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O conceito de área de figuras planas nas pesquisas científicas

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2 O CONCEITO DE ÁREA DE FIGURAS GEOMÉTRICAS PLANAS

2.1 O conceito de área de figuras planas nas pesquisas científicas

O conceito de área, além de ser um conteúdo que motiva bem os alunos nas aulas de matemática, devido à possibilidade de contextos diferenciados, seja no resgate dos conhecimentos prévios oriundos da presença na prática social, seja na abordagem de outras disciplinas ou em outros conteúdos da própria matemática, também motiva diversos pesquisadores a se debruçarem sobre questões relativas tanto ao processo de ensino e da aprendizagem, quanto de resultados de avaliações institucionais referentes a esse conceito.

Destacamos aqui um grupo de pesquisa da Universidade Federal de Pernambuco, Brasil, intitulado Grupo Pró-Grandeza, que há mais de 10 anos vem aprofundando a compreensão de fenômenos didáticos relativos às grandezas e medidas, em especial área de figuras geométricas planas na qual se baseiam, inicialmente, nas ideias de Douady e Perrin Glorian (1989), posteriormente em Baltar (1996), Bellemain e Lima (2002) e outros colaboradores.

Resultados de pesquisas deste grupo destaca que, em avaliações de rede na França, os alunos, no nível equivalente do 4º ao 7º anos do ensino fundamental

brasileiro, tinham geralmente aproveitamento inferior a 50% nas questões sobre os conceitos de área e perímetro. Essa pesquisa revelou também que os erros mais frequentes entre os alunos avaliados são: confusão entre área e perímetro, uso inadequado de unidades e utilização de fórmulas errôneas (BALTAR, 1996).

Aqui no Brasil, avaliações institucionais tal qual as do Sistema de Avaliação Educacional de Pernambuco - SAEPE (2011) apresentam tipos de tarefas de níveis diferentes na mesma prova cujo objetivo é avaliar qual o desempenho dos alunos em cada questão, independente do nível de escolaridade. Os resultados têm revelado que, quando os alunos do 9º ano são solicitados a resolver tipos de tarefas envolvendo área de figuras planas no nível de sua escolaridade, o aproveitamento é inferior a 44%.

Esses resultados poderão estar revelando problemas conceituais e didáticos e, por isso, vêm sendo alvo de diversas investigações nacionais (SILVA, 2011; FERREIRA, 2010; CAVALCANTI, 2010; ARAUJO & CAMARA DOS SANTOS, 2009; HASSAN & HEALY, 2010; SILVA, 2009; BALDINI, 2004) e internacionais (DOUADY & PERRIN-GLORIAN, 1989; BALTAR, 1996; BATURO & NASON, 1996; COMITI & BALTAR, 1997; CHANDREQUE, 1998; COBO & FORTUNY, 2000; D’AMORE & FANDIÑO, 2007; KORDAKI, 2003; TSAMIR, 2007; KOSPENTARIS et al, 2011; ANWANDTER-CUELLAR, 2012).

Todas as pesquisas têm por finalidade mais ampla produzir conhecimento no sentido de desvelar as causas das dificuldades no conceito de área, seja por parte dos alunos ou de professores. Algumas pesquisas também analisam a abordagem de livros didáticos ou elaboram e experimentam sequências de atividades como propostas de melhoria no processo de ensino e de aprendizagem desse conceito. Essas pesquisas são geralmente publicadas em anais de eventos, revistas, jornais, boletins ou livros.

Pesquisas realizadas em Moçambique, com alunos do ensino fundamental, a respeito de como as crianças resolvem o tipo de tarefa “comparar área de figuras planas”, mostram que elas utilizam técnicas de percepção visual, contagem, superposição e decomposição, mas também utilizam medidas de comprimento não pertinentes, confundindo área com o perímetro (CHANDREQUE, 1998 apud PERRIN GLORIAN, 2001) confirmando as hipóteses dos documentos oficiais brasileiros.

Na Austrália, a pesquisa de Baturo e Nason (1996) realizada com professores em formação inicial a respeito das suas próprias concepções de área e as suas ideias sobre o que deve ser ensinado aos alunos revelam que, mesmo sabendo operar corretamente, eles confundem as unidades de medida, o que vem a reforçar a valorização da técnica sem a compreensão do conceito, ou seja, os elementos tecnológico-teóricos são poucos evidenciados. A hipótese dos pesquisadores para as dificuldades apresentadas é que elas poderão ter sua origem na escola, visto que esta apresenta uma tendência em focalizar o aspecto numérico e a introdução precoce do uso de fórmulas, como técnica para a resolução do tipo de tarefa “calcular as medidas de áreas de figuras planas”.

