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Oferecimento de impugnação à decisão provisória

No documento Estabilização da tutela antecipada (páginas 75-79)

4. DO PROCEDIMENTO DA ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA

4.6 DAS MEDIDAS A SEREM ADOTADAS PELO JUIZ

4.7.1 Oferecimento de impugnação à decisão provisória

O Código de Processo Civil prevê expressamente uma forma de insurgência do réu capaz de impedir a estabilização: a interposição de recurso contra a decisão que defere a tutela antecipada (art. 304, caput). Diz textualmente o CPC que a tutela antecipada “torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso”.

O recurso cabível no caso é o agravo de instrumento, ex vi do art. 1.015, inciso I, do CPC.

Logo, é incontroverso que a interposição de agravo de instrumento, além de ter aptidão para reformar ou invalidar a tutela antecipada concedida, impede a estabilização.

É importante notar que basta a interposição do agravo dentro do prazo para impedir a consolidação (empregada aqui como sinônimo de estabilização) da tutela provisória. Não é necessário o provimento do agravo. O CPC é claro ao dispor que a decisão será tornada estável se não for interposto o respectivo recurso.

A contrario sensu, se o prazo transcorrer in albis, haverá estabilização.

A interposição de agravo de instrumento é, portanto, a via mais adequada para obstar os efeitos previstos no art. 304, caput, do CPC.

É preciso reconhecer, contudo, que o legislador disse menos do que deveria. Não é razoável que apenas a interposição de recurso pelo requerido seja meio apto a impedir que os efeitos da tutela antecipada se estabilizem107. O que deve contar para esse propósito é a manifestação clara do réu no sentido de que discorda da estabilização, desde que veiculada dentro do prazo do agravo (15 dias, por força do art. 1003, §5º, do CPC).

O réu deve concordar com a estabilização por entendê-la vantajosa, e não ser obrigado a aceitá-la por erro na utilização do instrumento processual apto a impedi-la. Ademais, se ele não se satisfizer com a consolidação da decisão, certamente irá

107 Em sentido contrário, defendendo que apenas a interposição de recurso (agravo de instrumento)

impediria a estabilização: ANDRADE, Érico; NUNES, Dierle. Os contornos da estabilização da tutela provisória de urgência antecipatória no novo CPC e o “mistério” da ausência de formação da coisa julgada. Disponível em https://www.academia.edu/12103602/%C3%89rico_Andrade_e_Dierle_Nunes_- _Os_contornos_da_estabiliza%C3%A7%C3%A3o_da_tutela_provis%C3%B3ria_de_urg%C3%AAncia_ antecipat%C3%B3ria_no_novo_CPC_e_o_mist%C3%A9rio_da_aus%C3%AAncia_de_forma%C3%A7 %C3%A3o_da_coisa_julgada. Acesso em 17/08/2016.

questioná-la por intermédio de ação autônoma, frustrando o objetivo de economia processual que animou a criação da tutela satisfativa autônoma aqui estudada.

Nessa linha de entendimento, Ravi Peixoto108 defende interpretação ampliativa acerca dos mecanismos processuais aptos a impedir a estabilização da tutela antecipada. Em sua opinião, tais mecanismos são os seguintes: a) agravo de instrumento tempestivo, ainda que inquinado por vícios processuais; b) contestação109; c) reclamação. Não impediriam, entretanto, a estabilização as seguintes figuras processuais: a) embargos de declaração (que, todavia, de maneira excepcional, poderiam impedir a estabilização se forem acolhidos com efeitos infringentes para denegar a tutela anteriormente deferida); b) pedido de reconsideração; c) suspensão de segurança.

A lógica empregada por Ravi é a seguinte: aqueles institutos que são capazes de prolongar a litispendência e impedir o trânsito em julgado do processo impedem a estabilização. Já os institutos que não possuem esses efeitos não têm o condão de impedi-la.

O próprio autor sistematiza suas conclusões. Diz ele que os remédios jurídicos processuais precisariam cumprir os seguintes requisitos para impedir a estabilização: “a) aptidão para prolongar a litispendência; b) levar à reforma ou à invalidação da decisão e c) utilização no prazo do agravo de instrumento”110.

