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Da incompatibilidade entre a estabilização e o aditamento da inicial

No documento Estabilização da tutela antecipada (páginas 93-96)

4. DO PROCEDIMENTO DA ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA

4.8 POSSÍVEIS ATITUDES DO AUTOR APÓS A MANIFESTAÇÃO DO RÉU

4.8.3 Da incompatibilidade entre a estabilização e o aditamento da inicial

É opção do sujeito interessado requerer a concessão de tutela antecipada antecedente, apta a adquirir estabilidade, ou dar início, de imediato, ao procedimento plenário, em que haverá cognição exauriente da causa. Neste último caso, ao final, não havendo vícios processuais ou outra causa que impeça a análise do mérito, chegar-se-á a uma decisão protegida pela coisa julgada material.

É possível também ao autor fazer uso do procedimento de tutela antecipada antecedente sem fazer a opção pela estabilização. Somente neste caso, após o

deferimento da liminar, o autor estará autorizado a aditar a inicial mesmo se o réu não houver impugnado a decisão, e deverá fazê-lo, sob pena de extinção do processo. Esta

situação será vista em tópico próprio.

Cada uma das alternativas das quais pode o autor lançar mão tem suas vantagens e desvantagens.

De um lado, tem ele um procedimento mais célere e que lhe poderá proporcionar uma decisão sumária e estável, podendo a questão litigiosa ser resolvida num curtíssimo prazo, mas sem a autoridade da coisa julgada material. De outro, há um procedimento mais moroso e de cognição exauriente, e que lhe oferecerá a coisa julgada.

A legislação houve por bem conferir estabilidade à decisão que defere a tutela antecipada antecedente justamente para atribuir alguma segurança jurídica ao autor da demanda, segurança esta que não se equipara à coisa julgada material, mas em cujo

entorno gravitam uma série de regras que dificultam a alteração da decisão, como, por exemplo, a necessidade da propositura de ação judicial específica com o fito de desfazê- la, sem contar com o fato de que, após o decurso dos prazos prescricional ou decadencial relativos ao direito material que constitui objeto da demanda, a situação consolidada não mais poderá ser revista.

Em suma, o autor, pela lógica do instituto aqui estudado, abriria mão de uma parcela da estabilidade característica da coisa julgada material e, em troca, ganharia a solução do caso em prazo muito mais curto.

Decerto não foi intenção do legislador permitir que o sujeito fosse beneficiado pela tutela antecipada estável e, ainda assim, pudesse optar pelo prosseguimento do processo para a realização de cognição exauriente do seu objeto litigioso. Isso simplesmente esvaziaria o instituto; retiraria toda a sua utilidade. Ademais, sequer seria uma postura coerente.

Ora, se o autor deseja o exame do mérito com cognição exauriente, que instaure de logo o procedimento principal. Se lhe é necessário (em virtude da extrema urgência, por exemplo) ou conveniente requerer uma tutela antecipada antecedente antes de inaugurar o procedimento principal, que assim o faça, mas deverá declarar, desde o princípio, que não pretende valer-se da estabilização da tutela antecipada (em verdade, basta que não manifeste, na petição inicial, intenção de beneficiar-se da estabilização).

Portanto, o requerente não pode obter a estabilização e, ao mesmo tempo, inaugurar a fase de cognição exauriente do processo. Não haveria ganho de tempo nem economia de recursos, pois, mesmo com a estabilização da tutela sumária, o procedimento plenário seria instaurado, consumindo ainda mais recursos públicos e privados.

No momento em que o autor faz, na petição inicial, opção pela estabilização da tutela antecipada, há preclusão lógica da possibilidade de aditar a inicial se o réu

concordar com a decisão liminar137. A opção pela estabilização significa que o autor deseja encerrar a demanda com a aceitação da decisão pelo réu e a atribuição de estabilidade à decisão que lhe favorece; deseja, enfim, uma rápida solução do conflito, e isto é incompatível com o aditamento da inicial para o prosseguimento da demanda.

