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No decorrer do trabalho procurar-se-á evidenciar relações conflituosas entre atores do movimento, em nome da preservação do meio ambiente Nos extremos, um ecomarketing visando o lucro e um ecologismo dos pobres, fora

No documento 123456789/81183 (páginas 30-36)

1 MOVIMENTO AMBIENTALISTA E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL (DS)

6 No decorrer do trabalho procurar-se-á evidenciar relações conflituosas entre atores do movimento, em nome da preservação do meio ambiente Nos extremos, um ecomarketing visando o lucro e um ecologismo dos pobres, fora

Os anos 80 são marcados pela Comissão Brundtland e pela proeminência dos partidos verdes que haviam surgido na década anterior. A Comissão iniciou seus trabalhos em 1983 e quatro anos depois publicou seu famoso Relatório, no qual sintetiza o conceito de desenvolvimento sustentável. A entrada do setor empresarial tendo em vista aproveitar-se de um emergente mercado verde - que valoriza ou impõe ao produtor o cuidado ambiental - caracteriza os anos 1990. Para os autores referidos (Leis e D ’Amato), o ambientalismo adota um perfil complexo e multidimensional “de grande iniciativa e capacidade de ação ética e comunicativa, que o habilita para se constituir em um eixo civilizatório fundamental, na direção de uma maior cooperação e solidariedade entre nações, povos, culturas, espécies e indivíduos.” (Leis, 1996: 117)

No Brasil, a constituição do ambientalismo deve ser situada nos anos 70, “quando começam a configurar-se propostas provenientes tanto do Estado quanto da sociedade civil” (Id., ib.: 96). O Estado e a sociedade civil formam aqui, na sua origem, os dois atores de um movimento bissetorial, mantendo entre si relações ao mesmo tempo complementares e contraditórias (entidades ambientalistas a denunciar a degradação ambiental, forçando a ação do Estado; este a aprimorar a legislação, mas sobretudo resistindo a reconhecer a importância da problemática ambiental). Na década seguinte, a disseminação da preocupação social com a deterioração ambiental transforma o ambientalismo brasileiro em um movimento multissetorial e complexo (Viola & Boeira, 1990). Ele é formado basicamente pelos mesmos setores e processos mencionados acima, o que torna o ambientalismo nacional - à exceção de alguns aspectos específicos, como por exemplo uma relação de dependência entre os atores estatais e os sociais (Leis, 1996:100 ) - semelhante ao global. A característica de complexo do movimento ambientalista retira o anterior isolamento e promove o intercâmbio entre os diversos setores. Assim, por exemplo, as organizações ecológicas profissionais que surgem no final da década de 80, segundo Leis, não mais se dedicam à denúncia, mas sim a buscar alternativas viáveis de conservação ou restauração de ambientes degradados, influenciando as “agências estatais de meio ambiente, o poder Legislativo, a comunidade científica e o empresariado.” (Id.,ib.: 102)

A fase final dos anos 80 e o ano de 1990 são marcantes no ambientalismo brasileiro. Registram a mudança de um movimento que se interessava pelos problemas ecológicos mas

não os vinculava ao tema do desenvolvimento sócio-econômico: economia e ecologia eram percebidas como realidades antagônicas. A acentuação da crise econômica; a discussão e aceitação do conceito de desenvolvimento sustentável expresso no Relatório Brundtland, de 1988 (do qual se falará adiante) pela maioria dos integrantes do movimento; e outras razões, fizeram com que se passasse a considerar não mais exclusivamente a perspectiva da proteção ambiental, mas, sim, esta em relação ao desenvolvimento.

Neste sentido, o ano de 1990 foi importante por definir claramente a nova posição, quando dos preparativos para a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio-92: “Já não se falava mais em proteção ambiental de forma isolada, mas de como atingir um novo estilo de desenvolvimento que a atenda de forma apropriada” (Leis, 1996: 109). O desenvolvimento sustentável passou a ser o paradigma do movimento ambientalista, e por isso mais adiante será detalhado.

Na seqüência será abordada sob a ótica das relações políticas internacionais, uma primeira crítica da visão do potencial do ambientalismo para reconverter a problemática social e a ambiental, no capitalismo em escala global, e vir a alcançar o desenvolvimento sustentável, paradigma desse movimento.

1.3. -Ambientalismo e relações políticas internacionais

Apresentam-se, como uma primeira abordagem sobre a questão levantada neste trabalho, a saber, quanto a perspectivas de solução da problemática social e ambiental no universo capitalista, algumas considerações de caráter sócio-político. De fato, vai-se já cerca de um quarto de século de preocupação social mais explícita com as questões ambientais. A observação deste período pode, portanto, trazer elementos indicativos acerca das perspectivas de evolução futura.

