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CRÍTICA À ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA: SUPOSTA

No documento Estabilização da tutela antecipada (páginas 108-112)

4. DO PROCEDIMENTO DA ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA

4.12 CRÍTICA À ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA: SUPOSTA

A estabilização da tutela antecipada não recebeu apenas aplausos da comunidade jurídica. Houve também quem o criticasse por supostamente promover a violação do contraditório e da ampla defesa.

Mirna Cianci, por exemplo, parece admitir a constitucionalidade do instituto, argumentando que a sumariedade pode conviver sem problemas com o contraditório diferido, muito embora reconheça a possibilidade de a estabilização da tutela antecipada ser considerada inconstitucional porque, segundo entende, a decisão adquire um grau maior de estabilidade após dois anos, contados da ciência, pelas partes, da extinção do processo, a despeito de não ter havido cognição exauriente. Ou seja, a autora entende que o grau de estabilidade conferido à decisão após a expiração do prazo bienal da ação de revisão da tutela antecipada, somado à ausência de cognição exauriente do objeto da ação, pode configurar uma mácula de inconstitucionalidade. Afirma ainda que a amplitude de defesa estaria seriamente comprometida a partir da vigência desse novo instituto, uma vez que o exercício do contraditório estaria limitado à apresentação de recurso ou ao ajuizamento de nova ação por parte do réu158.

É legítima a preocupação da autora com possíveis efeitos deletérios que possam advir da utilização da modalidade de tutela satisfativa autônoma aqui estudada, particularmente aqueles relacionados a violações aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

De fato, o novo procedimento deverá abreviar o trâmite do processo, o que significa dizer que haverá redução de tempo e principalmente de oportunidades para que ambas as partes possam alegar e provar aquilo que seja do seu interesse.

Muito embora esse “prejuízo” recaia sobre ambas as partes, importa aqui dedicar atenção à situação do réu, que é quem está sendo demandado e quem pode suportar medidas gravosas ao seu patrimônio jurídico.

Nesse sentido, é correto dizer que, se há abreviação do procedimento, como acima dito, o réu verá reduzidas suas oportunidades para produzir provas e, de modo geral, para falar nos autos. Haverá menos tempo para produzir defesa e, portanto, para evitar a prolação de um provimento judicial que lhe seja desfavorável. Com uma produção probatória menos densa, é possível sustentar, ao menos em tese, que a decisão oferece um menor grau de segurança, tornando mais elevada a possibilidade de o réu sofrer injusta diminuição do seu patrimônio.

É preciso, realmente, cuidado no manejo da tutela antecipada antecedente para evitar que a busca da celeridade descambe para a injustiça.

158 CIANCI, Mirna. A estabilização da tutela antecipada como forma de desaceleração do processo (uma

As características da estabilização poderão causar em alguns a sensação de que está sendo autorizada uma violência desmedida contra o réu sem que haja uma justa causa para tanto, haja vista a inexistência de ampla instrução probatória.

É necessário admitir com naturalidade essas críticas e reconhecer-lhes uma justa preocupação com a preservação da ordem processual e, em especial, de princípios constitucionais que são bastante caros ao processo civil brasileiro, particularmente o contraditório e a ampla defesa.

Todavia, é preciso notar que as críticas não são procedentes, e as razões para essa conclusão são várias.

Primeiro, porque ao réu é dada a alternativa de impedir a estabilização da tutela antecipada mediante o oferecimento de impugnação contra a decisão que a defere. É o que basta para obstar o efeito estabilizante previsto no CPC.

Como visto, a estabilização da tutela antecipada tem caráter bilateral, de sorte que ela apenas se efetiva se houver consenso entre ambas as partes. Se uma delas entende inconveniente que o procedimento se restrinja à fase antecedente da tutela de urgência, a manifestação do seu inconformismo é o que basta para impedir a estabilização.

Por essa primeira razão, já se vê que o novo instituto criado pelo CPC-2015 não se traduz em violência ou arbitrariedade contra o réu. Pelo contrário, é-lhe oferecido mecanismo – muito simples, por sinal – capaz de impedir o efeito estabilizante indesejado. Não há lesão ao princípio do contraditório, já que, em clara aplicação desse mesmo princípio, a simples manifestação de vontade do réu é suficiente para impedir a consolidação daquilo que o demandado entende como prejudicial a si próprio.

