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4 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS DA PESQUISA

4.2 FOLHAS E PRODUÇÃO

4.2.1 O formato requerido pelo Folhas é determinante na busca da

Como visto anteriormente no corpo deste trabalho propriamente ou no Manual de Produção do Folhas, o texto produzido pelo professor-autor tem que apresentar alguns requisitos: i) problema; ii) desenvolvimento teórico; iii) desenvolvimento teórico interdisciplinar; iv) desenvolvimento contemporâneo; v) proposta de atividades; vi) referências.

A produção, como processo, tem início quando o professor-autor define o conteúdo específico de Química a ser desenvolvido no Folhas, ou quando ele consegue definir um bom problema para começar o texto. Conforme o Manual, ele pode escolher qualquer conceito de Química para ser desenvolvido num Folhas. O conteúdo específico escolhido pode advir de um conteúdo que não seja de seu domínio, mas que queira estudá-lo, ou, ao contrário, seja um conceito que o professor queira explorar pela facilidade, pela prática em que já opera com ele na sua sala de aula.

A mobilização para a produção do material já é movimento na direção da formação. Esta atitude, por si só, caracteriza interesse de formação. A produção, em si, é mais que isso, leva realmente o professor a tratar da sua formação. O professor se dispõe a estudar, a pesquisar, a escrever. Esses exercícios que são muitas vezes relegados a segundo plano na rotina de trabalho do professor, por questões tantas, são praticados sistematicamente, durante o tempo do processo Folhas. Maldaner (2003, p.195) argumenta:

[...] o estudo individual do professor, planejado e coordenado em espaços coletivos, criados dentro da própria escola ou por grupos de escola, é atividade inerente ao exercício profissional e, por isso, deve ser preocupação permanente dos próprios professores, das escolas e dos sistemas educacionais.

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Do ponto de vista da Professora Elisa, o Folhas possibilita o exercício de estudar, pesquisar e escrever:

Estudar, estudar. Eu tenho que estudar, eu tenho que por no papel aquilo que eu já estudei, que eu já aprendi, pesquisar coisas novas, se tem coisa novas aí no mercado. É um meio de se inspirar. Porque, se eu vou fazer uma pós-graduação, seja qual for ela, eu tenho que estudar. E se eu estou fazendo, construindo um trabalho onde eu tenho que sentar, e eu tenho que escrever, pra mim é isso... isso é um estudo, isso é uma preparação de aula. Toda vez que eu vou preparar uma aula, eu estou estudando. Eu resumo isso a estudo. Estudar e melhorar, aprender mais, a mudar certos métodos que a gente tem. Que está viciado em alguns métodos que você tem que mudar os procedimentos, tem que ir ao encontro de meios diferentes de como ensinar. Você estava ensinando de um jeito, você pode mudar. Então, pra mim é estudo, resumindo é estudo. (ELISA – 15)

A produção do texto no formato requerido também tem papel formativo fundamental no contexto do Folhas. A tarefa de elaboração do problema para o Folhas, este considerado do ponto de vista do aluno é estranha para o professor. Ele está acostumado, em geral, a elaborar problemas, que se constituem como tais, para os professores. E estes, como se sabe, não chamam a atenção dos alunos. Como exemplo, apresento um problema de um Folhas de Química:

“Se a Química faz parte do cotidiano, por que ao abrir os livros encontram-se números, letras, bolinhas coloridas e fórmulas?”22

A busca da resposta para este problema, assim formulado, é de interesse do professor de Química. E, também, é tema de estudo de muitos pesquisadores em ensino de Química. É certo que os alunos devem saber o que significam as bolinhas coloridas, os números, etc., mas eles não ficariam muito interessados em ler um Folhas de Química que iniciasse com essa questão e que contivesse somente explicações sobre o porquê das representações em Química.

Outro exemplo, agora de um Folhas de Língua Portuguesa:

"Aconteceu um atropelamento e os paramédicos assistiram a vítima." A frase está correta?23

O que está em jogo no enunciado deste problema é que ele explicita um problema claramente de professor: conhecer as exigências da norma escrita, as prescrições gramaticais. A regra em questão é a regência do verbo assistir, que, nesse sentido, muitas gramáticas prescrevem como transitivo indireto.

