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Convênios ICMS e exigência de lei específica

No documento Incentivos Fiscais (páginas 58-65)

4.1 Perspectiva sintática dos Convênios ICMS

4.1.1 Convênios ICMS e exigência de lei específica

A despeito do inquestionável valor metodológico que uma abordagem por meio de uma perspectiva sintática, é de se reconhecer que o estudo do direito não se exaure em sua compostura lógico-formal. Nem mesmo pode se analisar o fenômeno jurídico apenas a partir de suas unidades mínimas, as normas jurídicas. Estas não existem isoladamente, mas dentro de uma forma-limite de sistema113 que orienta as formas de produção e inclusão de normas, bem como sua coordenação e subordinação, segundo ensina o mestre pernambucano Lourival Vilanova:

E não há norma jurídica que não pertença a um determinado sistema. Isoladamente, não tem ela o específico característico de valer, de ser exigível, em sua observância e em sua aplicação. Mesmo diante de toda norma cabe a pergunta: de onde provém, de ondem obtém sua existência válida? Há de provir de um sistema, em cujo interior se encontram os modos de constituir e desconstituir normas. [...]

As normas de organização (e de competência) e as normas do “processo legislativo”, constitucionalmente postas, incidem em fatos e os fatos se tornam jurígenos. [...]

Assim, as normas, potencialmente incidentes sobre as classes de fatos que delinearam, resultam de fatos que, por sua vez, são qualificados com fatos jurídicos por outras normas do sistema114.

A função sintática dos convênios deve ser ordenada a partir de uma análise de um todo sistêmico da Constituição a fim de obter uma melhor compreensão do fenômeno jurídico da concessão de incentivos, benefícios fiscais e isenções em matéria de ICMS. Como bem salienta o Mestre Paulo de Barros Carvalho “derivação é operação lógico-semântica em que se articula uma unidade normativa a outras que lhe são sobrepostas ou sotopostas na hierarquia do conjunto”115, sob esse aspecto é de suma relevância utilizar-se dessas operações lógicas para o fim de investigar as relações sintático-semânticas dentro de uma ordem no sistema.

É sob esse enfoque que se pretende analisar o conteúdo do § 6º do art. 150 da Constituição Federal e se perquirir qual o veículo introdutor habilitado pelo sistema a inserir norma que veicule incentivos fiscais, especialmente, no que toca o ICMS. Para tanto insta transcrever o texto do referido dispositivo:

§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou

113 VILANOVA, Lourival. As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo. 7. ed. São Paulo: Noeses, 2010, p. 137.

114 Idem. Causalidade e relação no direito. 5. ed. São Paulo: Noeses, 2015, p. 28.

115 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e positivação no direito tributário. v. I. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2014, p. XXI.

contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g.

Luciano Garcia Miguel promoveu uma análise da expressão “sem prejuízo”, comparando-a com outros dispositivos constitucionais que a utilizam, permitindo extrair a mesma noção de exceção ao § 6º:

Na Constituição Federal, sempre que foi usado o termo sem prejuízo, o constituinte quis dar plena eficácia à norma que estava sendo ressalvada. Ora, não se pode admitir em todas as situações em que usou o termo sem prejuízo, exceto numa, o constituinte pretendeu dar plena eficácia à norma excepcionada. Se tivesse sido sua intenção que a concessão de benefícios fiscais, no âmbito do ICMS, se desse por convênio e por lei (somado), teria escrito com maior clareza o § 6º do art. 150.

Mas assim não fez. Tudo indica que o § 2º, XII, ‘g’, do art. 155 excepciona o § 6º do mesmo artigo.116.

Na mesma senda Roque Antônio Carrazza assevera que não se mostra adequado a utilização de lei ordinária para introdução do conteúdo dos convênios, por entender exceção expressa na Constituição Federal:

Damo-nos pressa em deixar assentado que a lei ordinária estadual (ou distrital) não é o meio jurídico adequado para ratificar convênio que venha a dispor sobre isenções de ICMS.

Embora não se discuta que, em matéria tributária, o princípio da legalidade vem atendido, em regra, com a edição de lei ordinária, ele, no caso específico das isenções de ICMS, por expressa ressalva constitucional (art. 15, § 2º , XII, ‘g’), demanda, para implementar-se, decreto legislativo ratificador de convênio celebrado por todas as Unidades Federativas interessadas117.

