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3 CONTEXTUALIZAÇÃO TEÓRICA

3.1.2 Definições e taxonomia dos conflitos 1 Definições

Definir a palavra conflito é uma tarefa árdua, composto de diversas variantes, um conflito pode ser social, político, psicanalítico, familiar, interno, externo, entre pessoas, entre instituições ou entre nações, pode ser um conflito étnico, religioso ou ainda um conflito de valores.

De fato, a noção de conflito não é unânime. Nascido do antigo latim, a palavra conflito tem como raiz etimológica a ideia de choque ou a ação de chocar, de contrapor ideias, ideologias, valores, interesses ou armas. Por isso, para que haja conflito é preciso, em primeiro lugar, que as forças confrontantes sejam dinâmicas, contendo em si próprias o sentido da ação, reagindo umas sobre as outras.

Na tentativa de uma explicação mais esmiuçada para o fenômeno conflito, percebe-se que consiste num enfrentamento entre dois seres ou grupos da mesma espécie que manifestam, uns a respeito dos outros, uma intenção hostil, geralmente com relação a um direito. Para manter esse direito, afirmá-lo ou restabelecê-lo, muitas vezes lançam mão da violência, o que pode trazer como resultado o aniquilamento de um dos conflitantes.

Essa definição de conflito pode ser desmembrada em alguns aspectos importantes. Primeiramente, se avista que o enfrentamento é voluntário, de modo que um homem, ao tropeçar em uma pedra, colide com a mesma e não conflita com ela, justamente porque não há a intenção de conflitar. A “vontade conflitiva” pode se direcionar a uma única pessoa ou a um grupo. Num segundo momento, avista-se a necessidade de que os

antagonistas sejam da mesma espécie, pois não se denomina conflito o enfrentamento entre um homem e um animal.

A intencionalidade conflitiva implica na vontade hostil de prejudicar o outro, porque é considerado um inimigo ou porque assim se quer que seja. A hostilidade pode ser uma simples malevolência ou tomar aspectos mais graves como uma briga ou uma guerra.

O conflito trata de romper a resistência do outro, pois implica no confronto de duas vontades quando uma busca dominar a outra com a expectativa de lhe impor a sua solução. Essa tentativa de dominação pode se concretizar através da força direta ou indireta, através da ameaça física ou psicológica. No final, o desenlace pode ocorrer da vitória de um e da derrota do outro. Assim, o conflito é uma maneira de ter razão independentemente dos argumentos racionais (ou razoáveis). Então, percebe-se que não se reduz a uma simples confrontação de vontades, ideias ou interesses. É um procedimento contencioso no qual os antagonistas se tratam como adversários ou inimigos (SPENGLER, 2009).

No que tange ao objeto do conflito, geralmente refere-se a um direito entendido não apenas como uma disposição formal, mas também como uma reivindicação de justiça.

O conflito pode ser definido como um processo ou estado em que duas ou mais pessoas divergem em razão de metas, interesses ou objetivos individuais percebidos como mutuamente incompatíveis.

No meio de cada conflito existe uma tensão. A tensão é entendida como um estado de inquietação ou distúrbio, desassossego interior, desequilíbrio: um sentimento de stress psicológico seguidamente manifestado por aumento do tônus muscular e por outros indicadores psicológicos de emoção, um estado de hostilidade latente ou oposição entre indivíduos ou grupos, como classes, raças ou nações (SERPA, 1999).

O desejo é seguidamente o motor dessa máquina tenso/conflitiva (WARAT, 2001). Quando dois desejos se chocam, nasce o conflito. Dessa desarmonia nascida do choque de desejos resulta, muitas vezes, a submissão de um aos desejos do outro, de modo que se pode individuar um ganhador (aquele que se sobrepõe) e um perdedor (aquele cujos desejos são sublimados pelo outro). Desse modo, o conflito pode ser definido também como um processo dinâmico de interação

humana e confronto de poder no qual uma parte influencia e qualifica o movimento da outra (LORENZ, 2001).

O conflito pode ser considerado tanto uma potencialidade como uma situação, uma estrutura, uma manifestação, um evento ou um processo. Em cada uma dessas formas existe um confronto dialético entre a realidade e a perspectiva do homem, em entrelaçadas potencialidades, disposições e poderes. O que é perceptível é o movimento de forças, o “toma/larga”, o “puxa/empurra”, o “dá/tira” (SPENGLER, 2010-a). Um movimento para frente e para trás. Por isso, Rudolph Rummel (1976) define o conflito como o equilíbrio dos vetores de poder. Nenhuma das partes tem poder suficiente para sobrepor-se à outra e eliminar o conflito.

