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3 CONTEXTUALIZAÇÃO TEÓRICA

3.1.5 Sociologia do conflito

Heráclito de Éfeso, filósofo pré-socrático, foi o primeiro filósofo a contemplar o movimento e relacioná-lo com a mudança e a contradição, características fundamentais presentes no homem e na própria natureza, bem como na relação homem- natureza. Fragmentos dos escritos de Heráclito, conforme Melo Neto (1996), demonstram seu entendimento de que a lei fundamental que governa o universo é a luta entre os contrários, luta que, em última análise, constitui uma unidade profunda e que se expressa nas correlações mais variadas como as que existem entre completo e incompleto, concorde e discorde, harmonia e desarmonia e de todas as coisas um, e de um, todas as coisas (MELO NETO, 1996).

Desde então, a luta entre os contrários passou a objeto de estudos permanentes, que desaguaram na Teoria do Conflito, de

Karl Marx (DEMO, 1989). A dialética hegeliana, retomada por Marx para a compreensão da realidade social, que opera com a unidade de contrários, enxerga a realidade social a partir do pressuposto do conflito social, percebendo que “toda formação social é suficientemente contraditória, para ser historicamente superável” (Demo, 1989, p. 88).

A perspectiva marxista (que credita a existência dos conflitos ao embate entre relações socioeconômicas), apoiada no método do materialismo histórico dialético, consiste no primeiro modelo realmente próprio das ciências sociais, ainda que tenha sido construído em uma aproximação com a filosofia, já que o funcionalismo que a secundou (que atribui a existência dos conflitos à natureza humana) tem seus conceitos e métodos tomados de empréstimo à física e à biologia (DEMO, 1989, p. 89- 90).

Marx não chegou a escrever especificamente sobre direito, mas com sua teoria do conflito, contribuiu grandiosamente para o surgimento da sociologia jurídica, estabelecendo relações entre estado, direito, economia e sociedade. No modo de produção capitalista, a classe dominante (detentora dos meios de produção) impõe seus interesses econômicos à classe proletária.

Diante dessa infraestrutura social conflituosa, ergue-se uma superestrutura jurídica e estatal a fim de manter a dominação de classes. Como variáveis dependentes da estrutura econômica e da relação de dominação, o Direito e o Estado aparecem como instrumento de coerção da classe dominante, servindo à imposição de sua ideologia (ARNAUD, 2000). Nesse sentido Marilena de Sousa Chauí (CHAUÍ, 1984, p. 78), explica:

Através do Estado, a classe dominante monta um aparelho de coerção e de repressão social que lhe permite exercer o poder sobre toda a sociedade, fazendo-a submeter-se às regras políticas. O grande instrumento do Estado é o direito, isto é, o estabelecimento das leis que regulam as relações sociais em proveito dos dominantes. Através do direito, o Estado aparece como legal, ou seja, como ‘Estado de direito’. O papel do direito ou das leis é o de fazer com que a dominação não seja tida como uma violência, mas como legal, e por ser legal e

não violenta, deve ser aceita. A lei é direito para o dominante e dever para o dominado. Ora, se o Estado e o direito fossem percebidos nessa sua realidade real, isto é, como instrumento para o exercício consentido da violência, evidentemente ambos não seriam respeitados e os dominados se revoltariam. A função da ideologia consiste em impedir essa revolta fazendo com que o legal apareça para os homens como legítimo, isto é, como justo e bom.

Nessa linha de raciocínio, para compreender a importância sociológica do conflito e dos meios de seu tratamento, além de adotar como ponto de partida a obra clássica de Karx Marx71,

pela relevância histórica que apresenta, este estudo recorreu a alguns sociólogos consagrados. Assim, Max Weber assume destaque especialmente por sua influência em grandes nomes da sociologia moderna, como Ralf Dahrendorf, cuja releitura do trabalho de Marx, apoia a discussão dos temas propostos nesta tese (WEBER, 2000; WEBER, 2004). As ideias de Georg Simmel (1858 – 1918) e Julien Freund (1921 – 1993) complementam a base teórica e contribuem para o aprofundamento da discussão do presente tópico.

