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CAPÍTULO II – O PROCESSO DE COMPOSIÇÃO E RECRUTAMENTO DAS

2.1. O processo de indicação dos juízes do Conselho Constitucional em Moçambique

2.1.1 Mandatos dos juízes conselheiros do Conselho Constitucional

Como se disse anteriormente, os juízes conselheiros do Conselho Constitucional (CC) são nomeados para um mandato de cinco anos, renovável sem limite legal, podendo ir até a aposentadoria, estando sujeito a uma nova confiança das elites competentes para a indicação destes. No entanto, neste subtítulo, pretende-se mapear os mandatos que cada jurista cumpriu como Juiz Conselheiro deste soberano órgão jurídico-constitucional.

Em três de novembro de 2003, dia em que o CC passou a existir como instituição autónoma, cinco juristas foram indicados para compor ao recém-criado CC, em Moçambique. Tratava-se de Rui Baltazar dos Santos Alves, designado pelo presidente da República (nomeação ratificada pela Assembleia da República) para presidente do CC, Teodato Mondim da Silva Hunguana e Lúcia da Luz Ribeiro, indicados pela Frelimo (Partido no poder) e Orlando António da Graça, apontado pela Renamo-União Eleitoral (Coligação da oposição nas eleições de 1999) e João André Ubisse Guenha, cooptado pelos seus pares. No início de 2004, Lúcia Fernanda Buinga Maximiano do Amaral, proposta pela Frelimo e Manuel Henrique Franque, indicado pela Renamo, completaram o número formal da composição do CC (ver Quadro 9).

Quadro 9 – Juízes do primeiro mandato do Conselho Constitucional (2003-2009)

Membros Órgão indicador Função

1 Rui Baltazar dos Santos Alves Presidente da República Juiz-presidente

2 Teodato Mondim da Silva Hunguana AR (Partido Frelimo) Juiz Conselheiro

3 Lúcia da Luz Ribeiro AR (Partido Frelimo) Juíza Conselheira

4 Lúcia Fernanda Buinga Maximiano do Amaral AR (Partido Frelimo) Juíza Conselheira

5 João André Ubisse Guenha Seus pares (Cooptação) Juiz Conselheiro

6 Orlando António da Graça AR (Renamo-União Eleitoral) Juiz Conselheiro

7 Manuel Henrique Franque AR (Renamo-União Eleitoral) Juiz Conselheiro Fonte: Elaboração própria com base em dados da pesquisa.

No primeiro mandato (2003-2009) do CC, partindo da análise do perfil político destes juristas, não havia dúvidas que a Frelimo era representada pelos cinco juízes conselheiros no CC (um indicado pelo presidente da República, também presidente do partido Frelimo, três pela bancada maioritária da Frelimo e um pela cúpula também majoritária indicada) contra

dois do partido Renamo. Note-se que, o jurista João André Ubisse Guenha, que tinha sido cooptado pelos seus pares, no segundo mandato foi indicado pela bancada parlamentar da Frelimo.

O segundo mandato do CC (2009-2014) foi composto pelos seguintes juristas: Luís António Mondlane, presidente do CC designado pelo presidente da República em substituição à Rui Baltazar dos Santos Alves; Lúcia da Luz Ribeiro (renovação), João André Ubisse Guenha (renovação) e Domingos Hermínio Cintura (novo), todos propostos pela Frelimo. Manuel Henrique Franque (renovação) e Orlando António da Graça (renovação), propostos pela Renamo; e José Norberto Rodrigues Baptista Carrilho, designado pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial (ver Quadro 10).

Quadro 10 – Juízes do segundo mandato do Conselho Constitucional (2009-2014)

Membros Órgão Indicador Função Mandatos

1 Luís António Mondlane Presidente da República Juiz-presidente Primeiro

2 Lúcia da Luz Ribeiro AR (Partido Frelimo) Juíza Conselheira Segundo

3 João André Ubisse Guenha AR (Partido Frelimo) Juiz Conselheiro Segundo

4 Domingos Hermínio Cintura AR (Partido Frelimo) Juiz Conselheiro Primeiro

5 Orlando António da Graça AR (Renamo-União Eleitoral) Juiz Conselheiro Segundo

6 Manuel Henrique Franque AR (Renamo-União Eleitoral) Juiz Conselheiro Segundo

7 José Norberto R. B. Carrilho CSMJ Juiz Conselheiro Primeiro Fonte: Elaboração própria com base em dados da pesquisa.

Como se observa no quadro acima (Quadro 10), no primeiro mandato do CC desde a sua criação em 2003, dos primeiros sete membros indicados, somente quatro conseguiram renovar os seus mandatos. Os restantes três tiveram que abandonar o órgão. Dos que não renovaram, está Rui Baltazar dos Santos Alves, foi sentar em casa; Teodato Mondim da Silva Hunguana voltou a fazer política e, em 2010 foi nomeado presidente do Conselho de Administração da Moçambique Celular – Mcel (uma empresa estatal); e Lúcia Fernanda Buinga Maximiano do Amaral, que voltou a sua origem – a magistratura do Ministério Público, onde foi nomeada procuradora-geral adjunta, chefiando o departamento especializado para a área de controlo da legalidade.