Aqui no Brasil, outra pesquisa que destacamos e que foi realizada com alunos do curso normal médio (futuros professores de nível equivalente ao primeiro e segundo ciclos do ensino fundamental) foi a de Duarte e Santos (1997), na qual se investigou uma sequência de atividades para a construção do conceito de área. Os resultados indicaram que os próprios professores em formação apresentaram dificuldade no tipo de tarefa “comparar área e perímetro sem a utilização de medidas”. Eles também utilizaram técnicas errôneas, segundo as quais, área e perímetro variavam no mesmo sentido.

Na pesquisa de Duarte (2002), o objetivo foi diagnosticar as técnicas utilizadas pelos alunos da 5ª série (6º ano) do ensino fundamental em relação ao conceito de área, propondo situações de comparação, medida e produção de superfícies. A análise dos resultados indicou uma dificuldade nas tarefas de comparação e produção de áreas sem medidas, pois os alunos não conseguiam diferenciar área e número, assim como superfície e área. Logo, não aceitavam que figuras diferentes podem ter a mesma área. Esses dados confirmam o que foi relatado nas pesquisas de Douady e Perrin-Glorian (1989) realizadas na França e que veremos mais adiante.

A pesquisa de Pessoa (2010), cujo objetivo era diagnosticar as técnicas utilizadas por estudantes do 6º ano do ensino fundamental na resolução do tipo de tarefa “determinar a medida de área de figuras planas em malhas quadriculadas”, detectou que os alunos apresentavam desempenho satisfatório quando as tarefas exigiam apenas a técnica de contagem dos quadradinhos na malha, no entanto quando era solicitada a visualização de uma figura ladrilhável, eles apresentavam grandes dificuldades. A autora também observou que, assim como nos estudos de

Douady e Perrin-Glorian (1989) e Bellemain e Lima (2002), os alunos apresentam dificuldade em dissociar a área do perímetro. Embora o tipo de tarefa seja calcular a medida de área, eles determinam o perímetro.

A pesquisa de Secco (2007) teve por objetivo investigar por meio da técnica de compor e decompor figuras planas, até a demonstração das fórmulas (tecnologia), como o conceito de área pode ser apresentado de maneira significativa e motivadora aos alunos do 9º ano do ensino fundamental. Para isso, o autor propõe uma sequência didática dividida em três blocos, sendo um com tipo de tarefas empíricas, outro com uso do software Cabri-Géomètre e o último com tipo de tarefas dedutivas para o estudo das fórmulas.

As análises de experimentação da sequência mostraram que o processo de reconfiguração de figuras poligonais planas contribuiu para a apropriação do conceito de área e que esse processo foi significativamente favorável à passagem do empírico para o dedutivo. Tipos de tarefas como essas corroboram com o pensamento de Douady & Perrin Glorian, no sentido que não devemos introduzir técnicas com uso de fórmulas para calcular a medida de área sem que o aluno compreenda o conceito de área de figuras geométricas planas.

Em relação à elaboração e à experimentação de sequências de atividades relativas ao conceito de área, destacamos a pesquisa de Moreira (2010), com foco na formação inicial de professores de matemática, apresentando uma proposta de intervenção didática a partir da abordagem presente nos Elementos de Euclides e a abordagem de Facco (2003), que também apresenta uma proposta de ensino e uma reflexão sobre a aprendizagem do conceito de área a professores do 6º ao 9º ano do ensino fundamental em formação continuada. A sequência didática envolvia técnicas de decomposição e composição de figuras planas. Em ambos os casos, os resultados alcançados apontam no sentido de uma contribuição positiva das abordagens didáticas experimentadas.

Há pesquisas aqui no Brasil, que exploram a análise dos livros didáticos, como podemos destacar a pesquisa de Santos e Bellemain (2007), que analisaram uma coleção de livros didáticos e perceberam que nela havia algumas regularidades na abordagem da figura do paralelogramo e da área dessa figura, as quais correspondem a valores das variáveis didáticas privilegiadas. Verificaram, inclusive, poucas tarefas envolvendo comparação de áreas sem utilizar medidas. Perceberam,

além disso, que alguns tipos de tarefas reforçavam as concepções numéricas e geométricas e que existe pouca ênfase na noção de área enquanto grandeza.