Em sentido contrário Mizabel Derzi, em nota de atualização ao festejado Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar de Aliomar Baleeiro, considera que não há abertura para dispensa de edição de lei em sentido estrito nas disposições do art. 150, § 6º da Constituição Federal e considera que o rol do referido dispositivo é taxativo:

A Constituição Federal não abriu exceção à legalidade no ICMS. Quanto à concessão de isenções e outros beneficios tributários, ela exige a edição de prévios convênios interestaduais, que também deverão ser ratificados pelas respectivas Assembleias Legislativas estaduais, nos termos a serem estabelecidos em lei complementar. Enfim, o art. 150, § 6°, é taxativo: a exigência de lei para a concessão de isenção ou outro subsídio deve ser feita sem prejuízo da observância de prévios convênios interestaduais, no ICMS. O dispositivo, na nova redação que lhe deu a Emenda Constitucional n. 03, não cria exceção à legalidade, mas impõe a obediência simultânea aos convênios e à lei estadual118.

Não obstante entendimento contrário da jurista mineira, entende-se que é possível afirmar que a edição de Convênio de ICMS dispensaria a edição de lei em sentido estrito;

entretanto, o mesmo não se poderia afirmar que os mesmos poderiam ser considerados, por si só, como veículo introdutores aptos a inserir direito novo no âmbito da ordem interna dos

116 MIGUEL, Luciano Garcia. Incidência do ICMS nas operações de importação. São Paulo: Noeses, 2013, p.

95. 117 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 583.

118 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 8. ed. atualizada por Mizabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 146.

Estados.

Essas são as palavras de Tárek Moisés Mousallem ao considerar que “Os convênios entre os Estados-Membros não são veículos introdutores competentes para ejetarem enunciados-enunciados sobre direito tributário a ordem interna de cada ente federado.”.119

Igualmente sob a perspectiva de se tratarem os convênios ICMS de norma vinculativa e de conteúdo abstrato e impositivo Eurico Marcos Diniz de Santi afirma que atribuir condição meramente autorizativa a referidos veículos introdutores conduz à noção de que estaria esvaziada a função do CONFAZ e inutilizada a figura dos convênios ICMS. Nas suas palavras se evidencia:

A limitação dos poderes do Estado frente aos seus cidadãos não pode se esgotar em mera “autorização. No campo da tributação interestadual, a inclusão de cláusulas meramente autorizativas torna os convênios simbólicos, álibis da usurpação da legitimidade conferida pela decisão unânime do CONFAZ.

O tratamento que deveria ser uniforme em todo o território nacional passa a ser discricionário, definido ad hoc pelo Secretário de Fazenda e pelo Chefe do Poder Executivo de cada um dos vinte e outros entes federados.

Para os entes federados, a aprovação de convênios meramente autorizativos implica acesso à ampla discricionariedade, própria da delegação. Secretários de Fazenda e Chefes do Poder Executivo local se tornam isoladamente competentes para estabelecer regras cuja validade constitucional está diretamente ligada ao colégio, i. e à reunião dos entes cuja expressão da vontade política não se esgota na voz isolada desses agentes”120. (Destaques no original)

Nas lições de José Eduardo Soares de Melo denota-se uma possível coexistência de convênio ICMS de natureza dúplice, ora impositiva com observância obrigatória por todas as unidades federativas, ora de natureza autorizativa de implementação facultativa pelos Estados121. Com quem se alinha Heleno Taveira Torres:

Os convênios tanto podem ser vinculantes ou dispositivos, obrigando (modal deôntico

“obrigatório”) os Estados a concederem as isenções que tipificam; como podem ser autorizativos, hipótese em que teremos apenas a permissão (modal deôntico

“permitido”) para que a isenção possa ser criada, podendo o Estado nunca autorizá-la ou se a houver autorizado, que a revogue quando entender oportuno, respeitando-se os limites do princípio da anterioridade122. (Destaques no original)

Se, de outra ponta, a natureza dos convênios ICMS possa ser considerada autorizativa, em virtude da competência exclusiva das assembleias legislativas dos Estados e do Distrito Federal para legislar em matéria de ICMS, os referidos atos normativos constituiriam uma fase preliminar do processo legislativo tendente produzir veículo introdutor de norma concessiva de

119 MOUSSALLEM, Tárek Moysés. Fontes do Direito. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2006, p. 208.

120 SANTI, Eurico Marcos Diniz. ICMS. Guerra fiscal: redução da base de cálculo para fraudar a Constituição Federal. São Paulo: Max Limonad, 2016, p. 70.

121 “Os convênios de ICMS têm natureza impositiva (adoção obrigatória por todas as unidades federativas), ou autorizativa (utilização facultativa), observando a sistemática seguinte:” MELO, José Eduardo Soares de. ICMS:

teoria e prática. 12. ed. São Paulo: Dialética, 2012, p. 368.

