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Conceitos de Desenvolvimento

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INTEGRANDO O CONCEITO DE AGRUPAMENTOS DE EMPRESAS ÀS CONCEPÇÕES DE DESENVOLVIMENTO

1.1 Conceitos de Desenvolvimento

As causas do desenvolvimento econômico de um país ou região constituem-se em um tema que vem sendo debatido desde séculos anteriores. Conforme considerações de Pavarina (2003), tal discussão origina-se de autores que não tinham como meta em seus estudos uma análise específica sobre a questão. Assim, estudos como os de François Quesnay, David Ricardo e Adam Smith, sem referirem-se diretamente ao problema do desenvolvimento, lançavam seus questionamentos iniciais. Neste sentido, é importante citar a observação de Sen (1995, p. 10), considerando a obra mais importante de Adam Smith, que “[...] um tratado sobre a natureza e as causas da riqueza das nações era, de fato, também um questionamento sobre os assuntos básicos do desenvolvimento econômico”.

Verifica-se um esforço, desde então, no sentido de definir o termo “desenvolvimento econômico”, ensejando, assim, certa negligência no que diz respeito à compreensão exata de seus condicionantes. Ainda que sejam várias as definições encontradas na literatura, todas são unânimes em concordar, pelo menos, que o desenvolvimento econômico está relacionado à melhoria nas condições de vida ou no bem-estar das pessoas.

Nas décadas de 1950 e 1960, do século XX, a evolução teórica sobre o desenvolvimento ficou limitada à análise das causas do aumento do produto ou da renda nacional per capita, como elementos representativos desta “melhoria na condição de vida”. Antes da incorporação de novos elementos e os avanços tecnológicos, os determinantes do crescimento com os do desenvolvimento econômico eram considerados sinônimos.

Sen (2000, p. 17), entretanto, propõe uma ampliação da definição. Para o autor “o desenvolvimento é como um processo de expansão das liberdades reais que as pessoas desfrutam”, sendo que o Produto Nacional ou a Renda per capita deve-se restringir como um “[...] meio de expandir as liberdades desfrutadas pelos membros da sociedade” e tais liberdades não devem limitar-se à acumulação de riqueza ou ao crescimento das demais variáveis relacionadas à renda, mas dependem igualmente dos direitos civis, políticos e sociais, incluindo capacidades elementares como, por exemplo, “[...] ter condição de evitar privações como a fome, a subnutrição, a morbidez evitável e a morte prematura, bem como as liberdades associadas a saber ler e fazer cálculos aritméticos, ter participação política e liberdade de expressão” (SEN, 2000, p. 52). Desta forma, o crescimento econômico torna-se um meio relevante para o desenvolvimento econômico, mas não um fim em si mesmo.

Conforme assinala Pavarina (2003), uma das discussões clássicas a respeito deste tópico vincula o aumento no Produto Nacional, coeteris paribus, à melhora das condições de vida dos indivíduos, notadamente a esperança de vida. Na ótica de Sen (1995), esta relação encerra uma problemática substancial: a esperança de vida pode ser considerada uma medida de quantidade e não de qualidade de vida das pessoas, ao mesmo tempo em que o crescimento do Produto Nacional tomado como uma variável relacionada com o aumento médio, não significa, portanto, apropriação homogênea por toda a população.

Outro aspecto analisado por Sen (1995), diz respeito ao fato de que o Produto Nacional elenca somente bens transacionados no mercado, imputando-lhes determinado preço. São excluídos elementos aos quais a atribuição de um preço é impossível, tais como o ambiente

natural, social e físico, que podem influenciar ou mesmo determinar as condições de sobrevivência da população. Uma vez que dezenas de variáveis podem estar relacionadas à melhoria das condições de vida dos indivíduos, um conceito amplo de desenvolvimento não pode ignorá-las, conforme aponta Sen (1995):

[...] o processo de desenvolvimento econômico não pode abstrair da expansão da oferta de comida, vestuário, moradia, serviços médicos, educacionais etc. e da transformação da estrutura produtiva e essas mudanças importantes e cruciais são sem dúvida questões de crescimento econômico. (SEN, 1995, p. 12).

Da mesma forma, Dasgupta (1990) considera que o desenvolvimento não pode limitar- se à posse de bens físicos ou outros incluídos na análise tradicional. A garantia de liberdades individuais precisa ser levada em consideração, apesar de a teoria econômica dispensar pouco interesse a essas questões, quer seja por processos metodológicos ou simples irrelevância ou menosprezo (PAVARINA, 2003).

Assim, de forma que possamos continuar esta análise bibliográfica dos conceitos de desenvolvimento, principalmente na América Latina, é importante considerar que o tema abrange um amplo escopo analítico, notadamente no que diz respeito aos aspectos metodológicos, tendo- se em mente que o crescimento econômico é apenas um dentre os múltiplos aspectos do desenvolvimento econômico.