22 Enunciado de um problema de Folhas de Química elaborado por um professor participante do Projeto.

23 Enunciado de um problema de Folhas de Língua Portuguesa elaborado por um professor participante do Projeto.

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O problema evidencia, também, uma concepção de língua e de linguagem que já está ultrapassada, devido aos avanços da Lingüística. A Língua se constitui no uso, na interação entre os falantes, ela não é um código fechado, pronto, petrificado. Para o aluno, é importante que tenha o que dizer, e que diga, que conheça regras gramaticais, sim, às quais ele recorrerá como ferramenta. Do mesmo modo, os alunos não seriam instigados a ler um Folhas de Língua Portuguesa que iniciasse com um problema enunciado dessa maneira.

Agora, problemas como os que listamos a seguir, pode-se afirmar, chamam atenção do aluno, o mobilizam para a leitura do Folhas, para a busca por uma resposta:

“O que o chocolate, a vela e o batom têm em comum?” “Você beija comSciência?”

“Desde há muito tempo se empacota energia para facilitar o seu uso. Como se faz isso?”

“Você sabe o que as espinhas têm em comum com os anabolizantes?”

É bom lembrar que a linguagem em que o professor-autor formula o problema pode ser diversificada, isto é, pode usar imagens (cenas), poemas, charges, etc. e, também, que o problema não precisa necessariamente ser expresso em uma pergunta.

Pergunto ao Professor João: como foi o seu processo de formulação do Problema do seu Folhas?

Inicialmente é difícil, mas depois, tudo, tudo se torna mais fácil. Assim, uma nova visão das coisas, de como fazer. Mas no primeiro Folhas que eu comecei a fazer foi difícil problematizar. Muitas vezes passando por pessoas pra avaliar o trabalho, elas colocavam orientações, realmente muitas eram válidas, muitos problemas eu fazia bem extensos, com várias perguntas [...] (JOÃO – 68)

A Professora Roberta demonstra sua dúvida inicial com relação a formular problemas para o Folhas:

O problema eu acho essencial, eu acho que esse que foi o grande tchan do projeto. E no começo, no primeiro Folhas que eu escrevi, eu tinha a idéia assim, o problema, um problema que seria problema para todo mundo e não problema para o aluno. [...]

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Essa dificuldade do professor, em elaborar problemas que sejam problemas para os alunos, a que ela se refere acima, acredito, está ligada à concepção mais geral que têm do que seja problematizar, isto é, apresentar aos alunos o conhecimento na forma de problemas a serem resolvidos, para assim se apropriarem dele. Parte da aula e do planejamento é reservada à tarefa de resolução de problemas, especialmente preparados ou simplesmente retirados do livro-texto utilizado.

No contexto do Projeto, “problema” assume outra propriedade diferente e essencial: a necessidade. E mais, necessidade do aluno.

Saviani (2004), para definir problema, conceito que desenvolve na sua publicação, aborda o conceito de pseudo-problema a partir de uma reflexão sobre como os homens produzem a sua própria existência e o ilustra com um exemplo bem esclarecedor, retirado da estrutura escolar:

Muitas das questões que integram os currículos escolares são destituídas de conteúdo problemático, podendo-se aplicar a elas aquilo que dissemos dos exercícios escolares: “se algum problema o aluno tem, não se trata aí do desconhecimento das respostas às questões propostas, mas, eventualmente, da necessidade de saber quais as possíveis conseqüências que lhe poderá acarretar o fato de não aplicar os procedimentos transmitidos nas aulas”. Toda uma série de mecanismos artificiais é desencadeada como resposta ao caráter artificioso das questões propostas. O referido caráter artificioso configura, evidentemente, o que denominamos pseudo- problema. Um raciocínio extremado tornará óbvio o que acabamos de dizer: suponhamos que as 7100 ilhas do arquipélago das Filipinas tenham cada uma, um nome determinado. Suponhamos, ainda, que um professor de Geografia exija de seus alunos o conhecimento de todos esses nomes. Os alunos estarão, então, diante de um problema: como conseguir a aprovação em face dessa exigência? Uma vez que eles não necessitam saber os nomes das ilhas (isso não é problema), mas precisam ser aprovados, partirão em busca dos artifícios (pseudo-problemas). (SAVIANI, 2004, p. 15)

Com o exemplo exagerado do autor, visualizo um outro motivo pelo qual o professor, em geral, tem dificuldade em formular bons problemas, problemas que realmente reflitam a necessidade dos alunos: a ausência da compreensão do que seja contextualização e de que ela está intimamente ligada ao que se configura como necessidade para os alunos.