Bruno Garcia Redondo, por seu turno, possui entendimento que distende ainda mais as possibilidades de o réu impedir a estabilização, servindo a esse propósito, em seu ponto de vista, “qualquer ato impugnativo lato sensu do réu, apresentado dentro do prazo do recurso”, como, por exemplo, além do agravo de instrumento, a suspensão de segurança, reclamação, contestação ou reconvenção. Em seu entender, não seriam

108 PEIXOTO, Ravi. “Por uma análise dos remédios jurídicos processuais aptos a impedir a estabilização

da tutela antecipada antecedente de urgência”. In: DIDIER JR., Fredie; PEREIRA, Mateus; GOUVEIA, Roberto; COSTA, Eduardo José da Fonseca (coord.). Grandes temas do novo CPC, v. 6: tutela provisória. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 250-255. No mesmo sentido, defendendo maior amplitude na interpretação dos mecanismos aptos a impedir a estabilização: NEVES, Daniel Assumpção Amorim. Manual de Direito Processual Civil. Volume único. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 451-452; BUENO, Cássio Scarpinella, Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 261-262.

109 Fredie Didier, Rafael Alexandria e Paula Sarno também entendem que, se o réu antecipa o protocolo

de sua defesa, ainda que não interponha recurso, impede-se a estabilização (DIDIER JR., Fredie; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de; BRAGA, Paula Sarno. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 2. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 609).

110 PEIXOTO, Ravi. “Por uma análise dos remédios jurídicos processuais aptos a impedir a estabilização

da tutela antecipada antecedente de urgência”. In: DIDIER JR., Fredie; PEREIRA, Mateus; GOUVEIA, Roberto; COSTA, Eduardo José da Fonseca (coord.). Grandes temas do novo CPC, v. 6: tutela provisória. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 256.

cabíveis, para essa finalidade, o mandado de segurança (ante a previsão legal de agravo) e a ação rescisória111.

Marcelo Pacheco Machado entende que “qualquer sorte de resposta fornecida pelo demandado em relação ao pedido de tutela de urgência, ainda que não signifique a interposição do recurso cabível”, será suficiente para “impedir a estabilização dos efeitos da tutela de urgência”112.

José Maria Tesheiner e Renan Thamay apresentam entendimento um pouco diferente: a simples interposição de agravo de instrumento impediria a estabilização, mas o pedido de suspensão de liminar e a reclamação apenas a impediriam se fossem acolhidos113.

Eduardo Talamini informa que o projeto do novo Código de Processo Civil dispunha que a ausência de impugnação da medida urgente pelo réu era pressuposto para a estabilização. Questionando a extensão do verbo “impugnar”, o referido autor entendia que ele não estaria a significar somente “contestar”, e não estaria aludindo somente à interposição de recurso, pois, se “a intenção fosse condicionar a estabilização dos efeitos à falta de recurso contra a medida urgente, haveria de se empregar diretamente a expressão ‘não recorrer’”, de forma que impugnação abrangeria “recurso, medida impugnativa autônoma, pedido de reconsideração ou mesmo qualquer outra insurgência contra a concessão de medida urgente”114.

Horival Marques, por seu turno, também aduziu que a expressão “impugnação” abrangeria a apresentação de contestação, recurso ou mesmo mera petição em que o réu manifeste oposição à tutela de urgência requerida115, opinião que foi manifestada ainda à época em que o projeto do novo CPC estava em tramitação116.

111 REDONDO, Bruno Garcia. “Estabilização, modificação e negociação da tutela de urgência antecipada

antecedente: principais controvérsias”. In: DIDIER JR., Fredie; PEREIRA, Mateus; GOUVEIA, Roberto; COSTA, Eduardo José da Fonseca (coord.). Grandes temas do novo CPC, v. 6: tutela provisória. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 286.

112 MACHADO, Marcelo Pacheco. Simplificação, autonomia e estabilização das tutelas de urgência:

análise da proposta do projeto de novo Código de Processo Civil. Revista de Processo, vol. 202, ano 36. São Paulo: RT, dezembro/2011, p. 263.

113 TESHEINER, José Maria Rosa; THAMAY, Rennan Faria Krüger. Aspectos da tutela provisória: da

tutela de urgência e tutela da evidência. Revista de Processo, vol. 257. São Paulo: RT, julho/2016, p. 13.

