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Os limites da reciclagem

No documento 123456789/81183 (páginas 195-200)

TRABALHO HUMANO

7 LIMITES AMBIENTAIS E A RECICLAGEM DE MATERIAIS.

32 De nossa parte, levantamos a hipótese de que, igualmente, a participação individual na coleta comunitária seletiva do lixo para reciclagem possui um lado contraproducente do ponto de vista ambiental O argumento

7.6. Os limites da reciclagem

Conforme analisam Horton (1995) e LeflF (1996), referindo-se a este tema e citados no item 7.1, a criação de uma lei da reciclagem de materiais gera expectativa ambiental e econômica, para muitos aparecendo como "o futuro" com relação a estes dois aspectos - relativos ao meio ambiente e às possibilidades macroeconômicas. Não desconsiderando a importância ética e dos resultados concretos das ações que buscam melhorar a relação sociedade-meio ambiente, há, todavia, quanto à reciclagem, que levar-se em conta as condições objetivas que de um lado permitem mas, de outro, delimitam seu alcance.

Um dos principais impedimentos a que a reciclagem tenha papel relevante do ponto de vista ambiental reside no grande volume de lixo produzido nas comunidades de alta densidade e magnitude populacionais e com cultura consumista (sociedades de consumo em massa). A contribuição da reciclagem, embora amenize o problema da degradação do meio ambiente, é relativamente pequena frente ao total de lixo a que deve ser dada uma destinação. É o que se demonstra na seqüência.

7.6.1 Limite da reciclagem relacionado ao volume de lixo produzido

Inicialmente, o problema será abordado relativizando-se com o total de lixo produzido as seguintes parcelas que o compõem: a parte passível de aproveitamento (reciclável); e a parcela sem possibilidade de ser aproveitada, à qual é necessário dar-se uma disposição final - em depósitos (depositação), aterros (aterramento) ou queima (incineração). No caso de Los Angeles, por exemplo, de acordo com Horton (1995), conforme referido no item 7.5, de uma

produzido, já que a medição só é feita nos pontos de disposição - isto é, o que resta disperso, não recolhido, não é computado.

Na Alemanha, atinge-se já cerca de 30% de aproveitamento do lixo domiciliar. Mas há que se distinguir dois tipos de aproveitamento possíveis. Num, tem-se o produto utilizado novamente, é o mesmo produto que aparece nó segundo ciclo de utilização e, portanto, trata-se de reuso (reutilização, como ocorre com as garrafas de vidro para embalar leite): nem todo aproveitamento é, então, reciclagem. O outro tipo de aproveitamento é a reciclagem. Neste, um novo produto surge no segundo ciclo, derivado da transformação do produto original. Para esta transformação é necessária a adição de outros materiais, mais energia e outros insumos e recursos. É sobre este tipo de aproveitamento que a presente análise se detém.

A reciclagem atingindo pequena participação, como num caso observado, ou percentual elevado em relação ao total de lixo, como no outro, há, todavia, um aspecto correlato a ter-se em conta. Trata-se da evolução dos dados quanto ao volume de rejeito produzido e as perspectivas futuras. Tomemos os dados de 1993 (da tabela 5), que pretendem demonstrar o progresso alemão na solução da problemática do lixo. Tem-se que, deconsiderando o item entulho e terra de escavação, foram produzidas, no ano, um total de 194 milhões de toneladas de rejeitos, por uma população em torno de 80 milhões de pessoas (cfe. Nações Unidas, 1995, apud Deustschland n.3, junho 96: 43) . Isto representa a média anual de 2.425 kg por pessoa e uma produção diária em torno de 6,6 kg per capita de lixo. E uma cifra elevada, para uma sociedade que já adota a postura de evitar a produzí-lo. No caso de Los Angeles, a produção per capita de resíduos sólidos situa-se em tomo de 4 kg/dia - considerando os de origem residencial, comercial/industrial e de construção/demo lição (Horton, 1995: 4).