Exemplos com as características do exercício de Geografia, que o autor apresenta, podem ser vistos no material didático mais utilizado pelos professores de Química, o livro didático.

Vigotski, ao estudar o desenvolvimento dos conceitos, atribui considerável importância aos problemas quando apresentados aos alunos, pois, para ele, “a

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formação dos conceitos surge sempre no processo de solução de algum problema que se coloca para o pensamento do adolescente. Só como resultado da solução desse problema, surge o conceito” (2001, p. 237). É bom lembrar que para o autor, o conceito de problema não assume a perspectiva de “resolução de problemas” a qual nos referimos. No entanto, pode-se dizer que, no pensamento de Vigotski, resolver exercícios-problemas, bem formulados, de fato ajuda os estudantes a significarem os conceitos em outros níveis e em outros contextos, que também são importantes serem internalizados, para se desenvolverem.

A formação do professor, baseada na racionalidade técnica, que concebe a competência profissional ligada estritamente à aplicação do conhecimento científico aos problemas da prática, torna o professor um aplicador de técnicas, dificultando ou mesmo impedindo a sua reflexão sobre ela. Essa postura de aplicador de técnicas também corroborada no uso irrefletido do material didático em aula implica igualmente as interpretações equivocadas do que seja o problema no Folhas.

Entretanto, quando lhes é apresentada outra forma de conceituar problema, sustentada teoricamente, e lhes é dada a oportunidade de formulá-los e discuti-los como foi feito em oficinas a eles oferecidas, começam a reconstruir o seu significado, como expressa o Professor Marcos.

[...] uma das primeiras reuniões que tivemos aqui no núcleo de Goioerê [...] participei como professor. Não me lembro bem agora o nome do professor que veio. Vianna. Professor Carlos? (MARCOS – 23)

Ele veio e começou a falar como seria o projeto e pediu pra todo mundo ali na hora, tentar fazer um problema. Mas antes de fazer, eu sabia o que era, mais ou menos.

(MARCOS – 24)

Eu já tinha um problema. E eu comecei a colocar na minha cabeça. Alguma coisa que chamasse a atenção dos alunos, que tivesse interesse naquela idade de alunos, e eu fiquei pensando: “bom, os meus alunos do terceiro ano gostam de dirigir”. (MARCOS

– 25)

Daí comecei lembrar da minha trajetória, quando eu tinha 18 anos, o que eu gostava. Eu lembrei que já trabalhava e passei muita raiva com um carro movido a álcool (risos). Não sei quem inventou um carro, no caso uma Kombi, movido a álcool (risos). Não existia a tecnologia de hoje. E eu fiquei pensando...Naquela época eu passei muita raiva, mas por quê? Você tem que pensar o porquê. Daí surgiu o problema, só que tem que explicar isso [... ] (MARCOS – 26)

Sabendo que num dia frio a combustão é mais difícil, em um carro movido a álcool, do que um carro movido a gasolina e tal. Tentar explicar por que. Não lembro bem certinho como eu escrevi no dia. Daí ele perguntou, na hora: “Mas isso aqui é interessante pra idade?”.Ficou aquele silencio, eu fiquei pensando “será que eu fiz a pergunta errada?” (risos). (MARCOS – 27)

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A oportunidade de formular problemas, expô-los nas oficinas e discutir sobre eles sob a orientação dos oficineiros, técnicos pedagógicos da SEED, interagir com os colegas permitiu aos professores a construção e reconstrução do significado de problema no contexto do Folhas em nível consciente e formativo esperados.

Outra exigência do Folhas é o “desenvolvimento teórico”24, expressão controvertida, que no contexto do Projeto significa desenvolvimento do conceito que o professor-autor escolheu para explorar. Mais especificamente, no caso da Química, espera-se que o professor-autor não vá tratar apenas do aspecto teórico dos conhecimentos desta ciência, ou seja, das informações de natureza atômico- molecular que necessitam de modelos explicativos.