114 TALAMINI, Eduardo. Tutela de urgência no projeto de novo Código de Processo Civil: a

estabilização da medida urgente e a “monitorização” do processo civil brasileiro. Revista de Processo, vol. 209, ano 37. São Paulo: RT, julho/2012, p. 29.

115 FREITAS JUNIOR, Horival Marques de. Breve análise sobre as recentes propostas de estabilização

das medidas de urgência. Revista de Processo, vol. 225, ano 38. São Paulo: RT, novembro/2013, p. 207.

116 À época, constava do art. 281, § 2º, do projeto do novo CPC: “Concedida a medida em caráter liminar

e não havendo impugnação, após sua efetivação integral, o juiz extinguirá o processo, conservando a sua eficácia”.

Sobre a contestação, há que se considerar que ela deve sim ser apta a impedir a estabilização.

Entretanto, deve-se observar que, quando o réu for intimado do deferimento da tutela antecipada antecedente, ele ainda não terá conhecimento da petição inicial aditada pelo autor (aliás, o autor sequer poderá aditar se não houver recurso do requerido, segundo posição defendida neste trabalho), razão pela qual não será possível o oferecimento de contestação que possa realmente fazer frente à demanda. O réu não poderá defender-se do que não conhece por inteiro. Note-se que apenas se houver impugnação pelo requerido o autor poderá aditar e, por óbvio, o réu só terá acesso ao conteúdo do aditamento em momento posterior, razão pela qual a contestação não poderia ter levado em consideração o inteiro teor da inicial naquele primeiro momento. O momento adequado para a contestação propriamente dita deve estar situado após o aditamento.

Logo, a contestação “deve ser tida tão somente como objeção à estabilização” e, caso o requerente adite a inicial, o réu deverá ter nova oportunidade para contestar117. No mais, aqui se adota o entendimento de que qualquer manifestação do réu contrária à estabilização, desde que apresentada dentro do prazo do agravo, impede a ocorrência desta, pois, como acima dito, para que haja consolidação da decisão é preciso concordância do réu.

Não há razão, por exemplo, para não autorizar que o pedido de suspensão de segurança impeça a estabilização, já que se trata de uma clara providência visando a combater a tutela provisória. Ademais, pensar de forma contrária poderia criar uma situação esdrúxula: o presidente do tribunal, por um lado, suspende os efeitos da decisão e, por outro lado, a decisão se torna estável porque o pedido de suspensão não seria apto a impedir este fenômeno. Como uma decisão suspensa poderia ser considerada eficaz e, mais do que isso, ser reputada estável? Não faz sentido.

Em suma, havendo insurgência do réu contra a tutela provisória dentro do prazo de 15 dias relativo ao agravo, por qualquer meio, não haverá estabilização. Por “qualquer meio” entenda-se recurso de agravo de instrumento, petição simples, pedido de reconsideração, reclamação, pedido de suspensão de segurança, enfim, qualquer mecanismo que demonstre o inconformismo do réu com a decisão.

117 DI SPIRITO, Marco Paulo Denucci. “Adequações procedimentais para a tutela satisfativa antecedente

no Código de Processo Civil/2015”. In: DIDIER JR., Fredie; PEREIRA, Mateus; GOUVEIA, Roberto; COSTA, Eduardo José da Fonseca (coord.). Grandes temas do novo CPC, v. 6: tutela provisória. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 374.

Exceção faz-se aos embargos de declaração, pois visam a sanar contradição, omissão, erro material ou obscuridade da decisão, sem que signifiquem oposição do réu à tutela de urgência. Se os embargos, entretanto, forem nitidamente destinados a modificar a substância do julgado (embargos com efeitos infringentes), servirão para impedir a estabilização.

Oferecida pelo réu impugnação à decisão sumária de forma tempestiva, automaticamente é impedida a concessão de estabilidade à decisão.

A partir de então, o autor será intimado para proceder como entender conveniente. Ele poderá ficar silente, e nesse caso o processo será extinto sem resolução do mérito – e cairá a tutela antecipada –, ou poderá aditar a petição inicial, dando seguimento à demanda.

No documento Estabilização da tutela antecipada (páginas 75-79)