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DEFINIÇÃO DE EMOÇÃO E SENTIMENTO

No documento e o cerebro criou o homem.pdf (páginas 139-142)

O QUE HÁ NO CÉREBRO CAPAZ DE CRIAR A MENTE?

DEFINIÇÃO DE EMOÇÃO E SENTIMENTO

Conversar sobre a emoção traz dois problemas. Um é a hetero- geneidade dos fenômenos que podemos chamar por esse nome. Como vimos no capítulo 2, o princípio do valor funciona por meio de mecanismos de recompensa e punição, e também de impulsos e mo- tivações, que são uma parte essencial da família da emoção. Quando falamos em emoções propriamente ditas (por exemplo, medo, raiva, tristeza ou nojo), também falamos necessariamente de todos aqueles outros mecanismos, pois eles são componentes de cada emoção e es- tão independentemente envolvidos na regulação da vida. As emoções propriamente ditas são apenas uma joia da coroa integrante da regu- lação da vida.

O outro problema importante é a distinção entre emoção e senti- mento. Emoção e sentimento, embora façam parte de um ciclo forte- mente coeso, são processos distinguíveis. Não importa que palavras usamos para nos referir a esses processos distintos, contanto que re- conheçamos que a essência da emoção e a essência do sentimento são diferentes. Obviamente, para começar, não há nada de errado com as palavras "emoção" e "sentimento", e elas servem perfeita- mente para o propósito, em inglês e nas muitas línguas nas quais têm uma tradução direta. Comecemos, pois, pela definição desses termos básicos à luz da neurobiologia atual. Emoções são programas de ações complexos e em grande medida automatizados, engendrados pela evolução. As ações são complementadas por um programa cog- nitivo que inclui certas ideias e modos de cognição, mas o mundo das emoções é sobretudo feito de ações executadas no nosso corpo, desde expressões faciais e posturas até mudanças nas vísceras e meio

interno.

Os sentimentos emocionais, por outro lado, são as percepções compostas daquilo que ocorre em nosso corpo e na nossa mente quando uma emoção está em curso. No que diz respeito ao corpo, os sentimentos são imagens de ações, e não ações propriamente ditas; o mundo dos sentimentos é feito de percepções executadas em mapas cerebrais. Mas cabe aqui uma ressalva: as percepções que denomin- amos sentimentos emocionais contêm um ingrediente especial que corresponde aos sentimentos primordiais de que já tratamos anterior- mente. Esses sentimentos baseiam-se na relação única entre o corpo e o cérebro que privilegia a interocepção. Há outros aspectos do corpo sendo representados em sentimentos emocionais, obviamente, mas a interocepção domina o processo e é responsável pelo que des- ignamos como o aspecto sentido dessas percepções.

A distinção geral entre emoção e sentimento, portanto, é ra- zoavelmente clara. Enquanto as emoções constituem ações acompan- hadas por ideias e certos modos de pensar, os sentimentos emocion- ais são principalmente percepções daquilo que nosso corpo faz dur- ante a emoção, com percepções do nosso estado de espírito durante esse mesmo lapso de tempo. Em organismos simples capazes de comportamento mas desprovidos de um processo mental, as emoções também podem estar vivas, mas não necessariamente são seguidas por estados de sentimento emocional.

Emoções ocorrem quando imagens processadas no cérebro põem em ação regiões desencadeadoras de emoção, por exemplo, a amíg- dala ou regiões especiais do córtex do lobo frontal. Quando qualquer uma dessas regiões desencadeadoras é ativada, certas consequências sobrevêm: moléculas químicas são secretadas por glândulas

endócrinas e por núcleos subcorticais e liberadas no cérebro e no corpo (por exemplo, o cortisol no caso do medo), certas ações são executadas (por exemplo, fugir ou imobilizar-se, contrair o intestino, também em caso de medo), e certas expressões são assumidas (por exemplo, uma expressão facial ou postura de terror). É importante, pelo menos nos humanos, o fato de que certas ideias e planos tam- bém vêm à mente. Por exemplo, uma emoção negativa como a tristeza leva à evocação de pensamentos sobre fatos negativos; uma emoção positiva causa o oposto; os planos de ação representados na nossa mente também condizem com o sinal geral da emoção. Certos estilos de processamento mental são imediatamente implementados assim que ocorre uma emoção. A tristeza desacelera o raciocínio e pode nos levar a ficar ruminando a situação que a desencadeou; a alegria pode acelerar o raciocínio e reduzir a atenção para eventos não relacionados. O agregado de todas essas respostas constitui um "estado emocional" que se desenrola no tempo com razoável rapidez e então arrefece até que novos estímulos capazes de causar emoções sejam introduzidos na mente e iniciem outra cadeia de reações emo- cionais. Os sentimentos emocionais constituem o passo seguinte.

Seguem-se rapidamente à emoção e constituem a legítima, con- sequente e definitiva realização do processo emocional: a percepção composta de tudo o que ocorreu durante a emoção, as ações, as idei- as, o modo como as ideias fluem, devagar ou depressa, ligadas a uma imagem ou rapidamente trocando uma por outra.

Visto de uma perspectiva neural, o ciclo emoção-sentimento começa no cérebro, com a percepção e a avaliação de um estímulo potencialmente capaz de causar uma emoção e o subsequente desen- cadeamento de uma emoção. O processo dissemina-se então para outras partes do cérebro e pelo corpo propriamente dito,

desenvolvendo o estado emocional. Na conclusão, o processo retorna ao cérebro para a parte do ciclo correspondente ao sentimento, em- bora o retorno envolva regiões cerebrais diferentes daquelas onde tudo começou.

Os programas de emoção incorporam todos os componentes do maquinário da regulação da vida que foram surgindo na história da evolução, como a percepção e a detecção de condições, a mensur- ação dos graus de necessidade interna, o processo de incentivo com seus aspectos de punição e recompensa, os mecanismos de predição. Os impulsos e as motivações são constituintes mais simples da emoção. É por isso que nossa alegria ou tristeza alteram o estado de nossos impulsos e motivações, mudando imediatamente nossa mis- tura de apetites e desejos.

DESENCADEAMENTO E EXECUÇÃO DE EMOÇÕES

No documento e o cerebro criou o homem.pdf (páginas 139-142)