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3 METODOLOGIA

3.1 O INSTRUMENTO E A METODOLOGIA DA PESQUISA

Para a construção de dados empíricos da pesquisa, optei pela entrevista, técnica de trabalho mais comumente utilizada nas pesquisas em ciências sociais, conforme Lüdke e André (1986). Pensei, desde o início dos trabalhos, em realizar entrevistas semi-estruturadas. Em primeiro lugar, para minimizar uma inerente condição hierárquica entre pesquisadora e os sujeitos da pesquisa, já que trabalho na SEED, o que poderia prejudicar, e muito, a produção dos dados. A entrevista semi-estruturada favorece a interação, na medida em que não segue uma estrutura rígida, criando uma atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem responde. Interação que busquei para instalar um clima de estímulo e de receptividade mútuos para que as informações fluíssem de maneira apreciável e principalmente autêntica. Além do mais, tendo a entrevista semi-estruturada esta qualidade, acredito que seria a forma de produção de dados que mais combinaria com o processo Folhas como um todo.

As autoras citadas (1986, p.35), quando apontam exigências e cuidados requeridos para qualquer entrevista, recomendam uma especial atenção com o que chamam de “imposição de uma problemática”. Mesmo com a utilização de um vocabulário adequado ao informante, o entrevistador apresenta um questionamento que não tem a ver com o seu conjunto de valores e preocupações. O entrevistado, nestas ocasiões, tende a responder de forma a confirmar as expectativas do entrevistador. Embora o universo de diálogo entre pesquisadora e sujeitos da pesquisa seja muito semelhante, o que certamente evitou a situação mencionada, ressalto que sempre tive em mente a recomendação.

Por outro lado, como não havia a intenção de tratar estatisticamente os dados, não era necessária uniformidade de resultados, o que seria próprio de uma entrevista padronizada, como respostas a um questionário. Elaborei algumas questões que compõem um esquema básico que, porém, não foi aplicado rigidamente nem igualmente a todos os entrevistados.

E, por último, porque não tinha informações específicas a buscar e supunha que as perguntas feitas não esgotariam o assunto, a entrevista semi-estruturada vinha bem ao encontro das expectativas da pesquisadora. Além disso, outras questões poderiam ser levantadas, dependendo da resposta dos entrevistados, ou

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seja, poderiam surgir questões suplementares, sempre que algo de interessante e não previsto na lista original de questões aparecesse.

As questões inicialmente dirigidas aos sujeitos da pesquisa abordaram os tópicos:

• Características da formação inicial. • História profissional

• Propriedades do trabalho pedagógico em sala de aula • Motivo(s) que levaram à produção do Folhas

• Referencial de pesquisa na produção • Processo de produção

• Conhecimento químico • Processo de validação • Valorização profissional • Apreciação crítica do Projeto

O desdobramento destes itens em várias questões, no curso das entrevistas, possibilitou-me transitar por um campo bem amplo, pelo qual muitos dados de pesquisa puderam ser construídos.

Com duração de mais ou menos uma hora, as entrevistas foram realizadas sem uma ordem pré-determinada, uma a uma, evidentemente, gravadas, observada somente a disponibilidade de tempo dos sujeitos da pesquisa e pesquisadora, já que me deslocava até os seus locais de residência ou outros acordados.

Gravadas e transcritas, as entrevistas constam do meu arquivo pessoal. Cabe mencionar que foram retirados os vícios de linguagem, para o seu uso no corpo da dissertação. A transcrição das entrevistas foi enviada a três dos sujeitos participantes da pesquisa, via correio eletrônico, para que complementassem os dados da sua formação inicial que, a meu ver, não foram suficientemente explorados na primeira oportunidade. Os professores entrevistados completaram os dados na forma de memorial, como já mencionei, que também constam do meu arquivo pessoal.

De posse das entrevistas transcritas, passei a lê-las e relê-las com o objetivo de mergulhar na busca de momentos de formação, supondo uma ênfase para guiar o trabalho: formação.

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À vista da pergunta norteadora: considerando suas características, o

Projeto Folhas constitui um projeto de formação continuada para professores de Química?, iniciei uma leitura seqüencial, isto é uma após outra, marcando o que

poderia constituir momentos formativos. Depois, realizei uma leitura transversal para identificar a constância desses momentos em cada uma das transcrições.

É importante ressaltar que procurei captar como os professores vinham percebendo o Projeto e suas implicações na sua formação, e não a minha visão, pois, como já mencionei, trabalho na SEED, conheço a proposta do Folhas e, mais que isso, faço uma defesa, às vezes explícita do Projeto e de suas potencialidades como projeto de formação continuada durante as gravações. Entendo, porém, que essa atitude não veio prejudicar o andamento das entrevistas porque, mesmo assim, três professores sentiram-se à vontade para fazer críticas irrestritas ao Projeto e as verbalizaram, como se pode constatar nas transcrições. Ainda, podem-se notar comentários desfavoráveis subliminares ao Projeto nas entrevistas, o que também corrobora minha afirmação.

Ao examinar as entrevistas, tendo como referência o conceito “formação”, defini seis situações notáveis em que, por hipótese, os participantes da pesquisa vivenciaram o processo formativo pelo Folhas. São elas:

• Folhas e formação inicial • Folhas e produção

• Folhas e produção no formato • Folhas e vivência em sala da aula • Folhas e validação

• Folhas e valorização do professor

Coerente com o referencial histórico cultural adotado, em que formação quer dizer constituição e esta se dá pela significação, um processo predominantemente interativo, passei a pesquisar, no conjunto das situações, os momentos nos/pelos quais a formação/constituição/significação se realiza. Ao identificar as situações de formação procurei estudá-las numa perspectiva processual mesmo. Não tomá-las como objetos congelados, fixados. Ao invés disso, olhá-las como processos a serem examinados. Ou, dizendo de outro modo, estudar as situações formativas, localizadas nas entrevistas, em seu movimento.

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Numa pesquisa, abranger o processo de desenvolvimento de uma determinada coisa, em todas as suas fases e mudanças – do nascimento à morte – significa, fundamentalmente, descobrir sua natureza, sua essência, uma vez que é ‘somente em movimento que um corpo mostra o que é’. (VIGOTSKI, 2003, p. 86)

É evidente que não cogitei pesquisar o produto das situações formativas relativas ao Projeto, isto é, situar em que estado formativo estaria o professor depois de ter passado pelo processo Folhas. Tão somente pretendi identificar as situações formativas e caracterizá-las como tais. Entretanto, mais que descrever detalhadamente as situações formativas em cada professor, procurei explicá-las à luz do percurso histórico do Projeto, ou, em outras palavras, estudá-las historicamente, o que significa estudá-las no processo de mudança. (VIGOTSKI, 2003)

Também, não realizei a investigação dos processos de formação pela via do Projeto, restringindo-os ao estudo de seus constituintes, em separado e em profundidade, tampouco focalizei as suas diferenças e semelhanças. Pelo contrário, encarei-os como componentes de um todo, que é mais que a soma de suas partes, assim como nos ensina Edgar Morin em obra recente. Para este pensador, não basta conhecer as partes pelo todo, ou conhecer o todo pelas partes, como um círculo vicioso. É necessário extrair da relação parte-todo

[...] um tipo de inteligibilidade baseada na circularidade construtiva da explicação do todo pelas partes e das partes pelo todo, isto é, na qual essas duas explicações, sem poderem anular todos os seus caracteres concorrentes e antagônicos, se tornam complementares, no mesmo movimento que as associa.

Todo Partes

(MORIN, 2005, p. 259)