Tais dados, ao retratarem o grande volume de lixo produzido, revelam que, mesmo sendo fávorável o percentual de apírovéitámento, ainda resta uma enorme quantidade a ser dada destinação final. Haverá serhfire íi^ia grande prodÜ^âo de rejeitos cujas cáracterísticas não permitem que seja aproveitacíò. tlfea estimativa feitá ji&fa o município de Los Angeles situa em cerca de 75% do total produzido & jíâfcela a sofrer iièpositação (Horton, 1995: 3). No caso

alemão, considerando-se o nível de aproveitamento registrado em 1993, tem-se, em contrapartida, um volume de mais de 125 milhões de toneladas de lixo não aproveitável (desconsiderando-se entulho e material de escavação). Isto representa cerca de 342 milhões de kg/dia a requerer uma destinação final. A tendência, como se sabe, é a de diminuição do ritmo de crescimento da produção de rejeitos. Mesmo assim, todavia, o volume total restará muito grande, dada a dimensão dos valores envolvidos.

Há a considerar, além disso, a existência de um tipo de rejeito ao qual tem que ser dada destinação final especial: trata-se do lixo tóxico. Dados mencionados por R. Obertreis em 1989 (apud Altvater, 1995: 249), dão conta que “nos países industrializados, são produzidas anualmente cerca de 500 milhões de toneladas de rejeitos tóxicos (...)” Lembremo-nos, a propósito, que uma grande quantidade deste refugo tóxico é enviada pelos países ricos ao resto do mundo (sem contar que parcela do lixo não tóxico é também exportado). Obertreis cita a cifra de cerca de 6 milhões de toneladas anuais que são “transportadas de modo mais ou menos ilegal a países do Terceiro Mundo ou a países do bloco oriental.” (Id., ib.: 249). Considerem-se as estatísticas oficiais a respeito: veja-se a tabela 6.

Dados oficiais (que não computam as saídas ilegais) comprovam a grande quantidade de lixo tóxico exportada pelas nações industrializadas. Sete países somente - de um total aproximado de 17 que compõem o rol dos mais industrializados e ricos do mundo - respondem anualmente por quase 1.700.000 toneladas destas exportações, as quais normalmente destinam- se, sobretudo, a boa parte dos países da América Latina, África e Ásia. Os receptores deste rejeito tóxico - que geralmente acompanha os “conteineres” de lixo em geral comprado para fins de reciclagem - desconsiderando algumas divisas a curto prazo não têm vantagem alguma, pois importam um grave problema ecológico (o que vem a conflitar com a sustentabilidade ecológica do espaço ambiental, conforme conceituado no Capítulo V, item 5.4.1).

Tabela 6: Exportações Oficiais de Lixo Tóxico, por Sete Países Industrializados (1989) País Toneladas de lixo tóxico exportado Quantidade exportada em % do total de lixo tóxico produzido Quantidade (t) de lixo tóxico produzido(*) Alemanha Oc. 1.058.000 18,0 5.800.000 Holanda 189.000 13.0 1.450.000 Suiça 108.000 27,0 400.000 Finlândia 65.000 24,0 270.000 França 43.000 1,4 3.080.000 EUA 127.000 - - Canadá 101.000 3,0 3.350.000 Total (7 países) 1.691.000 - 14.350.000

Fonte: OCDE (apud Altvater, 1995: 248)

(*) Quantidades estimadas, pelo autor, em função dos parâmetros anteriores.

Pela tabela pode-se aquilatar, também, o que vem a ser o problema do resíduo tóxico internamente ao país que o produz. Não temos a referência de quanto a exportação oficial dos EUA representa sobre o total por ele produzido (nas questões ambientais este país é bastante reticente para se expor - veja-se sua postura na Rio-92, por exemplo, negando-se a assinar tratados). Mas sabe-se que os EUA são o maior produtor de lixo tóxica do rrrúndo, conforme afirma Altvater (1995: 250). Todavia, mesmo não computando a produção americana, isto é, considerando apenas os seis demais .países da tabela - ignorando, portanto, o maior produtor mundial - tem-se o total de 14.350.000 toneladas anuais, cifra já bastante eloqüente para caracterizar a gravidade do problema representado pelo lixo tóxico.

Tome-se ainda outro exemplo, que reflete o problema da quantidade produzida de lixo em geral, o da maior cidade do Brasil e da América do Sul. Em manchete, jornal paulistano alardeia: “Lixo torna-se maior desafio de São Paulo”. E informa que nos últimos seis anòs o volume relacionado ao tipo domiciliar, naquela capital, aumentou em 32% ! (ABM, 1998: 697).