No desenvolvimento teórico, assim como em todo o texto, o professor-autor escreve tendo como interlocutor o aluno. Isso pode representar pouca importância à primeira vista, contudo, o fato de o professor-autor escrever para o aluno marca uma expressiva diferença. Ele está acostumado a escrever para os colegas, a dirigir seus trabalhos para os seus pares e não para os seus alunos. Escreve seu planejamento de aula dirigido à supervisão pedagógica da escola, seus artigos para a comunidade de profissionais da sua esfera de atuação e, ainda, o material que constitui as suas leituras também é, normalmente, voltado a ele, professor. É certo que prepara suas aulas, escreve-as, mas raramente de forma sistematizada. Isso configura uma lacuna na formação do professor que pode ser preenchida pela via do Projeto, mais precisamente na escrita do texto, tal como ela é prescrita.

De um lado, nota-se que o professor-autor apresenta dificuldade no desenvolvimento teórico e, de outro, facilidade em realizá-lo. A facilidade pode ser atribuída ao fato de que desenvolver o conteúdo é a tarefa da qual ele mais se ocupa na aula, ou, como se diz, “dá conta do conteúdo”. Transpor para o papel, de antemão, seria tarefa corriqueira. A dificuldade pode estar em colocar no papel, na forma requerida pelo Projeto, a qual não é a que ele está habituado, como já mencionado.

Qual a parte do Folhas: problema, desenvolvimento teórico, desenvolvimento contemporâneo, relação interdisciplinar, atividades. Qual dessas etapas você acha mais importante na elaboração? Qual etapa lhe deu mais trabalho, você sentiu mais dificuldade? (BELMAYR)

24 Outra expressão talvez designasse melhor o que se pretende que o professor-autor realize nessa parte do texto e evitasse a confusão conceitual, mas depois de algum debate no Departamento, a escolha recaiu sobre ela.

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Com certeza o desenvolvimento teórico. (JOÃO – 61) [...]

Procurar, achar o conteúdo, pesquisar sobre o conteúdo, e colocar, colocar nesse, ou nesse lugar. (JOÃO - 62)

A fala no 62 do professor evidencia o seu esforço para arquitetar o texto, construí-lo, dar-lhe coerência do ponto de vista do desenvolvimento conceitual dos conhecimentos da Química.

O professor-autor, ao escrever sobre o conceito, desenvolvê-lo escrevendo, estará realizando, na linguagem escrita, seu pensamento, intencionalmente, de acordo com Vigotski (2003). Entendo que o teórico estudou, detalhadamente, as diferenças entre a comunicação oral e a comunicação escrita em crianças, atribuindo a esta um caráter mais consciente, mas seus estudos também auxiliaram a compreensão desses processos em adultos. Para ele (2003, p.124), “na escrita, somos obrigados a criar a situação, ou a representá-la para nós mesmos”. Criar a situação ou representá-la no ato de escrever impõe um distanciamento da situação real. Na minha análise, considero o distanciamento da situação real, a que ele se refere, o distanciamento do conceito. Escrever sobre o conceito é diferente de falar sobre o conceito na perspectiva vigotskiana, exige habilidades específicas como colocar as palavras numa seqüência para constituir a frase. E mais, colocar as frases em coordenação para desenvolver o conceito. Ao montar o seu texto, encadear os parágrafos, o professor-autor estará operando com o conceito. Isso, sem dúvida, é trabalho de formação no caso do professor-autor de Folhas.

A etapa que se discute na seqüência é o “desenvolvimento teórico interdisciplinar”, no corpo do Folhas. Por que ela o compõe? O exercício de estabelecer relações entre os componentes disciplinares pode conduzir a um processo formativo?

A SEED, como instância que pensa ações para a educação paranaense, e as executa, quer no âmbito administrativo quer no pedagógico e mais especificamente ações de formação continuada para os professores da sua Rede, como o Folhas, não ignora uma das tendências mais marcantes nas discussões sobre currículo, ensino e suas metodologias, qual seja, a interdisciplinaridade. Conceito controverso, que apresenta uma série de nuanças e que está presente como princípio relevante e paradigma em praticamente todos os domínios do saber e do fazer, hoje em dia.