Uma das características mais patentes no ambientalismo é a exigência de novas posturas no quadro das relações entre nações, visto pressupor a necessidade de uma política ambiental global (tendo em vista que grande parte dos problemas relacionados ao meio ambiente extrapolam fronteiras geo-políticas). Duas teorias fundamentariam a política

internacional, de acordo com Leis (1993). Uma, a realista, baseada em Hobbes, a qual vê o antagonismo entre Estados como natural no mundo moderno. Outra, idealista, derivada de Grotius e Kant, para a qual o antagonismo não seria a base das relações internacionais, sendo os conflitos evitáveis através do uso da razão è da cooperação.

A política internacional tem sido conduzida ao longo dos tempos modernos segundo os preceitos da primeira visão, a realista. A proposição contida no movimento ambientalista, ao contrário, pressupõe uma nova postura, de conteúdo idealista. Na prática, todavia, ocorre que, no plano internacional, apesar da retórica de cooperação e desenvolvimento sustentável, cada país argumenta acerca de sua soberania e busca garantir politicamente a maior vantagem na exploração dos recursos naturais e na utilização dos serviços ambientais de outros países (Porter e Brown, 1991). Portanto, a observação da realidade mostra que estamos longe da cooperação internacional e do desenvolvimento sustentável. Predomina o pensamento segundo o qual o mercado é capaz de encontrar as melhores soluções, mesmo para a crise ecológica global. À medida, porém, que cresce a economia em mercado mundialmente interdependente, aprofunda-se a crise social e ambiental planetária.

Por atravessar fronteiras dos Estados e das classes sociais a crise ambiental, segundo Leis (1993), configura o drama da condição civilizatória vigente. O autor citado vê o ambientalismo como uma contraposição defensiva às forças do mercado, mas que luta por se impor em contexto no qual o ecologismo pode acabar por ser apropriado mercantilisticamente - e os problemas sócioambientais, não resolvidos. Portanto, impõe-se a cooperação internacional; porém na prática isto não ocorre. Nos fóruns internacionais diversas situações de política podem se manifestar, dentre as quais as coalizões e os vetos. Assim, o interesse de um país pode se contrapor ao da maioria.

Na política ambiental global os Estados produzem os documentos legais, criando os Regimes Ambientais Globais. Um Estado, nos fóruns que decidem estes diplomas, pode exercer uma das quatro posições: líder, suporte, seguidor ou vetador (Porter e Brown, 1991). Interesses ou bases domésticas - política interna - podem levar um Estado à posição de veto, assim como levar à coalizão. Desta forma, nem todo problema ambiental global envolve o mesmo nível de interesse dos países, fazendo com que a cooperação, que derivaria da

Conforme se constata, a política ambiental insere-se no sistema de política global, a qual é fortemente influenciada por aspectos militares, políticos, econômicos e outros. A segurança ambiental, isto é a preservação ambiental para garantir um resultado global, confronta, por exemplo, com o conceito militar de segurança fundado nas estratégias de preparação para a guerra (onde se inclui o armamento nuclear, hoje em menor grau, porém ainda ameaçadoramente presente). Seguindo este raciocínio, Porter e Brown concluem pelas

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dificuldades no encaminhamento rumo ao desenvolvimento sustentável, mas apontam otimisticamente para o papel das organizações não-govemamentais na criação de uma política ambiental global.

Paul Kennedy também examina o problema de uma política ambiental mundial. Vê na globalização conduzida pelos interesses das empresas transnacionais (controladoras das novas tecnologias) apoiadas pelo sistema financeiro internacional e na lógica do mercado global, as causas do aumento das desigualdades no mundo: “O mercado racional, pela sua própria natureza, não se preocupa com a justiça social e a igualdade.” (Kennedy, 1993: 53). Portanto, a dimensão social do DS não seria atingível. Tome-se o exemplo da biotecnologia, citado pelo referido autor: ela tem o potencial de agravar a situação dos países subdesenvolvidos, através do que denomina “imperialismo biológico”. A partir de recursos genéticos extraídos nos subdesenvolvidos, os países tecnologicamente avançados desenvolvem e patenteiam variedades de sementes e outras espécies agropecuárias que inibem ou criam relações de dependência na produção, dos primeiros. Com interesses tão divergentes tais como os apontados, não há como pretender cooperação internacional (não considerando os casos de submissão nacional - e não cooperação - a países que já dominam o cenário mundial).

