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CAPÍTULO IV – ANÁLISE DOS ACÓRDÃOS DO CONSELHO CONSTITUCIONAL

4.3. Declaração de voto ou votos vencidos

De acordo com o artigo 33 da Lei n° 06/2006, de 02 de agosto - Lei Orgânica do Conselho Constitucional, os acórdãos e as deliberações do Conselho Constitucional são tomados por consenso. Na falta deste, são decididos pela pluralidade de votos dos juízes conselheiros presentes. Para o efeito, cada juiz conselheiro dispõe de um voto e em caso de empate o presidente dispõe de voto de qualidade. Ademais, os juízes conselheiros do Conselho Constitucional têm o direito de lavrar voto vencido.

Desta forma, nesta parte do trabalho analisa-se a tendência e a proveniência dos votos vencidos e declarados nos Acórdãos e Deliberações analisados. Portanto, nas 157 decisões do Conselho Constitucional, somente 11 tiveram declaração de ―voto vencido‖, sendo três (3) em ações diretas da fiscalização da constitucionalidade, cinco (5) nos recursos contenciosos eleitorais e três (3) nos atos de validação e proclamação dos resultados eleitorais.

No total são 12 votos vencidos constantes em 11 acórdãos, distribuídos pelos seguintes atores requerentes: um voto vencido aparece na ação solicitada pelo procurador-geral da

República, dois votos vencidos na solicitação submetida pelos deputados da Assembleia da República, três votos vencidos nos recursos contenciosos submetidos pelos outros partidos da oposição, quatro votos vencidos nos recursos contenciosos submetidos pelo partido Renamo, maior partido da oposição; e três (3) votos vencidos nos atos do Conselho Constitucional de validação e proclamação dos resultados eleitorais.

Além disso, os 12 votos vencidos pertencem somente a dois juristas: quatro (4) de Teodato Mondim da Silva Hunguana, Juiz Conselheiro de 2003 a 2009 (cumpriu apenas um mandato), indicado pela banca parlamentar da Frelimo e oito (8) de Manuel Henrique Franque, Juiz Conselheiro desde o dia 21 de maio de 2004, apontado pela bancada da oposição, Renamo-União Eleitoral.

Teodato Mondim da Silva Hunguana, jurista de formação e de reconhecido mérito na esfera jurídica moçambicana, membro sênior do partido Frelimo, fez parte do primeiro grupo que compôs o Conselho Constitucional, após a sua criação em 2003. Nas eleições de 1999, a Frelimo e seu candidato, Joaquim Alberto Chissano foram declarados vencedores. O partido Frelimo obteve 133 assentos parlamentares contra 117 da Renamo-União Eleitoral. Pelo critério da representação proporcional, a Frelimo tinha o direito de indicar três juristas para o Conselho Constitucional, enquanto que a Renamo tinha o direito de indicar dois. Teodato Mondim da Silva Hunguana foi um dos escolhidos pela bancada parlamentar da Frelimo na Assembleia da República, para o mandato de cinco anos, como preconiza a lei.

Durante o seu mandato, Teodato Mondim da Silva Hunguana apareceu com voto vencido na Deliberação nº 25/CC/2004 de 26 de outubro, referente ao recurso interposto pela coligação de políticos denominada Grande Oposição (GO). Um outro jurista que teve voto vencido nesta mesma deliberação, foi Manuel Henrique Franque, proposto pelo partido Renamo. Na decisão colegial da aludida deliberação, houve cinco (5) votos contra o recurso da Grande Oposição. Votaram contra, os seguintes juízes: Rui Baltazar dos Santos Alves (presidente), Lúcia da luz Ribeiro, João André Ubisse Guenha, Lúcia F.B. Maximiano do Amaral, todos da Frelimo e Orlando António da Graça, da Renamo. Votaram a favor: Teodato Mondim da Silva Hunguana (Frelimo) e Manuel Henrique Franque (Renamo).

Igualmente, Teodato Mondim da Silva Hunguana teve também votos vencidos nos seguintes acórdãos e deliberações:

- Deliberação nº 29/CC/2004 de 5 de novembro, no recurso interposto pelo Partido Trabalhista (PT), sendo o único que apareceu com a declaração de voto vencido a favor do PT;

- Acórdão n.º 08/CC/2007 de 27 de dezembro, na ação direta solicitada pelo procurador-geral da República ao Conselho Constitucional, em 24 de maio de 2007, a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 595 a 599, 603 e 607 a 612, todos do Código de Processo Penal, e do artigo 16 da Lei n.º 3/2004, de 21 de janeiro. Este pedido foi acolhido pelos outros seis juízes conselheiros, que pelo voto da maioria declaram inconstitucional os artigos supra mencionados, sendo o Teodato Mondim da Silva Hunguana o único derrotado no ato de votação;

- Acórdão nº 07/CC/2008, de 28 de agosto, referente à ação intentada pelos oitenta e seis (86) Deputados da Assembleia da República que requereram ao Conselho Constitucional a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade da Lei nº 5/2007, de 9 de fevereiro. Na decisão, a maioria do CC (06) decidiu em não dar provimento ao pedido de declaração de inconstitucionalidade do artigo 34 da Lei n. º 5/2007, de 9 de fevereiro, que admitem a dissolução das Assembleias Provinciais pela Assembleia da República, sob proposta do Conselho de Ministros, quando elas não aprovem, pela segunda vez e em tempo útil, as propostas do Plano e do Orçamento provinciais.

