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O DISCURSO AMBIENTAL DA MÍDIA IMPRESSA DE ESTRELA RS E A FORMAÇÃO DE MEIOS DE COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIOS

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante as análises observamos que ambos os jornais mostram superficialidade na publicação de informação ambiental. As matérias não aprofundam a discussão da problemática ambiental, nem no âmbito global nem no âmbito local, e não fazem uma relação entre esses contextos, o que seria importante para o entendimento da problemática ambiental. Também não contribuem para informar ou sensibilizar a comunidade para uma atuação mais cidadã. Dessa forma, os modos de retratar a “realidade” ambiental praticados pelos jornais A e B não estão voltados para a construção da cidadania ambiental de seus leitores. Enquanto o jornal A mostrou carência de fontes, apegando-se a dados oficiais, e apenas reproduzindo seu discurso, o jornal B apoiou-se em relações tensas com o poder público para publicar matérias. Os dois jornais explicitam coberturas sujeitas à perda da credibilidade, já que demonstraram falta em relação às regras do jornalismo enquanto serviço público e de interesse comunitário.

Nenhum dos jornais buscou uma aproximação mais direta com a comunidade no que tange às questões ambientais. O jornal A, destaca-se pela sua superficialidade

e pela reprodução do discurso oficial, não trazendo a opinião da comunidade para suas matérias nem mesmo abrindo um canal de relacionamento com ela. O jornal B só se preocupou em denunciar e criticar o poder público, e, da mesma forma que seu concorrente, não trouxe informações que contribuíssem para o conhecimento ambiental da comunidade. Apesar de o jornal B informar que uma das denúncias era de moradores, a opinião deles sobre o fato não foi solicitada, o que reforça que se sobressaiu o interesse pessoal do editor em denegrir a imagem da prefeitura. O jornal A mostrou-se mais informativo, porém “publicava o que chegava”. Já o jornal B foi mais opinativo, mas apenas reproduziu os desentendimentos com o poder público. Em função disso, a prefeitura acabou tendo mais espaço do que qualquer outro ator social enquanto fonte de matérias ambientais. Ou seja, o jornalismo impresso em Estrela está mais voltado para o poder público do que para a comunidade. Tanto a questão ambiental quanto o tema resíduos sólidos domésticos foram tratados com superficialidade pelos jornais, o que levanta a hipótese de que não estão sensibilizando a comunidade para compreender a realidade ambiental de seu município nem fazendo com que se sinta responsável por ela.

Os jornais não demonstraram características de meios de comunicação com vínculo comunitário, já que não se adaptaram à realidade de cada comunidade. A mídia comunitária, ou da comunidade, tem o papel de informar e sensibilizar os cidadãos para pensar seu contexto local, fazendo retornar o sentido de comunidade, os princípios de igualdade e solidariedade e a preocupação com o outro. Para PERUZZO (2007, p. 79), os meios de comunicação comunitários devem priorizar conteúdos de interesse do público local, ter um viés educativo em relação aos

temas que dizem respeito à realidade concreta da localidade […] principalmente assuntos que quase não têm espaço na grande mídia, ou seja, aqueles relacionados às atividades das organizações dedicadas a trabalhos visando ao bem-estar coletivo e à vida do ‘povo’, seu modo de ser, sua cultura.

Os jornais analisados, apesar das informações de procedência local, não demonstraram essa estreita relação com a comunidade, com seus problemas e interesses no que tange às questões ambientais.

A mídia local deve participar ativamente no processo de formação dos cidadãos, que precisam fazer parte do dia-a-dia dos veículos comunitários. Para ter um caráter comunitário, em um município pequeno, é importante que o jornal contribua com informação crítica e contextualizada para educação ambiental da população. A participação da população com sua opinião poderá fazê-los sentirem-se parte das soluções. A participação ativa da população também é decisiva na formatação dos meios de comunicação comunitários. Para PERUZZO (2007, p. 89), “se a grande mídia está distante e fora do controle do cidadão – do ponto de vista do acesso aos seus processos de produção e difusão de mensagens –, espera-se que os meios comunitários […] possibilitem a participação efetiva do morador”. A construção dos meios de comunicação comunitários se fará juntamente com a comunidade, ou não se fará.

A falta de conexão dos jornais locais com os problemas da comunidade, abordados de forma responsável, talvez seja determinante para os leitores se afastarem e buscarem as mídias eletrônicas. Estudo exploratório realizado na cidade de Estrela pela pesquisa “Práticas Ambientais e Redes Sociais…” constatou que os atores envolvidos na problemática dos resíduos sólidos domésticos (moradores, catadores, sociedade civil organizada, poder público) tendem a ser pautados com informações ambientais de caráter global, e para isso, a televisão e o rádio costumavam ser os meios de comunicação mais utilizados. Os moradores da cidade não citaram os jornais impressos locais como veículos importantes na disseminação de informação ambiental. Programas como Fantástico e Globo Repórter foram os mais citados. Como as pautas da grande mídia normalmente giram em torno de questões globais, dificultam a percepção dos indivíduos sobre os problemas ambientais na sua cidade, no seu bairro, na sua casa. Os jornais de Estrela estão perdendo a oportunidade de fazer com que a população leve os problemas ambientais para a esfera íntima, tornando-se um mediador de informação ambiental. Segundo PERUZZO (2007), a comunicação comunitária permite que as pessoas vivenciem um processo educativo que contribui para a construção da cidadania, pois os indivíduos passam a compreender melhor a realidade e o mundo que os cercam. Por isso, a comunicação comunitária deve se diferenciar da mídia tradicional, valorizando informações e situações de interesse local.