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Severino (1999, p. 172) lembra que fundamental no conhecimento é o processo não o produto dele e que “o saber é resultante de uma construção histórica, realizada por um sujeito coletivo”. E, prossegue:

Daí a importância da pesquisa, entendida como processo de construção dos objetos do conhecimento, e a relevância que a ciência assume em nossa sociedade. Mas impõe-se à ciência a necessidade de se efetivar como um processo interdisciplinar, exatamente ao contrário das tendências predominantes no positivismo, historicamente tão importante na consolidação da postura científica no Ocidente, mas tão pouco interdisciplinar em sua proposta de divisão epistemológica do saber. (SEVERINO, 1999, p. 172)

Assim como o saber não pode se dar na fragmentação, precisa acontecer na perspectiva da totalidade na ciência de hoje, o agir também não. Para Severino (1999, p. 173), a prática da interdisciplinaridade é mais capital no ensino do que em outras áreas, dado o efeito multiplicador da ação pedagógica.

A educação, em todas as suas dimensões, torna ainda mais patente a necessidade da postura interdisciplinar: tanto enquanto objeto de conhecimento e de pesquisa como espaço e mediação de intervenção social.(SEVERINO, 1999, p. 173)

Schäffer (1995) faz uma retomada da trajetória dos estudos sobre interdisciplinaridade no Brasil, até 1993, e constata que, a partir da concepção do termo como proposta generalizadora, foi se constituindo na relação síntese/totalidade doze tipos de interdisciplinaridade, alguns mais ligados ao fazer pedagógico, a saber: interdisciplinaridade instrumental, típica do século XX, na qual as ciências continuam isoladas porque o que está em jogo é a utilidade do conhecimento. Esta se desdobra em interdisciplinaridade administrativa, em que as disciplinas se agregam, mas não questionam seus fundamentos. Na auxiliar, as disciplinas apóiam-se entre si, e, na interdisciplinaridade por disciplina líder, uma disciplina opera como princípio de unidade. Por último, a interdisciplinaridade

interativa, caracterizada pela interação entre poucas disciplinas.

Esses tipos de interdisciplinaridade descritos levam-me a situar a interdisciplinaridade demandada pelo Folhas.

Não foi deliberada a definição de um tipo de interdisciplinaridade como sendo o padrão estabelecido pelo Projeto, aquele que o professor-autor deveria desenvolver no seu Folhas, mesmo porque, como já foi mencionado, e não poderia ser de outra forma, o termo, seu conceito, admite nuanças. E, também, sabe-se, que

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o objeto em estudo é que vai ditar as possibilidades de relação mais estreitas, durante o processo de produção. As possíveis relações, portanto, não podem ser pensadas de antemão, é desejável que aflorem no decorrer da elaboração do texto e é imprescindível que as relações sejam realmente desenvolvidas no texto, não somente indicadas. Um cuidado a ser tomado pelo professor-autor de Folhas, ao realizar no texto as relações interdisciplinares, é o relativo a como as disciplinas envolvidas interdisciplinarmente tratam os seus objetos de estudo. Por exemplo, se um Folhas de Química fizer relação interdisciplinar com Geografia, os conceitos geográficos abordados o devem ser na perspectiva da Geografia adotada nas Diretrizes Curriculares de Geografia do Estado. O formato prescreve a realização de relações interdisciplinares com duas outras disciplinas. Duas relações interdisciplinares, um número que foi arbitrado e que, suponho, tenha sido determinado para forçar o professor-autor a relacionar o conceito abordado no seu Folhas a conceitos de uma disciplina mais distante da sua, já que existem disciplinas que apresentam mais proximidade que outras, em termos de campo de conhecimento.

Professora Roberta menciona sua dificuldade em desenvolver as relações interdisciplinares no texto e responde assim à minha pergunta sobre o item que lhe deu mais trabalho no Folhas:

A interdisciplinaridade, porque nós não somos acostumados a invadir a área dos outros. Você sabe pra você, aí na hora que você vai expor você precisa ter uma leitura maior e traduzir na linguagem mais fácil e também não deixar ele te envolver tanto, senão na hora que você vê, está contaminado mais pela disciplina da relação interdisciplinar do que pela sua, porque também vão aparecendo novas perspectivas que vão somando e o assunto vai se alongando então você precisa limitar bem o que você quer. Então isso ai é muito difícil, foi o mais complicado para mim. (ROBERTA – 43)

O discurso de Roberta permite salientar três pontos. Primeiramente, nota-se a forma disciplinar na qual ela trabalha, não habituada que está a “invadir” o território