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Economia ecológica, movimentos sociais e políticas ambientalistas

No documento 123456789/81183 (páginas 113-119)

4 ECONOMIA ECOLÓGICA: OS FLUXOS FÍSICOS DE ENERGIA E MATERIAIS E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.

19 Ecologia humana pode ser definida como uma ciência interdisciplinar voltada ao estudo dos dinâmicos processos biológicos e sociais que ocorrem entre os homens como indivíduos, coletividades e sociedades e

4.7 Economia ecológica, movimentos sociais e políticas ambientalistas

Para os economistas ecológicos, então, o mercado pura e simplesmente não capta todas as extemalidades ambientais, a não ser por pressão externa a ele, vinda dos movimentos sociais e efetivada em políticas ambientalistas.

Os resultados práticos observados todavia mostram que as políticas ambientais - manifestadas em forma de atos ou leis e implementadas através da criação de novos ministérios e departamentos públicos - indicam que o problema ecológico é tratado de forma residual ou como componente secundário das políticas oficiais. Há um vácuo de políticas alternativas. Enquanto se verifica a proliferação da consciência ambiental e de movimentos sociais clamando em favor da resolução da crise ecológica, muito pouco há de iniciativas governamentais efetivas neste sentido. Em relação ao primeiro aspecto é ilustrativo o que ocorre nos Estados Unidos: cerca de 190 milhões, dos seus 250 milhões de habitantes, consideram-se a si próprios ambientalistas e afirmam, em pesquisa específica, estarem dispostos a se envolver em algum tipo de atividade para defender o meio ambiente (inclusive pagando mais taxas). Cerca de 120 milhões de americanos dizem ter feito doações para grupos ambientalistas; e 40 milhões indicam terem participado de algum movimento desta natureza

(Toledo, 1993: 45). A situação não é muito diferente na Europa, onde pesquisas envolvendo 12 paises mostram que, já em 1988, entre 60% a 85% da população consideravam a proteção ambiental um urgente e imediato problema (Id., ib.: 45).

Para o economista ecológico Victor Toledo, há um vasto setor da população, que se expressa favoravelmente a ações em relação ao meio ambiente, sem representação na política formal. O alto grau de abstenção nas eleições havidas nos países pesquisados, referidos acima, indicaria, a seu ver, descrédito nos partidos e lideranças tradicionais.

Em estudo que realizamos, numa direção semelhante, acerca do Estado de Santa Catarina (Montibeller Filho, 1994), a conclusão confirma as ponderações acima. Observamos que por força da opinião pública, do movimento ambientalista, da conscientização do quadro técnico no próprio seio do governo estadual, criou-se uma política de apoio ao setor privado - no caso analisado, o Prodec/Programa de Desenvolvimento da Empresa Catarinense - a qual explicita objetivos que vão ao encontro das proposições de sustentabilidade ambiental (além da social e da econômica). Todavia, ao analisar o sistema de ponderação para concessão de benefícios às empresas e o resultado da operação do programa, foi constatado que a aplicação efetivada confronta com os objetivos propostos (explicitados). Pode-se conjeturar que a criação de leis e órgãos específicos tem o propósito maior de amenizar as críticas sociais do que efetivamente tratar do tema ambiental.

Os exemplos constituem-se nas primeiras indicações de que o sistema capitalista não consiga efetivamente dar conta da problemática ambiental devido às restrições à economia que seriam então colocadas, as quais contribuiriam para acentuar a tendência à queda da taxa de lucro. Assim, fica ele ludibriando. Um exemplo concreto: o mais alto edifício da Europa, recentemente concluído, e que concentra quase 5 000 funcionários de um banco, é apresentado como um “eco-prédio” (o que atende ao apelo mercadológico de um “eco-marketing”); como conciliador entre economia e ecologia, apenas por que suas formas permitem reduzir o consumo de energia (sem contar a dos elevadores) em relação aos demais edifícios; e possuir alguns jardins-suspensos (Deutschland, 1997: 63-65). Todos os demais problemas ambientais decorrentes da concentração geográfica de populações (tais como, por exemplo, os relativos ao trânsito de veículos), não são, todavia, considerados.