Na sociologia, a teoria é o instrumento de entendimento da realidade, dentro da qual se enunciam as leis gerais72. Difere, por isso, do direito, de cunho normativo e ideológico. A Teoria do Conflito culminou por ser a segunda grande construção da sociologia73. A partir de seus pressupostos, o problema das

71 Os textos de Marx são abordados pela sua abrangência e importância histórica, mas não constituem o objeto central deste estudo.

72 Antes mesmo de ser adotada pela sociologia, a teoria do conflito já havia obtido resultados de grande importância em outras áreas que não as especificamente sociológicas. É o caso, por exemplo, da história; da economia clássica, em especial sob a influência de Adam Smith e Robert Malthus; e da biologia nascida das ideias de Darwin sobre a origem das espécies.

73 A primeira foi o organicismo, construção teórica que nasceu da hábil síntese que Comte fez do organicismo e do positivismo, duas tradições intelectuais contraditórias. O organicismo representa uma tendência do pensamento que constrói sua visão do mundo sobre um modelo

origens e do equilíbrio das sociedades perdeu importância diante dos significados atribuídos aos mecanismos de conflito e de defesa dos grupos e da função de ambos na organização de formas mais complexas de vida social. O grupo social passou a ser concebido como um equilíbrio de forças e não mais como uma relação harmônica entre órgãos estabilizados.

Para os fins desta pesquisa é suficiente focalizar os três pressupostos fundamentais e interconexos da Teoria do Conflito, que podem ser resumidos, amiúde, nos interesses que os indivíduos procuram realizar e que são peculiares a cada sociedade; no poder como núcleo das estruturas e relações sociais e na luta para obtê-lo; e, por fim, mas ideias e valores utilizados pelos mais diversos grupos sociais como instrumentos para definir sua identidade e os seus objetivos.

A teoria social dos conflitos moderna tem como alvo um nível de análise voltado para a pesquisa das leis gerais da sociedade, no sentido de compreendê-la mais como um sistema de interesses em conflito e menos como uma classe econômica particular a promover um também particular tipo de revolução (SPENGLER, 2012). Segundo Ruth A. Wallace e Alison Wolf

orgânico e tem origem na filosofia idealista. O positivismo, que fundamenta a interpretação do mundo exclusivamente na experiência, adota como ponto de partida a ciência natural e tenta aplicar seus métodos no exame dos fenômenos sociais. Assim, os primeiros conceitos da nova disciplina foram elaborados de acordo com analogias orgânicas, três das quais são fundamentais para a compreensão dessa corrente sociológica: (1) o conceito teleológico da natureza, que implica uma postura fatalista, já que as metas a serem alcançadas estão predeterminadas, o que impede qualquer tentativa de alterá-las; (2) a ideia segundo a qual a natureza, a sociedade e todos os demais conjuntos existentes perdem vida ao serem analisados e por isso não se deve intervir em tais conjuntos. Essa noção leva, em consequência, à adoção de uma atitude de laissez-faire; e (3) a crença de que a relação existente entre as diversas partes que compõem a sociedade é semelhante à relação que guardam entre si os órgãos de um organismo vivo. Além do organicismo e da Teoria do Conflito, segue-se outras contribuições da sociologia, como o formalismo, o behaviorismo social e o funcionalismo. (Portal do Estudante de Filosofia, disponível em <http://www.estudantedefilosofia.com.br/conceitos/principaiscorrentesso ciologicas.php>, acessado em 01/08/2012.

(2001, p. 83), a teoria do conflito pode ser dividida em duas possibilidades distintas:

Um primeiro grupo de teóricos acredita que o cientista social tem a obrigação moral de se envolver em uma crítica da sociedade. Recusa-se a separar - ou admitir que se possa realmente separar - uma análise de seus juízos de valor. Os teóricos deste grupo geralmente acreditam que pode existir, em princípio, uma sociedade na qual não há lugar para o conflito social. Por esta razão, eles são freqüentemente considerados utópicos. O segundo grupo de teóricos consideram, pelo contrário, o conflito como inevitável e permanente na vida social e rejeita a ideia de que as conclusões da ciência social são necessariamente juízos de valor. Os proponentes desta corrente estão realmente empenhados em fundamentar uma ciência social do que cumprir com os altos padrões de objetividade que formam as ciências naturais. Pertencentes ao primeiro grupo, que inclui o marxismo moderno, estão teóricos da Escola de Frankfurt e referem-se extensivamente ao trabalho de Karl Marx. No segundo grupo, que reúne contribuições de Ralph Dahrendorf, Lewis Coser e Randall Collins, a influência de Marx ainda é evidente, mas a importância recai sobre os escritos de Max Weber.

