3.3 INDICADORES SOCIAIS
3.3.1 Contexto e conceituações
Apesar da construção do marco conceitual sobre indicadores sociais ter surgido nos
anos 20 e 30 nos Estados Unidos, só a partir de meados de 1980, com os aprimoramentos das
novas experiências de formulação e de implementação de políticas públicas, planejamento
local e planejamento participativo, a figura dos indicadores sociais terminou sendo
restabelecida. Diversos fatores contribuíram para difusão dos indicadores sociais no Brasil.
Entre estes fatores, podem-se citar: o avanço da democracia política nas últimas décadas; o
acesso a fontes de informações pela sociedade; as organizações sociais mais compromissadas;
a pressão popular por maior transparência; a efetividade dos gastos públicos; a persistência
dos problemas sociais, como a pobreza e a desigualdade; e a exclusão social (JANNUZZI,
2006).
A gestão pública atual busca a eficiência e o comprometimento com os resultados a
partir da transformação de várias dimensões e a incorporação de várias técnicas que permitam
e facilitem o processo de tomada de decisão para otimização dos recursos e atendimento das
demandas sociais. Neste processo, os indicadores sociais representam ferramentas potenciais
para tomada de decisão dos gestores públicos (CARDOSO, 1999).
Para Jordan Filho et al. (1974), países que apresentam menor disponibilidade de
recursos são os que mais os desperdiçam, revelando um processo entrópico. Para o autor, uma
das causas deste desperdício é a falta de informações que possibilitem uma visão verdadeira e
prévia da realidade momentânea e que permitam projeções de curto, médio e longo alcance
que auxiliem o planejamento e na tomada de decisões em bases realmente científicas.
Para melhor entendimento e interpretação sobre o que seja indicador social, procedeu-
se ao resgate de alguns conceitos e dimensões sobre estas métricas. Segundo Ferreira (1986),
a palavra “indicar”, originária do latim indicare, significa, verbo transitivo direto com sentido
de tornar patente, demonstrar, revelar alguma coisa não percebida. No dicionário de Houaiss
(2004), define-se como dar conhecimento por meio de traços, sinais ou indícios.
Talvez, a definição mais divulgada de indicadores sociais no final da década de 60 seja
a fornecida pelo documento publicado pelo Ministério da Saúde, Educação e Bem-Estar dos
EUA, intitulado Toward a Social Report. Este define um indicador social como.
[...] uma estatística de interesse normativo direto que facilita o julgamento conciso, compreensivo e equilibrado da situação dos principais aspectos de uma sociedade. Trata-se, em todos os casos, de uma medida direta do bem-estar e está sujeita à interpretação de que, se for modificada na direção “certa”, enquanto as outras coisas permanecerem inalteradas, a situação terá melhorado, ou as pessoas estarão em melhores condições. Portanto, as estatísticas sobre o número de médicos ou de policiais não poderiam ser indicadores sociais, ao passo que as cifras sobre os índices de saúde ou de criminalidade o seriam (Ministério da Saúde, Educação e Bem-Estar dos EUA, 1969 apud CARLEY, 1985, p. 24 e 25).
Desta definição podemos extrair dois aspectos importantes: a ênfase na natureza
normativa dos indicadores e nas medidas de produto. A ênfase normativa estabelece que as
métricas medirão a melhoria da situação, o que significa que alguém terá que definir e decidir
o que representa “melhorar” e em que medida.
Carley apresenta uma definição muito consistente sobre indicadores sociais. Segundo
o autor, não somos capazes de medir diretamente o bem-estar, desta forma, são necessários
substitutos das medidas mais diretas do bem-estar. Esses substitutos podem ser denominados
de indicadores sociais – “são medidas de uma característica observável de um fenômeno
social e que estabelecem o valor de uma característica diferente, mas não-observável do
fenômeno” (CARLEY, 1985, p. 2).
Na percepção da Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento
(OCDE, 1993) o indicador é um parâmetro ou valor derivado de parâmetros que indicam e
disponibilizam informações que permitem avaliar o estado de um fenômeno. Para a OCDE, os
indicadores quantificam e simplificam fenômenos e auxiliam a compreensão da complexa
realidade social. Outra conceituação adotada considera os indicadores como guias que
permitem medir a eficácia e eficiência das ações tomadas e os desvios entre a programação e
realização (KARDEC, 2002).
Para Carley (1985), os indicadores sociais não seriam descrições da realidade isentas
de juízos de valor, mas medidores de acréscimo ou decréscimo de efeitos sociais importantes.
À ênfase nas medidas de produto se sobressaem as de insumo, que predominaram no processo
decisório governamental ao longo do tempo. Para algumas linhas de pensamento da saúde
(incrementalistas e racionalistas), valores mais elevados das medidas de insumo (como
exemplo: proporção entre o número de médicos e o de habitantes, ou número de leitos
hospitalares, ou per capita de recursos aplicados da saúde) poderiam presumir uma melhoria
na saúde a partir destas métricas, e não indiretamente relacionada a uma multiplicidade de
outros fatores ambientais e pessoais, como nível de renda, a poluição, o fumo, entre outros.
Land (1971 apud CARLEY, 1985) levantou quatro aspectos importantes dos
indicadores sociais: (i) as métricas podem ser normativas; (ii) medir insumos ou produtos; (iii)
ser ou nãopassíveis de manipulação pela política; (iv) geralmente não são isentas de juízo de
valor.
Para Carley (1985, p. 2), “um indicador social deve ser sempre relacionado a um
conceito não-mensurável do qual é um substituto”; e aponta duas características importantes
dos indicadores sociais: esses são substitutos e são medidas. Os indicadores sociais
caracterizam-se como substitutos porque não representam a si mesmos, mas traduzem
conceitos sociais abstratos ou não-mensuráveis em termos operacionais. Como medida, os
indicadores referem-se às informações que são quantificáveis, recomendando-se aquelas que
sejam expressas através uma escala ordenada.
Para melhor esclarecimento, expõe-se a diferença conceitual entre as estatísticas
públicas e os indicadores sociais. Segundo Jannuzzi (2006), estatísticas públicas e indicadores
sociais apresentam características distintas entre si. Os primeiros são dados sociais na forma
bruta, parcialmente contextualizados em uma teoria social, enquanto os indicadores permitem
uma análise mais contextualizada e comparativa da realidade social no tempo e no espaço.
Para diferenciar ambas as medidas, citamos o posicionamento de Schirnding (1998, p. 15):
Os indicadores representam mais do que os dados em que são baseados. Por exemplo, a mensuração de vários aspectos da qualidade ambiental produz dados primários (como o nível de poluição do ar por hora) que são então agregados e resumidos para produzirem estatísticas (por exemplo, os níveis médios de poluição do ar a cada 24 horas). As estatísticas são então analisadas e reapresentadas na forma de indicadores (por exemplo, o número de dias em que as diretrizes de qualidade do ar foram excedidas), que podem, a partir daí, ser incorporados ao processo de tomada de decisão. Assim, os indicadores fornecem um meio de dar valor agregado aos dados, através de sua conversão em informação para uso direto dos tomadores de decisão.