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Conflito aparente de normas: art 303, § 2º e art 304, § 1º, do CPC

No documento Estabilização da tutela antecipada (páginas 87-90)

4. DO PROCEDIMENTO DA ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA

4.8 POSSÍVEIS ATITUDES DO AUTOR APÓS A MANIFESTAÇÃO DO RÉU

4.8.1 Posições doutrinárias a respeito das possíveis ocorrências processuais após a

4.8.1.4 Conflito aparente de normas: art 303, § 2º e art 304, § 1º, do CPC

Em verdade, esse problema está inserido em um contexto mais amplo, que exige, portanto, a extensão da discussão a outros dispositivos legais.

É necessário observar, nesse sentido, que algumas disposições do capítulo do CPC que cuida “do procedimento da tutela antecipada requerida em caráter antecedente” demandam um maior esforço interpretativo. Tal é o caso das disposições constantes do art. 303, § 2º (“Não realizado o aditamento a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo, o processo será extinto sem resolução do mérito”) e do art. 304, caput (“A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso”) e § 1º (“No caso previsto no

caput, o processo será extinto”), todos do novo Código de Processo Civil.

Há um conflito aparente de normas. Isto porque são previstas duas hipóteses de extinção do processo: uma para o caso de o autor não promover o aditamento da petição inicial determinado pelo art. 303, § 1º, I, do CPC (art. 303, § 2º, CPC), aditamento este que, pela literalidade da lei, mostra-se obrigatório sempre que houver o deferimento da tutela antecipada antecedente, e outra para o caso de o réu não oferecer recurso contra a mesma decisão (art. 304, § 1º, CPC).

Além disso, o CPC, por um lado, dispõe que a tutela antecipada se torna estável se não houver recurso do réu e, por outro, prescreve que, não havendo aditamento por parte do autor, o processo será extinto. No caso em que não há nem aditamento pelo autor nem recurso do réu, os efeitos da tutela antecipada serão estabilizados?

Esse questionamento é relevante porque, ao que tudo indica, a extinção do processo prevista no art. 303, § 2º, do CPC é uma sanção ao autor pela falta de aditamento – portanto, a extinção não virá acompanhada da estabilização dos efeitos da tutela –, ao passo que a extinção prevista no art. 304, caput, é uma consequência da não insurgência do réu contra a decisão que antecipa a tutela e, dessa forma, os efeitos dessa

extinção serão diversos (haverá, assim, estabilização da tutela antecipada). O conflito reside exatamente na previsão de soluções diametralmente opostas para os casos de inexistência simultânea de aditamento por parte do autor e de recurso por parte do réu. Não há solução legal expressa para o caso.

Há quem defenda que o juiz deve sempre aguardar o esgotamento dos dois prazos: o do autor (para aditar) e o do réu (para recorrer). Dessa forma, estaria ele “aplicando conjunta e harmonicamente os dois dispositivos legais” e, caso haja aditamento da petição inicial por parte do autor e não haja interposição de recurso pelo réu, deve o juiz intimar o demandante para que diga se deseja o seguimento do processo (quando o autor realiza o aditamento, está apenas se desincumbindo de um ônus processual, não significando isto que ele não deseja a estabilização da tutela antecipada)125.

Para Antonio de Moura, o “aditamento do autor é fato irrelevante para a estabilização”126.

É preciso notar, primeiramente, que parte dos problemas atinentes ao ora tratado conflito aparente de normas deve-se ao momento em que as medidas processuais de autor e réu serão tomadas ante o deferimento da tutela antecipada antecedente. Explica- se: o autor da demanda ordinariamente será instado a aditar o pedido antes de o réu ter a oportunidade de recorrer da decisão.

Isto porque, tão logo haja o deferimento da antecipação de tutela, será o autor, segundo a literalidade da lei, intimado da decisão – o que se dará por meio do seu advogado e por publicação no diário oficial –, passando então a correr o prazo para que promova o aditamento da inicial.

Já o réu, que ainda não tem ciência do processo, será citado e intimado a cumprir o que determinado na decisão, providência que, no mais das vezes, demorará mais do que a intimação do autor.