O problema, portanto, está não só na impossibilidade de reciclagem do total, como também na quantidade de rejeitos em geral que normalmente é gerado. De acordo com o economista Elmar Altvater, o problema reside não apenas no fato de que a condição para a sobrevivência do ser humano é produzir lixo, porém, mais ainda, em que "O homem da sociedade industrial fordista é um ser produtor de lixo em massa; este é seu estilo de vida" (Altvater, 1995: 244). Esta é uma característica do homem moderno da atualidade, com seu alto grau de individualidade, flexibilidade, mobilidade e autonomia. Tais condições baseiam-se no transporte, moradia e consumo individuais, isto é, no estilo de vida do desperdício. A este estilo de vida conflui uma indústria de bens de consumo individualizado, tais como: automóveis; produtos de consumo doméstico comercializados em pequenas porções hermeticamente embaladas; embalagens cuja única função é a de estimular o consumo dos produtos que contém; produtos e embalagens de plástico, e outros.

A preocupação com o lixo é, em geral, maior onde e por que o problema apresenta-se mais grave, como nos casos citados acima. A dimensão física que assume e a tendência de crescimento apontam a possibilidade de resolução apenas parcial com os aproveitamentos que podem ser feitos, como o da reciclagem. Esta constatação se afirma ainda mais pelos aspectos que se apontam na seqüência.

7.6.2. Limites ecológicos da reciclagem

A reciclagem de materiais é abordada, agora, sob o ângulo da economia ecológica. A análise econômico-ecológica, como visto no capítulo IV, leva em conta os fluxos físicos e o consumo de energéticos e materiais na produção. Para o caso da reciclagem interessam, sob este ângulo, o primeiro princípio e o segundo princípio da termodinâmica. Far-se-á um breve retrospecto acerca do seu significado (já explorado no capítulo referido).

0 primeiro e o segundo princípios da termodinâmica podem ser expressos, respectivamente, da seguinte maneira: A energia não pode ser criada ou destruída e, não é possível tranformar todo o calor em energia mecânica. O primeiro princípio é a lei da conservação de energia: a energia contida no universo é constante, podendo haver mudança de forma e lugar. O segundo princípio é a lei da entropia (entropia é a medida de desordem de um sistema). O segundo princípio baseia-se na dissipação de energia e implica em que "a propagação irreversível de calor é, neste contexto, sinônima de perda de rendimento" (Prigogine e Stengers, 1991: 94). Destes princípios e leis da termodinâmica decorrem as condições inerentes ao processo de produção econômica.

Com efeito, segundo Altvater, “qualquer processo de transformação material ou energética é associado a um aumento irreversível de entropia.” E, continua o autor, "as energias e matérias transformadas não estão mais disponíveis para uma nova utilização que faça sentido, isto é, que sirva à satisfação das necessidades humanas, sem que haja novos dispêndios de energia” (Altvater, 1995: 52). A reciclagem de materiais é um processo de transformação - quando não transforma é reuso de produto, conforme vimos. Transformar implica em utilizar mais energia, novos materiais e outros insumos e recursos. Além disto, tem-se que no "curso destas transformações, a energia é degradada. Isto significa que, passo a passo, a capacidade de reelaboração é consumida definitivamente.”(Id., ib.: 48)

Joan Martínez Alier, analisando o trabalho de economistas ecológicos, dentre os quais desponta Georgescu-Roegen, observa que estes derivam das leis da física a "impossibilidade de uma reciclagem total dos materiais” (Martínez Alier, 1991. 259). Além do aspecto quantitativo de novos gastos energéticos e de materiais para o processo de reciclagem - qualquer transformação da matéria os exige; as recicláveis, porém, em maior grau - tem-se outro problema, o qual diz respeito à qualidade do material e do produto final que passam por sucessivas transformações. O produto resultante de materiais reprocessados apresenta, geralmente, qualidade inferior ao que provém da primeira transformação. (E quanto mais sucessivas vezes for reciclada a matéria, pior a qualidade do produto). Isto ocorre principalmente nas transformações - de materiais - derivadas do calor, ou por reações químicas, que são a

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