Fica desde logo evidente que esta tese segue o caminho dos teóricos que consideram o conflito como inevitável. Nesse sentido, desponta em importância o sociólogo alemão Ralf Dahrendorf (1929-2009), que propôs uma remodelação dos princípios de definição das classes sociais, afastando-se do parâmetro marxista da propriedade dos meios de produção e sugerindo, em substituição, o parâmetro do poder e da autoridade. Segundo este autor, são as diferenças de poder que alimentam o conflito de classes, que nunca poderá ser eliminado (DIAS JÚNIOR, 2012).

Dahrendorf sustenta, ainda, que os direitos de cidadania e a igualdade de oportunidades contribuem para controlar este

mesmo conflito de classes. A possibilidade de organização das partes em oposição (p. ex., os assalariados poderem organizar- se em sindicatos) revela as vantagens da democracia e do exercício da cidadania, concluindo ser hodiernamente improvável a revolução preconizada por Marx, já que, com a evolução do capitalismo industrial em direção à sociedade pós-capitalista, passaram a existir modos aceites de regulação dos conflitos (DAHRENDORF, 1997).

O conflito de classes não tende mais para a produção de mudanças abruptas ou radicais. Por outro lado, adverte o sociólogo no livro “A lei e a ordem” (DAHRENDORF, 1997), que não existe liberdade sem lei, sem regras e sem instituições capazes de aplicar essas regras. Em um outro livro intitulado “Homo sociologicus”, Dahrendorf (1991) discorre sobre a existência de dois tipos novos de homens. Um é o “homo oeconomicus”, da moderna ciência econômica; o outro é o “psychological man” (DAHRENDORF, 1991. p. 37). Dahrendorf afirma, porém, que, em geral, não são questionadas a contradição entre o homem artificial e o homem real.

3.1.5.1 Os papéis sociais

Para cada posição que uma pessoa possa ocuparn na sociedade, ela possui atributos e modos de comportamento com os quais o indivíduo deve se adequar. Aceitando e cumprindo as exigências que lhe são impostas, o sujeito renuncia implicitamente à sua individualidade, mas merece o reconhecimento da sociedade na qual vive. Rebelando-se contra os papéis sociais, poderá conservar uma independência subjetiva, mas expondo-se às sanções da sociedade.

Destarte, a cada posição correspondem determinadas formas de comportamento. A tudo que o homem é, correspondem coisas que ele faz ou tem, assim como cada posição social corresponde a um papel social. Ocupando posições sociais, o indivíduo torna-se uma parte do enrredo escrito pela sociedade em que vive. Nasce, assim, o homo sociologicus, que constitui o elemento básico da análise sociológica (JOHNSON, 1997, p. 168-169).

Toda organização social possui um conjunto de papéis definidos que constitue um sistema de coerções normativas a que devem curvar-se os atores que os desempenham, e de

direitos correlativos a essas coerções. O papel social, assim, define uma zona de obrigações e de coerções recíprocas, que é também uma zona de autonomia condicionada. O problema da liberdade humana, a partir dessa concepção, se resumiria no equilíbrio entre comportamento condicionado pelos papéis sociais e autonomia.

Os papéis sociais implicam numa privação dos desejos particulares dos inivíduos, detendo a sociedade sanções capazes de coagir aquele que não desempenha o seu papel. Quem o desempenha, será recompensado, obtendo um ponto de reconhecimento que lhe fornece segurança. Este sistema cria expectativas de papéis, cujo efeito é reduzir a incerteza da interação: quando dois atores entram em interação, ambos esperam que o outro aja dentro do quadro normativo definido por seu papel (BOUDON, 1993, p. 415).

De notar-se que os papéis sociais são dinâmicos, e encontram-se em constante mudança. Da mesma forma que as leis perdem a razão de ser pela mudança do contexto social, também as expectativas dos papéis sofrem um processo de transformação.