Na transição do segundo para o terceiro mandato, dois juízes conselheiros não conseguiram renovar os seus mandatos. Trata-se de Orlando António da Graça que poderia renovar a sua permanência para o seu terceiro mandato e de José Norberto Rodrigues Baptista Carrilho que podia dar continuidade para o seu segundo mandato. Este último voltou a sua origem – no Tribunal Supremo, como Juiz Conselheiro. Orlando António da Graça, que tinha sido indicado pela Renamo, desconhece-se o seu paradeiro atual, verdade é que não voltou

para Assembleia da República, onde era Deputado aquando da sua indicação para membro do Conselho Constitucional.

No terceiro e atual mandato (2014-2019), compõem o CC, os seguintes juízes conselheiros: Hermenegildo Maria Cepeda Gamito, atual presidente desde 26 de maio de 2011, designado pelo presidente da República e ratificado pela Assembleia da República, em substituição de Luís António Mondlane, em virtude de este ter renunciado ao cargo; Domingos Hermínio Cintura; Lúcia da Luz Ribeiro; João André Ubisse Guenha; Mateus da Cecília Feniasse Saize, todos indicados pela bancada parlamentar da Frelimo; Manuel Henrique Franque, escolhido pela Renamo; e Ozias Pondja, designado pelo CSMJ (ver Quadro 11).

Quadro 11– Juízes do terceiro mandato do Conselho Constitucional (2014-2019)

Membros Órgão indicador Função Mandatos

1 Hermenegildo M. C. Gamito Presidente da República Juiz-presidente Segundo

2 Lúcia da Luz Ribeiro AR (Partido Frelimo) Juíza Conselheira Terceiro

3 João André Ubisse Guenha AR (Partido Frelimo) Juiz Conselheiro Terceiro

4 Domingos Hermínio Cintura AR (Partido Frelimo) Juiz Conselheiro Segundo

5 Mateus da Cecília F. Saize AR (Partido Frelimo) Juiz Conselheiro Primeiro

6 Manuel Henrique Franque AR (Renamo-União Eleitoral) Juiz Conselheiro Terceiro

7 Ozias Pondja CSMJ Juiz Conselheiro Primeiro

Fonte: Elaboração própria com base em dados da pesquisa.

Observa-se nos dados constantes nos quadros acimas que, em Moçambique, até a data de hoje, já foram nomeados para o cargo de presidente do CC três personalidades de renome na profissão jurídica nacional, especificamente, Rui Baltazar dos Santos Alves, Luís António Mondlane e Hermenegildo Maria Cepeda Gamito, este último ainda em exercício, já no seu segundo mandato, renovado a 14 de julho 2016, através da sua recondução, pelo atual presidente da República, Filipe Jacinto Nyusi. Estas três personalidades tiveram mandatos ou permanência no cargo diferentes, pois, as renovações não são automáticas, dependem da vontade do órgão de soberania que lhes nomeia – o presidente da República.

Nota-se também que dos três juristas que ocuparam o cargo de presidente do CC, somente um conseguiu renovar o seu mandato, Hermenegildo Maria Cepeda Gamito. Os dois primeiros não tiveram a mesma sorte, sobretudo o jurista Luís António Mondlane que somente ocupou o cargo por dois anos (ver Quadro 12).

Quadro 12 - Membros do Conselho Constitucional e seus mandatos/anos na função

Membros Anos de exercício Órgão indicador

PRESIDENTES DO CONSELHO CONSTITUCIONAL

Rui Baltazar dos Santos Alves 5 anos (2003 a 2009) – fez um mandato P. República Luís António Mondlane 2 anos (2009 a 2011) P. República Hermenegildo Maria Cepeda Gamito 7 anos (2011- atual, no 2º mandato) P. República

JUÍZES CONSELHEIROS DO CONSELHO CONSTITUCIONAL

Lúcia da Luz Ribeiro 14 anos (2003 - em exercício no 3º mandato) Bancada P. Frelimo João André Ubisse Guenha 14 anos (2003 - em exercício no 3º mandato) Bancada P. Frelimo Teodato Mondim da Silva Hunguana 5 anos (2003 a 2009) –fez um mandato. Bancada P. Frelimo Orlando António da Graça 10 anos (2003 a 2014) – fez dois mandatos. Bancada P. Renamo Lúcia Fernanda Buinga M. do Amaral 5 anos (2004 a 2009) – fez um mandato. Bancada P. Frelimo Manuel Henrique Franque 14 anos (2004- em exercício no 3º mandato). Bancada P. Renamo José Norberto Rodrigues B. Carrilho 5 anos (2009-2014) – fez um mandato. CSMJ

Domingos Hermínio Cintura 9 anos (2009 - em exercício no 2º mandato). Bancada P. Frelimo Mateus da Cecília Feniasse Saize 4 anos (2014- em exercício no 1º mandato). Bancada P. Frelimo Ozias Pondja 4 anos (2014- em exercício no 1º mandato). CSMJ

Fonte: Elaboração própria com base em dados da pesquisa.

