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Educação em direitos humanos: considerações

APROXIMAÇÕES PARA UMA PERSPECTIVA CRÍTICA

3.3 As possibilidades: aproximações para afirmação de uma concepção crítica de educação em direitos humanos

3.3.1 Educação em direitos humanos: considerações

O primeiro passo de um processo educativo em direitos humanos, conforme destaca Sacavino (2008a), é a sua difusão, por se tratar de um tema ainda pouco conhecido. Esta

41Vivaldo (2009) apresenta por meio de sua pesquisa as experiências em educação em direitos humanos mais

significativas, sob seu ponto de vista, no Brasil como, dentre outras: a Comissão de Justiça e Paz (CJP-SP); Novamerica; Universidade Federal da Paraíba; Observatório de Educação em Direitos Humanos da Universidade Estadual Paulista (UNESP) e a Educação em e para os Direitos Humanos em Santa Catarina. Consultar: VIVALDO, F. V. Educação em direitos humanos: abordagem histórica, a produção e a experiência brasileira. 2009. 157 f. Dissertação (Mestrado em Educação)–Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009. p. 78-106.

difusão deve ser acompanhada por um processo de sensibilização que se aproxime da realidade e que propicie às pessoas reconhecimento de que o tema afeta a todos e a todas e, concomitante a este processo, pela construção de uma visão crítica da polissemia de expressões dos direitos humanos e os interesses que podem assumir numa sociedade de classes. Disto decorre o seu caráter eminentemente político.

Benevides (2003, p. 309-310) define a educação em direitos humanos como sendo essencialmente a formação de uma cultura de respeito à dignidade humana, através da promoção e da vivência dos valores da liberdade, da justiça, da igualdade, da solidariedade, da cooperação, da tolerância e da paz. Para a autora, a formação desta cultura significa criar, influenciar, compartilhar e consolidar mentalidades, costumes, atitudes, hábitos e comportamentos que decorrem dos valores citados, os quais devem se transformar em práticas. A elas se acrescentaria a promoção do cultivo e vivência da participação, leitura de mundo e posicionamento crítico frente às desigualdades. Silva, A. A. (1998, p. 191), com base em Santos, define cidadão como o “[...] indivíduo que tem capacidade de entender o mundo, a sua situação no mundo e de compreender os seus direitos para poder reivindicá-los”.

De acordo com Benevides (2003), essa educação parte de três pontos essenciais. No primeiro, o autor caracteriza tal educação como de natureza permanente, continuada e global. No segundo ponto, volta-se para uma educação para a mudança e, no terceiro aspecto, refere- se à cultivação de valores para atingir corações e mentes e não apenas instrução, meramente transmissora de conhecimentos.

Em relação ao segundo ponto,

[...] trata-se [...] de uma mudança cultural [...] importante [...] pois, implica a derrocada de valores e costumes arraigados entre nós, decorrentes de vários fatores historicamente definidos: nosso longo período de escravidão [...] nossa política oligárquica e patrimonial; nosso sistema de ensino autoritário, elitista e com uma preocupação mais voltada para a moral privada do que para a ética pública; nossa complacência com a corrupção [...] nosso descaso com a violência, quando ela é exercida exclusivamente contra os pobres e os socialmente discriminados; nossas práticas religiosas especialmente ligadas ao valor da caridade em detrimento do valor da justiça; nosso sistema patriarcal e machista; nossa sociedade racista e preconceituosa contra todos os considerados diferentes; nosso desinteresse pela participação cidadã e pelo associativismo solidário; nosso individualismo consumista, decorrente de uma falsa ida de modernidade. (BENEVIDES, 2003, p. 310).

As pessoas estarão exercendo a cidadania ativa quando efetivamente participarem nas esferas de poder, tanto na participação de processos decisórios, como na organização de lutas na práxis pela promoção, defesa e reivindicação de direitos sociais, econômicos e culturais.

ao público, o respeito à minoria pela maioria em busca do bem comum, o usufruto da lei sem privilégios, o respeito à diversidade e o direito à participação como condições de exercício da cidadania ativa.

Como aponta Candau (2002), os processos de educação em direitos humanos devem começar por favorecer processos de formação de sujeitos de direitos, tanto em nível pessoal como coletivo, que articulem as dimensões ética, político-social e as práticas concretas. A educação em direitos humanos, na educação escolar, constitui-se em uma possibilidade de construir um “[...] espaço em que os sujeitos possam se significar politicamente de modo que tanto os sujeitos como os sentidos sejam não mera reprodução, mas transformação,

resistência, ruptura.” (ORLANDI, 2007, p. 307, grifos nossos).

Essa educação deve propor-se ao resgate da memória histórica, rompendo com a cultura do silêncio e da impunidade. A memória brasileira, como aponta Viola (2010), frequentemente esquece-se de si mesma, ocultando o genocídio dos povos indígenas, as atrocidades do período da escravidão, o combate àqueles que se opuseram contra o colonialismo, as desigualdades da monarquia e das promessas não cumpridas da República. Por isso, para o autor, há a exigência de manter sempre viva na memória coletiva os horrores da história, buscando ressaltar as práticas e lutas dos movimentos sociais pelas conquistas de direitos, os questionamentos e as resistências ao modelo de sociedade hegemônica vigente, para que as pessoas se percebam também como sujeitos que produzem história.

O indivíduo é considerado como sujeito histórico quando capaz de modificar a realidade. Essa capacidade de agir sobre o curso dos processos sociais só é possível se o indivíduo for consciente, livre e responsável. Essa lógica passa a justificar as diferenças sociais como diferenças de capacidade. Daí que a tarefa central seja libertar o homem de si mesmo, torná-lo livre, tarefa eminentemente pedagógica. (ARROYO, 1996, p. 48).

Outra característica, importante, nos processos formativos, corresponde ao espaço cotidiano como referência permanente da prática educativa. Por meio do cotidiano, é possível refletir sobre os fatos e os acontecimentos que cada dia afetam as pessoas e suas consciências sobre a realidade. Para tanto, é necessário trabalhar o cotidiano em toda a sua complexidade. “É no tecido diário de relações, emoções, perguntas, socialização, produção de conhecimentos e construção de sentidos que criamos e recriamos continuamente nossa existência.” (CANDAU, 1995, p. 109). Neste processo educacional a metodologia utilizada é que traduz na prática pedagógica a concepção para qual sociedade as(os) profissionais da educação pretendem formar (também o tipo de) homens e mulheres. Por isso algumas considerações a respeito deste assunto são abordadas no próximo item.