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DA JUSTIFICAÇÃO TEÓRICO-FILOSÓFICA DA ESTABILIZAÇÃO DA

No documento Estabilização da tutela antecipada (páginas 44-47)

3. ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA

3.1 DA JUSTIFICAÇÃO TEÓRICO-FILOSÓFICA DA ESTABILIZAÇÃO DA

precipuamente ao delineamento do seu procedimento.

3.1 DA JUSTIFICAÇÃO TEÓRICO-FILOSÓFICA DA ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA

Como estamos a estudar o instrumento da estabilização da tutela antecipada, que tem como objetivo primordial a promoção de duração razoável na tramitação dos processos, é preciso perquirir o porquê desta inovação processual, é dizer, quais razões motivaram o surgimento dessa nova figura e qual o fundamento teórico que lhe dá sustentação59.

Sobre a justificação teórico-filosófica da tutela satisfativa autônoma, Elaine Harzheim Macedo afirma que um estatuto processual que tem por missão o estabelecimento de um processo fortalecido pela efetividade e tempestividade da prestação jurisdicional teria que valorizar as tutelas que rendam ensejo a um provimento antecipado no tempo, que podem ser de natureza satisfativa ou cautelar e que são comumente chamadas de tutelas de urgência ou tutelas diferenciadas, abarcando tutelas antecipadas, tutelas inibitórias e tutelas cautelares60.

O que está por trás da estabilização é, além da necessidade prática de pôr termo rapidamente aos processos como forma de alcançar a justiça, a necessidade de atender aos comandos constitucionais que preveem, expressa ou implicitamente, a duração razoável do processo como um direito fundamental do cidadão. É o caso, por exemplo, do art. 5º, incisos LXXVIII (“a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de

59 A estabilização da tutela antecipada inspirou-se, em grande medida, no instituto francês do référé. Diz

Gustavo Paim, a respeito deste instituto, que ele é uma forma de jurisdição sumária material e é julgado por um juízo próprio, que exerce uma jurisdição específica, a jurisdição provisória, e que não toca o julgamento do mérito do pedido principal. Diz ainda que o référé, em sua concepção tradicional, assegura uma tutela provisória enquanto se espera por uma tutela definitiva, mas também pode ser usado como substituto eficaz da própria tutela definitiva, pois não há obrigação legal de se deflagrar um processo principal (PAIM, Gustavo Bohrer. Estabilização da tutela antecipada. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 171).

60 MACEDO, Elaine Harzheim. Prestação jurisdicional em sede de tutela antecedente: procedimento,

estabilização da decisão e decurso do prazo de 2 (dois) anos: um novo caso de perempção? Revista de Processo, vol. 250, ano 40. São Paulo: RT, dez/2015, p. 190.

sua tramitação”) e LIV (“ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”) da Constituição Federal. O primeiro dispositivo citado expressamente atribui às partes processuais o direito subjetivo à razoável duração do processo e aos meios que garantam a celeridade de sua tramitação, direitos estes que já poderiam ser extraídos da garantia do devido processo legal mesmo antes da promulgação da Emenda Constitucional nº 45, de 2004, que inseriu no art. 5º da Constituição o aludido inciso LXXVIII.

Nesse sentido, afirma Alexandre Câmara que, desde 1992, ano em que internalizado o Pacto de São José da Costa Rica no ordenamento jurídico brasileiro, existe previsão expressa na legislação pátria de um direito à razoável duração do processo (art. 8º, item 1, do referido tratado internacional61), mas que mesmo antes

disso já era possível concluir que os princípios do devido processo legal e da inafastabilidade do controle jurisdicional (art. 5º, incisos LIV e XXXV da Constituição, respectivamente) impunham que a duração do processo obedecesse a parâmetros razoáveis62.

Eider Avelino acrescenta que a duração razoável do processo não é somente uma decorrência do devido processo legal e da inafastabilidade da jurisdição, mas deflui da essência do Estado Democrático de Direito, e que o Estado tem a obrigação de entregar “uma prestação jurisdicional justa e no menor prazo possível, sem dilações desnecessárias e excessivas, contrárias às expectativas mínimas dos cidadãos em relação à solução dos conflitos”63.