Vê-se, portanto, evidências a indicar que o princípio ambientalista fundamental da cooperação entre países, em questões que prejudiquem interesses relevantes de um. não é a tônica. Pelo contrário, o mais frequentemente observado é o país com força política procurar posicionar-se estrategicamente para continuar usufruindo (sem a devida compensação) dos bens e serviços ambientais oferecidos pelos mais fracos e para desfrutar das oportunidades

econômicas potenciais abertas pelo ambientalismo. O primeiro caso pode ser ilustrado com o comportamento reticente dos Estados Unidos em relação aos tratados de biodiversidade; o segundo, com a política alemã de desenvolvimento de ecotecnologias e de fechamento de suas fronteiras através das leis ambientalistas de importações (ecoprotecionismo).

Esses são breves comentários, trazidos da ciência política. Aqui, porém, já se pode começar a perceber limites do sistema capitalista frente à problemática sócioambiental para atingir o desenvolvimento sustentável em escala planetária. Esta é a questão central, e será retomada adiante sob a ótica sócio-econômica, com maior profundidade. O paradigma do desenvolvimento sustentável é, hoje, portanto, o padrão normativo do movimento ambientalista. Devido a isto, a seguir faz-se um apanhado acerca do conteúdo deste conceito.

1.4. - O paradiema do desenvolvimento sustentável.

O movimento ambientalista consegue produzir um conjunto de princípios em relação ao meio ambiente através dos protocolos e declarações emanados dos diversos fóruns e conferências mundiais e internacionais sobre o tema. Este conjunto formal constitui, hoje, a base do direito ambiental internacional e, por conseqüência, de diversos países, como o direito ambiental brasileiro. Este direito associa a proteção do meio ambiente ao desenvolvimento sócio-econômico. A legislação brasileira é ilustrativa a respeito: “A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico (...)” (Lei 6.938, art. 2, de 31 de Agosto de 1981).

A preocupação com a preservação do meio ambiente conjugada com a melhoria das condições sócio-econômicas da população fez surgir o conceito de ecodesenvolvimento, depois substituído pelo de desenvolvimento sustentável. No presente trabalho, a seguir inicialmente será detalhado o conceito de ecodesenvolvimento e, depois, o de desenvolvimento sustentável, de maneira que se tornem operacionalizáveis. Isto será feito com base em estudos anteriores (sobretudo Montibeller Filho, 1993; 1994). Julgamos importante reproduzir o conteúdo daqueles trabalhos, com alterações visando ao objetivo

atual, haja vista o tema continuar sendo o nosso objeto de estudo. 1.4.1. -Ecodesenvolvimento.

A construção do novo conceito parte da crítica à visão economicista e ao desenvolvimentismo7, denunciando-os como reducionismo econômico e como responsáveis pela geração dos problemas sociais e ambientais. E o ecodesenvolvimento põe-se como resposta à crise da ciência até então estabelecida, nas abordagens de fenômenos sociais que se complexificaram com o advento destas questões. Sem embargo, na ciência, o conceito em pauta, que veio a se constituir em novo paradigma ou padrão normativo, se difunde em resposta aos limites das abordagens que não mais conseguem dar conta de compreender a realidade complexa e mutante, composta de fenômenos sociais que não tomavam lugar ativo no pensamento científico, tais como a exclusão social e a questão ambiental.

Outro questionamento, feito a partir deste paradigma, é quanto ao antropocentrismo vigorante nas escolas econômicas, o qual se caracteriza em tomar o homem como única referência. Isto faz com que, do ponto de vista ambiental, a natureza seja vista na condição de simples recurso para a produção de bens/ Sua utilização, em forma e intensidade, fica subordinada aos interesses econômicos. A . ciência econômica, segundo Comeliau e Sachs (1988), ao fundamentar-se no cálculo econômico, ou nos valores-de-troca, não considera os valores-de-uso e nem os valores monetários dos bens ambientais não transacionados normalmente nò mercado.

O antropocentrismo e o cálculo econômico levam ao resultado social da fetichização da taxa de crescimento econômico. Isto é, toma-se esta' pelo que ela efetivamente não é: alcançar elevadas taxas como sinônimo de melhor condição de vida da sociedade. Em função desta fetichização tem-se o culto ao crescimento da produção - quantificada no conceito de Produto Interno Bruto (PIB) que representa o valor da produção obtida ao longo do ano - mesmo que para isto degrade o meio ambiente e comprometa as possibilidades de produção futuras.

7 O economicismo, sendo uma visão unilateral da realidade, não considera as demais dimensões desta, enfocando

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