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CAPÍTULO I – A escola vista como organização

2. A Escola Como Arena Política

A partir dos anos 60, mas sobretudo nos anos 80, as fortes transformações sociais, transportadas para dentro das escolas pelas pessoas que as compõem, nomeadamente os alunos, fizeram com que as organizações escolares deixassem de se caracterizar pelo consenso, e passassem a deixar transparecer os conflitos que as agitam e fazem mover.

A sociedade actual é constituída por diferentes grupos, cujos interesses não são conciliáveis o que faz das escolas organizações em que os diferentes actores não perseguem os mesmos objectivos, usando o seu poder de influência para atingir os seus fins.

Neste contexto, LIMA (1998a, p.66), defende que aplicando o modelo da Arena Política ao estudo da escola vista como organização se pode “ chamar a atenção para a heterogeneidade que caracteriza os diversos actores educativos, para a conflitualidade

que pode marcar os seus interesses e as suas acções e, até, para o seu potencial de intervenção e de mudança”.

Por sua vez, BALL (1994, p.25-26) mostra-se favorável à aplicação deste modelo aos estudos que fazem uma abordagem organizacional da escola, afirmando que “Raras vezes têm sido investigadas e tomadas em conta as ideias e experiências dos actores, em particular a compreensão da micropolítica da vida escolar”.

Também SILVA (2001, p.590) defende que a relação entre a escola e os pais é um tipo de relação em que cada um dos actores usa a sua estratégia e que deverá “ser encarada como uma arena política, com armadilhas múltiplas e uma resultante em aberto”.

Esta visão da escola implica recusar “quer a racionalidade linear e a previsibilidade das imagens empresarial e burocrática, quer a unidade de objectivos e a visão consensual da perspectiva democrática” COSTA (1996, p.73) A organização escolar possui assim algumas características que, segundo o referido autor (ibidem), nos permitem defender a aplicação da metáfora política a esta organização e que são as seguintes:

“- a escola é um sistema político em miniatura cujo funcionamento é análogo ao das situações políticas existentes nos contextos macro-sociais;

- os estabelecimentos de ensino são compostos por uma pluralidade e heterogeneidade de indivíduos e de grupos que dispõem de objectivos próprios, poderes e influências diversas e posicionamentos hierárquicos diferenciados;

- a vida escolar desenrola-se com base na conflitualidade de interesses e na consequente luta pelo poder;

- os interesses (de origem individual ou grupal) situam-se quer no interior da própria escola, quer no seu exterior e influenciam toda a actividade organizacional;

- as decisões escolares, tendo na base a capacidade de poder e de influência dos diversos indivíduos e grupos, desenrolam-se e obtêm-se, basicamente, a partir de processos de negociação;

- interesses, conflito, poder e negociação são palavras-chave no discurso utilizado por esta abordagem organizacional.”

Tentaremos de seguida caracterizar cada um dos quatro conceitos referidos, que de acordo com os defensores da imagem da escola como arena política, são fundamentais para caracterizar este tipo de organização.

2.1. Os interesses na escola

Esta perspectiva micropolítica da escola, atribui mais importância aos indivíduos do que à instituição, assim sendo admite que cada indivíduo tem os seus interesses e que, apercebendo-se de que sozinho não os pode defender, associa-se em grupos de modo a poder atingir os seus objectivos.

Como consequência desta associação, “Os interesses dos grupos passam, assim, a dominar a tomada de decisões nas organizações escolares.” (COSTA, 1996, p.82) levando a que os objectivos deste tipo de organizações estejam constantemente sujeitos a ajustes decorrentes da adaptação constante aos interesses dos grupos mais influentes.

2.2. O conflito na escola

Numa organização tão complexa como a escola, surgem os mais variados grupos, que perseguem os interesses mais diversos, esta realidade faz com que se gerem conflitos de interesses nos momentos de tomar decisões.