Spengler (2010) contribui para tal discussão ao sustentar que, quando os papéis sociais não são desempenhados de forma adequada (conforme as expectativas do grupo social), nascem os conflitos. Tais conflitos são relações sociais, caracterizando-se como apenas um dos muitos meios de interação e convívio dentro de uma mesma sociedade. Ao perceber a sociedade como um tecido de relações humanas que se transforma sem cessar, o conflito deve, necessariamente, fazer parte dessa canálise como o meio através do qual muitas dessas alterações acontecem (SPENGLER, 2010). É por isso que a importância sociológica do conflito não é negada.

3.1.5.2 Sanções sociais

Os indivíduos que não observam os comportamentos determinados pela sua posição social, são alvo das sanções sociais, via de regra exercidas pelas leis. Mas a lei também contribui para a manutenção das expectativas de papéis, na medida em que auxilia na orientação dos indivíduos por meio da fixação de comportamentos aceitos, permitindo uma maior clareza dos papéis sociais.

Mas essa coerção não representa a única forma de punição e regulação social, já que algumas sanções advindas da própria sociedade podem, em muitos casos, serem piores do que as impostas pela lei. Por exemplo, quando se atribui um determinado rótulo a uma pessoa, como ocorre com o louco, o alcoólatra, o violento e muitos outros.

É importante registrar que a mudança do contexto social pode fazer com que as expectativas de papéis, antes entendidas como obrigatórias, passem por um processo de revalidação com o passar do tempo. O que se esperava de um determinado papel no século passado talvez não se espere na atualidade. Basta ver o exemplo trazido por Spengler (2007) ao referir a desconfiguração do crime de vadiagem: na década de 1940, caso alguém fosse encontrado pelas ruas sem portar uma carteira de trabalho, poderia ser preso por se enquadrar no crime de vadiagem. Hoje, aquele que venha a adotar esse tipo de postura, talvez seja invejado, pois o que mais falta na atualidade é tempo livre.

Percebe-se que, em nome da vida em sociedade e, principalmente, em nome de um mínimo de segurança, o homem abre mão da sua individualidade, da sua liberdade e, com isso, como afirma Dahrendorf (1997), deixa de ser tão completo. Fica claro, portanto, que ao lado da grande heterogeneidade presente na sociedade e da divergência de interesses, a limitação da liberdade dos indivíduos e a imposição de condutas predeterminadas por meio dos papéis sociais contribui significativamente para o aparecimento dos conflitos.

3.1.5.3 O conflito social

A importância sociológica do conflito decorre do fato de que nenhuma sociedade é totalmente homogênea. Essa heterogeneidade resulta em desacordos, discórdias, controvérsias, assim como choques e enfrentamentos. O jogo de dissensões se caracteriza pela vontade de uns de impor seus pontos de vista sobre os outros mediante a persuasão, o domínio ou ainda por outros meios. Por isso, o choque de interesses e de visões de mundo divergentes é inevitável e gera uma relação de forças. Fatores como ódio, inveja, necessidade, desejo, etc. são causas do conflito.

Mas o conflito, além de impregnar-se de antagonismos, é também um modo de conseguir algum tipo de unidade, ainda que através da aniquilação de uma das partes conflitantes. Desse modo, o conflito é parte integrantes das relações sociais e não necessariamente representa sinais de ruptura. Cero, porém, é que o conflito estimula a criação do novo, provocando mudanças.

Nesse sentido, Simmel (1983, p. 122) aponta o conflito como um dos meios de manutenção da coesão do grupo no qual ele irrompe. As situações conflituosas eviodenciam uma forma de interação intensa, unindo os integrantes do grupo com mais frequência que a ordem social.

A existência de uma interação humana extremamente complexa, que combina antipatias e simpatias, num ritmo de aparição e desaparição igualmente volúvel, a par de variáveis externas unificadoras e desagregadoras, como a fraternidade e a guerra, por exemplo, produzem uma forma de vida humana em sua totalidade insolúvel. E aquilo que à primeira vista pode parecer conflito, na verdade, é uma das formas de socialização. O conflito, destarte, contribui para a manutenção dos limites da identidade grupal ou social (SIMMEL, 1983, p. 154).