Contudo, as razões da renovação ou não renovação, não são públicas, somente os políticos com competência de indicar são os que sabem. Nos termos da lei, os juristas que somente ficaram no cargo por apenas um mandato poderiam continuar a semelhança dos outros que lá ficaram. Já que em Moçambique os mandatos destes membros são curtos (cinco anos) e susceptíveis de renovação até a jubilação, mediante uma nova proposta ou confiança do órgão que indica (presidente da República, Assembleia da República e CSMJ). Mas a própria lei é omissa em relação aos requisitos para a renovação ou permanência. Não existe um instrumento legal que especifique todos os requisitos necessários para a renovação por forma a evitar equívocos de alguns juristas pensarem que estão sendo injustiçados.

Os padrões em vigor guiam-se somente em uma avaliação subjetiva feitas pelas elites governantes, o que até certo ponto torna fatal a independência das elites indicadas, já que pelas regalias de que gozam e que lhes são atribuídas por lei, não há ninguém que não queira renovar ou que não queira ser Juiz Conselheiro do Conselho Constitucional. E para isso, é possível que ocorra relações clientelistas, de modo a agradar quem tem o poder de nomear, o que muitas vezes acaba transformando-se em problemas político e/ou jurídico.

No entanto, o Conselho Constitucional é, até então, na sua composição, um órgão de soberania bipolarizado e maioritariamente controlado pela Frelimo (ver Quadro 13). Até então, a renovação dos seus membros tem ocorrido na base de um acordo bilateral entre a FRELIMO e a REMANO. No mandato de 2009, a FRELIMO, por si só teve os dois terços dos mandatos parlamentares para fazer passar as suas propostas. A RENAMO é que ficou dependente do partido no poder. O Movimento Democrático de Moçambique (MDM),

segundo maior partido da oposição, não conseguiu indicar o seu representante no CC, por razões da proporcionalidade, aliado aos poucos deputados (oito) que obteve nas quartas eleições legislativas de 2009 (ver Quadro 14).

Quadro 13 - Representação político partidária no Conselho Constitucional (2002 – 2014)

PARTIDOS POLÍTICOS E CSMJ

Ano de Eleições/Representantes no CC

2003/2004 2009 2014 FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique) 03 03 04 RENAMO (Resistência Nacional Moçambicana) - 02 01

RENAMO – UE (Renamo União Eleitoral) 02 - -

Presidente da República 01 01 01

Juízes Conselheiros (Cooptação) 01 - -

CSMJ (Conselho Superior da Magistratura Judicial) - 01 01

TOTAL 07 07 07

Fonte: Elaboração própria com base em dados da pesquisa.

Desta forma, diga-se de passagem, que no mandato 2014-2019, a Frelimo está com cinco representantes (um indicado pelo presidente da República ao mesmo tempo presidente da Frelimo e quatro pela bancada parlamentar da Frelimo na Assembleia da República) contra um do maior partido da oposição (escolhido pela bancada parlamentar da Renamo na Assembleia da República), neste órgão de soberania responsável pela administração da justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional. Em cinco eleições presidenciais e legislativas realizadas no país (1994, 1999, 2004, 2009 e 2014), as bancadas da oposição, não conseguiram reunir um número de deputados suficiente para contrariar as vontades do partido no poder (ver Quadro 14), que sempre aparece como dominador.

Quadro 14 - Número de Deputados na Assembleia da República de Moçambique (1994 – 2014)

PARTIDOS POLÍTICOS ANO DE ELEIÇÕES/NÚMERO DE

DEPUTADOS ELEITOS

1994 1999 2004 2009 2014 FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique) 129 133 160 191 144 RENAMO (Resistência Nacional Moçambicana) 112 - - 51 89

RENAMO-UE (RENAMO-União Eleitoral) - 117 90 - -

Movimento Democrático de Moçambique (MDM) - - - 08 17

União Democrática (UD) 09 - - -

TOTAL 250 250 250 250 250

Fonte: Elaboração própria com base em dados da pesquisa.

Porém, devido à forma da composição do Conselho Constitucional moçambicano, a atividade dos juízes conselheiros tem sofrido frequentes oposições, sendo um dos principais argumentos, o fato deste órgão de soberania ser composto majoritariamente por juristas

militantes do partido no poder (Frelimo). Sendo acusado de agir em favor do seu partido ou do governo vigente. Chega-se a pensar que seja uma miragem, esperar que um órgão jurídico bipolarizado como este, com juristas cooptados pela confiança política, delibere na base da isenção e da imparcialidade. No entanto, uma das formas de diminuir esse tipo de desconfiança, é estabelecer um órgão autônomo e independente, a partir da sua criação e composição dos seus membros até ao seu funcionamento.

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