Bruno Garcia Redondo127, a propósito do assunto, afirma que o prazo que deveria começar a correr primeiro é o que o réu tem para impugnar (não o prazo para o

125 CAVALCANTI NETO, Antonio de Moura. “Estabilização da tutela antecipada antecedente: tentativa

de sistematização”. In: DIDIER JR., Fredie; PEREIRA, Mateus; GOUVEIA, Roberto; COSTA, Eduardo José da Fonseca (coord.). Grandes temas do novo CPC, v. 6: tutela provisória. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 206.

126 CAVALCANTI NETO, Antonio de Moura. “Estabilização da tutela antecipada antecedente: tentativa

de sistematização”. In: DIDIER JR., Fredie; PEREIRA, Mateus; GOUVEIA, Roberto; COSTA, Eduardo José da Fonseca (coord.). Grandes temas do novo CPC, v. 6: tutela provisória. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 207.

autor aditar). Não havendo impugnação, o processo deve ser extinto, ocorrendo, dessa forma, a estabilização da tutela antecipada (evita-se, assim, desperdício de atividade jurisdicional). O prazo para aditamento só seria iniciado se houvesse apresentação de recurso contra a decisão liminar.

Ambos os citados autores apontam vias interpretativas que tentam de alguma forma compatibilizar os dois dispositivos legais em hipotético conflito.

Bruno Garcia Redondo128, por exemplo, idealizou três possíveis soluções para o caso: a) o prazo para o autor aditar seria contado a partir da efetivação da tutela antecipada, e não da decisão concessiva; b) os juízes fixariam prazo superior a 15 dias para o aditamento a ser realizado pelo autor, o que é autorizado pelo próprio art. 303, § 1º, I129; c) deveriam ser promovidas alterações no art. 303 do CPC-2015 para que dele

passe a constar expressamente que o prazo para o autor aditar será contado a partir de sua intimação para oferecer contrarrazões ao agravo de instrumento interposto pelo réu.

Na visão do citado autor, isto resolveria o problema porque faria com que o demandante fosse instado a fazer o aditamento após a expiração do prazo para recurso do réu, de forma que poderia ele, o autor, tendo ciência da postura do demandado (pela interposição ou não de recurso), pudesse avaliar se seria conveniente ou não a promoção do aditamento.

No mesmo sentido se posiciona Marco Paulo Di Spirito, afirmando que nada impede que o juiz aguarde o prazo para manifestação do réu a respeito da tutela antecipada para, só então, intimar o autor para aditar a inicial130.

As indigitadas soluções são interessantes, pois têm o mérito de levar a decisão do autor a respeito do aditamento para um momento posterior à decisão do réu a respeito da interposição ou não de recurso contra a antecipação de tutela. Todavia, faltou discutir o problema de forma mais direta. Faltou enfrentar expressamente o fato

127 REDONDO, Bruno Garcia. “Estabilização, modificação e negociação da tutela de urgência antecipada

antecedente: principais controvérsias”. In: DIDIER JR., Fredie; PEREIRA, Mateus; GOUVEIA, Roberto; COSTA, Eduardo José da Fonseca (coord.). Grandes temas do novo CPC, v. 6: tutela provisória. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 289.

128 REDONDO, Bruno Garcia. “Estabilização, modificação e negociação da tutela de urgência antecipada

antecedente: principais controvérsias”. In: DIDIER JR., Fredie; PEREIRA, Mateus; GOUVEIA, Roberto; COSTA, Eduardo José da Fonseca (coord.). Grandes temas do novo CPC, v. 6: tutela provisória. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 290.

129 Além do dispositivo citado, também o art. 139, VI, do CPC autoriza a dilação do prazo.

130 DI SPIRITO, Marco Paulo Denucci. “Adequações procedimentais para a tutela satisfativa antecedente

no Código de Processo Civil/2015”. In: DIDIER JR., Fredie; PEREIRA, Mateus; GOUVEIA, Roberto; COSTA, Eduardo José da Fonseca (coord.). Grandes temas do novo CPC, v. 6: tutela provisória. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 376.

de que, pela letra da lei, o aditamento seria de todo modo obrigatório, o que não parece ser a interpretação mais correta.

No documento Estabilização da tutela antecipada (páginas 87-90)