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A (não) renovação dos mandatos dos juízes do Conselho Constitucional

CAPÍTULO IV – ANÁLISE DOS ACÓRDÃOS DO CONSELHO CONSTITUCIONAL

4.4 A (não) renovação dos mandatos dos juízes do Conselho Constitucional

Uma análise ponderada permite concluir que, as decisões colegiais do Conselho Constitucional (CC) sugerem haver ou ter havido uma interferência. Tudo quanto se vê, é que as deliberações do CC são feitas mediante uma votação e, que os votos muitas vezes transparecem um pendor partidário. Por outro lado, é sabido que, a composição deste órgão é por indicação política. Consequentemente, os juízes indicados tendem a obedecer aos seus líderes, sob o receio de não renovarem os seus mandatos: os indicados pelo partido Frelimo votam em função dos interesses do seu partido e, os propostos pela Renamo idem. Os juízes propostos pela Renamo para o CC têm sido os mais derrotados nas ações interpostas pelo seu partido ao Conselho Constitucional. Porque estão em minoria e, as deliberações do CC sendo por votação, acabam dando vantagem à Frelimo.

Verifica-se assim, uma submissão da elite judicial à elite política, por meio de um jogo político, de promoções dos magistrados e da manutenção de cargos públicos. É uma rede, em que quem age fora dela é severamente castigo, por via de exclusão política. Pode ter sido o caso de Teodato Mondim da Silva Hunguana e de Orlando António da Graça, que viram seus mandatos não serem renovados pelos nomeadores (elites políticas).

Verdade é que esta confiança existe e, é tida como fundamental para a renovação do mandato dos juízes conselheiros do Conselho Constitucional. Verifica-se que depois destes dois juízes acima (Teodato Mondim da Silva Hunguana, membro da Frelimo e Orlando António da Graça, membro da Renamo) terem-se mostrado ou se posicionado contra os recursos interpostos pelos seus partidos, ou a favor de recursos interpostos por um partido oposto as suas proveniências, não renovaram os seus mandatos no Conselho Constitucional.

Como se referiu anteriormente, Teodato Mondim da Silva Hunguana, jurista proposto pelo partido Frelimo para o Conselho Constitucional, apareceu com voto vencido no recurso interposto pela coligação de partidos políticos, denominada Grande Oposição (GO). No recurso interposto pelo Partido Trabalhista (PT), Teodato Hunguana é o único que aparece com a declaração de voto vencido a favor do PT; na ação direta interposta pelo procurador- geral da República - uma figura de escolha direta do Presidente da República, que é também presidente do partido Frelimo –; e na ação intentada pelos oitenta e seis Deputados da Assembleia da República, pela bancada minoritária da Coligação Renamo-União Eleitoral. Esta sua posição, provavelmente não agradava ao seu partido. Consequentemente, no mandato seguinte, de 2009-2014, viu seu mandato a não ser renovado, tendo sido substituído pelo jurista Domingos Hermínio Cintura, outro jurista também de alto prestigio acadêmico.

Após cessar as funções de juiz conselheiro do CC em 2009, Teodato Mondim da Silva Hunguana concorreu nas eleições internas do partido Frelimo, ao nível de Maputo-Cidade, para constar na lista dos candidatos à Assembleia da República, nas eleições de 28 de Outubro de 2009. Infelizmente, não conseguiu entrar e em 2010 acabou sendo nomeado Presidente do Conselho de Administração da Moçambique Celular (Mcel). No entanto, o trajeto deste jurista mostra que as instituições da justiça moçambicana são dirigidas por juristas que efetivamente estão interessados nas questões políticas. Pois, após cessar as funções, mostram interesses de voltar a ocupar cargos políticos ou do Estado, mercê de nova indicação. Esta pretensão pode significar que as elites jurídicas continuem mostrando afinidades às elites governantes, para não perder a confiança política.

Orlando António da Graça, também jurista de formação, foi um dos escolhidos pela Coligação Renamo-União Eleitoral, para representá-la no primeiro mandato do CC. Como a

Renamo-União Eleitoral tinham conseguido 117 assentos parlamentares e, conforme o critério de representação proporcional pela Assembleia da República, tinha que indicar dois representantes. O jurista Orlando António da Graça foi um dos escolhidos pela bancada parlamentar da Renamo-União Eleitoral, sendo Manuel Henrique Franque o segundo, para um mandato de cinco anos (novembro de 2003 a novembro de 2008).

Terminado o mandato e chegado o momento de cessão ou renovação, sempre conforme o critério de representação proporcional pela Assembleia da República, a Frelimo continuava com o direito de indicar os três e a Renamo os dois juízes conselheiros. Eis que, a Renamo, o maior partido da oposição, anunciou a renovação de Manuel Henrique Franque no CC (o jurista com mais votos vencidos nos acórdãos do Conselho Constitucional) e a substituição de Orlando António da Graça (sem declaração de voto expressa nos acórdãos analisados) por Isabel Rupia, uma antiga procuradora-geral adjunta e diretora do Gabinete Central de Combate à Corrupção, para juíza conselheira do Conselho Constitucional.