3.1.2.2 Taxonomia

O conflito pode ser manifesto ou latente, sendo o primeiro conhecido e trabalhado de forma explícita, enquanto o segundo ocorre quando as pessoas não o percebem ou o evitam. Pode ser intrapsíquico ou interpessoal, ou seja, do sujeito com ele mesmo ou entre os indivíduos. O conflito pode ser ainda funcional e disfuncional: funcional quando é aberto e pode proporcionar uma oportunidade para resolver o problema; disfuncional quando é reprimido, não expressado diretamente, prolongando-se por tempo geralmente longo (TING-TOMEY E OETZEI, 2001).

Os vários tipos de conflitos podem ser distinguidos com base em algumas características objetivas: dimensões, intensidade, objetivos. Quanto à dimensão, o indicador utilizado será constituído pelo número de participantes potenciais (por exemplo, uma greve na qual participam todos os trabalhadores das empresas envolvidas). A intensidade poderá ser avaliada com base no grau de envolvimento dos participantes, na sua disponibilidade de resistir até o fim (perseguindo os chamados fins não negociáveis) ou a entrar em tratativas apenas negociáveis.

Moore (1998) assinala outra espécie de conflito, os emergentes, isto é, quando ambas as partes reconhecem que existe uma disputa surgindo, ensejando uma troca de tons severos entre elas, mas não sabem como resolver a questão. O

autor faz ainda uma breve classificação para os conflitos (MOORE, 1998):

a) de relacionamento: causados por emoções fortes, problemas de comunicação, preconceitos, percepções distorcidas, etc.

b) relacionados a dados: causados por falta ou erro de informação, por interpretações diferentes sobre os dados ou procedimento de avaliação;

c) de interesse: causados por competição, quando há interesses percebidos ou realmente excludentes, que podem estar relacionados com o objeto da disputa, com o procedimento ou mesmo interesses psicológicos;

d) estruturais: causados por comportamento destrutivo, desigualdade no controle ou acesso aos recursos, fatores físicos ou ambientais, que impedem a cooperação;

e) de valores: causados por ideias e crenças diferentes utilizadas para valorar ou avaliar fatos ou atos, está relacionado com o modo de vida, religião e ideologia. Ao retratar os tipos de conflitos, suas variáveis e características mais importantes, SOARES (2010, p. 70-71) apresenta a seguinte exposição, conforme o Quadro 21:

Quadro 21 – Tipos de Conflito

Tipo de conflito Variável mais importante Características Conflito de recursos

escassos

Competição A percepção de escassez e necessidade

desencadeia o conflito que é fortemente marcado pela competição (há disputa porque não há o suficiente para todos). Se o conflito envolve a desigualdade na distribuição, já não é mais considerado conflito de recurso escasso.

Conflito de poder Controle, influência e cooptação

Relacionado à motivação de obter sucesso, ganhos. Disputam-se porque uns querem mandar, controlar ou influenciar os outros.

Conflitos de autoestima Autopercepção Disputa-se porque o orgulho foi ferido, como pessoa em relação interpessoal ou o valor ideia do grupo, se entre grupos.

Conflitos de valores Valores/crenças mais fortes

A disputa existe porque os valores ou crenças fundamentais estão em jogo. As vezes os valores são a causa ou simplesmente servem de argumento para atingir outros interesses. Alguns deles podem ser inegociáveis.

Conflito estrutural Tempo Conflitos que superam a esfera interpessoal ou

grupal para atingir toda a sociedade. São conflitos incrustados à estrutura social. A disputa nesse caso envolve um problema cuja solução requer longo prazo, esforço importante de muitas pessoas ou meios, além das possibilidades pessoais. Conflito de identidade Identidade Relacionado ao processo de identificação. A

disputa envolve a maneira íntima de ser de uma pessoa ou de um grupo.

Conflito normativo Norma Um conflito normativo também é cultural na medida em que a norma faz parte da cultura. Disputa-se porque não se cumpre uma norma legal ou social.

Conflito de expectativa Expectativas A disputa é causada porque não se cumpriu o que um esperava do outro.

Conflito de inaptidão Mudança A disputa é causada pela mudança que causa tensões.

Conflito de informação Informações (verbais,

escritas, gestuais, etc.) Disputa causada por algo dito ou não dito, ou que se compreendeu de forma diferente. Conflito de interesses Interesses Disputa é sobre os interesses (algo que as

pessoas desejam ou necessitam) contrapostos. Conflito atributivo Responsabilidade A disputa ocorre porque alguém não assume a

responsabilidade ou culpa de uma situação ocorrida.

Conflito de relações

pessoais Confiança A disputa ocorre porque não se dão como pessoas – choque de personalidades. Conflito de inibição Inibição Conflito que envolve um bloqueio a uma ação. A inibição pode se dar por medo, por querer evitar problemas. A disputa existe porque corresponde ao outro a solução.

Conflito de legitimação Reconhecimento /

dar valor ao outro Aqui a disputa envolve a maneira como o outro age, agiu ou agirá, sem autorização para fazê-lo.