137 Se o réu impugnar a decisão provisória, não haverá qualquer empeço a que o autor adite a inicial, pois,

nesse caso, o próprio réu tornou impossível a estabilização, abrindo ao autor o caminho da cognição exauriente.

Note-se que o processo antecedente para estabilização da tutela antecipada e o processo de cognição plena e exauriente para a consecução da coisa julgada são, de certa maneira, antagônicos. Ou bem se pretende um, ou faz-se a opção pelo outro. Ou se busca uma solução rápida e com relativa estabilidade, ou se deseja um resultado mais demorado e com coisa julgada. É incompatível, do ponto de vista lógico, pretender um e outro.

Ademais, se se permitisse o prosseguimento do processo, a estabilização perderia completamente o sentido e a inovação legislativa seria letra morta.

Aliás, é da própria natureza da tutela antecipada estável que ela não continue sendo submetida a discussão138, pois a estabilidade serve para conferir às partes a segurança de que seu patrimônio jurídico, no específico ponto que foi objeto da tutela sumária, não seja alterado, segurança esta que ficaria comprometida se, de maneira injustificada, a lei permitisse a continuidade do processo. A continuidade da discussão judicial da questão implica, em essência, uma afronta à estabilidade recentemente introduzida em nosso sistema processual.

A estabilização tem também o propósito de promover pacificação social, que estará comprometida se o litígio se prolongar.

Se a matéria continuar a ser apreciada pelo judiciário após a estabilização, desta feita para cognição plena da questão, será simplesmente anódino o próprio instituto da estabilização. Explique-se: estando a matéria sub judice, as providências para assegurar a proteção do beneficiário ficarão a cargo do próprio juízo. A proteção que decorreria da estabilização torna-se menos necessária – para dizer o mínimo – porque os efeitos a ela associados podem ser requeridos ao juiz, sempre que assim parecer conveniente à parte. Parece bastante claro que o propósito da estabilização é justamente evitar a cognição exauriente, possibilitando uma solução rápida da demanda. Para confirmar essa conclusão, basta ao intérprete da norma fazer-se a seguinte pergunta: por que a parte precisaria da estabilidade de uma decisão se a matéria continuasse a ser discutida em juízo? A estabilidade só tem sentido se o processo é encerrado, caso contrário, a estabilização será inócua, já que a decisão poderá ser revista facilmente a qualquer tempo, pois isso é da natureza de qualquer demanda que esteja tramitando em juízo. A

138 Ressalte-se que é possível a propositura de ação para a revisão, modificação ou invalidação da decisão

que defere a tutela antecipada estável, na forma do art. 304, §2º, do CPC, mas a mera propositura, por si só, não desfaz a estabilidade. É preciso decisão judicial expressa nesse sentido, proferida no bojo da citada ação.

litispendência gera uma situação de incerteza acerca da matéria discutida que em nada combina com a estabilização ora tratada.

Além do mais, dois dos seus objetivos primordiais – economia de tempo e de recursos públicos e privados – seriam jogados por terra.

O legislador quis transmitir a seguinte mensagem ao autor da demanda: satisfaça-se com a tutela antecipada estabilizada e evite o prolongamento do processo.

É por isso que não se pode considerar acertada a conclusão de Artur César de Souza, que dá a entender que o autor poderá valer-se do procedimento de tutela antecipada antecedente e, desde o primeiro momento, apresentar a petição inicial destinada ao procedimento de cognição exauriente, solicitando ao juiz dispensa do aditamento139.

Se na petição inicial há opção pela abertura de procedimento de cognição exauriente após o deferimento da tutela antecipada antecedente, há de se presumir o desinteresse do autor pela estabilização da tutela antecipada e ele deverá aditar a inicial, sob pena de extinção do processo (sem estabilização, evidentemente).

O aditamento da inicial é, enfim, incompatível com a estabilização da tutela antecipada.

4.8.4 Posição adotada neste trabalho a respeito das possíveis posturas do autor

No documento Estabilização da tutela antecipada (páginas 93-96)