Importante destacar também que, na Deliberação nº 30/CC/2004 de 18 de dezembro, referente ao recurso interposto pela Coligação Renamo-União Eleitoral e o seu candidato Afonso Macacho Marceta Dhlakama, apensar de ter votado contra, Teodato Mondim da Silva Hunguana teceu algumas considerações: ―Embora votando pelo não provimento do recurso, a fundamentação da Deliberação da CNE suscita algumas dúvidas e interrogações, que as informações adicionais submetidas em resposta à notificação deste Conselho Constitucional, não esclarecem completamente‖. O seu homólogo, Manuel Henrique Franque, proposto pela Coligação Renamo-União Eleitoral, votou pelo provimento do recurso, tendo sido o único voto vencido.

Como se pode perceber o sentido de voto deste juiz, Teodato Mondim da Silva Hunguana, a sua percepção não tinha cor partidária. Recursos interpostos pelos partidos de oposição ele votava a favor, de acordo com a sua consciência. Igualmente, perante ações interpostas que viessem de figuras ligadas ao Estado e ao partido Frelimo, o seu partido - à semelhança da sua indicação para o Conselho Constitucional, o procurador-geral da República é também indicado pelo presidente da República, que é ao mesmo tempo presidente do partido Frelimo - Teodato Mondim da Silva Hunguana votava contra. Esta forma de tomada de posição (que deve ser interpretada como ―neutralidade‖), não se observa em alguns juristas que estiveram ou estão lá no CC.

Como se referiu anteriormente, Manuel Henrique Franque, proposto pela Coligação Renamo-União Eleitoral, é o segundo jurista que se encontra nos acórdãos publicados com declaração de voto vencido, que em alguns círculos de opinião, foi sendo unânime com o juiz Teodato Mondim da Silva Hunguana. Para além dos casos anteriores, em que convergiu com o seu homólogo, Manuel Henrique Franque aparece também com voto vencido na decisão constante no Acórdão nº 08/CC/09 de 14 de agosto, referente ao Processo nº 08/CC/2009, de verificação dos requisitos legais exigidos para as candidaturas ao cargo de Presidente da República.

Manuel Henrique Franque aparece ainda com voto vencido nas decisões seguintes: - Acórdão n.º 07/CC/2007 de 18 de dezembro, atinente à ação intentada pelos oitenta e seis (86) deputados da Assembleia da República, pertencentes às bancadas parlamentares da oposição, que no dia 27 de novembro de 2007, requereram ao Conselho Constitucional a declaração da inconstitucionalidade ou ilegalidade dos despachos presidenciais n.ºs 25 e 26/2007, de 21 de Agosto, nos quais eram nomeados como juízes conselheiros do Tribunal Administrativo: José Ibraimo Abudo e David Zefanias Sibambo, cujo provimento foi negado pelo CC, por alegada falta de fundamento legal;

- Acórdão nº 02/CC/2009 de 15 de janeiro, referente à validação e proclamação dos resultados das eleições dos órgãos das autarquias locais, realizadas no dia 19 de novembro de 2008, em quarenta e três (43) municípios do país. Teve voto vencido pelos fundamentos constantes do Acórdão nº 12/CC/2008, de 30 de dezembro;

- Acórdão n.º 21/CC/2014 de 29 de dezembro, que valida e proclama os resultados das Eleições Presidenciais, Legislativas e das Assembleias Provinciais de 15 de outubro de 2014;

-Acórdão nº 12/CC/2008 de 30 de dezembro, referente ao recurso interposto pelo Partido Renamo, que ao abrigo do artigo 8 da Lei nº 8/2007, de 26 de fevereiro, interpôs recurso de uma deliberação da Comissão Nacional de Eleições que, indeferiu a sua reclamação impugnando o Apuramento Geral das Eleições Autárquicas de 19 de novembro de 2008. Um recurso cujo provimento foi recusado, por divergência entre os fundamentos do pedido e o objeto do recurso;