122 TORRES, Heleno Taveira. Isenções no ICMS – Limites Formais e materiais. Aplicação da Lc nº 24/75.

Constitucionalidade dos chamados “convênios autorizativos”. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 72, pp. 88-93, abr/2001, p. 92.

incentivo fiscal. É o que ensina Alcides Jorge Costa:

Os convênios são uma fase peculiar do processo legislativo, em matéria de isenções do ICM. Fase que limita a competência das Assembléias Legislativas, mas que não pode eliminá-la123. (Destaques no original)

Igualmente na linha de raciocínio de que constituem os convênios ICMS uma etapa prévia que deve ser observada pelos Estados, alinhava Paulo de Barros Carvalho:

É direito subjetivo de cada um desses entes federativos exercer a competência tributária do ICMS, inclusive a instituição de isenções, incentivos ou benefícios fiscais. No entanto, sempre assim pretenderem, têm que, antes, buscar a produção e convênio, sem o qual, não se pode reputar apropriado o procedimento legislativo124.

A previsão geral da Lei Complementar nº 24/1975, em seu art. 1º é de que os incentivos fiscais serão concedidos ou revogados pelos convênios celebrados pelos Estados e Distrito Federal, em reuniões em que estarão presentes seus representantes e representante do Governo Federal, colegiado que denomina-se Conselho Nacional de Política Fazendária - CONFAZ.

Desde já é importante destacar alguns pontos sensíveis na conformação dos convênios sob a edição da referida Lei Complementar, o primeiro diz respeito ao agente competente. Ao estabelecer, em seu art. 2º, que participarão das reuniões de celebração de convênio representantes das unidades federadas, entende-se que o agente competente aqui deveria ser o Chefe do Poder Executivo do Estado ou Distrito Federal, é o que adverte Tárek Moisés Moussalem rememorando lições de Sacha Calmon Navarro Coelho:

Pela singela definição do conceito de convênio dado pelo eminente jurista mineiro, é forçoso concluir que os secretários das Fazendas Estaduais não são agentes competentes para editarem normas tributárias, isto é, não são agentes credenciados pelo ordenamento para realizarem atividade de enunciação criadora de tributos125.

Noutra passagem, o Professor Sacha Calmon critica, de forma contundente, a forma como usualmente se dá representação nas reuniões do CONFAZ, em que os Estados se fazem representar por Secretários:

Não é assim, o representante do povo do estado que se faz presente na assembléia, mas o preposto do Executivo, via de regra um Secretário de Estado, usualmente o da fazenda ou das finanças. Nestas Assembleias, são gestados os convênios que só passa a valer depois que as Assembleias Legislativas – casas onde se faz representar o povo dos estados- ratificam os convênios pré-firmados nas Assembleias. Com efeito, não poderia um mero preposto do chefe do executivo estadual exercer competência tributária impositiva ou exonerativa. Esta é do ente político, não é do Executivo nem do seu chefe, muito menos do preposto, destituível ad nutum126.

O segundo ponto, concerne ao procedimento de aprovação dos convênios ICMS, em

123 COSTA, Alcides Jorge. ICM na Constituição e na Lei Complementar. São Paulo: Editora Resenha Tributária, 1978, p. 130.

124 CARVALHO, Paulo de Barros; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Guerra fiscal: reflexões sobre a concessão de benefícios no âmbito do ICMS. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2014, p. 63.

125 MOUSSALLEM, Tárek Moysés. Fontes do Direito. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2006, p. 208.

126 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 192.

uma análise paralela às considerações tecidas no parágrafo anterior, é no que toca a forma de internalização das deliberações das reuniões adotada.

Insta notar que a Lei Complementar nº 24/1975, segundo apostila Paulo de Barros Carvalho127, foi editada num regime político distinto do ambiente democrático da Constituição da República de 1988, em que se “admitia” (e sob muitas aspas) que os representantes dos Estados, por meio de decretos executivos, fizessem inserir normas tributárias no âmbito de sua respectiva legislação. Destaca o professor paulista:

Pelo exposto, conclui-se que os convênios não se sobrepõe às legislações estaduais e, muito menos, às nacionais. Cada qual tem seu campo privativo de atuação, encontrando fundamento de validade na Constituição da República, que os delimita.

Inadmissível, portanto, que o legislador estadual estabeleça prescrições cuja competência foi atribuída ao Congresso Nacional ou à deliberação conjunta dos Estados e Distrito Federal128.

