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CAPÍTULO III A comunicação Escola-Família

1. Comunicar, em que consiste?

1.2. Comunicação entre a escola e a família

1.2.3. Efeitos positivos da comunicação escola-família

É claro que, se a comunicação entre escola e família é ineficaz, não se pode pretender culpabilizar apenas uma das partes, a família mostrará por vezes pouca disponibilidade, a escola joga com todas as suas limitações e a sociedade está talvez comodamente alheada desta problemática. O poder político conhece o problema, mas ficará mais económico se o ignorar... A verdade é que a escola recebe os alunos, pode conhecê-los melhor, sensibilizar-se com as suas dificuldades de adaptação e muito fazer para repor um pouco de justiça, num sistema educativo que se deseja democrático.

Tal como nos diz RAMIRO MARQUES, (1993, p.25): “Os efeitos positivos do envolvimento dos pais no aproveitamento escolar fazem-se sentir em todos os graus de ensino e grupos sociais.” Coloca-se no entanto outra questão, como vai a escola envolver os pais se, quer a comunicação, quer o nível socio-económico ou mesmo a cultura se mantêm? E há uma agravante, os alunos sentindo-se mal acolhidos ou não,

irão sempre à escola com maior ou menor grau de absentismo. Mas os pais desses alunos irão, estarão dispostos a sentir na pele os olhares curiosos e de reprovação daqueles que pertencem a culturas mais próximas à da escola?

A escola deverá tratar os pais como os maiores responsáveis pela educação dos filhos, mas sobretudo como seus iguais na responsabilidade pelo sucesso educativo deles.

“A melhor maneira de criar continuidade entre as escolas e os valores e culturas das famílias é abrir as escolas aos pais, criar espaço para eles se reunirem, proporcionar comunicação frequente, tratá-los como verdadeiros membros da comunidade educativa e dar-lhes a conhecer o currículo escolar.” (ibid p.33)

É sabido que em Portugal ainda não estão reunidas as condições necessárias para que esta entreajuda se faça de forma satisfatória. As escolas têm pouca autonomia, os professores pouca formação nesta área, não há verbas para investir na comunicação com os pais e no seu adequado acolhimento nas escolas, os pais em alguns casos não têm mesmo tempo para ir à escola, para além de que não existe no nosso país o hábito dos professores motivarem as famílias a irem à escola. Se bem que é à escola que cabe cativar os pais para que se envolvam no processo educativo dos seus filhos. Isto porque há entre pais e professores uma relação hierárquica, sobretudo em relação aos pais de mais baixo nível social. Assim sendo, MARC et PICARD (s/d., p.124-125) dizem-nos que “É o actor em posição alta que tem a iniciativa da interacção. O actor em posição baixa só toma a iniciativa quando se trata de desempenhar uma obrigação em relação a alguém situado num nível superior.”

Por outro lado sabe-se que os pais que vão à escola preferem sempre tratar de assuntos que digam directamente respeito à vida escolar do seu filho, raros são aqueles que estão motivados para participar na escola ao nível das grandes decisões. É que,

“mesmo quando as organizações oferecem reais possibilidades de participação a todos os seus membros, esta só é efectiva entre o pessoal do quadro e da direcção e que muito poucos indivíduos aspiravam participar nas decisões relativas a um nível superior ao seu.” (ibid, p.105)

Mas então de que forma a escola comunica com as famílias? Essa comunicação faz-se ou simplesmente não existe?

Diz-nos PERRENOUD (1995, p.89):

“na mais participativa das escolas, os professores e os pais encontram-se, na melhor das hipóteses, uma dezena de vezes no decurso de um ano escolar, muitas vezes em circunstâncias que só permitem uma conversa superficial. E mesmo que as comunicações escritas ou telefónicas sejam mais frequentes, não se podem comparar com a densidade de comunicações que se estabelecem através da criança.”

É de facto este o principal e privilegiado canal de comunicação entre a família e a escola.

1.2.3.1. A criança como mensageira e como mensagem

A criança leva todos os dias para casa sinais de alegria, tristeza, entusiasmo, frustração, repete comentários que ouviu ao professor, levando para a escola mensagens de tipo semelhante. Isto faz com que pais e professores recebam mensagens que poderão já ter sido alteradas de acordo com os interesses da criança. Para além destas existe uma mensagem, os trabalhos de casa, que no caso dos pais estarem devidamente motivados, pelo professor, para apoiar os filhos na sua realização, podem contribuir para que a escola conheça melhor os valores da família e esta contacte mais a fundo com os objectivos da escola. Os trabalhos de casa chegam quase todos os dias à família e são objecto de comentários e interpretações que vão chegar aos ouvidos do professor, se a criança achar que isso joga a seu favor. FAVRE e STEFFEN (1988, p.3) dizem-nos precisamente que “os trabalhos de casa constituem, tradicionalmente, uma ligação privilegiada entre a escola e as famílias”. Todo este circuito de comunicações dá à criança um poder imenso na gestão das relações entre a família e a escola.