Do modo como vêm abordando as questões ambientais, os jornais não conseguiram sensibilizar a população para essa problemática em sua cidade. Isso foi percebido em estudo exploratório, no qual perguntamos aos atores de diferentes campos sociais se existia algum problema ambiental na cidade ou região. Muitos dos informantes disseram não haver problema ambiental, citando problemas globais como a poluição em São Paulo, o desmatamento na Amazônia e o derretimento das geleiras. Isso mostra o desconhecimento da população, de modo geral, em relação às questões ambientais de sua região. É preciso planejamento, pesquisa e uma postura de proximidade com o leitor para que os veículos, antes de sensibilizarem a comunidade para a problemática ambiental, sensibilizem. A efemeridade tem sido a principal vilã das ações ambientais, o que se explicita na forma como se midiatiza a Semana do Meio Ambiente, e logo depois esses temas caem no esquecimento.

Segundo PAIVA (2002), é preciso que os jornais e os editores saibam ler- se criticamente e ser capazes de interpretar e não apenas reproduzir as falas das fontes, pois essa é uma forma de ultrapassar a abordagem tradicional dos fatos. Para ELHAJJI (2002), esta é uma forma de autorreflexão, ou seja, uma consciência crítica a respeito do que está sendo publicado, pois além de saber o que dizer e como dizer, o jornalista precisa compreender o significado político e ideológico de seus modos de dizer.

Portanto, em que medida e em que sentido esses jornais são comunitários? Entendemos que, pelo fato de ambos os jornais darem prioridade às informações de procedência local e terem caráter informativo, eles assumem características comunitárias. Mas precisam fortalecer os laços com a comunidade e mostrar de forma contínua e planejada suas preocupações com as questões locais, entre as quais se incluem as questões ambientais. Sabemos que esses veículos de comunicação

têm caráter comercial e privado, diferentemente das rádios comunitárias, por exemplo, que surgem com caráter de meios de comunicação voltados aos interesses da comunidade. Os jornais precisam manter os anúncios que veiculam, pois eles geram receita que contribui na continuidde das atividades jornalistas. No entanto, é preciso hibridizar o caráter comercial e o caráter comunitário. Essa mediação reforça os laços com a comunidade e mantém o jornal em funcionamento. É possível que jornais de comunidade com caráter e interesses comerciais se tornem comunitários, já que a função social e pública dos meios de comunicação deve ir ao encontro dos interesses dos cidadãos. Caso contrário, os jornais acabam sendo apenas um negócio desvinculado de suas funções sociais (SILVA, 2002).

Uma relação mais próxima entre esses atores pode ocorrer em forma de debates, publicação de artigos e opiniões da população sobre as questões ambientais locais, eventos e demais atividades que contem com a participação ativa dos moradores da cidade. Nesse contexto os jornais entrariam num círculo virtuoso de cidadania, podendo vir a ser mais lidos e mais apreciados por leitores, e consequentemente por anunciantes, por estarem mais sintonizados com a comunidade e com seus interesses. Dessa forma podem começar a compreender seu papel enquanto atores envolvidos na complexa rede socioambiental, contribuindo para as alterações de posicionamento dos cidadãos em relação às questões ambientais.

REFERÊNCIAS

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CHAMPAGNE, Patrick. Formar a opinião: o novo jogo político. Rio de Janeiro: Vozes, 1998. ELHAJJI, Mohamed. Por um jornalismo auto-reflexivo. In: PAIVA, Raquel (Org.). Ética,

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INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Cidades. 2007. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1>. Acesso em: jul. 2008.

JACOBI, Pedro. Educação ambiental e cidadania. In: Congresso Estadual de Comitês de Bacias Hidrográficas, 1., 1998, São Paulo. Anais… São Paulo, 1998.

PAIVA, Raquel. A publicização da ética no espaço midiatizado. In: PAIVA, Raquel (Org.).

Ética, cidadania e imprensa. Rio de Janeiro: Mauad, 2002.

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PERUZZO, Cicilia M. Krohling. Rádio comunitária, educomunicação e desenvolvimento. In: Raquel Paiva (Org). O retorno da comunidade: os novos caminhos do social. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007.

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REIGOTA, Marcos. Meio ambiente e representação social. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2004. SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. 4. ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2002.

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SILVA, Luiz Martins da. Imprensa e cidadania: possibilidades e contradições. In: MOTTA, Luiz Gonzaga (Org). Imprensa e poder. São Paulo: Editora Oficial do Estado, 2002. THOMPSON, John B. A mídia e a Modernidade: uma teoria social da mídia. Rio de Janeiro: Vozes, 1998.

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O TRATAMENTO JURÍDICO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS DOMÉSTICOS