É entendimento minoritário, mas vale ser destacado para ilustrar essa ideia aspeada acima, os argumentos defendidos por Antônio Pinto da Silva, cuja fundamentação atribui uma fala, sem possível comprovação, atribuída a Manuel Gonçalves Ferreira Filho, no sentido de que o Poder Executivo exerceria a posição de Governo:

Eu lembraria apenas, de passagem, o ensinamento do nosso Professor de Direito Constitucional, ex-vice-Governador do Estado, Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que, numa aula secreta que ele deu na Escola Superior de Guerra (existe também “aula secreta, ’aula confidencial’), sustentava que, na realidade, o Poder Executivo não é, hoje, apenas Executivo: o Poder Executivo é o Governo. Então, está dentro dessa linha: é o Governo que ratifica. Poder Executivo é Governo”129.

O que não se poderia admitir – dentro da atual quadra constitucional –, de forma que tais dispositivos além de não terem sido recepcionados, não teriam fundamento de validade constitucional.

Citada fala foi proferida em congresso do IDEPE em 18 de março de 1981, após apresentação de tese defendida por Wagner Balera130, que se seguiu em mesa de debates presidida por Hamilton Dias de Souza, tendo por Relator Alexandre da Cunha Ribeiro Filho e, dentre os debatedores, José Maria Dantas, Francisco Pimentel e Antônio Pinto da Silva e Geraldo Ataliba.

127 É preciso considerar, porém, que a Lei Complementar n. 24/75 foi produzida sob o manto da Carta de 1967, tendo por base contexto socioeconômico diverso daquele que se verifica hoje, no âmbito da vigência da Constituição de 1988. CARVALHO, Paulo de Barros. A concessão de isenções, incentivos ou benefícios fiscais no âmbito de ICMS. In: CARVALHO, Paulo de Barros; MARTINS, Ives Gandra. Guerra fiscal: reflexões sobre a concessão de benefícios no âmbito do ICMS. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2014, p. 58.

128 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e positivação no direito tributário. V. I. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2014, p. 161.

129 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 192.

130 BALERA, Wagner. ICM – isenções por convênios. Revista de Direito Tributário, São Paulo, n. 21/22. jul./dez.

1982. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. .

Sobre esse ponto, Geraldo Ataliba analisando o conteúdo do disposto do art. 23, § 3º da Constituição de 1967 com o advento da EC 01/69131 considera que: “previsão do convênio só funciona, nesse procedimento, como condição de validade do ato legislativo que vai conceder a isenção.”132.

A conclusão da tese apresentada por Wagner Balera, que foi aprova por maioria, em suma se destaca:

É inaceitável que se pretenda ratificar por decreto do Poder Executivo alteração na legislação tributária dos Estados. Somente a manifestação do Poder Legislativo estadual, por força do princípio da legalidade, é legítima para alterar a lei tributária133.

Sobre o assunto, a doutrina nacional vem se manifestando de forma contundente, desde sua publicação134, para concluir que a forma que mais se harmoniza com os princípios constitucionais Republicano e Federativo, seria a ratificação dos convênios por meio de ato do Poder Legislativo estadual, especialmente, por meio de decreto legislativo. José Souto Maior Borges, nesse sentido acrescenta:

[...] o convênio substitui, neste domínio das isenções, a competência material do Poder Legislativo, para disciplinar tais isenções tributárias exercendo, assim, a função de sub-rogado constitucional do princípio da reserva da lei tributária formal em matéria de isenção.

Deve-se, porém, acrescentar que, se os convênios não estão subordinados hierarquicamente à legislação tributária estadual, a sua eficácia plena depende de ratificação do Poder Legislativo, sem o que não estará preenchida a exigência do princípio da legalidade135.

Forte nas palavras de Alcides Jorge Costa sob o mesmo ponto de vista:

A Constituição diz que os convênios serão celebrados e ratificados pelos Estados segundo o disposto em lei complementar. Esta, por seu turno atribui ao Poder Executivo dos Estados competência para ratificar estes convênios. Assim, o Poder Executivo celebra e ratifica os convênios.

Como se vê, as Assembléias Legislativas ficam excluídas do processo, o que nos parece contrário à Constituição136.

131 Art. 23 [...] § 6º As isenções do impôsto sôbre operações relativas à circulação de mercadorias serão concedidas ou revogadas nos têrmos fixados em convênios, celebrados e ratificados pelos Estados, segundo o disposto em lei complementar.

132 ATALIBA, Geraldo. Debate. In: BALERA, Wagner. ICM – isenções por convênios. Revista de Direito Tributário, São Paulo, n. 21-22, 1982, p. 163-182.