Mas, ao contrário do que defendia a Teoria das Relações Humanas e também a Teoria Clássica, para os defensores da perspectiva micropolítica, como afirma COSTA citando BALDRIDGE (1983), “o conflito não é percepcionado, nem como um problema a evitar, nem como um acontecimento inapropriado ou uma disfunção, mas surge como algo natural e inevitável… podendo mesmo ser percebido como… benéfico para o desenvolvimento de uma saudável mudança organizacional.” (ibid, p.82)

No entanto, estes conflitos não resultam apenas de diferentes interesses no interior da escola, mas surgem também de pressões exteriores à escola, que estando inserida num ambiente social externo, é por ele também influenciada e condicionada. É claro que só a aceitação e compreensão de todos estes conflitos existentes na escola pode permitir a administração de uma organização com tal complexidade. Verifica-se aqui mais uma divergência em relação à TRH, já que não era tido em conta o ambiente externo à organização, nem a sua influência no interior da mesma, a organização era vista como um sistema fechado, impermeável ao exterior.

2.3. O poder na escola

Segundo os defensores da escola como arena política, os diferentes interesses individuais e de grupos, fundamentam-se no poder que os diferentes actores têm na organização, sendo que normalmente, “nas situações conflituais surgem como vencedores aqueles que detêm maiores fatias de poder e nos processos de negociação os que representam um maior peso organizacional.” (ibid, p.83)

No entanto COSTA (ibid, p.83), citando BACHARACH (1988) e HOYLE (1986a), distingue dois tipos de poder nas organizações que também se encontram na escola, trata-se do poder de autoridade, que “corresponde ao poder formal, cuja fonte se situa na estrutura hierárquica da organização” e do poder de influência, que é informal, “não estando dependente de processos de legitimação legal, pode ser suportado por diversificadas fontes, tais como o carisma, o conhecimento, a experiência pessoal ou o controlo dos recursos.” (ibidem)

Ainda segundo o mesmo autor que cita BUSH (1986), os gestores da escola têm cinco formas de poder, tornando-se assim nos actores que mais podem influenciar o rumo da organização escolar, e que são os seguintes: “o poder de posição oficial, o poder de especialista, o poder pessoal, o poder de controlo das recompensas e o poder coercivo.”

Mas não são apenas os gestores que têm poder na escola, também os professores podem exercer “o poder físico, o poder remunerativo, o poder pessoal, o poder cognoscitivo, o poder normativo e o poder autoritativo.”, tal como defende COSTA (1996, p.84), citando FORMOSINHO (1980).

Não ficamos por aqui, também os pais, os alunos, as autarquias e outros interesses locais têm poder na escola, nomeadamente desde a implementação do Decreto-Lei 115-A de 98 que lho atribuiu formalmente, mas que alguns destes actores exercem mesmo informalmente, (como veremos no capítulo seguinte).

2.4. A negociação na escola

Na organização escolar a tomada de decisões resulta de um processo de negociação e compromisso que, embora nunca consiga satisfazer totalmente todos os

actores quer sejam indivíduos ou grupos, mas acabam por reflectir os interesses dos que têm maior poder ou influência dentro da escola. Mas tenhamos em conta que mesmo os grupos mais fracos dispõem de algum poder de contestação que, podendo incomodar o funcionamento da escola, forçam os grupos mais poderosos a negociarem.

Em todos estes jogos de interesses e processos negociais, os diferentes actores utilizam bens de troca, que tal como refere COSTA são colocados na mesa das negociações e servem de moeda no processo negocial. O mesmo autor, citando HOYLE (1986a), apresenta o exemplo das negociações entre o director da escola e os professores, em que o director oferece aos professores “… a distribuição dos bens materiais, a promoção…, o aumento da auto-estima…, a autonomia e a aplicação flexível das regras;” e os professores oferecem ao director “A estima…, o apoio aos seus objectivos, a opinião sobre a liderança, a conformidade com as regras e a reputação da escola.” (1996, p.85)

Sendo a escola uma organização sujeita à constante introdução de inovações, e tendo o ser humano uma forte resistência à mudança, facilmente se entende que a inovação pedagógica e a introdução de reformas educativas são os factores que mais conflitos geram entre as organizações escolares e os professores, surgindo a negociação como fundamental neste processo.

3. Marcas da metáfora de Arena Política na escola