Neste contexto, lembramos de Albert O. Hirschman, que apresentou uma grande contribuição para as teorias do desenvolvimento econômico e para a economia. A própria trajetória de vida do autor contribuiu no sentido de entender as direções da sua produção científica. Dentre a vasta bibliografia, encontramos “Estratégia do Desenvolvimento Econômico”, cuja obra foi publicada em 1958 e analisava o tema do desenvolvimento econômico dos países subdesenvolvidos e de como colocá-lo efetivamente em prática.

O referido livro é sobremaneira citado, principalmente, pela abordagem conceitual conhecida como “encadeamentos para frente e para trás”. Tal conceito seria a grande contribuição de Hirschman para a economia em geral e para as teorias do desenvolvimento, especificamente. Em outro trabalho, cujo título é “A estratégia do desenvolvimento revisitado”, ele destaca a sua experiência profissional no Federal Reserve, na ocasião da reconstrução da Europa Ocidental, que o fez descrente a respeitos dos benefícios de uma intervenção estrangeira em países em crise, fazendo alusão à intervenção americana imposta aos países europeus.

Foi nesse ambiente de discordância que Hirschman parte para a Colômbia, prestando serviços para o Banco Mundial. Nessa ocasião, preferiu participar e aprofundar os estudos sobre desenvolvimento que estavam em curso naquele país a aplicar alguma receita estrangeira, com

dados pouco confiáveis, oriundos dos EUA e do Banco Mundial. Dessa forma, adotou uma metodologia específica para resolver os problemas colombianos, que o autor denominou de procura por possíveis “racionalidades ocultas”. Tais estudos levaram-no a concluir que o desenvolvimento econômico dos países periféricos seria fruto de mecanismos de pressão, haja vista que foram identificados gargalos na economia colombiana, excessos de oferta e demanda e o crescimento não-equilibrado, como indutores do desenvolvimento econômico daquela nação.

Assim, verifica-se que as sua trajetória teórica está bastante relacionada com a sua história de vida e que a construção do conceito de “encadeamentos para frente e para trás” está diretamente ligada à idéia dos ditos “mecanismos de pressão”.

Uma das conclusões a que chega Hirschman é a de que nos países subdesenvolvidos não havia escassez de fatores de produção. Ou seja, não faltava capital, trabalho, recursos naturais ou qualquer outro fator, mas sim uma escassez disfarçada, uma oferta sub-utilizada, de tais fatores. Em sua análise, argumenta que a vantagem desse tipo de abordagem seria a de poupar tempo, ao cessar a busca inútil pelos inúmeros pré-requisitos necessários ao desenvolvimento e de concentrar a atenção em uma questão apenas. Isso diferencia a sua pesquisa das outras teorias do desenvolvimento econômico até então existentes. A questão passa a ser a seguinte: como utilizar os fatores de produção sub-utilizados nessas economias?

No entanto, o próprio Hirschman reconhece que este caminho não é tão fácil, uma vez que lidaria com questões desconhecidas, inexploradas, e, por isso mesmo, complicadas à primeira vista.

Outra abordagem interessante é a que o autor analisa sob a ótica da transformação social das sociedades “estacionárias”, dos países subdesenvolvidos. Neste caso, Hirschman propõe a conciliação entre a atividade empreendedora individual e a capacidade de cooperação e inclusão social no processo de desenvolvimento, de forma que as pessoas percebam os benefícios mútuos de tal cooperação para o bem de toda a sociedade. No entanto, ele mesmo destaca que tal visão de transformação só poderia ser adquirida durante o próprio processo de desenvolvimento.

O diagnóstico do subdesenvolvimento feito por Hirschman apontava para a incapacidade de tomar decisões nessas sociedades. Ou seja, todos os fatores de produção necessários para promover o desenvolvimento seriam reduzidos a apenas um, que condicionaria os outros, conforme já foi dito: a capacidade de tomar decisões.

Outra concepção de desenvolvimento, numa visão mais espacial/local, foi desenvolvida por Barquero (1988), que define desenvolvimento econômico local como um processo de crescimento e mudança estrutural que, mediante a utilização do potencial de desenvolvimento existente no território, conduz à melhoria do bem-estar das pessoas de uma localidade ou região. Quando a comunidade local é capaz de liderar o processo de mudança estrutural, aí fica caracterizado o desenvolvimento local endógeno.

A hipótese de partida é que as localidades e territórios têm um conjunto de recursos (econômicos, humanos, institucionais e culturais) e de economias de escala não exploradas que constituem seu potencial de desenvolvimento. Cada localidade ou território se caracteriza, por exemplo, por uma determinada estrutura produtiva, um mercado de trabalho, um sistema produtivo, uma capacidade empresarial e conhecimento tecnológico, uma dotação de recursos naturais e infra-estruturas, um sistema social e político, uma tradição e cultura, sobre os quais se articulam os processos de crescimento econômico local.