- Deliberação nº 22/CC/2004 de 26 de outubro, relativo ao recurso interposto pela Coligação Renamo-União Eleitoral, que impugnava a Deliberação nº 43/2004 de 11 de outubro da Comissão Nacional de Eleições, que determinava a realização do sufrágio no estrangeiro, nomeadamente: África do Sul, Malawi, Quénia, Swazilândia, Tanzânia, Zâmbia, Zimbabwé, Alemanha e Portugal, no quadro das Eleições Presidenciais e Legislativas marcadas para os dias 1 e 2 de dezembro de 2004. A Renamo-União Eleitoral, socorrendo-se

do artigo 119 da Lei nº 7/2004, de 17 de junho, que estipula que o ―círculo eleitoral corresponde ao território da República de Moçambique, com uma superfície de 779.500 km quadrados‖, entendia que a luz deste preceito legal, não pode haver eleições no estrangeiro. Este processo culminou com a negação do provimento ao recurso interposto, por improcedência dos fundamentos alegados;

- Deliberação n.º 25/CC/2004 de 26 de outubro, alusivo ao recurso interposto pela coligação de partidos políticos, denominada Grande Oposição, que foi rejeitado alegadamente por carecer de sustentação legal atendível. Lembrar que esta decisão teve dois votos vencidos: de Manuel Henrique Franque e de Teodato Mondim da Silva Hunguana;

- Deliberação n.º 30/CC/2004 de 18 de Dezembro, atinente ao recurso requerido pela Coligação Renamo-União Eleitoral e o candidato Afonso Macacho Marceta Dhlakama. O Conselho Constitucional negou provimento a este recurso.

Nota-se uma diferença nos votos vencidos entre os dois juristas que já declararam os seus votos. Teodato Mondim da Silva Hunguana, membro sênior do partido Frelimo, é o que aparece com mais votos vencidos, nos recursos submetidos pelos partidos de oposição e pelos membros e dirigentes do partido Frelimo, que convergem nesta filiação política. Significa que, ele votava a favor daqueles e contra estes últimos, o que deixa transparecer que a sua decisão de voto, não tinha qualquer convicção político- partidária. O mesmo já não se pode dizer em relação a Manuel Henrique Franque, membro sênior do partido Renamo, que aparece com mais votos vencidos nos recursos interpostos pelo seu partido e pelos partidos da oposição, o que mostra, de alguma forma, certa aliança com o partido que lhe indicou para aquele cargo.

Quadro 43 - Juiz conselheiro e seus votos vencidos (1990 2017)

Juiz Conselheiro Votos Vencidos Requerentes e total de processos

Teodato Mondim da Silva Hunguana

04

Procurador-Geral da República (Voto contra) 01 Deputados da Assembleia da República (Voto a favor) 01 Grande Oposição (GO) (Voto a favor) 01 Partido Trabalhista (PT) (Voto a favor) 01

Manuel Henrique

Franque 08

Deputados da Assembleia da República (Voto a favor) 01 Partido Renamo (Voto a favor) 01 Coligação Renamo-União Eleitoral (Voto a favor) 02 Validação e proclamação dos resultados eleitorais (Voto contra)

02 Grande Oposição (GO) (Voto a favor) 01 Ato de verificação dos requisitos legais (Voto contra) 01 Fonte: Elaboração própria com base em dados da pesquisa.

Constata-se ainda neste ponto que, nenhuma declaração de ―voto vencido‖ foi encontrada nas ações submetidas pelo presidente da República, Tribunais, Provedor de Justiça, Sociedade Civil, partido Frelimo e partido Movimento Democrático de Moçambique (MDM). O que pode significar que, na deliberação das ações solicitadas por estes atores, não tenha havido muitas discrepâncias, em termos de entendimento normativo. O consenso na interpretação das leis tem dominado as sessões. Os problemas surgem quando são recursos intentados pelos partidos políticos ou pelos titulares de cargos politizados (deputados).

Parece haver mais consenso nos atos relativos à fiscalização da constitucionalidade. Já em matérias eleitorais o figurino muda por completo. Foram oitenta e uma (81) decisões do Conselho Constitucional referentes aos atos eleitorais (recursos eleitorais e atos de validação e proclamação de resultados eleitorais), nove (9) votos vencidos foram declarados. Enquanto que, em 59 ações de fiscalização da constitucionalidade, três (3) foram votos vencidos, todos tendo apenas dois declarantes: Teodato Mondim da Silva Hunguana e Manuel Henrique Franque.

A questão que se levanta é: será que os demais atores daquele órgão tiveram sempre o mesmo entendimento na discussão da matéria jurídica? Não será por temer represálias e a não renovação dos seus mandatos, como sucedeu com Teodato Mondim da Silva Hunguana e Orlando António da Graça, este último, apesar de não ter apresentado nenhuma declaração de voto vencido, teve alguns destaques de votos contra os recursos interpostos pelo partido Renamo, que lhe propôs para o cargo de juiz conselheiro do CC.

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