo a Base Curricular da Rede Municipal (PAULISTA, 2012, p.211) “É importante saber, de início, que as grandezas (comprimento, massa, tempo, capacidade, temperatura, etc.) e medidas (velocidade, energia elétrica, densidade demográfica) estão presentes em quase todas as atividades da vida em sociedade”. Discordamos do comentário acima em que, por exemplo, a velocidade é considerada como uma medida e não como grandeza. Nesse caso, entendemos que a velocidade é uma grandeza física que pode ser comparada e medida.

Quanto ao conceito de área de figuras geométricas planas, encontramos duas competências referentes a esse assunto nesse documento. A primeira, “calcular medidas usando malhas quadrangulares e triangulares, relacionando unidades de medida a áreas e perímetros de figuras planas”. Essa atividade é sugerida para ser vivenciada a partir do 4º ano e, a segunda, “construir e aplicar fórmulas (área, perímetro, volume, densidade e velocidade), desenvolvendo mecanismos de reconstrução de procedimentos formais e usos dos mesmos em situações- problema”, para ser trabalhada a partir do 6º ano do ensino fundamental.

A Base Curricular municipal parece andar em vias contrárias às orientações dos demais documentos apresentados tanto na esfera nacional quanto na estadual. O que esses documentos preconizam é que, a partir dos tipos de tarefas envolvendo comparações, estimativas e usos de unidades de medidas não convencionais, o estudante compreenda o conceito de grandeza e distinga entre o objeto matemático, a grandeza e a medida da grandeza. Por outro lado, na proposta municipal, espera- se que eles, a partir do 6º ano do ensino fundamental, construam e apliquem fórmulas desenvolvendo estruturas de reconstrução de técnicas formais, o que não permite, a nosso ver, uma construção mais significativa do conceito pelo aluno.

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