É interessante, então, neste momento, observar a posição política de Martínez Alier quanto a um ecologismo popular. Em sua tese, de 1994, defende serem os segmentos pobres da população, os quais necessitam lutar para garantir as condições de sobrevivência, que efetivamente protegem o meio ambiente. Segundo o autor, “a história está cheia de movimentos ecologistas dos pobres, isto é, de conflitos sociais com conteúdo ecológico e cujos atores tinham uma percepção ecológica” (Martínez Alier, 1994:20). Demonstra-a com muitos exemplos concretos nos quais a natureza é protegida pela forma de explorá-la sem degradação do meio. Os movimentos sociais dos pobres, sendo luta pela sobrevivência, logo são movimentos ecológicos, pois seus objetivos são a garantia das necessidades ecológicas para a vida : “energia (as calorias da comida e para cozinhar e aquecer-se), água e ar limpos, espaço para morar” (Id., ib.: 26). Estas formas de garantir a sobrevivência permitem manter os recursos naturais fora do sistema de mercado, o que é essencial do ponto de vista ecológico, já que a racionalidade mercantil infravalora estes recursos e os utiliza abusivamente. O ecologismo popular refere-se, também, às associações comunitárias e sindicatos de trabalhadores - rurais e urbanos - que se engajam na defesa do meio natural, ao mesmo tempo em que buscam as mudanças sociais e a melhoria das condições de vida dos meios populares (Rousset, 1998).

Numa direção muito parecida com a acima exposta vai a proposição de Enrique Leff de uma nova racionalidade produtiva, a que chama racionalidade ambiental (trazendo da economia o critério de racionalidade e da ecologia o critério ambiental). Para Leff, o paradigma produtivo alternativo da racionalidade ambiental estaria fundado no conceito de produtividade ecotecnológica. Este articula três níveis de produtividade - ecológico, tecnológico e cultural - no manejo integrado dos recursos produtivos. A produtividade ecológicadeve ser medida pela produção de valores de uso naturais e não avaliada pelos preços de mercado. Ela está sujeita a uma taxa básica de produção ecossistêmica, a qual depende dos ritmos de extração e das condições de regeneração de seus recursos em padrões alternativos de aproveitamento. A produtividade tecnológica, “em sentido restrito e independente do capital que incorpora - é medida em termos da eficiência mecânica e, sobretudo, termodinâmica dos processos produtivos.” (Leff, 1994: 112). E a produtividade cultural, que é gerada “a partir da reconstrução das práticas produtivas e dos processos de trabalho tendo em conta os valores culturais que normatizam a organização produtiva de uma formação social”, é medida através

Observando-se a tese do ecologismo popular de Martínez Alier e a proposição de Leff quanto ao novo paradigma da racionalidade ambiental, vemos que estes dois atuais expoentes da economia ecológica restringem as possibilidades desta a um relativamente pequeno segmento social, situado à margem, a rigor, da economia de mercado. Além disto, as proposições são essencialmente vinculadas à atividades básicas de sobrevivência e ou próprias do setor primário da economia. Outra forma que para os economistas ecológicos, segundo nossa dedução, possibilitaria o desenvolvimento sustentável, mantido o sistema, seria através das decisões pelo critério da racionalidade ambiental utilizando a análise multicritério (esta será considerada no item 5.5 do próximo capítulo).

Proposições, como a do ecologismo popular, que restringem o desenvolvimento sustentável às margens do mercado, apesar da sua localizada importância social e ecológica, a nosso ver não respondem à problemática ambiental colocada pelo/ao capitalismo: basta ter em conta a dimensão total que a questão assume e o alcance limitado de ações marginais.

Conclusões

No presente capítulo foram apresentados os conceitos, definições e proposições principais da economia ecológica e de autores expressivos desta corrente da economia ambiental, e procurou-se deduzir do conjunto de suas propostas respostas quanto quanto à questão central do presente trabalho.

Mostrou-se que a economia ecológica insere-se no quadro da ecologia humana, esta por sua vez fundamentada em princípios e concepções adaptados da ecologia (geral), portanto em conceitos biológicos e físicos, tais como a visão sistêmica, o princípio do equilíbrio geral, os fluxos físicos de energia e de materiais e as leis da termodinâmica. Um conceito destacado foi o de capacidade de suporte que, quando trata de populações humanas e pressupõe seu crescimento, configura-se no paradigma ambientalista do desenvolvimento sustentável.

pensamento, procurar conduzí-la no sentido de reduzir a produção de entropia, que é a medida da desordem de um sistema (situação caótica, representada sobretudo pelo desperdício de energia e de materiais). Quanto a isto os economistas ecológicos tecem críticas (fundamentadas, a nosso ver) à economia ambiental neoclássica, na medida em que esta acredita na eficiência do sistema de preços e nestes, exclusivamente, baseia suas análises. As decisões unicamente pelas regras dos mercados (real; ou hipotético, como nos casos dos bens e serviços ambientais), dizem os ecoeconomistas, conduzem a uma economia ecologicamente ineficiente.