133 Op. cit., p. 181.

134 “De todo o exposto, resulta que é absolutamente inadmissível que caiba ao Executivo, além do que lhe é próprio, ou seja, a celebração do acordo, também a ratificação do ato, pois seria admitir que o mesmo Poder que celebra o convênio deva ratificá-lo em ato subseqüente. (FANUCCHI, Fábio. Convênios para isenção do ICM – inconstitucionalidade da lei complementar nº 24, de 1975. Revista de Direito Tributário, São Paulo, n. 01. 1977, pp. 42-45); Têm-se apontado diversas inconstitucionalidades que viciam esta lei complementar sendo a que provocou protesto generalizado da doutrina a norma consubstanciada no art. 4º da referida lei que atribui ao Poder Executivo Estadual a ratificação, por decreto, dos convênios. Sobre preceito calcado num equívoco a respeito da matéria que pode ser objeto de decreto, referido dispositivo guarda o vício do autoritarismo que marcou a edição do Ato Complementar nº 34.” BALERA, Wagner. ICM – isenções por convênios. Revista de Direito Tributário, São Paulo, n. 21-22, 1982, pp. 163-182.

135 BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária. São Paulo: RT, EDUT, 1975, p. 173.

136 COSTA, Alcides Jorge. O ICM na Constituição e na lei complementar. São Paulo: Ed. Resenha Tributária, 1979, p. 130.

Ricardo Lobo Torres, já na vigência da atual Constituição Republicana, aponta que tais inconsistências poderiam ter sido corrigidas por ocasião da Lei Complementar nº 87/1996, o que não se deu por veto presidencial em decorrência de vício de iniciativa:

Esperava-se que a LC 87/96 compatibilizasse os convênios com as garantias do regime democrático, a que voltamos plenamente com a CF 88, passando a exigir a ratificação pelas Assembleias Legislativas, que o autoritarismo político dispensara e que a EC 3/93 recomenda; mas os arts. 27 a 29 do projeto daquela lei complementar introduziam pequenas alterações na LC 24/75, sem, todavia, corrigir o déficit de legitimidade democrática, e foram vetados pelo Presidente da República com fundamento apenas no vício de iniciativa137.

Na mesma senda, as ponderações de Roque Antonio Carrazza:

Assentadas estas premissas, fica fácil proclamar que convênio não é lei, nem o CONFAZ órgão legislativo. Assim, os funcionários do Poder Executivo que o integram não podem, a pretexto de dispor sobre isenções de ICMS, “legislar a respeito.

É o Poder Legislativo de cada Estado e do Distrito Federal – onde têm assento os representantes do povo local- que, ratificando o convênio, as concederá. Detalhando o assunto os Estados e o Distrito Federal devem, para conceder isenções de ICMS, firmar entre si convênios. Não são eles, porém, que dão força normativa às deliberações tomadas. Esta resulta do decreto legislativo que vier a ratifica-los, em cada unidade federativa. Os convênios apenas integram o processo legislativo necessário à concessão destas desonerações tributárias. Elas surgem – ou deveriam surgir – do decreto legislativo ratificador do convênio interestadual.”138. (Destaques no original)

Não obstante posicionamento contrário de Heleno Taveira Torres139, reverbera a doutrina nacional, já ao lume da nova ordem constitucional, no sentido de que a internalização dos convênios em matéria de ICMS não pode ser ratificada por meio de decreto do Poder Executivo140 por violação flagrante dos princípios Republicano e Federativo.

Em remate, Paulo de Barros Carvalho deixa assente que o instrumento introdutor primário de normas tributárias que veiculem incentivos fiscais é o decreto legislativo:

É imperioso, por decorrência do princípio da legalidade, que a ordem jurídica recolha a matéria desses atos multilaterais de vontade, sem o que não se dá a produção de normas válidas no direito pátrio. E é precisamente por essa razão que o decreto legislativo assume importância significativa como instrumento primário de introdução de regras tributárias141.

Tal posição cristaliza a ideia de que o veículo introdutor competente para inserção dos enunciados prescritivos objetos dos convênios, na ordem interna dos Estados, deveriam se dar

137 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 20. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2018, p.

386.

138 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 423.

139 TORRES, Heleno Taveira. Isenções no ICMS – Limites Formais e materiais. Aplicação da Lc nº 24/75.

Constitucionalidade dos chamados “convênios autorizativos”. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 72, pp. 88-93, abr./2001, p. 92.

140 “A regra também se aplica aos convênios de ICMS, que – seja-nos permitido insistir – só podem ser ratificados por meio de decreto legislativo (lei lato sensu). Vai daí que é inconstitucional, o art. 4º, caput, da Lei Complementar 24/1975 quando prevê que os aludidos convênios serão ratificados por decreto.” CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 584.

141 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 28. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 95.

No documento Incentivos Fiscais (páginas 58-65)