Esta mesma ideia é expressa por PERRENOUD (1995, p.112):

“ a criança intervém selectivamente e activamente na comunicação entre professor e pais... Quando se lhe confia uma mensagem joga também os seus trunfos, por vezes esquece, censura ou inventa. E a criança pesa sobretudo na interpretação das mensagens de que está encarregada no sentido de servir os seus interesses do momento, para deitar água na fervura ou para reconciliar os pais e os professores, para se fazer esquecer ou para se valorizar.”

Seria por isso muito útil que pais e professores conhecessem bem este duplo papel da criança, enquanto “mensageira” e “mensagem” entre os dois mundos - quantas vezes antagónicos - em que tem que viver. Pais e professores têm que ter em conta que na sociedade em que vivemos a criança é tida como “um ser dependente, imaturo e irresponsável, considerado provisoriamente incapaz de conduzir a sua vida de maneira autónoma.” (ibid, p.92)

Sendo assim este poder de que ela usufrui para manipular a comunicação entre a escola e a família, pode muitas vezes ser usado para a concretização de objectivos pouco benéficos para ela própria. Convirá portanto que pais e professores tenham

acesso ao conhecimento deste importante papel da criança, já que ela “Nem sempre tem consciência do seu poder e nem sempre o usa em seu proveito.” (ibid, p.113)

Em geral as escolas preocupam-se imenso com a forma de levar os pais às reuniões, a participar em festas ou simplesmente a conhecer o professor. Não têm, no entanto, consciência da importância e do poder que tem a criança no estabelecimento de relações indirectas entre estas “duas instituições condenadas a cooperar numa sociedade escolarizada” (ibid, p.90)

Se de facto se pretende melhorar o sucesso educativo dos alunos e para isso é fundamental apostar na relação Escola-Família, é importantíssimo não desprezar que esta comunicação é um sistema complexo de relações directas - pouco frequentes - e indirectas - diárias - no qual actuam a família e a escola, mas sobretudo a criança enquanto mensageiro e mensagem. Tenha-se no entanto em conta que a criança “muito longe de ser um dócil mensageiro... é, de facto, o árbitro das relações entre pais e professores, que pode tornar possível ou esvaziar de sentido as comunicações directas entre ambos.” (ibid, p.90)

Resumo

Neste capítulo, abordámos a problemática da comunicação entre a escola e a família. Verificámos que, em qualquer organização, é fundamental que a comunicação entre os seus membros seja eficaz, mas que de uma forma geral esse objectivo é difícil de atingir, dado que a comunicação envolve o nível pessoal, dificultando assim a introdução de grandes alterações a este nível.

Tomámos ainda contacto com as limitações que o professor enfrenta enquanto comunicador, sobretudo na actualidade, em que a escola é frequentada por uma diversidade de culturas e etnias, a qual coloca aos profissionais de educação grandes e novos desafios. Estamos a referir-nos não apenas à comunicação entre o professora e os alunos de diferentes culturas, mas também à necessidade cada vez maior que o docente tem de construir uma ponte cultural entre si e os pais dos seus alunos, oriundos de diversos meios sociais, culturais e étnicos.

Procurámos depois encontrar nas teorias do desenvolvimento humano as razões que justificam uma forte aposta da escola na comunicação com as famílias, uma vez que, nomeadamente tratando-se de crianças mais novas, a predisposição para aprender depende tanto da qualidade de cada um dos subsistemas sociais que frequenta – escola e família - como da qualidade das relações que se estabelecem entre eles.

Finalmente vimos os efeitos positivos que a comunicação eficaz entre escola e famílias pode ter no sucesso educativo dos alunos e debruçámo-nos sobre o importante papel que o aluno desempenha na comunicação entre pais e professores.

Vejamos, no capítulo que se segue, se a forma como os professores do 1ºCiclo representam a escola e as práticas educativas das famílias dos seus alunos, poderão ou não influenciar a relação entre ambas as instituições.

CAPÍTULO IV - As representações dos