Para a economia ecológica os preços de mercado devem, também, ser considerados nas análises - além do exame dos fluxos físicos de energia e materiais porém submetidos à observação de que eles podem estar camuflando trocas ecologicamente desiguais. Neste caso, um produtor (empresa, região ou país) testaria vendendo a preços baixos recursos naturais - como por exemplo minerais, alimentícios ou florestais - devido a estes não conterem, em forma de custo refletido no preço, o valor econômico do desgaste ambiental (degradação do meio físico e social, exaustão da fonte produtora do bem) deixado na área de produção.

Apesar da crítica ao sistema de preços, os economistas ecológicos propõem que este deva ser pressionado “desde fora” - politicamente, portanto - pelo movimento ambientalista em suas diversas formas (criação de regulamentos, leis; ações voluntaristas e coletivizadas, por exemplo), para que assuma os custos ambientais. Consideram, a nosso ver acertadamente, que a valoração econômica dos bens e serviços ambientais, essência da economia ambiental neoclássica, é frágil como instrumento de decisões para questões relativas ao meio ambiente. A referida valoração é feita pelos indivíduos em mercados fictícios (visto que o mercado real normalmente não considera bens e serviços ambientais) e, aspecto mais grave do ponto de vista de uma avaliação, tendo que manifestar-se em relação à importância que o bem ou serviço ambiental considerado teria, ou não, para as gerações futuras.

Colocam, portanto, os economistas ecológicos, o problema da incomensurabilidade intergeracional, ou diacrônica, de valores na avaliação monetária neoclássica dos bens ambientais. Apontam ser basicamente esta a questão que impede a obtenção de preços

ecologicamente corretos; porém é possível - e importante dizem, obter-se preços ecologicamente corrigidos. Mesmo assim, os preços no mercado serão efetivamente corrigidos (ecologicamente), não por serem recalculados pelos especialistas para considerar, embora deficientemente, os custos ambientais, mas sim pela pressão da sociedade civil - movimento ambientalista - sobre o mercado. Como, todavia, não serão preços ecologicamente corretos. tem-se uma primeira dedução de que, desta forma, na perspectiva econômico-ecológica, o desenvolvimento sustentável muito provavelmente não será alcançado no capitalismo (outros argumentos sobre este aspecto serão apresentados nos capítulos seguintes).

Abordou-se, também, o posicionamento de economistas ecológicos em favor de atividades econômicas, com conteúdo ambientalista, que se desenvolvem às margens do mercado, na medida que estas procuram preservar as condições naturais, visando garantir a sobrevivência de coletividades empobrecidas. Elas poderiam se conduzir por uma racionalidade ambiental (em contraposição a uma racionalidade apenas economicista). De nossa parte, reconhecemos a importância social e ambiental contida nesses processos econômicos que se instalam nas bordas do sistema. Todavia, tem-se que, forçosamente, apontar o seu limitado alcance frente à dimensão total que a questão social e ambiental assume no sistema como um todo. E, portanto, concluir que, por esta via, também não se vislumbra a possibilidade de, no capitalismo, atingir- se o desenvolvimento sustentável.

Pesquisadores ambientalistas, não só os da vertente econômico-ecológica, buscam estabelecer critérios capazes de avaliar se uma sociedade evolui segundo padrões do DS. Assim, formulam os denominados indicadores de sustentabilidade. Em tese, tais indicadores - ou índices - são aplicáveis a qualquer sociedade concreta, independentemente do modo de produção dominante. A seguir são apresentadas algumas das principais formulações neste sentido, analisando-as sob a ótica de sua aplicação em sistemas de mercado. Nossa hipótese básica é a de que a análise desses indicadores também é capaz de revelar a insustentabilidade sócioambiental inerente à economia de mercado.

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