Também considerando livros didáticos, destacamos a pesquisa de Silva (2011), que tinha por objetivo analisar as abordagens de comprimento, de perímetro e de área em livros didáticos do 6º ano do ensino fundamental, aprovados no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) de 2008 e de 2011 à luz da Teoria Antropológica do Didático (TAD). Os resultados dessa pesquisa indicaram que, na maioria das obras, a ênfase nas grandezas geométricas é insuficiente e o foco é na medida e não na grandeza. Especificamente em relação ao conceito de área de figuras planas, observou-se que o tipo de tarefa predominante é calcular a medida da área, cujas técnicas utilizadas são a contagem da quantidade de superfícies unitárias necessárias para ladrilhar a figura e o uso de fórmulas. Já o bloco tecnológico-teórico se apoia essencialmente nas operações fundamentais com números racionais escritos na forma decimal, nas propriedades das figuras geométricas e no campo das grandezas e medidas.

Ainda explorando livros didáticos, temos a pesquisa de Carvalho (2012) que teve como uma das metas investigar como era abordado o conteúdo de área, no Guia de Estudo do aluno do Programa Projovem Urbano. Para isso, ele adotou como quadro teórico e metodológico a Teoria Antropológica do Didático. Os resultados indicaram que a palavra área aparece no material com diversos sentidos e em várias ocasiões, tanto no estudo da matemática como nos demais componentes curriculares. O cálculo da medida de área do retângulo se destaca em relação a outros tipos de tarefa. Duas técnicas podem ser identificadas no Guia de Estudo para resolver tarefas do tipo calcular a medida da área de um retângulo, mas o grau de explicitação dessas técnicas é baixo.

Existem ainda pesquisas que associam mais de um objeto de estudo. Neste caso, destacamos a de Santos (2005), que teve por objetivo investigar as possíveis relações entre a abordagem da área do paralelogramo em uma coleção de livros didáticos para as séries finais do ensino fundamental e as técnicas utilizadas pelos alunos de uma 8ª série na resolução de tipos de tarefas relativos a esse tema.

Os resultados da pesquisa acima indicaram entre outras convergências que, tanto na coleção como nas técnicas dos alunos, há indícios da importância do uso das figuras como suporte de representação. Os resultados também apresentam divergências no sentido de o livro escolher trabalhar inicialmente área com medida

e, posteriormente, com técnicas de composição e decomposição. Esperava-se que os alunos pesquisados, usuários do livro didático, apresentassem dificuldades relativas à dissociação entre comprimento e área. No entanto, os alunos distinguem nos tipos de tarefas propostos essas duas grandezas.

Outra pesquisa que associa mais de um objeto de estudo é a de Teles (2007) que investigou imbricações entre os campos conceituais das grandezas, da geometria, bem como no campo numérico, algébrico e funcional na Matemática Escolar, na formulação e no tratamento de tipos de tarefas envolvendo as fórmulas do cálculo de área de figuras planas. Para isso, essa autora analisou a mobilização de invariantes operatórios e representações simbólicas nas técnicas de resolução de alunos e as estratégias utilizadas para o cálculo da medida de área do retângulo em duas coleções de livros didáticos para o ensino fundamental. A análise dos resultados indica que a técnica principal para o cálculo da medida da área do retângulo é a multiplicação das medidas dos comprimentos dos lados.

Na França, a pesquisa de Anwandter- Cuellar (2012) tinha como proposta estudar o lugar e o papel das grandezas na construção de diferentes domínios matemáticos, funcionais, numéricos e geométricos em suas inter-relações na escola, bem como o estabelecimento de um filtro no campo das grandezas, ou seja, tanto estabelecer um quadro para analisar os elementos do ensino dos objetos matemáticos como tomar “cada entrada de maneira relativamente independente, de modo a compor uma análise em que os vários componentes se cruzam e se complementam” (BELLEMAIN, 2013, p. 25). A metodologia envolveu o estudo do livro didático, da prática do professor e do conhecimento aprendido pelos alunos (equivalentes ao 6º e 7º ano do ensino fundamental brasileiro) em relação ao domínio das grandezas. Os resultados da pesquisa permitiram observar dinâmicas internas entre os diferentes domínios no estudo realizado com o conceito de proporcionalidade. Verificou também uma dinâmica dentro do domínio da grandeza área, a qual foi utilizada na escola. Também, criou o filtro das grandezas que serviu de base para outras pesquisas.

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