Os críticos poderiam redarguir afirmando que o prazo para o recurso de agravo é exíguo e que, portanto, o risco de perda de prazo é elevado a ponto de comprometer o próprio direito a defesa, pois, expirado in albis o prazo quinzenal, consuma-se a estabilização.

Esses argumentos também não procedem, já que o prazo para interpor agravo é igual ao prazo para contestação e, ainda que se verifique a estabilização em virtude de um deslize do réu quanto ao prazo, há a oportunidade de propositura da ação autônoma para revisão da tutela antecipada, na forma do art. 304, § 2º, do CPC.

Transcorrido o prazo de dois anos sem manifestação do réu, continua sendo possível discutir a matéria de fundo em ação autônoma, segundo posicionamento defendido neste trabalho. Se o resultado desta demanda for favorável ao réu que sofreu

a medida de tutela antecipada, evidentemente esta última perderá efeito. O réu do procedimento de tutela satisfativa autônoma só não se beneficiará desta alternativa se houver ocorrido o fenômeno da prescrição ou da decadência.

Como se vê, são várias as possibilidades de que dispõe o réu para opor-se à estabilização da tutela antecipada, antes ou depois da sua efetivação. Não se pode dizer, portanto, que os princípios do contraditório e da ampla defesa foram vulnerados em virtude da sumariedade do procedimento. Ainda que sumário e com prazo relativamente curto – 15 dias – para oposição do réu à medida antecipatória, são várias as oportunidades de que ele dispõe para questioná-la, podendo beneficiar-se, inclusive, de medidas sumárias em outro procedimento se demonstrar a presença dos requisitos que as autorizam.

Desirê Bauermann tem opinião no mesmo sentido. Afirma que a estabilização apenas transfere ao requerido o ônus de propor a ação principal para discutir o mérito da questão controvertida, razão pela qual não haveria ofensa ao princípio do contraditório159.

É preciso sublinhar que a celeridade e o corte no procedimento da tutela satisfativa autônoma não são fatores que impossibilitam ou comprometem a defesa do demandado, que continua a ser assegurada com as características que a permitam adaptar-se ao procedimento em que ela é exercida.

Esse encurtamento procedimental é característica necessária para que o instituto cumpra o seu principal objetivo, que é a promoção da economia, da celeridade e da efetividade do processo.

Em juízo de ponderação, é possível dizer que, ao lado dos ganhos em economia e celeridade que a estabilização da tutela sumária trouxe, não houve, como contraponto, perda de oportunidades de defesa que comprometessem o livre exercício do contraditório e o próprio princípio da ampla defesa.

É evidente que, se se pretende criar um procedimento mais célere, ajustes nas regras que modelam o respectivo rito devem ser feitos com o objetivo de acelerar a tramitação processual. Não se pode afirmar, todavia, que qualquer redução de prazo ou modificação de regras de procedimento que visem a abreviá-lo são inconstitucionais por causarem prejuízo à defesa; sê-lo-ão apenas aquelas que, de fato, retirem das partes,

159 BAUERMANN, Desirê. As tutelas de urgência no projeto de novo Código de Processo Civil. Revista

particularmente do réu, os instrumentos efetivos para a defesa judicial dos seus interesses.

Evidentemente, esse não é o caso do procedimento ora analisado. Pelo contrário, o legislador teve enorme cuidado ao dotar o réu de variadas possibilidades de defesa, que podem ser exercidas tanto em caráter preventivo, evitando a estabilização, quanto repressivo, promovendo a sua revisão. Aliás, não é demais ressaltar que a simples postura de inconformismo do réu, manifestada por meio da apresentação de impugnação, é suficiente para evitar a estabilização. Não há qualquer margem de apreciação discricionária do juiz a respeito da idoneidade da peça de impugnação para impedir o efeito estabilizante. Interposto o recurso, obsta-se a estabilização automaticamente. O impedimento da estabilização é um direito potestativo do demandado: manifestada a vontade nesse sentido, não há nada que o autor ou mesmo o magistrado possam fazer para evitar o prosseguimento do feito.

Por tais razões, não procedem as críticas no sentido de que a estabilização da tutela sumária enfraqueceu o direito de defesa. O que se fez foi conferir maior racionalidade ao sistema, abreviando o procedimento sem vulnerar os direitos das partes.

4.13 DA CONVENIÊNCIA DA UTILIZAÇÃO DA ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA

No documento Estabilização da tutela antecipada (páginas 108-112)