3.1.5.4 Cultura do conflito

Atualmente, vive-se uma cultura do conflito. Ross (1995, p. 251) menciona que a cultura do conflito é a configuração das normas, práticas e instituições de uma sociedade que tem a ver com coisas pelas quais as pessoas entram em disputa com seus adversários, assim como as disputas desenvolvem-se e, por último, com a forma provável de terminarem. É um produto da organização socioestrutural e das disposições psicoculturais.

O autor afirma, ainda, que o conceito de cultura do conflito abarca o viés de como as instituições e as práticas sociais influenciam no desenvolvimento de determinados conflitos. A extensão em que os conflitos ocorrem, assim, pode ser considerada como conduta cultural. Como refere Ross, o simples conhecimento do contexto cultural no qual um conflito se desenvolve diz muito de suas raízes, de sua provável evolução e de seus meios de manejo (ROSS, 1995, p. 253).

Mas há também a compreensão de que os próprios indivíduos, vinculados a seus papéis sociais, propagam a conflituosidade a partir da ideia que devem responder

energicamente a qualquer ameaça à sua posição, desencadeando uma espiral conflitiva, que ofusca as possibilidades de consenso e autocomposição das diferenças. Assim, quanto mais competitiva for a sociedade, mais presente estará a banalização do conflito.

3.1.5.5 Conflito, luta e combate

Um dos autores que se destaca na análise dos conflitos é o sociólogo alemão Julien Freund, que em sua obra Sociología del conflicto aborda a violência e identifica duas espécies de conflitos que dela se utilizam: a luta e o combate (FREUND, 1995. p. 58). A violência não é um componente da intensidade do conflito; ela não mede o grau de envolvimento das partes, mas assinala a inexistência, a inadequação ou a ruptura de normas existentes para regulação dos conflitos.

A violência consiste em uma relação de poder que implica na renúncia a outras maneiras de interagir socialmente, para forçar a parte contrária a atuar contra a sua vontade ou executar uma vontade estranha. Pode ser considerada um instrumento utilizável num conflito social, mas não o único e nem necessariamente o mais eficaz (PASQUINO, 2004, p. 226).

Essa imposição de vontade se dá através de ameaças, de intimidação, de meios agressivos ou repressivos, capazes de atentar contra a integridade física ou moral do outro, contra os seus bens materiais ou contra as suas ideias e crenças, sugerindo a aniquilação física em caso de resistência. Em outros termos, a violência desenvolve uma relação entre poderes e não entre forças (EINSTEIN e FREUD, 2005).

É pertinente verificar a diferença entre poder e força: a força costuma estar associada à ideia de algo que se encontra próximo e presente; ela é mais coercitiva e imediata do que o poder. O poder, em seus estágios mais profundos, é antes força; o poder é mais universal e mais amplo, ele contém muito mais e não é tão dinâmico (CANETTI, 1995).

Especificamente quanto à força, o conflito pode apresentar manifestações diferentes entre si, reunidas em duas espécies principais: a luta e o combate. A luta é uma forma indeterminada de conflito, muitas vezes confusa, feroz e desmesurada, ela pode se apresentar de duas formas (CANETTI, 1995):

a) mediante uma violência direta (os motins são exemplos típicos, uma vez que neles a violência se desencadeia brutalmente sem retroceder diante de nada, sem observar proibições sociais nem limites morais; nos motins tudo é possível, tudo está permitido, mesmo porque as consequências de uma derrota no uso da força geralmente são fatais);

b) ou mediante procedimentos mais dissimulados, inclusive insidiosos, porque seu objetivo é a largo prazo (a luta de classes serve de exemplo, nela, a noção de luta toma um aspecto mais abstrato porque não se manifesta diretamente, já que a luta de classes possui um objetivo permanente de emancipação do ser humano de toda a exploração, dominação e discriminação).

Já o combate é o tipo de conflito regulamentado, com convenções mais ou menos precisas. O combate se caracteriza pela humanização do conflito em nome daquilo que certos autores da Teoria Geral do Estado chamam de direito da guerra ou direito de revolução. A principal função do combate é subordinar a violência a um fim necessário de modo que ela esteja regulamentada. Então, o combate se apresenta como uma forma de moderar um conflito, impondo uma disciplina aos que se enfrentam, submetendo suas vontades a uma vontade