Este conceito de desenvolvimento reúne um conjunto de traços e características que lhes dão uma configuração específica. Neste sentido, Barquero (1988) observa que o desenvolvimento local faz referência a processos de acumulação de capital nas localidades. A disponibilidade da oferta de mão-de-obra suficientemente qualificada para as tarefas que realiza, unida à capacidade empresarial e organizacional, fortemente articulada à tradição produtiva local e a uma cultura atenta para as inovações, favorecem a acumulação de capital nos sistemas produtivos locais.

Trata-se de processo de desenvolvimento econômico que se caracteriza pela organização sistêmica das unidades de produção, favorecendo a competitividade das empresas locais nos mercados nacionais e internacionais. A organização do sistema produtivo local formando redes de empresas propicia a geração de economias de escala e a redução dos custos de transação e, portanto, rendimentos crescentes e crescimento econômico.

Barquero (1988) ainda informa que os processos de desenvolvimento se produzem graças à utilização eficiente do potencial econômico local que se vê facilitado pelo funcionamento adequado das instituições e mecanismos de regulação do território. A forma de organização produtiva, as estruturas familiares e tradições locais, a estrutura social e cultural e os códigos de conduta da população condicionam os processos de desenvolvimento local.

Assim, o desenvolvimento local obedece a uma visão territorial (e não funcional) dos processos de crescimento (FRIEDMAN e WEABER, 1979), que parte das hipóteses de que o

território não é um mero suporte físico dos objetos, atividades e processos econômicos, mas um agente de transformação social. Os autores lembram que cada região se vincula ao sistema de relações econômicas do país em função da sua especificidade territorial e de sua identidade econômica, política, social e cultural4.

Autores como Stöhr (1985), entendem que o conceito de desenvolvimento local concede um papel predominante para as empresas, organizações, instituições locais e à sociedade civil nos processos de crescimento e mudança estrutural, onde os atores locais, públicos e privados, são os responsáveis pelas ações de investimento e de controle dos processos.

Nesta perspectiva do desenvolvimento, Arocena (1995) indica que o social se integra com o econômico. A distribuição da renda e da riqueza e o crescimento econômico não são dois processos que surgem e tomam forma de maneira paralela, mas adquirem uma dinâmica comum pelo fato de os atores públicos e privados assumirem decisões de investimentos orientadas para resolver os problemas locais, afetando as empresas e a economia local, fazendo com que este seja um espaço em que as iniciativas dos diversos atores da sociedade organizada se fazem realidade.

Barquero (1988) conclui sua análise informando que o desenvolvimento econômico é um processo de crescimento e mudança estrutural da economia de uma região, em que se pode identificar, pelo menos, três dimensões: uma econômica, caracterizada por um sistema de produção que permite aos empresários locais usar, eficientemente, os fatores produtivos, gerar economias de escala e aumentar a produtividade a níveis que permitem melhorar a competitividade nos mercados; outra sociocultural, em que o sistema de relações econômicas e sociais, as instituições locais e os valores servem de base para o desenvolvimento; e outra, política e administrativa, em que as iniciativas locais criam um entorno local favorável à produção e impulsionam o desenvolvimento sustentável.

Barquero (1997b) vai mais além quando informa que:

Esta conceitualização do desenvolvimento local constitui um modelo alternativo ao proposto pelo paradigma do desenvolvimento exógeno, dominante durante os anos 50 e 60, segundo o qual o crescimento se apoiaria nos processos de industrialização e na concentração da atividade produtiva, através de grandes plantas, em um número reduzido de grandes centros urbanos, a partir dos quais

4 É importante ressaltar as contribuições de Amaral Filho (2002), que oferece, em seu artigo “Desenvolvimento Regional Endógeno em um

Ambiente Federalista”, uma proposta de reconstrução do conceito e da política de desenvolvimento regional, numa perspectiva endógena, objetivando forjar um conceito mais agregado e, para isso, procurando aproximar as abordagens regional (ou local) e macroeconômica, ao mesmo tempo em que introduz o ambiente federalista como elemento de coordenação das iniciativas locais.

os mecanismos de mercado o difundiriam, favorecendo o desenvolvimento das cidades e regiões periféricas. (BARQUERO, 1997b, p. 51).

Por um lado, verifica-se que o modelo de desenvolvimento local se produz como conseqüência da geração de economias externas, devido a três fatores: as economias de escala na produção, a introdução de inovações por parte das empresas líderes e o fluxo de mão-de-obra excedente das atividades tradicionais às mais modernas.

No entanto, diferencia-se dele, pelo menos, em quatro aspectos: o desenvolvimento pode ser também difuso (e não concentrado nas grandes cidades); os sistemas locais de empresas podem liderar os processos de crescimento e mudança estrutural ao gerar economias de escala e reduzir os custos de transação como as grandes empresas; as formas de organização social e o sistema de valores locais flexibilizam os mercados de trabalho e permitem às empresas locais trabalhar com baixos custos de produção e, em particular, com salários relativamente baixos e; por último, a sociedade civil exerce um controle crescente dos processos de desenvolvimento das localidades e regiões. (BARQUERO, 1997b).

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