Contudo, pelo voto majoritário do partido Frelimo, que dispunha de 133 assentos na Assembleia da República, contra 117 da Renamo, a proposta não passou – foi chumbada. Tendo se mantido o juiz Orlando António da Graça que acabou cumprindo o segundo mandato até a sua saída em 2014. No entanto, como não há limites de mandatos fixados por lei, alguns juristas que entraram no primeiro mandato junto com Orlando António da Graça, permanecem em exercício até hoje (Lúcia da Luz Ribeiro e Manuel Henrique Franque, por exemplo), estando sujeitos apenas a renovação dos seus mandatos, através das sucessivas indicações pelos seus aliados.

De referir que, Manuel Henrique Franque tem sido recorrentemente o juiz conselheiro do CC com voto vencido (ver Quadro 43), diferentemente de Orlando António da Graça, que até a sua saída não tinha declarado nenhum voto vencido, principalmente, nos recursos interposto pelo partido que lhe indicou para representá-lo no Conselho Constitucional. Pelo menos nas 157 decisões, sendo 123 constantes em acórdãos e 34 em deliberações, descarregados no site oficial do Conselho Constitucional e analisados, não consta nenhum voto vencido declarado por Orlando António da Graça.

Lembre-se de que, somente foram registrados doze (12) votos vencidos, dos quais oito (08) são de Manuel Henrique Franque, indicado pelo partido Renamo e, quatro (04) de Teodato Mondim da Silva Hunguana, juiz conselheiro proposto pelo partido Frelimo, que acabou cumprindo somente um mandato. E, na Deliberação n.º 30/CC/2004 de 18 de Dezembro, concernente ao recurso interposto pela Coligação Renamo-União Eleitoral e o seu candidato Afonso Macacho Marceta Dhlakama, onde Teodato Mondim da Silva Hunguana

teceu algumas considerações e Manuel Henrique Franque votou a favor, Orlando António da Graça votou contra. O mesmo sucedeu com a decisão constante no Acórdão n.º 07/CC/2007 de 18 de Dezembro, atinente a ação intentada pelos oitenta e seis deputados da Assembleia da República, pertencentes à bancada parlamentar da oposição (em que ele fez parte), votou contra. De igual modo, Orlando António da Graça votou contra na decisão constante no Acórdão nº 12/CC/2008 de 30 de Dezembro, referente ao recurso interposto pelo partido Renamo, tendo sido Manuel Henrique Franque o único com voto vencido.

Alguns analistas entenderam que, a pretensão de não continuidade de Orlando António da Graça prende-se pelo caráter íntegro, imparcial, idôneo, independente e transparente que o caracterizou durante o seu primeiro mandato. Foi daqueles juízes conselheiros, que à semelhança de Teodato Mondim da Silva Hunguana, o seu voto não tinha nada a ver com a cor partidária do proponente do recurso interposto (seja do seu partido, seja de um partido oposto). Votava segundo as suas convicções, conhecimentos e entendimentos. Não se pretende aqui inferiorizar as convicções dos outros juízes conselheiros que trabalham ou trabalharam no CC, mas apenas destacá-los pela coragem que sempre tiveram em poder se posicionar a favor de uma ação intentada por um partido, que não seja da sua proveniência. Estiveram também no CC juízes bons, como é o caso de: Rui Baltazar dos Santos Alves, José Norberto Rodrigues Baptista Carrilho, entre outros, que saíram também derrotados em algumas decisões e acabaram cumprindo apenas um mandato (um mandato de cinco anos).

Infelizmente, é a realidade moçambicana. Acontece e tem acontecido. O mais difícil é e, tem sido trazer à tona estes fatos.

Conclusão parcial

Conclui-se, neste capítulo, que as decisões e o posicionamento dos juízes conselheiros do Conselho Constitucional de Moçambique, dão-se, não somente como uma luta jurídica, mas também como uma luta política. Os juristas indicados para o CC protegem, de alguma forma, os interesses dos seus partidos. Ao que tudo indica, nota-se que são monitorados pelos partidos que lhes propõem para ocupar aquela função. Os que se mostraram íntegros e se calhar imparciais, na tomada de decisões, viram os seus mandatos não renovados. O cumprimento de apenas um mandato dos juízes: José Norberto Rodrigues Baptista Carrilho, Lúcia Fernanda Buinga Maximiano do Amaral, Rui Baltazar dos Santos Alves e Teodato Mondim da Silva Hunguana, é uma forte indicatriz e, corrobora para esta tese de que “é

Desta forma, é correto afirmar-se que, as elites judiciais indicadas para o Conselho Constitucional, não gozam de uma independência efetiva. Pois, estão totalmente susceptíveis à influências e pressões externas, propiciadas pela forma como estas elites judiciais são indicadas para aquela função. Consequentemente, fica assim neutralizado o caráter de integridade e de imparcialidade destes juristas, para a tomada de melhores decisões, que sirvam à nação e ao povo moçambicano. Isto acontece nestes casos, porque está em causa fazer escolhas: ou garantir o cargo ou estar fora no próximo mandato.

CAPÍTULO V – A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E OS PRINCIPAIS

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