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Diferentes expectativas mobilizam os professores para a produção de

4 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS DA PESQUISA

4.4 FOLHAS E VALORIZAÇÃO DO PROFESSOR

4.4.1 Diferentes expectativas mobilizam os professores para a produção de

Não é preciso evidenciar a situação do professor da Educação Básica, no que diz respeito à valorização da sua profissão no cenário nacional. Ela está retratada nos baixos salários, nas precárias condições de trabalho agravadas pela sobrecarga de horas de trabalho e, principalmente, na indiferença evidente, por parte das administrações públicas, em não reconhecer a função social de inserir as gerações novas na cultura, através do ensino e da educação escolar como bem social valioso e considerá-la não apenas como despesa, mas como investimento (MALDANER, 2007). Essas mesmas administrações não podem mais ignorar que a situação em que se encontra a educação brasileira também é fruto da formação dos professores que nela atuam. E também não podem ignorar que soluções são viabilizadas com investimento na formação desses professores em termos de extensão de oportunidades e da qualidade delas.

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Agora, não bastam o reconhecimento por parte das autoridades, do lugar da educação na constituição da sociedade brasileira, bons salários, condições próximas das ideais para o trabalho, se o próprio professor não se admitir como profissional do ensino. Sem isso, não se consolida profissionalmente, não ganha respeito como profissional. E, para ser respeitado profissionalmente, precisa tratar da sua formação profissional e construir sua história de profissional professor.

Como o professor promove a sua formação se, no mais das vezes, tem seu tempo tomado pelas aulas que não são dispensadas para esse afastamento, não tem oportunidades de formação porque as iniciativas governamentais direcionadas à formação são pontuais e não conseguem atingir a totalidade de professores?

Só com alguma sorte e boa dose de esforço, posso dizer.

Tenho claro que o Projeto Folhas, da forma como está estruturado, atende àquelas carências presentes em grande parte das ações de formação. Todos os professores da Rede Estadual podem participar do processo. Não precisam se afastar da escola, deixar suas aulas, seu trabalho para investir na sua formação. Eles podem, a qualquer momento, durante o ano letivo, entrar no processo formativo, quando tiverem mais disponibilidade de tempo para pesquisar e escrever ou mesmo quando estiverem dispostos. Podem produzir nas suas horas-atividades25 ou mesmo em horários alternativos.

Com o Projeto, o Estado não negligencia o seu compromisso de formar os professores que trabalham na sua Rede, sob uma política educacional estabelecida, extensiva à formação dos seus professores que atuarão nas escolas por ele mantidas. Diria que, com o Projeto, o Estado investe na formação do professorado e a reconhece como necessidade imprescindível para melhorar a qualidade da educação paranaense. Mas, e o professor do Estado, reconhece a necessidade de investir na sua formação? De maneira geral, o professor quer mais formação, posso afirmar, seja de que natureza for, pedagógica ou específica da área de conhecimento em que atua, para suprir suas carências formativas.

A partir do Projeto, o professorado é convidado a gerir sua formação. A participação é voluntária. O Projeto oferece a todos os professores oportunidade de formação. Funciona na lógica da oportunidade de formação para todos e na formação pela produção. O professor que produz Folhas passa pelo processo de

25 Duas horas fora de sala de aula a que o professor estatutário tem direito a cada 20 horas- aula. Elas devem ser cumpridas na escola.

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validação e tem seu Folhas publicado, pontua, soma pontos para ascensão no Plano de Carreira.

O Projeto, como modalidade de formação continuada de professores, vai ao encontro das diferentes expectativas que, normalmente, coincidem com demandas formativas e de natureza profissional dos professores.

Na fala do Professor João, ficam evidentes os motivos que o mobilizaram para participar do Projeto, quando lhe pergunto: como você entrou em contato com o Folhas? E o que o levou a escrever, a produzir um Folhas? O seu primeiro Folhas?

Ah, foram vários aspectos. O primeiro foi a oportunidade talvez de não ficar estagnado num plano de cargos, [...] e não avançar mais, em relação a salário. E o segundo aspecto também, foi no sentido de crescer profissionalmente. E eu acho que eu consegui isso, muitos aspectos,... acho que as minhas aulas hoje, são mais ricas....e tudo. Ricas em, no sentido, prático experimental... não só no sentido experimental, mas no sentido social, contextual, interdisciplinar [...]. Aliás, é tudo isso, procurar um crescimento, crescimento geral. Todos os aspectos, [...] do meu ponto de vista, profissional, financeiro, enfim, todos, todos, todos esses aspectos aí. (JOÃO -

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Como se pode notar, o Professor João entrou no processo porque vê necessidade em investir na sua formação e supre, no Folhas, suas expectativas quanto à ela. Pelo que interpreto, tinha expectativas quanto a benefícios salariais e quanto às suas carências formativas.

A Professora Elisa aponta outros motivos que a levaram a participar do Projeto. Uso novamente este trecho da sua entrevista, mas agora interpreto outros aspectos dele:

O que você mais gostou da idéia do Folhas? (BELMAYR)

De poder por no papel o tipo de aula que eu acho que dá certo. De por ali, eu dou aula assim, então eu vou por no papel o tipo da minha aula. Ter a liberdade de temas livres, de temas aí que os alunos gostam de ouvir, que a gente consegue chamar a atenção deles, pra que eles atentem pros conteúdos químicos mesmo, e que fosse um material diferenciado dos livros. E que daí você vai buscar, você vai pesquisar, você tem que ver o que é certo no livro didático... tem um que tem um termo contemplado de um jeito, outro tem outro termo contemplado...o que é certo? E eles não sabem o que é certo. Daí o Folhas dá essa oportunidade de você ir procurar.