Pode-se dizer que “o acesso à justiça não mais encontra satisfação no aspecto puramente formal, mas insere no sistema o direito de utilização de todos os meios instrumentais disponíveis e capazes de conferir verdadeira adequação da tutela

61 Artigo 8º, item 1, do Pacto de São José: “Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas

garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.” (grifamos).

62 CÂMARA, Alexandre Freitas. O direito à duração razoável do processo: entre eficiência e garantias.

Revista de Processo, vol. 223, ano 38. São Paulo: RT, setembro/2013, p. 39-40. No mesmo sentido: ADONIAS, Antônio. A razoável duração do processo. Salvador: Faculdade Baiana de Direito, 2009, p. 40-41.

63 SILVA, Eider Avelino. A razoável duração do processo e o projeto de novo Código de Processo Civil:

uma constante preocupação. Revista de Processo, vol. 216, ano 38. São Paulo: RT, fevereiro/2013, p. 277-278.

jurisdicional”64. O conceito de acesso à justiça extrapola o seu sentido literal, significando também o “direito às garantias processuais, julgamento equitativo (justo), em tempo razoável e eficaz”65.

Além disso, a estabilização também foi motivada pela necessidade de reduzir os custos do processo, e é razoável afirmar que um procedimento acentuadamente abreviado como o aqui tratado proporcionará também economia de recursos públicos e privados.

O instituto estudado neste trabalho foi inserido em nosso sistema processual como forma de dar concretude aos comandos constitucionais acima mencionados. O princípio da razoável duração do processo, a propósito, deve ser visto sob um duplo aspecto: o primeiro é uma diretiva geral que prescreve que toda prestação jurisdicional deve ser entregue em prazo razoável; o segundo ostenta uma feição mais concreta e impõe ao legislador a criação de mecanismos e técnicas processuais que atribuam mais celeridade aos processos, determinando também aos magistrados a utilização das técnicas que proporcionem uma solução mais rápida para os litígios66.

Os procedimentos devem variar de acordo com as necessidades do direito material, devem ser formatados para permitir a tempestiva e efetiva proteção dos direitos materiais67.

Em juízo de ponderação tendo por objeto as medidas de política legislativa, podemos afirmar que o legislador, quando se põe a refletir sobre a adequação dos procedimentos que estabelecerá, terá sempre que tomar posição a respeito do conflito que envolve, por um lado, a tutela sumária e, por outro, a tutela ordinária.

Tira-se da doutrina a lição de que não há como escapar dessa escolha: ou se faz a opção pela ordinariedade, quando, então, estar-se-á privilegiando a segurança jurídica e o caráter definitivo da prestação jurisdicional, ou se escolhe a jurisdição provisória,

64 CIANCI, Mirna. “A tutela de evidência e a urgência no novo Código de Processo Civil”. In: DIDIER

JR., Fredie; PEREIRA, Mateus; GOUVEIA, Roberto; COSTA, Eduardo José da Fonseca (coord.). Grandes temas do novo CPC, v. 6: tutela provisória. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 404.

65 SOUZA, Wilson Alves de. Acesso à justiça. Salvador: Editora Dois de Julho, 2011, p. 26.

66 SILVA, Eider Avelino. A razoável duração do processo e o projeto de novo Código de Processo Civil:

uma constante preocupação. Revista de Processo, vol. 216, ano 38. São Paulo: RT, fevereiro/2013, p. 277-278.

67 Diz Ovídio Baptista que, em um sistema ideal de jurisdição, os procedimentos devem ter seu nível de

complexidade aumentado na razão inversa do grau de evidência do direito controvertido (SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. O processo civil e sua recente reforma. In: Da sentença liminar à nulidade da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 177).

privilegiando a efetividade, o corte de conhecimento (cognição sumária) e o encurtamento procedimental68.

Essa escolha cabe tanto ao legislador, quando cuida de criar normas processuais que sirvam de instrumento para o alcance dos direitos materiais pelas pessoas que deles são – ou se afirmam – titulares, quanto às próprias partes e seus advogados, quando devem decidir pela conveniência de lançar mão de uma demanda sumária ou de um processo plenário.

3.2 PRECEDENTES HISTÓRICOS DA ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA

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