Deveríamos ter mais tempo pra isso, mas é uma oportunidade que [Projeto] traz. Eu gostei. Quando eu vi, eu gostei. Primeiro encontro, primeira oficina de Folhas

eu já falei que ia escrever e voltei escrevendo. (ELISA – 8)

E essa situação da oportunidade que você comentou o que você acha disso, da oportunidade de escrever? (BELMAYR)

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Eu gosto. Eu acho que quando eu entrei na educação, a falta de oportunidade que

os professores têm de se expressar, e nunca é lido nada do que eles fazem... está aí! Foi dada essa oportunidade, então quem gosta de escrever, escreva. Quem gosta de se posicionar sobre determinado assunto, se posicione [..]. Foi dada essa oportunidade [...] Agora tem opção, dentro do seu trabalho, você pode estar escrevendo. Você tem a oportunidade de estar escrevendo. (ELISA – 9)

Professora Elisa percebe outra potencialidade formativa do Folhas, que vai ao encontro de um desejo seu, que pode expressar uma necessidade formativa sua, escrever, produzir seu próprio material de aula.

A Professora Roberta deixa entrever em sua fala, na seqüência, o motivo pelo qual aderiu ao Projeto, quando lhe perguntei sobre possíveis comentários que havia feito com colegas sobre sua intenção em produzir Folhas:

Não, não tinha comentado. Era muito nova a coisa, era muito recente, e eu já tinha

vindo de dois projetos que não tinham dado bom resultado. Então resolvi ver

sozinha primeiro o que ia acontecer. Aí eu fiz as leituras sem comentar com ninguém.

(ROBERTA – 30)

[...] falei não vou fazer [Folhas] porque já tinha feito o OAC26 que não tinha resultado

nenhum e o Vale Saber que também não tinha muito bem o resultado [...] (ROBERTA

– 31)

Ela estava desanimada pelos resultados das suas participações anteriores. Entendo que a Professora aderiu ao Folhas na expectativa de ter sua produção lida, analisada e pontuada, posso dizer, reconhecida, valorizada.

Ana, outra professora entrevistada, tinha outras expectativas quando aderiu ao Projeto: Eu gostei da idéia, da proposta, desse negócio de pesquisar, de você ter

que ler e estudar, isso que me atraiu no fundo. Aí, fiz num final de semana, numa folha [...].. (A – 16) Ela viu a oportunidade de avançar nos seus estudos, com a

produção de Folhas e a participação no processo.

Professor Marcos não menciona explicitamente suas expectativas de formação quanto ao Folhas, mas reconhece potencialidades formativas no processo e, mais, na aplicação de um Folhas em sala de aula, principalmente porque ele difere do livro didático usual no que se refere à ausência de respostas prontas para os usuários dele, professores ou alunos, como diz:

26 Objeto de Aprendizagem Colaborativa e Vale Saber foram dois projetos de formação de professores promovidos pela SEED, que priorizavam a produção do professor, o primeiro ainda na gestão atual do governador Roberto Requião e o segundo na gestão governamental anterior.

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[...] Porque na verdade ele não traz, o objetivo do Folhas não é pra ser pronto mesmo. [...] O Folhas é assim. A principio ele vai dar mais trabalho pro professor, porque o professor hoje está acostumado com o... pronto! Se não sabe, corre lá pro fundo e vê, ou pega um material de apoio que vem junto no livro didático que tem a resolução. Mas eu sei que a longo prazo até, eu acho melhor. Porque, quando eu comecei dando aula de Química, me jogaram logo de cara num cursinho. E eu estava começando na cidade. E não tinha nada, o material do alunoera o meu material. E eu rodavamadrugada tentando entender, fazendo os exercícios. Isso me deu uma base muito boa. Então, eu digo que o Folhas vai, também vai ser isso. Eu falo para as pessoas que realmente devemos querer abraçar esse projeto. Porque não é fácil não. Quem está acostumado com o livro didático, pega o Folhas, ali não tem resposta nem pro professor, nem pro aluno. [...] (MARCOS – 34)

Todas essas expectativas, que apreendi das falas dos professores entrevistados, participantes do Folhas, possivelmente dão legitimidade ao Projeto.

O professor, quando vê suas expectativas atendidas, percebe que foi “ouvido” e tem, de fato, sua importância reconhecida, só pode se sentir valorizado.

O Folhas atende às diversas expectativas dos professores diretamente ligadas às suas demandas de formação quando, pela produção no formato, exige que um conceito químico seja desenvolvido do ponto de vista da Química, do ponto de vista de duas outras disciplinas em relação interdisciplinar e seja, ainda, recontextualizado atualmente. Igualmente, atende expectativas ligadas às demandas de natureza profissional no sentido do professor-autor ter sua produção valorizada, pois a tônica do Projeto é a produção. O Projeto, do ponto de vista de política de formação de professores, tem como princípio a formação pela produção e a valorização advinda da produção. A SEED, com o Projeto, credita ao professor a capacidade de produzir com qualidade o material de suas aulas, valoriza essa produção e, ao valorizá-la, está valorizando, de fato, o professor.

4.4.2 O professor que vivencia o processo Folhas desenvolve atitude